15.04.2013 Views

O QUE É A FILOSOFIA?

O QUE É A FILOSOFIA?

O QUE É A FILOSOFIA?

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

coisa senão uma opinião empírica como tipo psicosso-ciológico. <strong>É</strong> preciso pois que a imanência do vivido a<br />

um sujeito transcendental faça da opinião uma proto-opinião na constituição da qual entram a arte e a cultura,<br />

e que se exprime como um ato de transcendência deste sujeito no vivido (comunicação), de modo a formar<br />

uma comunidade de amigos. Mas o sujeito transcendental husserliano não esconde o homem europeu cujo<br />

privilégio é de "europeizar" sem cessar, como o grego "grecizava", isto é, de ultrapassar os limites das outras<br />

culturas, mantidas como tipos psicossociais? Não somos então reconduzidos à simples opinião do Capitalista<br />

médio, o grande Maior, o Ulisses moderno cujas percepções são clichês, e cujas afecções são marcas, num<br />

mundo de comunicação tornado marketing, do qual mesmo Cézanne ou Van Gogh não podiam escapar? A<br />

distinção do originário e do derivado não basta, por si mesma, para nos fazer sair do simples domínio da<br />

opinião, e a Urdoxa não nos eleva até o conceito. Como na aporia platônica, a fenomenologia não teve jamais<br />

tanta necessidade de uma sabedoria superior, de uma "ciência rigorosa", quanto no momento em que, no<br />

entanto, nos convidava a renunciar a ela. A fenomenologia queria renovar nossos conceitos, dando-nos<br />

percepções e afecções que nos fariam nascer no mundo: não como bebês ou como hominídeos, mas como<br />

seres de direito cujas proto-opiniões seriam as fundações deste mundo. Mas não se luta contra os clichês<br />

perceptivos e afetivos se não se luta também contra a máquina que os produz. Invocando o vivido primordial,<br />

fazendo da imanência uma imanência num sujeito, a fenomenologia não podia impedir o sujeito de formar<br />

somente opiniões que já reproduziriam o clichê das novas percepções e afecções prometidas. Nós<br />

continuaríamos a evo-<br />

194 ▲<br />

luir na forma da recognição; nós invocaríamos a arte, mas sem atingir os conceitos capazes de enfrentar o<br />

afecto e o percepto artísticos. Os gregos com suas cidades, a fenomenologia com nossas sociedades<br />

ocidentais, tem certamente razão de supor a opinião como uma das condições da filosofia. Mas a filosofia<br />

encontrará a via que conduz ao conceito, invocando a arte como o meio de aprofundar a opinião, e de<br />

descobrir opiniões originárias, ou ao contrário é preciso, com a arte, subverter a opinião, elevá-la ao<br />

movimento infinito que a substitui precisamente pelo conceito?<br />

A confusão do conceito com a função é ruinosa sob vários aspectos para o conceito filosófico. Ela faz<br />

da ciência o conceito por excelência, que se exprime na proposição científica (o primeiro prospecto). Ela<br />

substitui o conceito filosófico por um conceito lógico, que se exprime nas proposições de fato (segundo<br />

prospecto). Ela deixa ao conceito filosófico uma parte reduzida ou degenerada, que ela se reserva no domínio<br />

da opinião (terceiro prospecto), servindo-se de sua amizade por uma sabedoria superior ou uma ciência<br />

rigorosa. Mas o conceito não tem seu lugar em nenhum destes três sistemas discursivos. O conceito não é<br />

uma função do vivido, nem uma função científica ou lógica. A irredutibilidade dos conceitos às funções só se<br />

descobre se, ao invés de confrontá-las de maneira indeterminada, se compara o que constitui a referência de<br />

umas e o que faz a consistência das outras. Os estados de coisas, os objetos ou corpos, os estados vividos<br />

formam as referências de função, ao passo que os acontecimentos são a consistência de conceito. São esses<br />

termos que é preciso considerar do ponto de vista de uma redução possível.<br />

EXEMPLO XII<br />

195 ▲<br />

Uma tal comparação parece corresponder à empresa de Badiou, particularmente interessante no<br />

pensamento contemporâneo. Ele se propõe a escalonar, sobre uma linha ascendente, uma série de fatores<br />

que vão das funções aos conceitos. Ele se dá uma base, neutralizada com relação aos conceitos, tanto<br />

quanto às funções: uma multiplicidade qualquer, apresentada como Conjunto elevável ao infinito. A primeira<br />

instância é a situação, quando o conjunto é remetido a elementos que são sem dúvida multiplicidades, mas<br />

que são submetidos a um regime do "contar por um" (corpos ou objetos, unidades da situação). Em segundo<br />

lugar, os estados de situação são os subconjuntos, sempre em excesso sobre os elementos do conjunto ou<br />

os objetos da situação; mas este excesso do estado não se deixa mais hierarquizar como em Cantor, ele é<br />

"indeterminável", numa "linha de errância", conforme ao desenvolvimento da teoria dos conjuntos. Resta que<br />

ele deve ser representado na situação, desta vez como "indiscernível" ao mesmo tempo que a situação se<br />

torna quase completa: a linha de errância forma aqui quatro figuras, quatro laços como funções genéricas<br />

(científica, artística, política ou dóxica, amorosa ou vivida), às quais correspondem produções de "verdades".<br />

Mas atinge-se, talvez, então uma conversão de imanência da situação, conversão do excesso ao vazio que<br />

vai reintrodu-zir o transcendente: é o sítio acontecimental, que se mantém à borda do vazio na situação, e<br />

não comporta mais unidades, mas singularidades, como elementos que dependem das funções precedentes.<br />

Enfim, o acontecimento, ele mesmo, aparece (ou desaparece), menos como uma singularidade que como um<br />

ponto aleatório sepa-<br />

196 ▲

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!