josé da silva carvalho - DSpace CEU
josé da silva carvalho - DSpace CEU josé da silva carvalho - DSpace CEU
1826, tornando-se assim causadores das desgraças subsequcntes l . £ que as reformas essenciaes, requisitadas pela burguezia e pelo povo, taes como a extinceSo dos privilegios, a desamortisaçao da propriedade e o ensino scientifico, eram contrarias á classe aristocrática e á do clero, alliada d'aquella durante secólos. Por isso, se os mais .perspicazes e illustrados, de entre os nobres e os elericaes, comprehendiam a necessidade de transigir com o espirito democrático do seu tempo, transigiam contrariados, e sempre diligenciando ceder o menos possivel e o mais tarde que pudesse ser. D'aqui, as promessas mal cumpridas ou nao cumpridas de todo e as nefastas meias medidas. Ambos os partidos—o dos aristócratas reformadores e o dos vintistas radicaes—estavam ainda fortemente representados, em 1832, persistindo impenitentemente nos seus erros. Mas de cada um d'elles se tinham já entáo separado os políticos mais moderados, convergindo para a formacáo de um partido medio. Do lado dos conservadores, veiu Mousinho da Silveira; do lado dos demócratas, Silva Carvalho. Homens de estado, feitos na leitura dos melhores livros e pelo exemplo das grandes capacidades políticas de Inglaterra e de Franca,—tendo-os a experiencia convencido de que a organisacáo dos poderes públicos segundo a constituicáo de 1822 annulla a acçao do poder executivo, tornando impossivel o governo, e de que era um contrasenso querer firmar o régimen representativo e repartir melhor a riqueza, isto é, qtíeier libertar o pensamento e o capital, deixando de pé as adversas instituiçoes do passado,—estavam ambos de accordo em que líberdade e constituicáo seriam cousas vas, se as nao completassem os códigos e as leis orgánicas que, modificando a estructura intima da sociedade, criassem ao mesmo tempo os sentimentos e os costumes proprios para assegurar de vez os beneficios da reforma. D. Pedro abraçou estas ideas, e nisso está a sua maior gloria. Combatendo a constituicáo de 1822 e defendendo a que ontorgara, salvou a força governativa, evitou a anarchia em quanto viven, e segurou o seu posto á frente do partido liberal, o que era indispensavel para o bom éxito da causa. Bompendo abertamente com o partido aristocrático, provou a boa fé com que queria elevar a burguezia e o povo, e revelou a perspicacia com que viu que de justiça o futuro lhes pertencia, por isso que a nova era, que vinha abrir, deveria ser mais de coragem cívica, de trabalho e de sciencia, que de pundonor militar, qualidade essencialmente fidalga, ou de auctoridade religiosa, necessidade temporaria, que justificara a organisacáo do clero e a sua riqueza. Os principios e as leis que antepoz intemeratamente á sofreguidáo ingleza, aos preconceitos do orgulho aristocrático e á errada política dos demagogos continham, pois, as bases mais seguras da prosperidade nacional, bem como a líberdade da consciencia, da térra e do trabalho, sujeita apenas as prescripçoes santas e ünpessoaes da justiça. D. Pedro, Mousinho da Silveira e Silva Carvalho—eis os tres grandes homens a quem Portugal deve os seus progressos no seculo xix. «Aos golpes da regencia da Terceira (escreveu Rebello da Silva 2 ), seguiram-se os golpes nao menos necessarios e decisivos da dictadura de Lisboa. As ordens religiosas extinctas, os antigos tribunaes abolidos, os principios da Carta 1 Manuscriptos de Mousinho da Silveira, na Bibliotheca Nacional. * VarSes ülustres da» tres epocha» constitucionaes, pag. 206.
