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O QUE É A FILOSOFIA?

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função composta. Da mesma forma, o problema das tangentes (diferenciação) mobiliza tantas variáveis<br />

quantas curvas há, e a derivada, para cada uma, é a tangente qualquer num ponto qualquer; mas o problema<br />

inverso das tangentes (integração) não<br />

(6) Sobre o sentido que toma a palavra figura (ou imagem, Bild) numa teoria das funções, cf. a análise de<br />

Vuillemin a propósito de Riemann: na projeção de uma função complexa, a figura "dá a ver o curso da função<br />

e suas diferentes afecções", "faz ver imediatamente a correspondência funcional" da variável e da função (La<br />

philosophie de 1'algèbre, P.U.F., pp. 320-326).<br />

163 ▲<br />

considera mais que uma variável única, que é a própria curva tangente a todas as curvas de mesma<br />

ordenada, sob a condição de uma mudança de coordenadas(7). Uma dualidade análoga concerne à<br />

descrição dinâmica de um sistema de n partículas independentes: o estado instantâneo pode ser<br />

representado por n pontos e n vetores de velocidade num espaço de três dimensões, mas também por um<br />

único ponto num espaço de fases.<br />

Dir-se-ia que a ciência e a filosofia seguem duas vias opostas, porque os conceitos filosóficos têm por<br />

consistência acontecimentos, ao passo que as funções científicas têm por referência estados de coisas ou<br />

misturas: a filosofia não pára de extrair, por conceitos, do estado de coisas, um acontecimento consistente, de<br />

algum modo um sorriso sem gato, ao passo que a ciência não cessa de atualizar, por funções, o<br />

acontecimento num estado de coisas, uma coisa ou um corpo referíveis. Deste ponto de vista, os Pré-<br />

Socráticos detinham já o essencial de uma determinação da ciência, válida até nossos dias, quando faziam<br />

da física uma teoria das misturas e de seus diferentes tipos(8). E os Estóicos levarão ao mais alto ponto a<br />

distinção fundamental entre os estados de coisas ou misturas de corpos nas quais se atualiza o aconteci-<br />

(7) Leibniz, D'une ligne issue de lignes, e Nouvelle application du calcul (trad. fr. Oeuvre concernant le calcul<br />

infinitésimal, Ed. Blanchard). Estes textos de Leibniz são considerados como bases da teoria das funções.<br />

(8) Tendo descrito a "mistura íntima" das trajetórias de tipos diferentes em toda região do espaço de fases de<br />

um sistema de estabilidade fraca, Prigogine e Stengers concluem: "Pode-se pensar numa situação familiar, a<br />

dos números sobre o eixo em que cada racional está cercado de irracionais, e cada irracional, de racionais.<br />

Pode-se igualmente pensar na maneira pela qual Anaxágoras [mostra como] toda coisa contém em todas as<br />

suas partes, até as mais ínfimas, uma multiplicidade infinita de germes qualitativamente diferentes<br />

intimamente misturados" (La nouvelle alliance, Gallimard, p. 241).<br />

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mento, e os acontecimentos incorporais, que se elevam como uma fumaça dos próprios estados de coisas. <strong>É</strong>,<br />

pois, por duas características ligadas que o conceito filosófico e a função científica se distinguem: variações<br />

inseparáveis, variáveis independentes; acontecimentos sobre um plano de imanência, estados de coisas num<br />

sistema de referência (disso decorre o estatuto das ordenadas intensivas, diferentes nos dois casos, já que<br />

são os componentes interiores do conceito, mas são somente coordenadas às abcissas extensivas nas<br />

funções, quando a variação não é mais que um estado de variável). Os conceitos e as funções se<br />

apresentam assim como dois tipos de multiplicidades ou variedades que diferem em natureza. E, embora os<br />

tipos de multiplicidades científicos tenham por si mesmos uma grande diversidade, eles deixam de fora as<br />

multiplicidades propriamente filosóficas, para as quais Bergson exigia um estatuto particular definido pela<br />

duração, "multiplicidade de fusão" que exprimia a inseparabilidade das variações, por oposição às<br />

multiplicidades de espaço, número e tempo, que ordenavam misturas e remetiam à variável ou às variáveis<br />

independentes(9). <strong>É</strong> verdade que esta oposição mesma, entre as multiplicidades científicas e filosóficas,<br />

discursivas e intuitivas, extensionais e intensivas, está apta a julgar também a correspondência entre a<br />

ciência e a filosofia, sua eventual colaboração, sua mútua inspiração. Há enfim uma terceira grande diferença,<br />

que não concerne mais ao pressuposto respectivo nem ao elemento como<br />

(9) A teoria das duas espécies de "multiplicidades" aparece em Bergson desde Les données itntnédiates, cap.<br />

II: as multiplicidades de consciência se definem pela "fusão", a "penetração", termos que se encontra<br />

igualmente em Husserl desde a Filosofia da aritmética. A semelhança entre os dois autores é extrema com<br />

relação a isto. Bergson não cessará de definir o objeto da ciência por mistos de espaço-tempo, e seu ato<br />

principal pela tendência a tomar o tempo como "variável independente", ao passo que a duração, no outro<br />

pólo, passa por todas as variações.<br />

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conceito ou como função, mas ao modo de enundação. Com certeza, há tanta experimentação como<br />

experiência do pensamento em filosofia quanto na ciência, e nos dois casos a experiência pode ser<br />

perturbadora, estando próxima do caos. Mas também há tanta criação em ciência quanto na filosofia ou nas

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