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Leia o Texto.

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10<br />

acompanhar sem reclamar nada, e lá se foi, obediente. Era incrível como eu<br />

me lembrava. Só me faltava tê-la visto às suas costas com seu alfanje.<br />

A morte de meu pai foi muito marcante, eu imaginava que meu pai fosse<br />

uma espécie de santo, que jamais morreria. Lembro-me nitidamente de sua mão<br />

forte apertando meu braço até começar a chorar e alguém me retirar dali.<br />

Reparei, ainda antes de sair do quarto, enquanto ele se estrebuchava com a dor<br />

da partida, que chorava; olhando-me, como se quisesse dizer algo para mim.<br />

Fiquei com medo. Aquilo ficou misturado na história do conto que ele contava<br />

em certos dias, papeando com seu Araldo. E então, lembrei-me de uma vez<br />

quando me surrou com uma vara de marmelo, por conta de algo que fiz e que<br />

nunca me lembrei de ter feito ou da verdadeira razão por que devia ter<br />

apanhado.<br />

Naquele dia eu desejei não tê-lo, desejei que tivesse morrido. Meu pai tinha um<br />

pátrio poder absoluto. Eu devia saber sempre por que estava apanhando, porque<br />

ele certamente, saberia por que estava me surrando. Mas, agora já não<br />

importava mais. Mais tarde, entretanto, entendi que, mesmo assim, preferia<br />

viver sem saber de suas razões por me surrar, que perdê-lo definitivamente.<br />

No dia do falecimento de meu pai, algumas pessoas choravam, outras<br />

conversavam e ainda outras cuidavam das crianças, dentre as quais, aquele<br />

menino franzino que fugia de quando em quando para ir espiar o movimento<br />

daquele povo estranho que enchia o lugar ao redor do seu cadáver, eu senti<br />

medo, mas algo me puxava para ficar espiando, não devia ter ido tão próximo<br />

dele – ai voltei a lembrar de repente daquele momento inesquecível -, foi como<br />

uma chaga incurável. Ficou-me as marcas para sempre, não no punho, mas na<br />

alma. Ao sondar de longe o cortejo fúnebre e definitivo dele, senti escorregar<br />

uma lágrima vulgar e fria em minhas faces, talvez descobrisse que aquele<br />

momento era-me o derradeiro, definitivo, nunca mais iria vê-lo. Talvez o vulgar<br />

daquela gota translúcida e salgada, fosse pela involuntária displicência do que<br />

sentia sem compreender.<br />

Ainda com meu livro à mão, sentei-me entre o meio fio, um tronco de<br />

árvore, a lata de lixo e a rua à minha frente. A história fluía diante de meus olhos<br />

- porta para a minha mente ávida -, e nela eu mergulhava no seu mundo.

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