Danah Zohar O SER QUÂNTICO
Danah Zohar O SER QUÂNTICO
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O ser quântico, então, o "eu" que consideramos aquilo que somos, é bastante real,<br />
mas ao longo do tempo revela-se mutável a cada momento, com contornos indefinidos e<br />
flutuantes. Podemos falar em sua dinâmica, mas não podemos realmente apontá-lo com<br />
o dedo, da mesma forma como não podemos definir precisamente nem a posição nem o<br />
momento de uma partícula elementar. Ela tem substância, mas esta substância nos ilude<br />
de muitas maneiras significativas. Posso dizer com alguma certeza que eu sou, mas, se<br />
isso fosse tudo o que pode ser dito sobre o ser, ficaria difícil dizer quem e o que eu sou.<br />
"Uma existência flutuando de momento a momento" é só o que se tem a dizer<br />
sobre a identidade individual das partículas elementares. Em determinado momento<br />
podemos dizer várias coisas sobre um elétron em particular (carga, massa, spin etc.) e<br />
nesse mesmo momento podemos distinguir um elétron do outro (se não por outro<br />
motivo, apenas por estarem em lugares diferentes, ou por possuírem momento diverso),<br />
mas eles não possuem uma identidade permanente, nenhuma identidade que os<br />
acompanhe ao longo do tempo. Estão bem aqui, concretamente, hoje, e desaparecerão<br />
amanhã. Se dois elétrons reconhecidamente distintos se fundirem e depois se separarem,<br />
haverá novamente dois indivíduos, mas indivíduos sem uma história. Será impossível e,<br />
na verdade, sem sentido nos perguntarmos qual era qual dos anteriores. Nesse aspecto<br />
os seres humanos não são como os elétrons, ou assim parece à maioria de nós.<br />
Os elétrons, ou qualquer outra partícula elementar, são coisas extremamente<br />
simples. Possuem poucas características pelas quais se pode distingui-los e, mais<br />
importante de tudo, não têm memória. Por isso não desfrutam de uma história. Â<br />
memória é um meio através do qual registramos os pontos por onde passamos e os<br />
levamos conosco para o futuro. Sem ela parece não haver nenhuma ligação entre os<br />
seres que fomos e os seres que somos agora.<br />
Ao nível do bom senso comum, sei que sou a pessoa que foi dormir ontem à noite<br />
em minha cama e acordou hoje pela manhã ali porque me lembro de mim mesma e da<br />
maioria das minhas atividades recentes. Lembro-me de meu nome, de boa parte do meu<br />
histórico, de minha aparência física e do fato de ter me deitado naquela cama na noite<br />
anterior. De forma semelhante me lembro de ir pescar com meu avô em criança, que<br />
freqüentei certa escola primária em Toledo, Ohio, que estudei física na MIT, tive certo<br />
círculo de amigos em Jerusalém etc. Através destas lembranças tenho uma figura de<br />
mim mesma como uma pessoa que esteve em existência ao longo dos vários períodos,<br />
uma pessoa distinta com história própria.<br />
Mas quão confiável é a memória, e exatamente quão substantiva ela é? Será real o<br />
histórico que ela nos fornece, um aspecto de uma identidade pessoal permanente que, de<br />
fato, perdura no tempo, ou será mais uma ilusão, um truque que nos faz acreditar em<br />
algum relacionamento definitivo entre o ser que éramos, o ser que somos e o que<br />
seremos, quando na verdade ele não existe?<br />
Para um filósofo como Derek Parfit qualquer idéia no sentido de que a Unha da<br />
memória tem substância é um erro. Sendo um reducionista declarado, ele iguala o ser,<br />
tal como é, aos aspectos e à dinâmica de nossos estados cerebrais corriqueiros. "Sou<br />
meu cérebro." Como o cérebro muda a todo momento, morrendo, se desenvolvendo e<br />
substituindo os velhos átomos por novos, também o ser está em mutação — não<br />
crescendo, mas literalmente sendo diferente.<br />
Parfit vê uma história individual como uma corrente de seres sucessivos, ligados