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O QUE É A FILOSOFIA?

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Empédocles, é Filia que o traça, mesmo se ela não retorna sobre mim sem dobrar o Ódio como o movimento<br />

tornado negativo que testemunha uma sub-transcendência do caos (o vulcão) e uma sobre-transcendência de<br />

um deus. Pode ser que os primeiros filósofos, e sobretudo Empédocles, tenham ainda o ar de sacerdotes ou<br />

mesmo de reis. Eles se apropriam da máscara do sábio, e, como diz Nietzsche, como a filosofia não se<br />

disfarçaria em seus primórdios? E mesmo, poderá ela jamais prescindir dos disfarces? Se a instauração da<br />

filosofia se confunde com a suposição de um plano pré-filo-sófico, como a filosofia não tiraria proveito disso<br />

para pôr uma máscara? Resta que os primeiros filósofos traçam um plano, que movimentos ilimitados não<br />

cessam de percorrer, sobre duas faces, das quais uma é determinável como Physis, na medida em que dá<br />

uma matéria ao Ser, e a outra como Noüs, enquanto dá uma imagem ao pensamento. <strong>É</strong> Anaximandro que<br />

leva ao maior rigor a distinção das duas faces, combinando o movimento das qualidades com a potência de<br />

um horizonte absoluto, o Apeiron ou o Ilimitado, mas sempre sobre o mesmo plano. O filósofo opera um vasto<br />

seqüestro da sabedoria, ele a põe a serviço da imanência pura. Ele substitui a genealogia por uma geologia.<br />

EXEMPLO III<br />

Pode-se apresentar toda a história da filosofia do ponto de vista da instauração de um plano de<br />

imanência? Distinguir-se-iam então os fisicalistas, que insistem sobre a matéria do Ser, e os noologistas,<br />

sobre a ima-<br />

gem do pensamento. Mas um risco de confusão surge muito rápido: em vez de o plano de imanência, ele<br />

mesmo, constituir esta matéria do Ser ou esta imagem do pensamento, é a imanência que seria remetida a<br />

algo que seria como um "dativo", Matéria ou Espírito. <strong>É</strong> o que se torna evidente com Platão e seus<br />

sucessores. Em vez de um plano de imanência constituir o Uno-Todo, a imanência está "no" Uno, de tal modo<br />

que um outro Uno, desta vez transcendente, se superpõe àquele no qual a imanência se estende ou ao qual<br />

ela se atribui: sempre um Uno para além do Uno, será a fórmula dos neoplatônicos. Cada vez que se<br />

interpreta a imanência como "a" algo, produz-se uma confusão do plano com o conceito, de modo que o<br />

conceito se torna um universal transcendente, e o plano, um atributo no conceito. Assim mal entendido, o<br />

plano de imanência relança o transcendente: é um simples campo de fenômenos que só possui<br />

secundariamente o que se atribui de início à unidade transcendente.<br />

Com a filosofia cristã a situação piora. A posição de imanência continua sendo a instauração filosófica<br />

pura, mas ao mesmo tempo ela só é suportada em doses muito pequenas, ela é severamente controlada e<br />

enquadrada pelas exigências de uma transcendência ema-nativa e sobretudo criativa. Cada filósofo deve<br />

demonstrar, com o risco de sua obra e por vezes de sua vida, que a dose de imanência, que ele injeta no<br />

mundo e no espírito, não compromete a transcendência de um Deus ao qual a imanência não deve ser<br />

atribuída senão secundariamente (Nicolau de Cusa, Eckhart, Bruno). A autoridade religiosa quer que a<br />

imanência não seja sustentada senão localmente ou num nível intermediário, um pouco como numa fonte em<br />

cascata na qual a água pode brevemente manar sobre cada plataforma, mas sob a<br />

condição de vir de uma fonte mais alta e descer mais baixo (transascendência e transdescendência, como<br />

dizia Wahl). Da imanência, pode-se estimar que ela seja a pedra de toque incandescente de toda a filosofia,<br />

porque toma para si todos os perigos que esta deve enfrentar, todas as condenações, perseguições e<br />

denegações que ela sofre. Isso demonstra, ao menos, que o problema da imanência não é abstrato ou<br />

somente teórico. À primeira vista, não se vê por que a imanência é tão perigosa, mas é assim. Ela engole os<br />

sábios e os deuses. A parte da imanência, ou a parte do fogo, é por ela que se reconhece o filósofo. A<br />

imanência só é imanente a si mesma, e então toma tudo, absorve o Todo-Uno, e não deixa subsistir nada a<br />

que ela poderia ser imanente. Em todo caso, cada vez que se interpreta a imanência como imanente a Algo,<br />

pode-se estar certo que este Algo reintroduz o transcendente.<br />

A partir de Descartes, e com Kant e Husserl, o cogito torna possível tratar o plano de imanência como<br />

um campo de consciência. <strong>É</strong> que a imanência é suposta ser imanente a uma consciência pura, a um sujeito<br />

pensante. Este sujeito, Kant o nomeará transcendental e não transcendente, precisamente porque é o sujeito<br />

do campo de imanência de toda experiência possível, ao qual nada escapa, o exterior bem como o interior.<br />

Kant recusa todo uso transcendente da síntese, mas remete a imanência ao sujeito da síntese, como nova<br />

unidade, unidade subjetiva. Ele pode até mesmo dar-se ao luxo de denunciar as Idéias transcendentes, para<br />

fazer delas o "horizonte" do campo imanente ao sujeito8. Mas,<br />

(8) Kant, Crítica da Razão pura: o espaço como forma da exterioridade não está menos "em nós" que o<br />

tempo como forma da interioridade ("Crítica do quarto paralogismo"). E sobre a Idéia como "horizonte", cf.<br />

"Apêndice à dialética transcendental".<br />

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