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ual ao de<br />
m relógio<br />
bmerso em<br />
Realização<br />
gum corpo<br />
e um relógio<br />
o E também<br />
S ESC apr esenta<br />
SÓ LÂMINA<br />
exposiç ão de nuno ramos
"Igual ao de um relógio<br />
Submerso em algum corpo<br />
Ao de um relógio vivo<br />
E também revoltoso"
Serviço Social do Comércio<br />
2° Reimpressão<br />
2010
SERVIÇO SOCIAL DO COMÉRCIO<br />
Presidência do Conselho Nacional do SESC<br />
Antonio Oliveira Santos<br />
Direção-Geral<br />
Maron Emile Abi-Abib<br />
Divisão Administrativa e Financeira<br />
João Carlos Gomes Roldão<br />
Divisão de Planejamento e Desenvolvimento<br />
Álvaro de Melo Salmito<br />
Divisão de Programas Sociais<br />
Nivaldo da Costa Pereira<br />
Consultoria da Direção-Geral<br />
Juvenal Ferreira Fortes Filho<br />
Luís Fernando de Mello Costa<br />
Projeto e Coordenação<br />
Gerência de Cultura / Divisão de Planejamento e Desenvolvimento<br />
Marcia Leite<br />
Lucia Helena Mattos - Coordenadora<br />
Assessoria externa<br />
Paulo Venâncio Filho - Produção de texto e curadoria<br />
Projeto Gráfico<br />
Assessoria de Divulgação e Promoção / Direção-Geral<br />
Christiane Caetano<br />
Equipe<br />
Marcella Marins Mesquita - Revisão de conteúdo<br />
Mario Saladini - Programação visual<br />
Guarim de Lorena - Fotos das obras<br />
Trechos da obra “Uma faca só lâmina”, de João Cabral de Mello<br />
Neto, utilizados de acordo com o estabelecido no art. 46 da Lei<br />
9.610/98, em seu inciso VIII.
O SESC E SEU TRABALHO COMO<br />
DIFUSOR DA CULTURA NACIONAL<br />
A cultura reflete a diversidade das identidades regionais do Brasil. Música, artes cênicas, cinema, artes plásticas e literatura in-<br />
tegram o cotidiano dos brasileiros. O SESC garante a democratização do acesso a essas variadas modalidades, nacionalmente,<br />
através de projetos como o ArteSESC, difusor das artes plásticas em exposições itinerantes que percorrem o país.<br />
Para a entidade, cultura não significa apenas entretenimento, mas uma nova compreensão da realidade. Em sua postura de articu-<br />
lador, o SESC investe tanto no estímulo à produção artístico-cultural, viabilizando espaço e estrutura para o trabalho do artista,<br />
como na qualificação de público, e em sua interação com os produtores culturais, por intermédio de um trabalho educativo que<br />
permeia todos os serviços e atividades ofertados pela instituição.<br />
Ao longo do tempo, os projetos do SESC tornaram-se referência, conquistaram credibilidade e foram além de seus objetivos<br />
iniciais, transformando-se muitas vezes em principal evento cultural e meio de contato do público com as artes. Esta é a contri-<br />
buição permanente do empresariado, por intermédio do Serviço Social do Comércio, à cultura da sociedade brasileira.<br />
Antonio Oliveira Santos<br />
Presidente do Conselho Nacional do SESC<br />
03<br />
SESC - Exposição <strong>Só</strong> <strong>Lâmina</strong>
ArteSESC em conexão com o<br />
contemporâneo<br />
O SESC é hoje reconhecido como um dos principais agentes de difusão das artes plásticas no país. Desde 1981 o ArteSESC vem<br />
realizando mostras itinerantes em centros urbanos e cidades do interior, tornando mais conhecidos os acervos de instituições<br />
culturais e a produção de artistas provenientes de várias partes do país, ao exibi-los nas unidades do SESC ou, eventualmente,<br />
em espaços da comunidade. Fazem parte do acervo de exposições do projeto reproduções de obras de artistas como Portinari e<br />
Margareth Mee.<br />
Com essas atividades, o SESC procura estabelecer as condições do diálogo necessário entre artistas plásticos e o público interessa-<br />
do nesse segmento. Atualmente, a programação busca dar visibilidade à produção artística moderna e contemporânea, marcando<br />
uma nova fase do projeto.<br />
Ser um artista plástico moderno ou contemporâneo significa estar em conexão com o que acontece em sua época, mostrando em<br />
suas obras os avanços das discussões e propostas da arte que se manifestam em diferentes modos no mundo. Diante deste cenário,<br />
o ArteSESC escolheu para itinerar a partir de 2008 artistas que proporcionam uma mudança nas tendências da arte brasileira e<br />
retomam uma postura mais crítica e política sobre a realidade cotidiana do país.
