João Cândido: A Luta pelos Direitos Humanos - DHnet
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UM PROTETOR<br />
NA MARINHA<br />
imediatos, embora estes estivessem presentes. Basta assinalar que, no início do<br />
século XIX, as estimativas demográfi cas (não havia ainda Censo organizado) apontavam<br />
que um terço da população brasileira era composta de “pardos livres”.<br />
Do ponto de vista dos ex-escravos, isto é, considerando-os como agentes<br />
históricos, o tempo do Pós-Abolição tinha um duplo signifi cado: liberdade e cidadania,<br />
conforme assinalam historiadores como Hebe Mattos e Flávio Gomes. Ou seja,<br />
colocava-se não apenas a superação do cativeiro, mas a busca de inserção na sociedade<br />
que se transformava.<br />
Com a Lei Áurea, os pais de <strong>João</strong> <strong>Cândido</strong> saíram da fazenda e ele fez a migração<br />
do campo para a cidade: morou em Rio Pardo e Porto Alegre até a adolescência. Assim,<br />
as relações pessoais baseadas na identidade regional (pertencimento a uma mesma<br />
localidade ou região) são marcantes na sociedade brasileira e, em geral, ultrapassam as<br />
diferenças sociais ou políticas e geram atitudes de proteção ou compadrio.<br />
<strong>João</strong> <strong>Cândido</strong> se valeria de laços de proteção em momentos decisivos de sua vida. Ainda<br />
em Rio Pardo, conheceu o futuro almirante Alexandrino de Alencar, também natural da cidade<br />
(“protegeu meus pais e minha família”, relataria o marujo) e que o encaminhou para a Marinha aos<br />
14 anos de idade. O almirante Alexandrino, fi gura expressiva, lutara na Guerra do Paraguai sob as<br />
ordens dos almirantes Barroso e Tamandaré. Participou da Revolta da Armada (1893–94), gerada<br />
pela pouca atenção dada à Marinha no governo Floriano Peixoto. Posteriormente, Alexandrino seria<br />
ministro da Marinha em cinco governos, ocasião em que foi procurado por <strong>João</strong> <strong>Cândido</strong>, que já<br />
sofria duras perseguições pela Revolta da Chibata. Ao tentar ganhar a vida navegando, o ex-marujo<br />
teve documentos arbitrariamente apreendidos pela Capitania dos Portos e procurou o conterrâneo<br />
para pedir justiça. Alexandrino telefonou para o capitão responsável e ordenou-lhe: “Entregue os<br />
papéis de <strong>João</strong> <strong>Cândido</strong> imediatamente; eu também já fui revoltoso e hoje sou ministro da Marinha”.<br />
Esse almirante faleceu em 1926. Registre-se que tais proteções ocasionais podem ter arrefecido,<br />
mas não impediram as numerosas perseguições que se abateram sobre <strong>João</strong> <strong>Cândido</strong>.<br />
A iniciação do futuro marujo na vida pública deu-se através de Pinheiro<br />
Machado, o famoso caudilho gaúcho com grande domínio político sobre o Brasil na<br />
Primeira República e atuação decisiva diante da Revolta da Chibata. <strong>João</strong> <strong>Cândido</strong><br />
narrou em suas memórias na Gazeta de Notícias que, “por motivos de força maior”,<br />
lutou nas tropas governistas da Divisão Norte sob o comando de Pinheiro Machado<br />
durante a Revolta Federalista em 1893 (que eclodiu contra o governo de Floriano<br />
Pinheiro Machado, importante<br />
líder político, comandava a<br />
primeira tropa na qual <strong>João</strong><br />
<strong>Cândido</strong> serviu, aos 13 anos.<br />
<strong>João</strong> <strong>Cândido</strong> conheceu<br />
a Marinha tradicional,<br />
com embarcações<br />
herdadas do Império.<br />
226 JOÃO JO CÂNDIDO A <strong>Luta</strong> <strong>pelos</strong> <strong>Direitos</strong> <strong>Humanos</strong><br />
Arquivo Nacional<br />
Fundação Casa de Rui Barbosa<br />
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