15.04.2013 Views

O QUE É A FILOSOFIA?

O QUE É A FILOSOFIA?

O QUE É A FILOSOFIA?

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

Todo conceito completo é um conjunto neste sentido, e tem um número determinado; os objetos do conceito<br />

são os elementos do conjunto(1).<br />

(1) Cf. Russell, Príncipes de Ia mathématique, P.U.F., sobretudo apêndice A, e Frege, Les fondements de<br />

1'arithmétique, Ed. du Seuil, § 48 e<br />

177 ▲<br />

<strong>É</strong> preciso ainda fixar condições da referência que dêem os limites ou intervalos nos quais uma variável entra<br />

numa proposição verdadeira: X é um homem, João é um homem, porque ele fez isto, porque ele se apresenta<br />

assim... Tais condições de referências constituem não a compreensão, mas a intensão do conceito. São<br />

apresentações ou descrições lógicas, intervalos, potenciais ou "mundos possíveis", como dizem os lógicos,<br />

eixos de coordenadas, estados de coisas ou situações, subconjuntos do conceito: a estrela da tarde e a<br />

estrela da manhã. Por exemplo, um conceito de um só elemento, o conceito de Napoleão I, tem por intensão<br />

"o vencedor de Iena", "o vencido de Waterloo"... Vê-se bem que nenhuma diferença de natureza separa aqui<br />

a intensão da extensão, já que ambas dizem respeito à referência, a intensão sendo somente condição de<br />

referência e constituindo uma endo-referência da proposição, a extensão constituindo a exo-referência. Não<br />

se sai da referência elevando-se até sua condição; permanece-se na extensionalidade. A questão é antes a<br />

de saber como se chega, através destas apresentações intencionais, a uma determinação unívoca dos<br />

objetos ou elementos do conceito, variáveis proposicionais, argumentos da função do ponto de vista da exoreferência<br />

(ou da representação): é o problema do nome próprio, e a tarefa de uma identificação ou<br />

individuação lógica, que nos faz passar dos estados de coisas à coisa ou ao corpo (objeto), por operações de<br />

quantificação que permitem tanto atribuir os predicados essenciais da coisa, como o que constitui enfim a<br />

compreensão do conceito. Vênus (a estrela da tarde e a estrela da manhã) é um planeta cujo tempo de<br />

revolução é inferior ao da terra... "Vencedor de Iena" é uma descrição ou apresenta-<br />

54: Ecrits logiques et philosopbiques, sobretudo "Fonction et concept", "Concept et objet", e para a crítica da<br />

variável, "Qu'est-ce qu'une fonction?". Cf. os comentários de Claude Imbert nestes dois livros, e Philippe de<br />

Rouilhan, Frege, les paradoxes de Ia représentation, Ed. de Minuit.<br />

178 ▲<br />

ção, ao passo que "general" é um predicado de Bonaparte, "imperador" um predicado de Napoleão, embora<br />

ser nomeado general ou sagrado imperador sejam descrições. O "conceito proposicional" evolui pois<br />

inteiramente no círculo da referência, na medida em que opera uma logicização dos func-tivos, que se tornam<br />

assim os prospectos de uma proposição (passagem da proposição científica à proposição lógica).<br />

As frases não têm auto-referência, como o mostra o paradoxo do "eu minto". Mesmo os performativos<br />

não são auto-referenciais, mas implicam numa exo-referência da proposição (a ação que lhe está ligada por<br />

convenção, e que realizamos enunciando a proposição) e uma endo-referência (o título ou o estado de coisas<br />

sob o qual se é habilitado a formular o enunciado: por exemplo, a intensão do conceito no enunciado "eu juro"<br />

é testemunho no tribunal, criança à qual se censura algo, enamorado que se declara, etc.)(2). Em<br />

contrapartida, se emprestamos à frase uma auto-consistência, esta só pode residir na não-contradição formal<br />

da proposição ou das proposições entre si. Mas quer dizer que as proposições não gozam materialmente de<br />

qualquer endo-consistência, nem de exo-consistência. Na medida em que um número cardi-nal pertence ao<br />

conceito proposicional, a lógica das proposições precisa de uma demostração científica da consistência da<br />

aritmética dos números inteiros, a partir de axiomas; ora, segundo os dois aspectos do teorema de Gõdel, a<br />

demonstração de consistência da aritmética não pode ser representada no interior do sistema (não há endoconsistência),<br />

e o sistema se choca necessariamente com enunciados verdadeiros que não são todavia<br />

demonstráveis, que permanecem indecidíveis (não há exo-consistência, ou o sistema consis-<br />

(2) Oswald Ducrot criticou o caráter auto-referencial que se empresta aos enunciados performativos (o que se<br />

faz dizendo: eu juro, eu prometo, eu ordeno...). Dire et ne pas dire, Ed. Hermann, p. 72 e ss.<br />

179 ▲<br />

tente não pode ser completo). Em resumo, tornando-se pro-posicional, o conceito perde todos os caráteres<br />

que possuía como conceito filosófico, sua auto-referência, sua endo-consistência e sua exo-consistência. <strong>É</strong><br />

que um regime de independência substituiu o da inseparabilidade (independência das variáveis, dos axiomas,<br />

e das proposições indecidíveis). Mesmo os mundos possíveis, como condições de referência, são cortados<br />

do conceito de Outrem que lhes daria consistência (de modo que a lógica se acha estranhamente desarmada<br />

diante do solipsismo). O conceito em geral não tem mais uma cifra, mas um número aritmético; o indecidível<br />

não marca mais a inseparabilidade dos componentes intencionais (zona de indiscernibilidade) mas, ao<br />

contrário, a necessidade de distingui-los, segundo a exigência da referência, que torna toda consistência (a<br />

autoconsistência) "incerta". O próprio número marca um princípio geral de separação: "o conceito letra da<br />

palavra Zabl separa Z de a, a de h, etc". As funções tiram toda sua potência da referência, seja a estados de

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!