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«Um centro na margem»: o caso do cinema português - SciELO

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748<br />

Jacques Lemière<br />

1990-2003, FASE DEFENSIVA. EUROPEIZAÇÃO DAS PRÁTICAS<br />

E VELEIDADES COMERCIAIS<br />

PRESSÕES NOVAS EVIDENTES NAS DESIGNAÇÕES INSTITUCIONAIS<br />

Pressões novas vão abater-se, daqui em diante, sobre as definições <strong>do</strong><br />

<strong>cinema</strong> e <strong>do</strong> quadro legislativo de produção que os cineastas <strong>do</strong> «grupo<br />

funda<strong>do</strong>r» tinham consegui<strong>do</strong> impor no perío<strong>do</strong> anterior. Estas pressões são<br />

visíveis <strong>na</strong> nova desig<strong>na</strong>ção <strong>do</strong> organismo estadual encarrega<strong>do</strong> de apoiar<br />

a produção e a difusão <strong>cinema</strong>tográfica. Em 7 de Dezembro de 1971, a Lei<br />

n.º 7/71 denomi<strong>na</strong>va-o Instituto Português <strong>do</strong> Cinema (IPC). Em 1 de Fevereiro<br />

de 1994, o Decreto-Lei n.º 25/94 chamava-lhe Instituto Português de<br />

Arte Cinematográfica e <strong>do</strong> Audiovisual (IPACA, pela integração de um Secretaria<strong>do</strong><br />

Nacio<strong>na</strong>l para o Audiovisual, cria<strong>do</strong> em Fevereiro de 1990). Em 21 de<br />

Dezembro de 1998, esta mesma instituição passava a desig<strong>na</strong>r-se, pelo Decreto-Lei<br />

n.º 408/98, Instituto <strong>do</strong> Cinema, <strong>do</strong> Audiovisual e Multimédia (ICAM).<br />

Estas mudanças <strong>na</strong> denomi<strong>na</strong>ção são, cada uma delas, emblemáticas da<br />

fusão que o governo pretendia estabelecer entre o <strong>cinema</strong> — propriamente<br />

dito — e, em 1994, «o audiovisual» (isto é, a televisão) e, em 1998, o<br />

multimédia. Cada uma delas é, evidentemente, o reflexo de modificações da<br />

Lei Orgânica <strong>do</strong> Cinema e <strong>do</strong>s mecanismos de ajuda à produção, modificações<br />

que se supunha viriam favorecer esta dupla fusão. De mo<strong>do</strong> muito<br />

significativo, como observou oportu<strong>na</strong>mente em 1999 um cineasta 45 , duas<br />

palavras-chave <strong>do</strong> mecanismo anterior, desde sempre em vigor, desaparecem<br />

da desig<strong>na</strong>ção institucio<strong>na</strong>l fi<strong>na</strong>l, a palavra «arte» e a palavra «<strong>português</strong>»:<br />

«O merca<strong>do</strong> é demasia<strong>do</strong> pequeno… e o Instituto foi cria<strong>do</strong> porque<br />

não havia merca<strong>do</strong>. Neste momento, os tubarões encontraram aí uma maneira<br />

de ir buscar dinheiro, de ganhar às custas de uma ideia de arte <strong>cinema</strong>tográfica.<br />

É por esta razão que ‘arte’ e ‘<strong>português</strong>’ desapareceram da<br />

desig<strong>na</strong>ção <strong>do</strong> Instituto <strong>do</strong> Cinema (o Instituto Português de Arte Cinematográfica<br />

e <strong>do</strong> Audiovisual passou a desig<strong>na</strong>r-se Instituto <strong>do</strong> Cinema, <strong>do</strong><br />

Audiovisual e Multimédia), perden<strong>do</strong>-se <strong>português</strong> e arte.»<br />

e […] apoia, assim, a ideia de uma produção <strong>cinema</strong>tográfica portuguesa em estreita relação<br />

com a economia global e inter<strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l <strong>do</strong> <strong>cinema</strong>» (encontraremos mais longe a história,<br />

ple<strong>na</strong> de senti<strong>do</strong>, das mudanças posteriores <strong>do</strong> nome de Instituto Português <strong>do</strong> Cinema). Esta<br />

ideia de «descomprometimento político» e de «liberalização <strong>do</strong> <strong>cinema</strong> de Esta<strong>do</strong>» articula-<br />

-se, <strong>na</strong>turalmente, com o contexto <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> autoritário que promulga esta lei.<br />

45 João Botelho, «Uniamoci nella dissidenza. Conversazione tra João Botelho, Pedro<br />

Costa, João Mário Grilo», in Amori di perdizione. Storie di <strong>cinema</strong> portoghese (1970-1999),<br />

1999. Notemos que os cineastas da ARPF reconvocam estes <strong>do</strong>is termos <strong>na</strong> sua carta de 25<br />

de Abril de 2002 dirigida ao ministro da Cultura: «Nós fazemos filmes portugueses [...] e<br />

acreditamos que o Cinema Português é um veículo fundamental e verdadeiro da arte e da<br />

cultura deste país.»

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