applicados, os privilegios reduzidos á innocencia das vaidades nobiliarias, c os apoios carcomidos do régimen absoluto feridos uns após outros vieram ao chao. Serviço iuapreciavcl, que nao se viu entáo, mas que todos reconhecem hoje. Audacia e previdencia raras, a que devemos os progressos e a tranquillidade aetuaes ! «Pelo que nos custou a queda do ultimo padrasto d'essas cidadellas, que diziam inoffensivas—a lei dos vinculos—podemos avaliar os annos e os combates, que nos levariam o assalto e a demolicáo das outras, se esta occasiáo única se nao tivesse aproveitado, como sinceramente pediam os que, desprezando as liçoes da experiencia, ignoravam o segredo de destruir no presente para edificar no futuro.» Na verdade, os golpes da dictadura de Lisboa foram nao menos necessarios e decisivos do que os da regencia da Terceira. A legislaçao de Mousinho continha, é certo, expressa ou implícitamente, a reforma completa da sociedade; comtudo, foi necessario tornar viaveis muitos dos seus artigos, e quasi todos dependiam de leis adjectivas e de regulamentos, cuja elaboraçao nao era tarefa menos difHcil que a de formular vagamente as leis substantivas. Faltavam tambem os códigos. Havia a organisar as repartiçoes publicas, o novo régimen tributario e as alfandegas. O estado precisava, alem de tudo isto, de fundar o crédito publico, firmar novos tratados e fomentar a agricultura, a prosperidade colonial, a industria, as bellas artes e o desenvolvimento da educacáo nacional em todos os seus ramos. Nao era dos menos arduos o trabalho de conter a ambicáo de cortos partidarios, empregar outros e sofrear as exigencias de muitos que mais se impunham do que pediam e a que era necessario attender para nao prejudicar uma causa ainda pouco enraizada. Um tal trabalho incluia a escoiha de quasi todo o pessoal da nova adininistraçao do estado, e envolvia naquella epocha uma das mais difficeis empresas. Para supperar táo momentosas difficuldades, encontrou D. Pedro em Silva Carvalho um estadista cuja capacidade politica era superior á do legislador da Terceira. Tiveram os dois homens de estado occasiáo de medir as suas forças, na cámara dos deputados, em 1834. As armas de acerba dialéctica de Mousinho cairam-lhe aos pés feitas em pcdaços, aos golpes da argumentacáo singela e sempre cortez de Silva Carvalho 1 . Mas foi principalmente na pratica da administracáo publica que a sua rara capacidade politica se evidenciou, a ponto de dispertar nos proprios adversarios a ambicáo de o attrahirem ás suas fileiras 2 . Acompanhcmol-o na prodigiosa empresa do começo da regeneracáo politica do estado portuguez. Carvalho vira claramente que a guerra civil entre os sectarios do absolutismo e os do régimen constitucional era urna lucta de classes, uma competencia de principios, e entendia que o systema de fusáo c de mutuas concessoes, tantas vezes tentado com pessimos resultados, dá logar a uma politica hybrida e sem 1 Vide a Gazela do governo, de 25 de novembro de 34, pag. 739, e José da Silva Carvalho c o seu tempo, vol. i, pag. 305. Vide tambem, na Gazeta de 1834, toda a discussáo sobre a venda dos bens nacionaes; e na pag. 706, a replica em defesa da organisacáo provisoria do Thesouro. 2 Cartas de Passos Manuel, de novembro de 1836, nesta seccáo de documentos.
- Page 56 and 57: cortes, para ellas decidirem dos se
- Page 58 and 59: á la reconnaissance de la Reine et
- Page 60 and 61: mentó a expedié á son gouverneme
- Page 62 and 63: As promessas de amnistía, as prome
- Page 64 and 65: «Depois de conferenciar em, o Impe
- Page 66 and 67: manobrado efficazmentc no Tejo, o d
- Page 68 and 69: ponto essencial para um plano segur
- Page 70 and 71: Na acçao de Messines, Sá bateu-se
- Page 72 and 73: Ill. m0 a v. ex. a DOC. CCLXXVI Car
- Page 74 and 75: a pedra no sapato aos puramente sal
- Page 76 and 77: semelhante motivo residir em Lisboa
- Page 78 and 79: no Estado Maior, apesar das minhas
- Page 80 and 81: os taes srs. Stubbs e Pacheco. Pela
- Page 82 and 83: a força que actualmente existe no
- Page 84 and 85: tomou auto para proceder contra a p
- Page 86 and 87: que os salteadores, chamados guias,
- Page 88 and 89: e esperal-os para nao termos perdas
- Page 90 and 91: elativa a negociaçoes cora D. Migu
- Page 92 and 93: DOC. CCLXXXVII Calculo da força mi
- Page 94 and 95: Escrevo a Freiré, mas tu és o the
- Page 96 and 97: abrir as communicaç
- Page 98 and 99: DOC. CCXC Memoria Silva Carvalho re
- Page 100 and 101: It appears to me that a sum less th
- Page 102 and 103: ever-to-be-lamented Majesty the Duk
- Page 105: SILVA CARVALHO (1833-1836) A SUA AG
- Page 109 and 110: conferiu-lhe a presidencia da nova
- Page 111 and 112: a nossa legislaçao antiga (que é
- Page 113 and 114: motivos a que adcante nos referirem
- Page 115 and 116: A mesma tcstomunha nos disse que on
- Page 117 and 118: denuncia-o; é agarrado e mettido n
- Page 119 and 120: Iam abrir-se as portas do parlament
- Page 121 and 122: passasse a lci das hypothecas, uma
- Page 123 and 124: Imagiiie-se quanto Silva Carvalho,
- Page 125 and 126: Na sessao de 22 de outubro, declaro
- Page 127 and 128: publica, a fim de nos livrarmos da
