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Leia o Texto.

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12<br />

No entanto, não me sentia bem ao ver a descrição daquele<br />

personagem. Percebi que, também eu, jamais havia me sentido feliz. Talvez, de<br />

verdade, eu jamais tivesse tido noção clara de algum estado de felicidade, era-me<br />

qualquer coisa de brincar com pipas que jamais tive; rodar piões, cujo riso de<br />

delícia somente compartilhava de longe ao ver outros meninos em pleno gozo da<br />

alegria, que certamente seria a tradução de algum desvendar de simples... Eu<br />

queria tanto saber de regozijos, mas, talvez o que sentisse fosse o mesmo que<br />

comer um pão com manteiga. Ah, um pão com manteiga! Lembrei-me - como me<br />

saciava a fome... Para mim era tão pouco, tão breve, tão pequeno, tão barato a<br />

felicidade, que não entendia como não tê-la. Será que aquele sentimento tão<br />

negativo, que nós, eu e José André sentíamos, não seria o reflexo dos sentimentos<br />

que víamos em adultos?<br />

Ouvíamos dizer: – A vida é barra pesada. - Que vida insuportável. - Que<br />

droga de vida! Estes jargões soavam tantas vezes em minha cabeça, e<br />

certamente na dele, que as frases, seguramente, haviam se tornado sangue,<br />

entrado em nossas circulações e nos transformados. Será que é isso que ressoa<br />

dentro dele e em mim - indaguei no silêncio.<br />

Comecei a associar os fatos de que muitos garotos da escola também haveriam de<br />

ter as mesmas similaridades que eu estava sentindo. Que tanto eles como José<br />

André e eu nunca havíamos tido grandes coisas, mas que não sentíamos aquela<br />

vontade tão sem bons propósitos. Fui remetido neste momento, às palavras da<br />

professora, quando perguntada, por que eu teria que fazer o que o outro não<br />

fazia, e ela me respondera: - “As pessoas, Henrique, são diferentes umas das<br />

outras”. Embora o personagem, ao menos até então, não portasse conduta<br />

marginal, o sentimento que mantinha em seu pobre coração era de desesperança,<br />

amargor, tristeza e desânimo.<br />

Apesar de sua pouca idade aquele personagem não era mais tão criança,<br />

bem podia saber das coisas. Os mais velhos sempre lhe aconselhavam a<br />

abandonar a revolta, mas ele fomentava sua ira, estava desiludido. Algo<br />

misterioso ou diabólico o conduzia a ser persuadido a insistir. Imaginava que seu<br />

sofrer era demasiado múltiplo. Como se tudo de doído lhe doesse em dobro.<br />

Havia em si uma ambição desproporcional, afinal estávamos no Brasil e as<br />

desigualdades eram marcantes e, para a maioria das pessoas, terem o que comer<br />

já era milagre, chegar ao final do primeiro grau era uma vitória inimaginável.<br />

Ele pensava fielmente, que se possuíssem coisas que tantos outros tinham, seria

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