Exatamente por ter influenciado singularmente a arte no Brasil, o SESC convidou Nuno Ramos para participar do projeto com<br />
a exposição <strong>Só</strong> <strong>Lâmina</strong>. Nuno se configura como um artista da experimentação, na qual a ausência de regras é menos um desafio<br />
às normas. Seus objetivos e suas instalações com materiais não estáveis como parafina, sal, vidro e mármore servem de impulso<br />
para suas infinitas experimentações.<br />
<strong>Só</strong> <strong>Lâmina</strong> reflete a postura do ArteSESC de estar antenado com as novas tendências, favorecendo uma produção artística nas<br />
suas diferentes linguagens.<br />
Maron Emile Abi-Abib<br />
Diretor-Geral do Departamento Nacional do SESC<br />
SESC - Exposição <strong>Só</strong> <strong>Lâmina</strong> 05
Este conjunto de três trabalhos, <strong>Só</strong> <strong>Lâmina</strong>, Carolina e<br />
Luz Negra, da obra já extensa e ainda em andamento de<br />
Nuno Ramos, serve de sintética e econômica introdução<br />
ao mundo plástico do artista, sem perda da potência da<br />
obra. Três trabalhos, três grandes direções que eventual-<br />
mente se cruzam e mostram tanto a atualidade quanto<br />
o substrato inquieto e transformador que se mantém há<br />
mais de vinte anos.<br />
<strong>Só</strong> <strong>Lâmina</strong> é o mais recente capítulo de um ciclo de en-<br />
frentamento ao qual Nuno tem se proposto já faz algum<br />
tempo. É um verdadeiro e convicto choque com os gran-<br />
des modernos brasileiros: Drummond, Bandeira, Goeldi,<br />
Nelson Cavaquinho e agora João Cabral de Mello Neto.<br />
Literatura, música e artes plásticas mostram a amplitude<br />
Paulo Venâncio Filho<br />
dos interesses de Nuno. De que modo ele vem transfor-<br />
mando esse interesse em legítima versão própria, meta-<br />
morfoseando-o plasticamente? Visitação, afinidade, ho-<br />
menagem, apropriação, não há um termo que defina com<br />
exatidão o que está sendo realizado. Acima de tudo, me<br />
parece, trata-se do franco reconhecimento da pressão que<br />
o moderno ainda exerce entre nós. Do artista, da obra,<br />
de uma obra, de uma imagem ou fragmento qualquer,<br />
de onde vem o impulso inicial? Creio que de todos esses<br />
elementos que ainda estão à disposição de quem os queira<br />
elaborar pois, para o bem ou para o mal, ainda não se<br />
enrijeceram e estão como que num estado de latência cul-<br />
tural. É desta possibilidade disponível, flexível, maleável<br />
que Nuno se apropria para dar outra forma. A constante<br />
metamorfose é uma das características do seu trabalho,<br />
SESC - Exposição <strong>Só</strong> <strong>Lâmina</strong> 07
Assim como uma bala | Do chumbo mais pesado | No músculo de um homem | Pesando-o mais de um lado | Igual ao de um relógio | Submerso em algum corpo | Ao de um relógio vivo | E também revoltoso | Relógio que tivesse | O gume de uma faca | E toda a impiedade | Da lâmina azulada | Assim como uma faca | Que sem bolso ou bainha | Se transformasse em parte | De vossa anatomia
1. Assim como uma bala | Enterrada no corpo | Fazendo mais espesso | Um dos lados do morto<br />
2. Qual bala que tivesse | Um vivo mecanismo | Bala que possuísse | Um coração ativo
3. Assim como uma bala | Do chumbo mais pesado | No músculo de um homem | Pesando-o mais de um lado<br />
4. Igual ao de um relógio | Submerso em algum corpo | Ao de um relógio vivo | E também revoltoso
5. Relógio que tivesse | O gume de uma faca | E toda a impiedade | Da lâmina azulada<br />
6. Assim como uma faca | Que sem bolso ou bainha | Se transformasse em parte | De vossa anatomia<br />
