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O QUE É A FILOSOFIA?

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são somente vividos imanentes ao sujeito solipsista, mas as referências do sujeito transcendental ao vivido;<br />

não são variáveis, perceptivo-afetivas, mas as grandes funções que encontram nestas variáveis seu percurso<br />

respectivo de verdade. Não são conjuntos vagos ou confusos, subconjuntos, mas totalizações que excedem<br />

toda po-<br />

185 ▲<br />

tência dos conjuntos. Não são somente juízos ou opiniões empíricas, mas proto-crenças, Urdoxa, opiniões<br />

originárias como proposições(6). Não são os conteúdos sucessivos do fluxo de imanência, mas os atos de<br />

transcendência, que o atravessam e o carregam, determinando as "significações" da totalidade potencial do<br />

vivido. O conceito como significação é tudo isso ao mesmo tempo, imanência do vivido ao sujeito, ato de<br />

transcendência do sujeito com relação às variações do vivido, totalização do vivido ou função destes atos.<br />

Dir-se-ia que os conceitos filosóficos só se salvam ao aceitar tornarem-se funções especiais, e<br />

desnaturalizando a imanência de que ainda carecem: como a imanência não é mais que a do vivido, ela é<br />

forçosamente imanência a um sujeito, cujos atos (funções) serão os conceitos relativos a este vivido — como<br />

vimos, seguindo a longa desnaturação do plano de imanência.<br />

Embora seja perigoso para a filosofia depender da generosidade dos lógicos, ou de seus remorsos,<br />

podemos perguntar se não podemos encontrar um equilíbrio precário entre os conceitos científico-lógicos e<br />

os conceitos fenomenológico-filosóficos. Gilles-Gaston Granger pôde propor uma repartição em que o<br />

conceito, sendo de início determinado como função científica e lógica, deixa todavia um lugar de terceira<br />

zona, mas autônomo, a funções filosóficas, funções ou significações do vivido, como totalidade virtual (os<br />

conjuntos confusos parecem desempenhar um papel de eixo ar-ticulador entre as duas formas de<br />

conceitos)(7). A ciência ar-<br />

(6) Sobre as três transcendências que aparecem no campo de imanência, a primordial, a intersubjetiva e a<br />

objetiva, cf. Husserl, Méditations cartésiennes, Ed. Vrin, notadamente § 55-56. Sobre a Urdoxa, Idées<br />

directrices pour une phénoménologie, Gallimard, notadamente § 103-104; Expérience et jugement, P.U.F.<br />

(7) G.-G. Granger, Pour Ia connaissance philosophique, cap. VI e VII. O conhecimento do conceito filosófico<br />

reduz-se à referência ao vivido, na medida em que esta o constitui como "totalidade virtual": o que implica um<br />

sujeito transcendental, e Granger não parece dar ao "virtual" outro sentido senão o sentido kantiano de um<br />

todo da experiência possível (p. 174-175). Observar-se-á o papel hipotético que Granger atribui aos<br />

"conceitos confusos" na passagem dos conceitos científicos aos conceitos filosóficos.<br />

186 ▲<br />

rogou o conceito a si mesma, mas há também conceitos não-científicos, que suportamos em doses<br />

homeopáticas, isto é, fenomenológicas. Donde os mais estranhos híbridos que se vê nascer hoje, do fregehusserlianismo<br />

ou mesmo de wittgenstein-heideggerianismo. Não era já, há muito tempo, a situação da<br />

filosofia na América, com um grande departamento de lógica e um minúsculo de fenomenologia, embora os<br />

dois partidos estivessem quase sempre em guerra? <strong>É</strong> como patê de cotovia, mas a parte da cotovia<br />

fenomenoló-gica nem sequer é a mais refinada, é a que o cavalo lógico concede, às vezes, à filosofia. <strong>É</strong><br />

antes como o rinoceronte e o pássaro que vive de seus parasitas.<br />

<strong>É</strong> uma longa série de malentendidos sobre o conceito. <strong>É</strong> verdade que o conceito é confuso, vago, mas<br />

não porque não tem contorno: é porque ele é vagabundo, não-discursivo, em deslocamento sobre um plano<br />

de imanência. <strong>É</strong> intencional ou modular, não porque tem condições de referência, mas porque é composto de<br />

variações inseparáveis que passam por zonas de indiscernibilidade, e lhe mudam o contorno. Não há de<br />

maneira nenhuma referência, nem ao vivido, nem aos estados de coisas, mas uma consistência definida por<br />

seus componentes internos: nem denotação de estado de coisas, nem significação do vivido, o conceito é o<br />

acontecimento como puro sentido que percorre imediatamente os componentes. Não há número, inteiro nem<br />

fracionário, para contar as coisas que apresentam suas propriedades, mas uma cifra que as condensa, lhes<br />

acumula os componentes percorridos e sobrevoados. O conceito é uma forma ou uma for-<br />

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ça, jamais uma função em qualquer sentido possível. Em resumo, não há conceito senão filosófico sobre o<br />

plano de imanência, e as funções científicas ou as proposições lógicas não são conceitos.<br />

Prospectos designam, de início, os elementos da proposição (função proposicional, variáveis, valor de<br />

verdade...), mas também os diversos tipos de proposições ou modalidades do juízo. Se o conceito filosófico é<br />

confundido com uma função ou uma proposição, não será sob uma espécie científica ou mesmo lógica, mas<br />

por analogia, como uma função do vivido ou uma proposição de opinião (terceiro tipo). Assim, deve-se<br />

produzir um conceito que dê conta desta situação: o que a opinião propõe é uma certa relação entre uma<br />

percepção exterior como estado de um sujeito e uma afecção interior como passagem de um estado a um

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