Para muitos, a figura central dos episódios do dia <strong>22</strong> de outubro não foi Luiz Paulo, João Lopes Salgado ou qualquer outra vítima ou líder estudantil. Nos momentos que se seguiram ao ataque dos policiais, destacou-se a atuação de Américo Piquet Carneiro. Diretor da Faculdade de Ciências Médicas desde 1964, cargo que ocuparia até 1971, o docente é apontado pelos estudantes da época como o responsável por evitar que os agentes do Dops e da PM invadissem o hospital naquela madrugada. “Seria uma tragédia maior. Eles aguardavam uma ordem de invasão, que acabou não se concretizando por interferência do professor Piquet Carneiro”, conta Fernando Pinto Bravo, estudante do segundo ano da FCM na época. Religioso, professor com uma visão progressista da saúde e da política, Piquet Carneiro utilizou de seus contatos na Igreja Católica e com alguns políticos para impedir que o pior acontecesse. “Ele era um democrata, um homem muito respeitado”, define João Andrade, calouro da FCM em 1968. A pediatra Edna da Cunha, que trabalhava no hospital no trágico dia, também relembra a intervenção decisiva do Diretor. : “O professor Piquet Carneiro ficou revoltadíssimo e, no que pôde, protegeu os alunos”, diz. Dois jornais da época destacaram, nas edições do dia seguinte, a atuação do docente. O Diário de Notícias informou que Piquet Carneiro havia tentado retirar os policiais do local e que teria tranqüilizado os estudantes, “permitindo a permanência na Faculdade, sob sua garantia”. Segundo o Jornal dos Sports, o Diretor, após “entrar em entendimento com o chefe de policiamento”, revelou estar “ao lado dos seus alunos e contra a repressão”. A corajosa declaração não surpreendeu os estudantes. Em outubro de 68, Piquet já era reconhecido quase como um deles. “Ele era amigo e protetor dos alunos”, relembra Valter Duarte, que cursava o segundo ano de Medicina. Para Muitos estudantes, com medo de serem presos e aguardando notícias dos demais amigos feridos, decidiram permanecer a madrugada no hospital. Jane Corona foi um deles. “Lembro-me de que fiquei sentada a noite todinha ali, na escada que vai para o Centro Cirúrgico. Eu, a Ângela, a Evelyn, todas nós sentadas, ainda assim, sem entender o que estava acontecendo. A noite foi passando e nós ali”. A essa altura, outras pessoas já haviam se juntado à resistência dos estudantes. Tenório infor- Evelyn Eisenstein, da turma de Valter, o Diretor era “uma pessoa extraordinária”. “Foi o único que se posicionou”, ressalta. Dilson Pires, aluno do primeiro ano de Odontologia em 1968, lembra-se de Piquet “como um pai”. Ferido gravemente durante a passeata, ficou mais de dois meses internado no hospital e perdeu um rim. Estudante de origem humilde, quando enfim recebeu alta, não tinha para onde ir. Nesse momento, a generosidade de Piquet manifestou-se. “Ele me acolheu dentro da universidade, me deixou morar na residência dos médicos”, conta o dentista. Aliado Aliado Aliado e e pr protetor pr otetor Os laços do Diretor com a cúpula católica já haviam servido outras vezes para livrar os estudantes da violência militar. Segundo Luíz Roberto Tenório, presidente do Centro Acadêmico da Faculdade de Ciências Médicas da Uerj (Casaf) em 1968, Piquet conseguia informações por meio da Igreja sobre pessoas que estavam ameaçadas e as repassava aos alunos, prevenindo-os. “Ele salvou vidas”, diz o ex-estudante, antes de relembrar o caso do colega Cláudio Campos, calouro da FCM, torturado pelo DOI-Codi, que Piquet Carneiro exigiu examinar no Hospital Central do Exército.“A partir desse movimento, o Cláudio pas- ma que intelectuais e artistas foram até o local prestar solidariedade. Segundo o Diário de Notícias, às 20h, cerca de trezentos membros da Frente Unida dos Estudantes do Calabouço (Fuec), da Faculdade Nacional de Direito e da Universidade do Brasil (hoje UFRJ), “armados de pedras e paus”, chegaram à faculdade “para ficarem de vigília até saberem se o colega Luiz Paulo sobreviveria”. O jornal reproduziu trecho do discurso de um dos alunos: “Eles traçaram o caminho da violên- ADVIR ADVIR Nº Nº <strong>22</strong> <strong>22</strong> • • OUTUBRO OUTUBRO DE DE 2008 2008 • • 20 20 sou a ter uma assistência melhor e foi transferido para o Pedro Ernesto. Aqui foi tratado e está vivo e muito bem hoje”, conta Tenório. O cargo administrativo ocupado pelo docente, no entanto, impediu que ele saísse ileso perante as ações do movimento estudantil. Tenório recorda a dificuldade que teve ao pôr em prática a decisão da assembléia dos estudantes de trocar de roupa no gabinete de Piquet, em protesto pela construção do vestiário, em 67. “Eu era contra, mas perdi na assembléia. Foi lamentável porque era um professor muito aliado nosso, uma pessoa importante na luta de resistência”, conta. João Lopes Salgado, também diretor do Centro Acadêmico na época, lembra que a relação entre a direção e o movimento “tinha aspectos muito sentimentais”. “Você tinha que lutar contra uma estrutura onde estava uma pessoa muito legal”, lembra. Salgado foi um dos que experimentou mais de perto a generosidade de Piquet. Em 1969, após ter participado do sequestro do embaixador norte-americano Charles Elbrick e já afastado da FCM, foi surpreendido pela notícia de que o Diretor havia mandado entregar ao militante a chave de seu consultório, em Copacabana. “Era uma pessoa que não me via há um ano e que eu havia até desrespeitado algumas vezes. Mas, era tão maravilhoso que disse '‘entrega pra ele essa chave’'”, relembra Salgado. O jovem não chegou a recebê-la, mas a atitude de Piquet Carneiro nunca mais foi esquecida.
