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em vez de cães e gatos. Gosto do silêncio e do isolamento<br />
dos peixes no tanque.<br />
– Sabe, Eliana, é que prefiro meus acarás aqui da Amazônia<br />
mesmo.<br />
– Você é um xenófobo, um nacional-chauvinista –<br />
retrucava ela em tom de provocação, mas já à beira da<br />
gargalhada. Nacionalismo aquariofilista seria o cúmulo, e<br />
ela sabia que essa classificação não colaria nunca em mim.<br />
Mas não perdi a chance de retrucar e fazê-la rir:<br />
– Errou! Você sabe que sou cosmopolita. Só que não<br />
agüento esse papo de afrodescendentes, sobretudo aplicado<br />
ao meu aquário.<br />
Eliana explodiu em gargalhada. Ficava sempre muito<br />
sensual sorrindo, mas nossa relação nunca ultrapassava esse<br />
ponto, retida por uma tensão no ar. Ela logo seguiu com<br />
o assunto dos ciclídeos:<br />
– Olha só esse Altalamprologus calvus, não é lindo? – O<br />
instinto maternal brota mesmo de qualquer lugar, pensava<br />
eu. Eliana olhava o zebradinho como quem olha um filho<br />
no berço. A ironia era o único remédio:<br />
– Ele me parece mais um bonsai de tucunaré.<br />
– Você está zombando, mas sabe que é isso mesmo. O<br />
tucunaré, os acarás do seu aquário e os da Pampulha, além<br />
das tilápias que o magnata do Ascânio Guedes exporta e<br />
que o Wellerson serve no mercado, todos eles são parentes<br />
desse meu amiguinho ciclídeo africano aqui.<br />
Meu gosto pelos aquários estava nas cores e nos movimentos.<br />
Nunca me interessei demais pelos dados técnicos<br />
dos peixes, ao contrário da Eliana, que adorava chamar<br />
a cada um pelo nome científico e era apaixonada pelas<br />
explicações zoofílicas e zoomórficas. Mas agora era a hora<br />
de eu me interessar. Pressentia que ali estava a chave<br />
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