LÍNGUA PORTUGUESA
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UNIdERSITÁRIO<br />
REDAÇÃO<br />
INSTRUÇÃO: Leia os seguintes trechos.<br />
Não se pode ser sem rebeldia<br />
Eu acho que os adultos, pais e professores, deveriam compreender<br />
melhor que a rebeldia, afinal, faz parte do processo da<br />
autonomia, quer dizer, não é possível ser sem rebeldia. O grande<br />
problema está em como amorosamente dar sentido produtivo, dar<br />
sentido criador ao ato rebelde e de não acabar com a rebeldia.<br />
Tem professores que acham que a única saída para a rebelião,<br />
para a rebeldia é a punição, é a castração. Eu confesso que tenho<br />
grandes dúvidas em torno da eficácia do castigo.<br />
Eu acho que a liberdade não se autentica sem o limite da<br />
autoridade, mas o limite que a autoridade se deve propor a si<br />
mesma, para propor ao jovem a liberdade, é um limite que necessariamente<br />
não se explicita através de castigos. Eu acho que a<br />
liberdade precisa de limites, a autoridade inclusive tem a tarefa de<br />
propor os limites, mas o que é preciso, ao propor os limites, é<br />
propor à liberdade que ela interiorize a necessidade ética do limite,<br />
jamais através do medo.<br />
A liberdade que não faz uma coisa porque teme o castigo<br />
não está “eticizando-se”. É preciso que eu aceite a necessidade<br />
ética, aí o limite é compromisso e não mais imposição, é assunção.<br />
O castigo não faz isso. O castigo pode criar docilidade, silêncio.<br />
Mas os silenciados não mudam o mundo.<br />
(Paulo Freire, Pedagogia dos sonhos possíveis.<br />
Org. Ana M. A. Freire. Editora Unesp)<br />
Autoridade em Ética<br />
Pode-se dizer, em tese, que a essência da ética provém da<br />
pressão da comunidade sobre o indivíduo. O homem pouco tem de<br />
gregário, e nem sempre sente, instintivamente, os desejos comuns<br />
a sua grei. Esta, ansiosa para que o indivíduo aja no seu<br />
interesse, tem inventado vários artifícios com o fim de harmonizar<br />
os interesses individuais com os seus próprios. Um destes é o<br />
governo, outro é a lei e o costume, e o outro é a moral. A moral<br />
torna-se uma força eficiente de duas maneiras: primeiro, através<br />
do louvor e da censura dos que o cercam e das autoridades; e<br />
segundo, através do autolouvor e da autocensura, os quais são<br />
chamados de “consciência”. Por meio destas várias forças —<br />
governo, lei, moral — o interesse da comunidade se faz sentir<br />
sobre o indivíduo. [...]<br />
Chego agora a meu último problema, que se relaciona com<br />
os direitos do indivíduo, em contraposição aos da sociedade. A<br />
ética, nós o dissemos, é parte de uma tentativa para tornar o<br />
homem mais gregário do que a natureza o fez. As pressões que a<br />
moral exerce sobre o indivíduo são, pode-se dizer, devidas ao<br />
gregarismo apenas parcial da espécie humana. Mas isto é uma<br />
meia verdade. Muitas de suas melhores cousas vêm do fato de<br />
não ser ela completamente gregária. O homem tem seu valor<br />
intrínseco, e os melhores indivíduos fazem contribuições para o<br />
bem geral que não são solicitadas e que, muitas vezes, chegam a<br />
sofrer reação por parte do resto da comunidade. É, pois, uma<br />
parte essencial da busca do bem geral, o permitir aos indivíduos<br />
liberdades que não sejam, evidentemente, maléficas aos outros. É<br />
isto que dá origem ao permanente conflito entre a liberdade e a<br />
autoridade, e estabelece limites ao princípio de que a autoridade é<br />
a fonte da virtude.<br />
(Bertrand Russell. A sociedade humana na ética e na política.<br />
Título original: Human society in Ethics and Politics.<br />
Tradução de Oswaldo de Araujo Souza. São Paulo:<br />
Companhia Editora Nacional, 1956)<br />
6<br />
VUNESP 2003 – <strong>LÍNGUA</strong> <strong>PORTUGUESA</strong><br />
PROPOSIÇÃO<br />
A atuação do homem na sociedade, mediada por padrões e<br />
modelos de comportamento e sujeita a atritos e tensões entre<br />
os interesses da comunidade e os dos indivíduos, pode assumir<br />
as mais variadas formas, que vão do puro e simples<br />
enquadramento até à mais exacerbada rebeldia. Os dois trechos<br />
apresentados focalizam essa questão sob os pontos de<br />
vista pedagógico (Paulo Freire) e ético (Bertrand Russell).<br />
Tomando como base de reflexão, se achar necessário, os textos<br />
mencionados, a letra de Raul Seixas e o poema de<br />
Fernando Pessoa (Álvaro de Campos), bem como sua própria<br />
experiência e opinião, escreva uma redação de gênero dissertativo<br />
sobre o tema<br />
Comentário<br />
OS PADRÕES SOCIAIS<br />
E A LIBERDADE DO INDIVÍDUO.<br />
A proposta de Redação da VUNESP solicitou uma<br />
dissertação que analisasse “Os Padrões Sociais e a Liberdade<br />
do Indivíduo”.<br />
Por ser um tema de caráter filosófico, o vestibulando<br />
provavelmente sentiria maior dificuldade em apresentar,<br />
em sua redação, uma abordagem objetiva, sobretudo na<br />
argumentação.<br />
Antes de selecionar os argumentos, no entanto, era<br />
preciso que o aluno determinasse seu posicionamento<br />
(sua tese) a respeito do tema: de que forma o grupo<br />
social impede (ou não) a existência da liberdade individual?<br />
Para auxiliar a argumentação do texto, o candidato<br />
poderia explorar as idéias apresentadas nos textos da<br />
coletânea e do exame.<br />
Em Não se pode ser sem rebeldia, Paulo Freire<br />
ressalta o lado positivo da rebeldia, já que a falta dela<br />
pode acarretar (no contexto escolar) medo, comodismo,<br />
passividade. O educador, porém, ressalta que há necessidade<br />
de existirem limites.<br />
Já em Autoridade em Ética, Bertrand Russell expõe<br />
que a ética se origina da “pressão da comunidade sobre<br />
o indivíduo”, de tal forma que esse passe a atuar em prol<br />
da coletividade.<br />
Por fim, Álvaro de Campos, em Lisbon Revisited, e<br />
Raul Seixas, em Metamorfose Ambulante, radicalizam,<br />
propondo uma ruptura: a recusa de seguir padrões.