“Anos da Chibata”: perseguição aos cultos afro-pessoenses e o ...
“Anos da Chibata”: perseguição aos cultos afro-pessoenses e o ...
“Anos da Chibata”: perseguição aos cultos afro-pessoenses e o ...
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Além dessa alteração no aparato jurídico local, as festas <strong>da</strong>s divin<strong>da</strong>des, dentro do<br />
calendário <strong>da</strong>s festas populares <strong>da</strong> ci<strong>da</strong>de, a ca<strong>da</strong> ano tomaram maior repercussão. As<br />
religiões <strong>afro</strong>-brasileiras vão saindo <strong>da</strong> invisibili<strong>da</strong>de, vão se mostrando ca<strong>da</strong> vez mais,<br />
embora ain<strong>da</strong> persistam muito arraiga<strong>da</strong>s no seio <strong>da</strong> socie<strong>da</strong>de às diversas formas de<br />
discriminação e <strong>perseguição</strong>. O maior exemplo de como a <strong>perseguição</strong>, ao deixar de ser legal,<br />
refugia-se no social, são as investi<strong>da</strong>s de igrejas neo-pentecostais contra os <strong>cultos</strong> <strong>afro</strong>brasileiros.<br />
Da mesma forma, o preconceito e a intolerância podem ser verificados nas<br />
relações sociais como um todo. É por isso que muitos adeptos <strong>da</strong> religião procuram manter<br />
em segredo a sua adesão ao culto. Considerando a mu<strong>da</strong>nça no aparato jurídico brasileiro e<br />
paraibano que reconheceu às religiões <strong>afro</strong>-brasileiras o estatuto de religião, mas ain<strong>da</strong><br />
persistindo o preconceito e a discriminação no seio <strong>da</strong>s relações sociais, é que Boaes 22 utilizou<br />
a expressão “visibili<strong>da</strong>de conturba<strong>da</strong>” para caracterizar o cenário <strong>da</strong>s religiões <strong>afro</strong><strong>pessoenses</strong>.<br />
Em resumo, a visibili<strong>da</strong>de está acontecendo, por força de uma imposição legal e<br />
conquista<strong>da</strong> em um terreno social fortemente marcado por atitudes e comportamentos<br />
negativos em relação ao fenômeno que assume visibili<strong>da</strong>de social. Esse é um fato que pode<br />
ser observado no que diz respeito a to<strong>da</strong>s as minorias quando começam a ter seus direitos<br />
reconhecidos.<br />
As Relações de poder dentro <strong>da</strong>s Federações dos Cultos Afro-<strong>pessoenses</strong>: marcas do<br />
patrimonislismo<br />
Ao contrário <strong>da</strong> filosofia política, a antropologia clássica não lança a questão sobre a<br />
origem <strong>da</strong> natureza do poder, embora a antropologia política contemporânea tenha suas<br />
tentativas. Não chegamos a tratar <strong>da</strong> gênese do poder político nas relações destas federações,<br />
mas de “autori<strong>da</strong>des” disputa<strong>da</strong>s para favorecer valores pessoais <strong>da</strong>queles que administram as<br />
instituições. Estendemos a noção de poder às outras instâncias, como a palavra, ao sagrado, a<br />
ancestrali<strong>da</strong>de (IZARD, 1991, p. 599). O que motivou, por exemplo, nos primeiros conflitos<br />
dentro <strong>da</strong> Federação dos Cultos Africanos foram, sobretudo, assuntos religiosos de teor<br />
sagrado. A autonomia dos terreiros, suas concepções e idéias partindo <strong>da</strong> plurali<strong>da</strong>de existente<br />
pela educação oral, trabalha<strong>da</strong> em ca<strong>da</strong> comuni<strong>da</strong>de, onde o pai ou mãe-de-santo é a<br />
autori<strong>da</strong>de máxima em poder religioso, se chocaram com a diversi<strong>da</strong>de, que a princípio<br />
reuniria, superando suas diferenças, para lutar pela inserção social <strong>da</strong>s religiões <strong>afro</strong><strong>pessoenses</strong>.<br />
A discussão dentro do aparelho <strong>da</strong>s federações trata<strong>da</strong>s se resumiu a um pseudoclero-<strong>afro</strong>-pessoense<br />
– não conseguiam estabelecer entre si nem uma relação de hierarquia de<br />
ordem sacerdotal 23 nem de hierarquia burocrática institucional. A gênese <strong>da</strong> primeira<br />
federação tramitava numa organização de caráter religioso. Também não se organizaram<br />
politicamente de forma a combater o adversário social que todos tinham em comum. Isso<br />
suscitava, na esfera <strong>da</strong>s instituições <strong>da</strong> socie<strong>da</strong>de civil organiza<strong>da</strong>, um caráter de comodismo<br />
na defesa dos direitos pontuais de tal ou tal terreiro, marcando a pessoali<strong>da</strong>de e o patronato. O<br />
grupo que conseguia a administração <strong>da</strong> federação se destacava mais pela resolução dos<br />
problemas internos de caráter religioso, respondendo a uma deman<strong>da</strong> que favorecia <strong>aos</strong><br />
interesses dos mais próximos, que o trabalho militante coletivo <strong>da</strong> classe. A Lei Estadual<br />
3.443/66 vem como conseqüência de uma política que respondia a deman<strong>da</strong> de alguns<br />
religiosos, através de ações particulares, não se caracterizava o que se compreende como<br />
socie<strong>da</strong>de civil organiza<strong>da</strong>. A lei teve um caráter de doação, inclusive é dessa forma que os<br />
dirigentes <strong>da</strong>s federações em João Pessoa fazem referência, por mais que policiem seus<br />
discursos.<br />
Em um segundo momento, a fun<strong>da</strong>ção <strong>da</strong> federação acontece em um período onde<br />
to<strong>da</strong>s as instituições políticas no Brasil precisavam ser constantemente acompanha<strong>da</strong>s pelo<br />
CAOS – Revista Eletrônica de Ciências Sociais, n. 14, Setembro/2009 Página 147<br />
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