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wecisley ribeiro do espirito santo-dissertaçao mestrado-ppgas-ufrj ...

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grupinho de três costureiras – “Trabalhar mais e ganhar menos!” – continua. “É a cultura<br />

(imitan<strong>do</strong> o tom de voz grandiloqüente <strong>do</strong> patrão) deles ué!” – zomba a outra. “Cultura?<br />

Isso é escravidão mesmo! O tempo da escravidão já acabou, minha filha!” – emenda a<br />

primeira.<br />

Dentre as operárias desta categoria, entretanto, não faltam aquelas que traduzam<br />

os dispositivos e jogos sub-reptícios de pressão patronal em asseverações explícitas. Assim<br />

é que minha principal informante, Vânia – talvez mais uma aliada <strong>do</strong> que informante<br />

mesmo – fez alguns comentários críticos interessantes acerca de minhas anotações:<br />

Os produtos chineses estão desbancan<strong>do</strong> os friburguenses? É ruim<br />

em! Duvi<strong>do</strong> que eles afetem a venda das confecções daqui. Tem muita<br />

confecção daqui que tem filial na China. Toda confecção tem um contrato<br />

com um compra<strong>do</strong>r já certo. Você acha que eles vão deixar de comprar<br />

daqui para comprar da China? Mesmo que esteja mais barato, às vezes o<br />

compra<strong>do</strong>r é amigo <strong>do</strong> <strong>do</strong>no da fábrica. Porque então que eles fazem<br />

tanta pressão pragente correr com produção, pra ficar encalha<strong>do</strong> no<br />

estoque? Claro que não! To<strong>do</strong> ano nesta época os patrões fazem pressão<br />

pra não aumentar os salários – é a época <strong>do</strong> dissídio sindical. Aí eles<br />

falam: ‘Ó gente, esse ano não tem como dar aumento porque a coisa ta<br />

feia, agente está a ponto de fechar, etc.’. E continuam pressionan<strong>do</strong> para<br />

aumentar a produção. Eles dizem: ‘vocês têm que dar graças a Deus que<br />

estão bem empregadas. Tem muita gente que está queren<strong>do</strong> entrar para<br />

ganhar menos que vocês’. E tem mesmo, o pior é que é verdade”. (Notas<br />

em caderno de campo).<br />

No momento em que escrevo estas linhas tenho a impressão de ter vivi<strong>do</strong> este<br />

episódio na semana passada, tamanha a nitidez de minhas memórias. Lembro-me de este ter<br />

si<strong>do</strong> o dia mais perturba<strong>do</strong>r de to<strong>do</strong> o trabalho de campo. O silêncio de uma costureira<br />

(“Eles disseram que, hoje em dia, quem tem um emprego... (silêncio) tem que dar graças a<br />

Deus, sabe?”) com a qual eu nunca havia conversa<strong>do</strong> – o que tornou a exposição desarmada<br />

e desalentada de seus sentimentos para mim ainda mais dramática – deixou um nó em<br />

minha garganta. De mo<strong>do</strong> que fiquei um tempo em silêncio, sem coragem de continuar<br />

minhas perguntas meio desajeitadas. Lembro-me ainda de ter me senti<strong>do</strong> muito mal ao<br />

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