IQUET CARNEIRO: UM ALIADO ADVIR ADVIR ADVIR Nº Nº Nº <strong>22</strong> <strong>22</strong> <strong>22</strong> • • • OUTUBRO OUTUBRO OUTUBRO DE DE DE 2008 2008 2008 • • • 21 21 21
- Page 3 and 4: REVIST REVISTA REVIST A AD ADVIR AD
- Page 5 and 6: ín índice ín Editorial Editorial
- Page 7 and 8: o poeta declina de toda responsabil
- Page 9 and 10: 8 UMA BATALHA ADVIR ADVIR Nº Nº 2
- Page 11 and 12: ADVIR ADVIR ADVIR Nº Nº Nº 22 22
- Page 13 and 14: isas ade, nós” ADVIR ADVIR ADVIR
- Page 15 and 16: edro Ernesto no Dia Estadual do a o
- Page 17 and 18: gás lacrimogênio. A substância s
- Page 19 and 20: falsa. Só a partir daquele dia, ac
- Page 21: ADVIR ADVIR ADVIR Nº Nº Nº 22 22
- Page 25 and 26: ecidas e outras com a vida mutilada
- Page 27 and 28: Car Carlos Car los Alber Alberto Al
- Page 29 and 30: do os jornais, havia entre três e
- Page 31 and 32: nós que estava à frente do movime
- Page 33 and 34: Chico Buarque, ainda mais porque, c
- Page 35 and 36: NCENDIARAM A GUANABARA são de um e
- Page 37 and 38: pleto, táticas de combate. Na UEG,
- Page 39 and 40: A A FORMA FORMATURA FORMA TURA QUE
- Page 41 and 42: assistência médica, morriam e que
- Page 43 and 44: coaduna às necessidades do povo br
- Page 45 and 46: EVEL EVELYN EVEL YN EISENSTEIN EISE
- Page 47 and 48: ÓRIA ao golpe de 1964 nem às pers
- Page 49 and 50: do por socialistas, anarquistas e p
- Page 51 and 52: seqüestros nos quais acabaram limi
- Page 53 and 54: a democradura e de tudo que represe
- Page 55 and 56: do, atingindo e discriminando, tamb
- Page 57 and 58: espírito estudantil, como coisa ab
- Page 59 and 60: Foto: Evandro Teixeira gando a dar
- Page 61 and 62: omo perdoá-los? Car Pôr fogo em t
- Page 63 and 64: amigo, a cuja memória dedico este
- Page 65 and 66: ADAIL ADAIL IV IVAN IV AN DE DE LEM
- Page 67 and 68: Sua orientação era marcada por fo
- Page 69 and 70: do movimento dos trabalhadores invi
- Page 71 and 72: TOS SOCIAIS NOS 40 ANOS DE 1968 Pal
- Page 73 and 74:
Abaix Abaixo Abaix Abaix o o o impe
- Page 75 and 76:
nacional do Trabalho - OIT, Organiz
- Page 77 and 78:
proximidade na trajetória históri
- Page 79 and 80:
tivos ou por sua criminalização,
- Page 81 and 82:
incontornável nos âmbitos naciona
- Page 83 and 84:
internas em cada uma dessas unidade
- Page 85 and 86:
qualquer repercussão internacional
- Page 87 and 88:
nou-se uma palavra de ordem central
- Page 89 and 90:
descentrada ou totalmente desprovid
- Page 91 and 92:
1 Löwy, M. O romantismo revolucion
- Page 93 and 94:
ENADOR DO NÚCLEO PIRATININGA DE CO
- Page 95 and 96:
O movimento operário tinha sido de
- Page 97 and 98:
Desde 1967, o Ministro do Planejame
- Page 99 and 100:
Ninguém sairia até a empresa cede
- Page 101 and 102:
BAMA NTRA O RACISMO ADVIR ADVIR Nº
- Page 103 and 104:
gênero, sexualidade, nacionalidade
- Page 105 and 106:
www.intactaretina.blogspot.com/2007
- Page 107 and 108:
Gloriosos Anos”, e assim passou a
- Page 109 and 110:
promover o pleno emprego e, com iss
- Page 111 and 112:
alimentação, ao pagamento de taxa
- Page 113 and 114:
http://news.bbc.co.uk/nol/shared/sp
- Page 115 and 116:
gindo novas eleições. De Gaulle,
- Page 117 and 118:
http://perfunction.typepad.com/phot
- Page 119 and 120:
mães. A indiferença dos europeus
- Page 121 and 122:
BIBLIOGRAFIA BIBLIOGRAFIA FRIEDEN,
- Page 123 and 124:
É É PROBIDO PROBIDO PROIBIR PROIB
- Page 125 and 126:
orientada para a emancipação cult
- Page 127 and 128:
cando ampliar o escopo da MPB, alar
- Page 129 and 130:
A guitarra elétrica criava um som
- Page 131 and 132:
Acabou-se a contemplação estétic
- Page 133 and 134:
ESTAVA LÁ ADVIR ADVIR Nº Nº 22 2
- Page 135 and 136:
aula, mas não assinávamos a lista
- Page 137 and 138:
Eu discursei um pouco antes da saí
- Page 139 and 140:
durante seis meses com camponeses.
- Page 141 and 142:
é outro arrependimento que eu tenh