- Page 129 and 130: cultivar sómente os terrenos mais
- Page 131 and 132: nem previram que, pelas frequentes
- Page 133 and 134: «Depois de ter tomado as ordens de
- Page 135 and 136: importantes ramos da prosperidade p
- Page 137 and 138: que de presente só paga a capital
- Page 139 and 140: nal. Quanto a indemnisaçoes, julga
- Page 141 and 142: por contrato, tudo o mais fica depe
- Page 143 and 144: de Saldanha os esforços que empreg
- Page 145 and 146: de quem menos a devia esperar. Acab
- Page 147 and 148: Já mal disposta por estes boatos,
- Page 149 and 150: interpellaçao ao ministerio, cujas
- Page 151 and 152: o Mais de oito dias se passaram em
- Page 153 and 154: destruir a melhor parte do seu trab
- Page 155 and 156: «Segunda. — Que os povos estáo
1826, tornando-se assim causadores <strong>da</strong>s desgraças subsequcntes l<br />
. £ que as reformas<br />
essenciaes, requisita<strong>da</strong>s pela burguezia e pelo povo, taes como a extinceSo<br />
dos privilegios, a desamortisaçao <strong>da</strong> proprie<strong>da</strong>de e o ensino scientifico, eram<br />
contrarias á classe aristocrática e á do clero, allia<strong>da</strong> d'aquella durante secólos.<br />
Por isso, se os mais .perspicazes e illustrados, de entre os nobres e os elericaes,<br />
comprehendiam a necessi<strong>da</strong>de de transigir com o espirito democrático do seu<br />
tempo, transigiam contrariados, e sempre diligenciando ceder o menos possivel<br />
e o mais tarde que pudesse ser. D'aqui, as promessas mal cumpri<strong>da</strong>s ou nao<br />
cumpri<strong>da</strong>s de todo e as nefastas meias medi<strong>da</strong>s.<br />
Ambos os partidos—o dos aristócratas reformadores e o dos vintistas<br />
radicaes—estavam ain<strong>da</strong> fortemente representados, em 1832, persistindo impenitentemente<br />
nos seus erros. Mas de ca<strong>da</strong> um d'elles se tinham já entáo separado<br />
os políticos mais moderados, convergindo para a formacáo de um partido medio.<br />
Do lado dos conservadores, veiu Mousinho <strong>da</strong> Silveira; do lado dos demócratas,<br />
Silva Carvalho. Homens de estado, feitos na leitura dos melhores livros e pelo<br />
exemplo <strong>da</strong>s grandes capaci<strong>da</strong>des políticas de Inglaterra e de Franca,—tendo-os<br />
a experiencia convencido de que a organisacáo dos poderes públicos segundo<br />
a constituicáo de 1822 annulla a acçao do poder executivo, tornando impossivel<br />
o governo, e de que era um contrasenso querer firmar o régimen representativo<br />
e repartir melhor a riqueza, isto é, qtíeier libertar o pensamento e o capital,<br />
deixando de pé as adversas instituiçoes do passado,—estavam ambos de accordo<br />
em que líber<strong>da</strong>de e constituicáo seriam cousas vas, se as nao completassem os<br />
códigos e as leis orgánicas que, modificando a estructura intima <strong>da</strong> socie<strong>da</strong>de,<br />
criassem ao mesmo tempo os sentimentos e os costumes proprios para assegurar<br />
de vez os beneficios <strong>da</strong> reforma.<br />
D. Pedro abraçou estas ideas, e nisso está a sua maior gloria. Combatendo<br />
a constituicáo de 1822 e defendendo a que ontorgara, salvou a força governativa,<br />
evitou a anarchia em quanto viven, e segurou o seu posto á frente do partido<br />
liberal, o que era indispensavel para o bom éxito <strong>da</strong> causa. Bompendo abertamente<br />
com o partido aristocrático, provou a boa fé com que queria elevar a<br />
burguezia e o povo, e revelou a perspicacia com que viu que de justiça o futuro<br />
lhes pertencia, por isso que a nova era, que vinha abrir, deveria ser mais de<br />
coragem cívica, de trabalho e de sciencia, que de pundonor militar, quali<strong>da</strong>de<br />
essencialmente fi<strong>da</strong>lga, ou de auctori<strong>da</strong>de religiosa, necessi<strong>da</strong>de temporaria, que<br />
justificara a organisacáo do clero e a sua riqueza.<br />
Os principios e as leis que antepoz intemeratamente á sofreguidáo ingleza,<br />
aos preconceitos do orgulho aristocrático e á erra<strong>da</strong> política dos demagogos<br />
continham, pois, as bases mais seguras <strong>da</strong> prosperi<strong>da</strong>de nacional, bem como a<br />
líber<strong>da</strong>de <strong>da</strong> consciencia, <strong>da</strong> térra e do trabalho, sujeita apenas as prescripçoes<br />
santas e ünpessoaes <strong>da</strong> justiça.<br />
D. Pedro, Mousinho <strong>da</strong> Silveira e Silva Carvalho—eis os tres grandes<br />
homens a quem Portugal deve os seus progressos no seculo xix.<br />
«Aos golpes <strong>da</strong> regencia <strong>da</strong> Terceira (escreveu Rebello <strong>da</strong> Silva 2<br />
), seguiram-se<br />
os golpes nao menos necessarios e decisivos <strong>da</strong> dictadura de Lisboa. As<br />
ordens religiosas extinctas, os antigos tribunaes abolidos, os principios <strong>da</strong> Carta<br />
1<br />
Manuscriptos de Mousinho <strong>da</strong> Silveira, na Bibliotheca Nacional.<br />
* VarSes ülustres <strong>da</strong>» tres epocha» constitucionaes, pag. 206.