«Um centro na margem»: o caso do cinema português - SciELO
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Jacques Lemière<br />
<strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l. Observaremos como num pequeno país, sem verdadeira indústria<br />
<strong>cinema</strong>tográfica, os processos e práticas de inter<strong>na</strong>cio<strong>na</strong>lização (que caracterizam<br />
o <strong>cinema</strong> desde o seu início) tomaram, nos últimos vinte e cinco anos,<br />
um relevo particular com a «europeização» desta indústria cultural.<br />
«A MAIS INTERNACIONAL DAS ARTES»<br />
Largamente desti<strong>na</strong><strong>do</strong> à circulação inter<strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l das obras 1 , o <strong>cinema</strong> foi<br />
sempre um campo de circulação inter<strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l <strong>do</strong>s realiza<strong>do</strong>res (de alguns, em<br />
qualquer <strong>caso</strong>, nomeadamente pela deslocação da Europa e da Ásia em direcção<br />
a Hollywood, mas também da África negra, magrebi<strong>na</strong> ou egípcia em direcção<br />
à Europa, em especial em direcção à França) e também <strong>do</strong>s actores (a aventura<br />
america<strong>na</strong> como conclusão da carreira <strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l ou europeia), <strong>do</strong>s técnicos (são<br />
disso exemplo os fenómenos de inter<strong>na</strong>cio<strong>na</strong>lização das carreiras <strong>do</strong>s directores<br />
de fotografia ou <strong>do</strong>s engenheiros de som) e, fi<strong>na</strong>lmente, como é óbvio, <strong>do</strong>s<br />
capitais (to<strong>do</strong>s os países de grande tradição <strong>cinema</strong>tográfica contemplaram <strong>na</strong><br />
sua legislação apoios ao <strong>cinema</strong>, dispositivos especiais de co-produção, como os<br />
acor<strong>do</strong>s franco-italianos <strong>do</strong>s anos 60, ou conheceram a implementação de coproduções<br />
no quadro <strong>do</strong> merca<strong>do</strong>).<br />
A análise da produção, da criação e da recepção <strong>cinema</strong>tográfica deve,<br />
por fim, confrontar o para<strong>do</strong>xo seguinte: por um la<strong>do</strong>, o <strong>cinema</strong> é «a mais<br />
inter<strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l das artes», segun<strong>do</strong> a expressão <strong>do</strong> cineasta Sergueï<br />
Eisenstein 2 ; por outro, um laço forte e específico une o <strong>cinema</strong> ao quadro<br />
<strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l, laço que podemos identificar a partir de um certo número de si<strong>na</strong>is.<br />
CINEMA E NAÇÃO<br />
O mais evidente desses si<strong>na</strong>is é a existência de géneros 3 próprios de<br />
certas <strong>cinema</strong>tografias <strong>na</strong>cio<strong>na</strong>is. Por exemplo, «o western é, evidentemente,<br />
o <strong>cinema</strong> americano por excelência» 4 e, mais genericamente, «Hollywood é<br />
uma terra de géneros» 5 , entre os quais podemos citar, para além <strong>do</strong> western,<br />
1<br />
Mesmo que essa circulação nem sempre seja mundial e permaneça igualmente geográfica<br />
e culturalmente dividida por sectores, os filmes da indústria <strong>cinema</strong>tográfica india<strong>na</strong> (uma grande<br />
indústria) ou da indústria egípcia (de menor dimensão) conhecem muito bem o caminho <strong>do</strong><br />
grande público <strong>do</strong>s países <strong>do</strong> Magrebe, mas não o <strong>do</strong> grande público da Europa ocidental.<br />
2 Na sua obra Réflexions d’un cinéaste, de Agosto de 1946 (col. «Essais et <strong>do</strong>cuments»,<br />
Moscovo, Éditions du Progrès, 1958): «Le <strong>cinema</strong>, bien sûr, est le plus inter<strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l des<br />
arts.»<br />
3 Defini<strong>do</strong>s como «as diversas manifestações de uma mesma grande forma» (J. L. Leutrat,<br />
Le <strong>cinema</strong> en perspective: une histoire, Nathan, 1992).<br />
4 Título de um livro de J. L. Rieupeyrout publica<strong>do</strong> em 1953.<br />
5 Jacqueline Nacache, Le cinéma hollywoodien classique, Nathan, 1995.