7. Qual uma faca íntima | Ou faca de uso interno | Habitando num corpo | Como o próprio esqueleto
8. De um homem que o tivesse | E sempre, doloroso | De homem que se ferisse | Contra seus próprios ossos<br />
9. 10. 11.<br />
9 a 11<br />
S/ Título, 2007<br />
Alumínio, pelúcia, espelho, acrílico e tinta óleo<br />
1 x 1 m<br />
1 a 8<br />
S/ Título, 2007<br />
Alumínio, pelúcia, espelho, acrílico e tinta óleo<br />
1,55 x 0,75 m
De um homem que o tivesse | E sempre, doloroso | De homem que se ferisse | Contra seus próprios | E sempre, doloroso | De homem que se ferisse | Contra seus próprios | =Qual uma faca íntima | Ou faca de uso interno, | Habitando num corpo | Como o p róprio esqueleto | Assim como uma bala | Enterrada no corpo | Fazendo mais espesso | Um dos lados do morto | Qual bala que
penso até que já existe um universo metamórfico só seu,<br />
distinguível através de certos materiais, fenômenos, pro-<br />
cessos. Pois em <strong>Só</strong> <strong>Lâmina</strong> trata-se de metamorfosear a<br />
áspera poesia de João Cabral. Para começar, o construtivo<br />
rigor do poeta não é o que se esperava encontrar junto<br />
à fluência plástica de Nuno, a sua incorrigível vocação<br />
picassiana. Mas a escolha certamente não é arbitrária ou<br />
voluntarista. Aparentemente por mais afastados, há um<br />
paralelo entre a brutalidade fria de “Uma faca só lâmina”<br />
e o método plástico de Nuno. Numa outra chave, só para<br />
exemplificar, recordemos Balada, o trabalho de Nuno que<br />
é simplesmente um livro, alvo e vazio, perfurado por uma<br />
bala. Balada: corpo que se oferece à bala. Nele a violência<br />
seca e sintética do tiro fica encravada, no grosso das pági-<br />
nas, chumbo dentro do papel, ali no lugar das palavras que<br />
o livro não tem. É bala lâmina que atravessa Balada. “Assim<br />
como uma bala/Enterrada no corpo”, só bala mais nada.<br />
<strong>Só</strong> <strong>Lâmina</strong>, vai então de certa forma, continuar a explorar,<br />
através do poema de João Cabral, aquela forma cortante<br />
do crescente, cimitarra, semi circular que os desenhos e<br />
esculturas de Nuno já vinham, faz algum tempo, apresen-<br />
tando. Forma-lâmina, a lâmina e seu corte, que corta e re-<br />
corta, ela mesma o objeto. Operação e resultado do corte<br />
que estrutura o desenho. De modo que esta série de onze<br />
desenhos manifesta não só a destreza plástica da lâmina,<br />
mas também o raciocínio seco do corte: onze desenhos,<br />
onze facadas de uma mesma lâmina. Ora o corte é limpo,<br />
precisão racional de um mundo claro e transparente, ora<br />
o corte é sujo, obscuro, corta o informe irracional e am-<br />
bos estão assim lado a lado, latejantes. E este método da<br />
lâmina, ávido, pede a ação incessante do corte. Continuar<br />
o corte, tudo o que seja para cortar; seja palavra, metal,<br />
vaselina, espelho ou papel. Na mesma faca, duas lâmi-<br />
nas: por um lado o poema de Cabral aceitando a matéria<br />
tal qual ela é: simples palavra escrita no papel, por outro<br />
Nuno a exigir da matéria ir além, até quase onde ela não<br />
é: líquido que é sólido, pesado leve, duro mole, belo feio.<br />
A mesma ambivalência e oposição dos estados físicos es-<br />
tão sempre presentes e atuantes nos desenhos, como tam-
ém nas pinturas e esculturas e nada mais é do que a forte<br />
estrutura do trabalho. Notável é a escolha dos materiais<br />
que Nuno utiliza: matérias de construção, destinadas a<br />
conter, estabilizar e sustentar. Pedra, areia, vidro, metal.<br />
No entanto, a matéria parece estar sempre invertida va-<br />
zando da forma, indo além dos limites e indefinindo-os,<br />
