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«Um centro na margem»: o caso do cinema português - SciELO

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742<br />

Jacques Lemière<br />

Portugal, uma lei (que veio substituir a de 1948, que taxava os filmes importa<strong>do</strong>s).<br />

A lei de 7 de Dezembro de 1971 instituía uma taxa, dita «adicio<strong>na</strong>l»,<br />

de 15% sobre o bilhete <strong>do</strong>s <strong>cinema</strong>s para fi<strong>na</strong>nciar o Instituto Português <strong>do</strong><br />

Cinema, que tinha por função suportar a produção de longas-metragens portuguesas<br />

30 .<br />

Um origi<strong>na</strong>l sistema público de produção foi, desta forma, instituí<strong>do</strong>,<br />

vin<strong>do</strong> a assegurar (a partir de 1973, data da criação <strong>do</strong> Instituto Português<br />

<strong>do</strong> Cinema) uma ajuda «a fun<strong>do</strong> perdi<strong>do</strong>» a uma deze<strong>na</strong> de longas-metragens<br />

por ano (ficção e <strong>do</strong>cumentários) num país cuja economia <strong>do</strong> <strong>cinema</strong> apresentava<br />

então as características seguintes:<br />

1. Ausência de um merca<strong>do</strong> <strong>cinema</strong>tográfico <strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l ou externo que<br />

permitisse rentabilizar os investimentos feitos <strong>na</strong> produção <strong>do</strong>s filmes.<br />

A parte <strong>do</strong> merca<strong>do</strong> interno <strong>do</strong>s filmes portugueses é, em Portugal,<br />

extremamente fraca, não ultrapassan<strong>do</strong> hoje 2% <strong>do</strong> total da frequência.<br />

E os países lusófonos não podem constituir-se como merca<strong>do</strong>s<br />

externos: a África lusófo<strong>na</strong> está ainda demasia<strong>do</strong> enredada <strong>na</strong> guerra<br />

civil e no desenvolvimento desigual para ser um espaço de exportação<br />

<strong>do</strong>s filmes portugueses; da mesma forma, o Brasil, mas por outras<br />

razões: a norma <strong>do</strong> <strong>português</strong> de Portugal (nomeadamente no plano<br />

fonético) está demasia<strong>do</strong> afastada entre os <strong>do</strong>is países para que a<br />

exportação <strong>do</strong>s filmes portugueses para o Brasil seja possível sem<br />

uma <strong>do</strong>bragem ou legendagem; e, por outro la<strong>do</strong>, o universo cultural<br />

brasileiro está hoje mais próximo <strong>do</strong> <strong>do</strong>s Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s <strong>do</strong> que <strong>do</strong><br />

de Portugal, o que compromete o interesse <strong>do</strong> público brasileiro pelas<br />

problemáticas e formas <strong>do</strong> <strong>cinema</strong> <strong>português</strong>. Esta realidade é retratada,<br />

em 1999, por João Botelho da seguinte forma: «O Instituto<br />

Português de Cinema foi inventa<strong>do</strong> nos últimos tempos de Marcelo<br />

Caetano para defender o <strong>cinema</strong> <strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l. Foi a direita que tomou esta<br />

iniciativa […] mas para defender o <strong>cinema</strong> <strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l. As subvenções<br />

a fun<strong>do</strong> perdi<strong>do</strong> foram inventadas porque nós não tínhamos merca<strong>do</strong>.<br />

Nós tínhamos uma língua que não tinha merca<strong>do</strong> 31 .»<br />

30 O preâmbulo da Lei n.º 7/71, que cria o Instituto Português de Cinema, confere-lhe<br />

como missão «proteger a produção de longas-metragens <strong>cinema</strong>tográficas» enquanto «manifestações<br />

da vitalidade cultural necessária ao desenvolvimento equilibra<strong>do</strong> da cultura portuguesa<br />

e a cultura <strong>do</strong>s portugueses», bem como apoiar, como já vimos mais acima, «a projecção<br />

inter<strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l de Portugal» (lei de 7 de Dezembro de 1971, reproduzida no Guia Profissio<strong>na</strong>l<br />

<strong>do</strong> Cinema, Televisão e Vídeo, cit.).<br />

31 João Botelho, «Uniamoci nella dissidenza. Conversazione tra João Botelho, Pedro<br />

Costa, João Mário Grilo», in Amori di perdizione. Storie di <strong>cinema</strong> portoghese (1970-1999),<br />

cit., 1999.

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