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O QUE É A FILOSOFIA?

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Estes dois primeiros aspectos ou folhas do cérebro-su-jeito, a sensação como o conceito, são muito<br />

frágeis. Não são somente desconexões e desintegrações objetivas, mas uma imensa fadiga que faz com que<br />

as sensações, tornadas pastosas, deixem escapar os elementos e as vibrações que elas têm cada vez mais<br />

dificuldade em contrair. A velhice é esta fadiga, ela mesma: então, ou é uma queda no caos mental, fora do<br />

plano de composição, ou uma recaída sobre opiniões inteiramente acabadas, clichês que mostram que um<br />

artista nada mais tem a dizer, não mais sendo capaz de criar sensações novas, não.mais sabendo como<br />

conservar, contemplar, contrair. O caso da filosofia é um pouco diferente, embora dependa de uma fadiga<br />

semelhante; desta vez, incapaz de manter-se sobre o plano de imanência, o pensamento cansado não mais<br />

pode suportar as velocidades infinitas do terceiro gênero que medem, à maneira de um turbilhão, a copresença<br />

do conceito a todos seus componentes intensivos ao mesmo tempo (consistência); é remetido às<br />

velocidades relativas que só concernem à sucessão do movimento de um ponto a outro, de um componente<br />

extensivo a um outro, de uma idéia a uma outra, e que medem simples associações, sem poder reconstituir o<br />

conceito. E, sem dúvida, ocorre que estas velocidades relativas são muito grandes, a ponto de simularem o<br />

absoluto; só são porém velocidades variáveis de opinião, de discussão ou de "réplicas", como entre os<br />

infatigáveis jovens cuja rapidez de espírito é celebrada, mas também entre os velhos cansados, que seguem<br />

opiniões desaceleradas e entretêm discussões estagnantes, falando sozinhos no interior de sua cabeça<br />

esvaziada, como uma longínqua lembrança de seus antigos conceitos, aos quais se agarram ainda, para não<br />

caírem inteiramente no caos.<br />

274 ▲<br />

Sem dúvida, as causalidades, as associações, as integrações nos inspiram opiniões e crenças, como<br />

diz Hume, que são maneiras de esperar e de reconhecer algo (inclusive "objetos mentais"): vai chover, a<br />

água vai ferver, é o caminho mais curto, é a mesma figura sob um outro aspecto... Mas, embora tais opiniões<br />

se insinuem freqüentemente entre as proposições científicas, não fazem parte delas, e a ciência submete<br />

esses processos a operações de uma natureza inteiramente diferente, que constituem uma atividade de<br />

conhecer, e remetem a uma faculdade de conhecimento como terceira folha de um cérebro-sujeito, não<br />

menos criador que os outros dois. O conhecimento não é nem uma forma, nem uma força, mas uma função:<br />

"eu funciono". O sujeito apresenta-se agora como um "ejecto", porque extrai dos elementos cuja característica<br />

principal é a distinção, o discernimento: limites, constantes, variáveis, funções, todos estes functivos ou<br />

prospectos que formam os termos da proposição científica. As projeções geométricas, as substituições e<br />

transformações algébricas não consistem em reconhecer algo através das variações, mas em distinguir<br />

variáveis e constantes, ou em discernir progressivamente os termos que tendem na direção de limites<br />

sucessivos. De modo que, quando uma constante é determinada, numa operação científica, não se trata de<br />

contrair casos ou momentos, numa mesma contemplação, mas de estabelecer uma relação necessária entre<br />

fatores que permanecem independentes. Os atos fundamentais da faculdade científica de conhecer<br />

pareceram-nos, neste sentido, ser os seguintes: colocar limites que marcam uma renúncia às velocidades<br />

infinitas, e traçam um plano de referência; determinar variáveis que se organizam em séries tendendo no<br />

sentido desses limites; coordenar as variáveis independentes, de modo a estabelecer, entre elas ou seus<br />

limites, relações necessárias das quais dependem funções distintas, o plano de referência sendo uma<br />

coordenação em ato;<br />

275 ▲<br />

determinar as misturas ou estados de coisas que se relacionam com as coordenadas, e às quais as funções<br />

se referem. Não basta dizer que estas operações do conhecimento científico são funções do cérebro; as<br />

funções são elas mesmas, as dobras de um cérebro que traça as coordenadas variáveis de um plano de<br />

conhecimento (referência) e que envia por toda a parte observadores parciais.<br />

Há, ainda, uma operação que precisamente mostra a persistência do caos, não apenas em torno do<br />

plano de referência ou de coordenação, mas em desvios de sua superfície variável, sempre reposta em jogo.<br />

São as operações de bifur-cação e de individuação: se os estados de coisas lhes são submissos, é porque<br />

são inseparáveis de potenciais que tomam do próprio caos, e que não atualizam sem risco de ser destruídos<br />

ou submergidos. Cabe pois à ciência pôr em evidência o caos, no qual mergulha o próprio cérebro, enquanto<br />

sujeito do conhecimento. O cérebro não cessa de constituir limites, que determinam funções de variáveis em<br />

áreas particularmente extensas; com mais razão, as relações entre essas variáveis (conexões) apresentam<br />

um caráter incerto e casual, não apenas nas sinapses elétricas que indicam um caos estatístico, como<br />

também nas sinapses químicas que remetem a um caos determinista(14). Há menos centros cerebrais que<br />

pontos, concentrados numa área, disseminados numa outra; e "osciladores", moléculas oscilantes que<br />

passam de um ponto a um outro. Mesmo num modelo linear, como o dos reflexos condicionados, Erwin<br />

Straus mostrava que o essencial era compreender os intermediários, os hiatos e os vazios. Os paradigmas<br />

arborizados do cérebro dão lugar a figuras rizomáticas, sistemas acentrados, redes de autômatos

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