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galeria de arte ocupava toda a parte frontal do imenso salão,<br />
com a parte posterior do vão fazendo as vezes de antiquário<br />
de móveis. Da rua seria impossível deduzir a presença<br />
encantadora de tantas telas. Bem na entrada o visitante se<br />
deparava com um <strong>Peixe</strong>, de Aldemir Martins, desenho de<br />
um metro de altura, datado de 1953, quase ao lado de um<br />
óleo de Castagneto, Os peixes, do final do século XIX.<br />
Assim como essas duas jóias, muitas outras peças da melhor<br />
pintura brasileira emolduravam as paredes. Mas o acervo<br />
não se compunha somente de artistas consagrados. Entre<br />
os dois quadros da entrada se postava um Nu de costas, de<br />
Joana Vilela, a provar que o marchand tinha olhos para o<br />
novo, quando esse novo não era apenas novidade. “Mulher<br />
com peixe”, pensei comigo, lembrando a sensualidade<br />
opulenta da gravura famosa do Di Cavalcanti. Além das<br />
telas, esculturas de variados tamanhos em aço e bronze,<br />
em madeira e pedra – e ainda objetos de parede, aquarelas<br />
e gravuras – estavam por todos os lados.<br />
Uma recepcionista, sentada numa mesinha ao lado<br />
da porta, sorriu e me convidou a entrar. Era uma mulata<br />
deliciosa, que parecia saída dos quadros do Mário Mariano<br />
para compor, com sua pele macia, um alto contraste com<br />
o ambiente das paredes brancas. Pisquei para ela, que abriu<br />
o sorriso, mostrando os dentes imaculados.<br />
– Linda galeria – disse eu, olhando no seu rosto. Ela<br />
baixou os olhos, tímida, e respondeu flertando:<br />
– Está aberta. Por que não entra para conhecer?<br />
Sorri em agradecimento e voltei-me para o salão. O<br />
encanto do espaço se cristalizava em um pequeno jardim<br />
no centro do salão, a cinqüenta centímetros do solo, cujas<br />
bordas formavam assentos de cimento polido. Esse jardim<br />
retangular ficava colocado abaixo de uma clarabóia de<br />
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