escorrendo e fazendo extravasar, estrutura desestruturante<br />
que se sustenta pelo próprio desmoronamento. O mesmo<br />
ocorre também nas instalações “sonoras”. Difícil é conter<br />
o som. O som vaza e desaparece, sai da palavra e se perde<br />
no espaço. Palavra, som, espaço formam uma equação pa-<br />
ralela a da superfície, forma e matéria das telas e desenhos.<br />
Assim, se apropriando da poesia, Nuno quer ultrapassar<br />
a palavra apenas lida, em silêncio, e dar som e imagem à<br />
palavra que não tem.<br />
É do que Carolina fala; da palavra falada. Este trabalho<br />
que é um extenso fragmento do interminável perguntar<br />
e responder que corta e recorta, da enunciação mental ao<br />
murmúrio da cidade, fala a língua do cubismo sonoro.<br />
O que é dito e respondido agora, em São Paulo, ou em<br />
qualquer outro lugar? Para onde vaza esse som que é parte<br />
da vida e do sentido de todos e da cidade? E se houvesse<br />
alguém para tudo isso ouvir? Não é isso que Carolina diz<br />
e não responde?<br />
Em <strong>Só</strong> <strong>Lâmina</strong> os versos atingem a proporção de ver-<br />
dadeiros anúncios estampados em agressivas placas<br />
de alumínio. São desenhos auto falantes, pois gritam<br />
e ensurdecem visualmente. Integrar o som - música,<br />
fala, ruído. É o que Nuno vem fazendo também já<br />
desde algum tempo. A matéria som, interessa espe-<br />
cialmente quando vaza de um continente, seja pala-<br />
vra, música ou ruído, e volta a ser apenas som. Ou de<br />
outro modo, e válido para todo o trabalho, a matéria<br />
qualquer que seja é provocada a vazar de seu conti-<br />
nente, o que implica o volume e, portanto, a espa-<br />
cialização do som ou até mesmo a ideia implícita de<br />
escultura sonora – o som seria afinal a matéria ideal<br />
do trabalho. Penso que o mundo para Nuno se estru-<br />
SESC - Exposição <strong>Só</strong> <strong>Lâmina</strong> 11
1.<br />
tura num antagônico e constante fluxo de capturar e<br />
evadir das formas.<br />
Pois vejamos. Em Luz negra a música que vaza do chão,<br />
faz soar alto a voz sepultada de Nelson Cavaquinho. As<br />
caixas acústicas que tocam Juízo final estão enterradas<br />
no solo. É como se a violenta contenção deformasse a<br />
matéria sonora e desse à tão característica subterrânea<br />
voz do cantor, o seu verdadeiro lugar. Próprias de Nuno<br />
são essas poderosas visões plásticas, como Nelson sob a<br />
terra e Drummond sobre a água. Quem sabe exista aí o<br />
projeto de uma outra espécie de land-art, uma fusional<br />
natureza/cultura.<br />
Ocorre-me chamar de Collages-Melées esses desenhos-<br />
colagem, essa quase simples gosma mascada, falada e co-<br />
2.<br />
lada. Realizada, parece, no ritmo do irritante regressivo<br />
rasgar, quebrar, colar, o infrutífero e cansativo, também<br />
vivo, desmontar poesia e remontar imagem. A excitante<br />
cacofonia visual quase não dá tempo ao olhar, absorve-o<br />
sem parar, super sintético artificial cafona o nunocabral<br />
caótico caos. Nada menos que a colagem moderna levada<br />
à exasperação dos tempos atuais.<br />
A matéria de um melado grudento lento cola, cansa e<br />
escorre pelo olhar esbugalhado. São desenhos para olha-<br />
res vazados. Cortada, a vista escorre pelos lados de uma,<br />
duas, três, onze, inúmeras facadas. Por lâminas cimitar-<br />
ras de cortantes recortes, recorrentes desastres plásticos<br />
de palavras estampadas, ditas e caladas. Letreiro popular<br />
ou/e vidraça quebrada? Um dadá trash cortante, belo pelo<br />
avesso, tal um bicho de pelúcia, uma página de poesia e<br />
3.
