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«Um centro na margem»: o caso do cinema português - SciELO

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760<br />

Jacques Lemière<br />

conseguir, o mais completamente possível, a fusão <strong>do</strong> <strong>cinema</strong> e <strong>do</strong> audiovisual,<br />

prometida depois de 1990, e liquidar totalmente o dispositivo de 1971, e, <strong>na</strong><br />

profissão <strong>cinema</strong>tográfica, a associação <strong>do</strong>s cineastas favoráveis a esta fusão<br />

(a ARCA), bem como a associação <strong>do</strong>s produtores de <strong>cinema</strong> 73 , que é<br />

<strong>do</strong>mi<strong>na</strong>da por uma orientação idêntica. Em 2002 ocorreu uma crise que<br />

precipitou esta pressão reforma<strong>do</strong>ra: ten<strong>do</strong> (ilegalmente) as televisões (privadas<br />

e públicas) cessa<strong>do</strong> de enviar ao ICAM as somas que provinham da taxa<br />

sobre a publicidade televisiva, a crise fi<strong>na</strong>nceira <strong>do</strong> ICAM que daqui resultou<br />

foi, em Novembro de 2002, utilizada pelo governo para mudar a direcção<br />

deste Instituto e, ao mesmo tempo, legitimar a reforma. Estava em preparação<br />

uma nova lei <strong>do</strong> <strong>cinema</strong> que arriscava reequilibrar, fi<strong>na</strong>lmente, o sistema em<br />

favor <strong>do</strong>s filmes com entradas mais fortes (mais fi<strong>na</strong>nciamento dito<br />

automático e menos fi<strong>na</strong>nciamento dito selectivo) e reforçar o poder <strong>do</strong><br />

produtor, através <strong>do</strong> cruzamento de vários meios: fi<strong>na</strong>nciamentos aos produtores<br />

através de planos plurianuais (no quadro de «contratos-programa»),<br />

fim <strong>do</strong>s apoios individuais, reforma <strong>do</strong> sistema de júri 74 .<br />

Por outro la<strong>do</strong>, este modelo artesa<strong>na</strong>l <strong>do</strong> <strong>cinema</strong> <strong>português</strong> sofreu a<br />

estandardização sinuosa <strong>do</strong>s «mo<strong>do</strong>s de fazer» resultantes da europeização,<br />

objectivamente identificável, das práticas de fi<strong>na</strong>nciamento e de produção<br />

<strong>do</strong>s filmes. Em Portugal, o produtor já substituiu o cineasta como interlocutor<br />

privilegia<strong>do</strong> da instituição pública de fi<strong>na</strong>nciamento (e, como tempos<br />

vin<strong>do</strong> a sublinhar, todas as reformas futuras visam reforçar esta posição).<br />

A experiência europeia de produtores importantes (Paulo Branco, <strong>na</strong> produção<br />

de filmes ditos de autor, que gere a sua empresa num eixo luso-francês,<br />

a partir <strong>do</strong> <strong>centro</strong> <strong>português</strong>, o grupo Madragoa, e a partir <strong>do</strong> <strong>centro</strong> parisiense,<br />

Gemini Films; António Cunha Telles, <strong>na</strong> produção executiva de filmes<br />

estrangeiros, nomeadamente franceses, que escolhem Portugal como lugar<br />

de rodagem, actividade que constitui o essencial <strong>do</strong>s negócios da sua sociedade,<br />

Animatógrafo), o desenvolvimento das co-produções 75 e a mestiçagem<br />

73 Associação <strong>do</strong>s Produtores de Filmes de Longa-Metragem.<br />

74 Atribuímos «ao poder político <strong>do</strong> <strong>cinema</strong>», junto <strong>do</strong>s «autores-realiza<strong>do</strong>res», um sonho<br />

(em to<strong>do</strong> o <strong>caso</strong>, dificilmente realizável, embora politicamente custoso) de reduzir fortemente<br />

o número <strong>do</strong>s filmes apoia<strong>do</strong>s pelo fi<strong>na</strong>nciamento público (por exemplo, quatro filmes por<br />

ano), numa proporção de três filmes caros e um filme de «artista». «É como se criássemos<br />

duas portas», afirma um deles, «uma porta de entrada <strong>do</strong>s artistas e uma porta de entrada <strong>do</strong>s<br />

comerciantes. Trata-se de uma ideia errada, pois, se pretendemos fazer um filme industrial<br />

europeu, é necessário investir 20 milhões de euros no filme. Ora 20 milhões de euros<br />

representam três ou quatro anos de <strong>cinema</strong> <strong>português</strong>, incluin<strong>do</strong> to<strong>do</strong> o tipo de filmes, e tais<br />

ideias conduzirão à ruí<strong>na</strong>» (Janeiro de 2003).<br />

75 As co-produções tor<strong>na</strong>ram-se frequentes a partir de mea<strong>do</strong>s <strong>do</strong>s anos 80. Algumas são<br />

reais, outras são fictícias. No primeiro <strong>caso</strong>, o co-produtor ou os co-produtores estrangeiros<br />

trazem dinheiro para a produção portuguesa; no segun<strong>do</strong> <strong>caso</strong>, eles são ape<strong>na</strong>s (contra uma<br />

percentagem) um nome que permite a obtenção de certas subvenções (como o fun<strong>do</strong><br />

Eurimagem, «cujo quadro jurídico de obtenção exige uma co-produção).

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