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– Como sabe? Só quinze dias de aula, ainda não deu<br />
tempo de decorar.<br />
– Ouvi os colegas te chamando no intervalo da aula.<br />
Era pura mentira. Desde que vira aquela boca, ficara<br />
fascinado por Elisa. Tenho péssima memória para nomes,<br />
mas um dia, de propósito, contara quantos alunos haviam<br />
assinado a lista de presença antes dela. Depois, foi só repassar<br />
a lista e concluir pelo nome. Sua pergunta, obviamente,<br />
constituía um teste para saber se eu havia prestado atenção<br />
nas pernas, na bunda linda, na pele de bebê, no cheiro<br />
estonteante. “Sua boca, meu bem”, pensei comigo, “basta<br />
para mim. Por ela posso morrer, como um peixe fisgado<br />
pela guelra”. Minha desculpa, vinculando a lembrança do<br />
nome ao zunzum do intervalo de aula, poderia denotar<br />
recuo ou indiferença. E talvez, no fundo, fosse mesmo um<br />
certo recuo. Por um momento, achei que estava diante de<br />
uma cockteaser, das que fogem na hora agá. Mas Elisa era<br />
grande jogadora. Manteve o sorriso e aceitou o negaceio<br />
como parte do jogo.<br />
– Na verdade, nasci Maria Elisa Beltrão, mas detesto o<br />
“Maria”. Desde que me casei, adotei o sobrenome do meu<br />
marido e o meu segundo nome. Me chama de Elisa. – Ela<br />
mencionara o marido, mas não parecia ser por escudo, para<br />
evitar intimidades, e sim por provocação, como a dizer<br />
“sou casada, mas adoro aventura”.<br />
– Um prazer ter você aqui.<br />
A mão macia escapou da minha palma, mas os lábios<br />
entreabertos e aquele cheiro bom de protetor solar salpicavam<br />
sombrinhas coloridas na minha retina. Tomei o livro e<br />
escrevi sem pensar: “Para Elisa, este convite a uma viagem<br />
no tempo, entre perfumes selvagens...”. Ela fechou o livro<br />
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