4.<br />
um espelho rapidamente batidos no liquidificador. Ingre-<br />
dientes de hoje, quando não há mais object trouvées para<br />
se encontrar.<br />
<strong>Só</strong> escrevendo assim, improvisando neste tema de Nuno,<br />
d’aprés João Cabral, consigo seguir seu fluxo, rapidamen-<br />
te juntando à vontade: imagens, associações, relações, im-<br />
pressões vagas e fortuitas, tentando apreender este proces-<br />
so plástico. Parece que vale tudo: espelho, vaselina, folha<br />
de ouro, pelúcia, metal, tinta. Tudo é o mesmo e diferen-<br />
te na absoluta não hierarquização da matéria. O aspecto<br />
lixo luxuoso do desenho de Nuno não quer ser agradável,<br />
mesmo assim, e por isso mesmo, chega a ser tão atraente,<br />
espelho partido de um mundo afluente e desgovernado.<br />
Quase sempre caótico, sem direção, desconexos, tais ma-<br />
teriais se agridem, chocantes, irritantes, desagradáveis ao<br />
5.<br />
tato, ao olhar, aos sentidos. Mas para isso precisam tam-<br />
bém ser belos, fortes, excitantes, alegres, como são.<br />
O choque Nuno/Cabral, destes assim chamados dese-<br />
nhos, traz o desafio de uma eloquência plástica ante uma<br />
contenção poética, ou o excesso diante da contenção, que<br />
são os momentos fortes, eventualmente o próprio cerne<br />
do trabalho. Disso resultam estes desastres verbo-visuais<br />
como displays do poema, transtornos plásticos vigorosos<br />
de resultado instável, de um todo quebrado e desconjun-<br />
tado que um dia já foi goeldiano. Facada a facada, Nuno<br />
destroça a anatomia dos oito versos iniciais de “Uma faca<br />
só lâmina”. Cada verso um desenho, cada linha escrita no<br />
alumínio recortado, cada letra na tinta espatifada assim<br />
como, assim como...<br />
6.<br />
SESC - Exposição <strong>Só</strong> <strong>Lâmina</strong> 13<br />
Sequência do vídeo “Luz Negra”
Foto da instalação “Carolina” - A instalação varia de acordo com o espaço.
Assim como uma bala<br />
Enterrada no corpo<br />
Fazendo mais espesso<br />
Um dos lados do morto<br />
Assim como uma bala<br />
do chumbo mais pesado<br />
no músculo do homem<br />
pesando-o mais de um lado<br />
Qual bala que tivesse<br />
um vivo mecanismo<br />
bala que possuísse<br />
um coração ativo<br />
Igual ao de um relógio<br />
submerso em algum corpo<br />
ao de um relógio vivo<br />
e também revoltoso<br />
Relógio que tivesse<br />
o gume de uma faca<br />
e toda a impiedade<br />
de lâmina azulada<br />
Assim como uma faca<br />
que sem bolso ou bainha<br />
se transformasse em parte<br />
de vossa anatomia<br />
Qual uma faca íntima<br />
ou faca de uso interno<br />
habitando num corpo<br />
como o próprio esqueleto<br />
De um homem que o tivesse<br />
e sempre, doloroso<br />
de homem que se ferisse<br />
contra seus próprios ossos. 1<br />
...seus próprios ossos. Ossos como destroços flutuantes<br />
numa superfície plana, desenhos da impermanente es-<br />
tabilidade das coisas espelhadas numa poça d’água qual<br />
forma disforme.<br />
1 MELO NETO, João Cabral de. Uma Faca <strong>Só</strong> <strong>Lâmina</strong>, Poesias Completas; 1940-1965, pág. 187, Rio de Janeiro Livraria José Olympio Editora, 1979<br />
SESC - Exposição <strong>Só</strong> <strong>Lâmina</strong> 15