Danah Zohar O SER QUÂNTICO
Danah Zohar O SER QUÂNTICO Danah Zohar O SER QUÂNTICO
5 Consciência e Cérebro: Dois Modelos Clássicos Embora, sob muitos aspectos, a consciência seja a coisa mais conhecida e acessível que cada um de nós possui, ela continua como um dos fenômenos menos compreendidos deste mundo. Toda vez que dizemos "eu" ou "nós", temos como suposição tácita que existe um "eu" ou "nós" consciente que está ali falando e pensando. Contudo, no mesmo momento em que tentamos focalizar este ser pensante, agarrá-lo de alguma forma tangível — como pegamos num dedo ou numa orelha — ele parece desaparecer diante de nossos "olhos". Sabemos bastante sobre como os dedos pegam uma coisa e como os ouvidos ouvem, mas sobre a origem e a natureza daquela pessoa consciente que dá origem ao pegar, ou interpreta o que se ouviu, não temos virtualmente nenhum fato físico. Não existe nenhuma anatomia ou fisiologia da consciência, muito menos uma física. Há aqueles (os dualistas), é claro, que argumentam que jamais poderá haver nenhuma compreensão física do ser ou da mente. Eles alegam que a mente e o corpo são coisas bem distintas e que a mente é necessariamente incorpórea — um "algo" etéreo que simplesmente nos vem de algum lugar lá fora e reside temporariamente dentro ou junto do "invólucro" do corpo. Mas há outros, em geral de tendências mais científicas, que estão convencidos de que a mente, ou consciência — como tudo o mais —, deve ter alguma explicação física. Sua fonte deve estar localizada em algum lugar do corpo, embora o local exato onde se pensa que ela esteja tenha variado consideravelmente ao longo do tempo, dando origem a todos os tipos de modelo. O antigo filósofo grego Epicurus acreditava que havia "átomos de alma" espalhados pelo corpo, responsáveis tanto pela consciência como pela vitalidade em geral, embora muitos gregos antigos pensassem que o coração ou o peito fossem a fonte dessas coisas. Outros fizeram suposições de que a consciência brotasse do funcionamento do fígado ou residisse no sangue. Segundo os filósofos hindus, ela está concentrada nos chakras, localizados ao longo da espinha dorsal — daí nossa suposta habilidade de dominá-los através da meditação ioga. E, nos tempos mais modernos, Descartes propôs que o ponto de encontro entre corpo e alma fosse a misteriosa glândula pineal localizada no centro do cérebro. Hoje a maioria dos que procuram uma sede física para a consciência presume que sua fonte deve estar na capacidade funcional do cérebro em si. Danos provocados em outros órgãos do corpo podem ocasionar todo tipo de distúrbios, mas um violento golpe na cabeça quase sempre provoca perda da consciência, exatamente como as drogas que agem sobre o cérebro e comprovadamente alteram vários padrões de consciência. Presume-se, portanto, que existe um vínculo necessário entre os estados físicos do
cérebro e a consciência ou os estados mentais, embora a natureza exata desta ligação ainda seja um dos grandes mistérios tanto da ciência como da filosofia. Nos últimos anos, a maneira escolhida para tratar desse enigma tem sido o "funcionalismo" e a tendência a comparar o cérebro com um computador, sugerindo que a mente, ou consciência, pode ser igualada aos processos que acontecem dentro do computador. Somos aquilo que podemos fazer, e o que podemos fazer é definido pelo plano detalhado de nosso circuito. O modelo do computador ainda domina a maior parte das pesquisas sobre o cérebro, que por sua vez tingem com suas cores toda forma de nos percebermos. Muitas vezes falamos em ter de "alimentar o sistema" ou estarmos com os "fusíveis queimados", estarmos "ligados" ou "desligados" e "programados para o sucesso ou para o fracasso". Dizemos que nosso cérebro é o hardware e nossa mente o software. Toda a biologia moderna agora opera segundo "programas comportamentais" onde antes havia um senso de propósito, ou ao menos de direção. Pensamos em nós mesmos como a "máquina mental". O cérebro é certamente o órgão controlador central do sistema nervoso e, como tal, suas funções físicas incluem comunicação, coordenação, computação, aprendizado e memória, todas elas funções que nossos melhores computadores também possuem em algum grau. Nesse nível, as analogias entre o funcionamento cerebral e o do computador são irresistíveis. Existe indubitável semelhança entre o modo como são organizados os complexos ajuntamentos de neurônios do cérebro e o serpentear de fios que compõe o circuito elétrico de um computador, especialmente agora com a invenção dos computadores com processamento paralelo. Assim como as "células nervosas" de um computador, os 10 bilhões ou 100 bilhões de neurônios do cérebro são também um tipo de fiação elétrica com várias mensagens passando para dentro e para fora do cérebro através de impulsos eletromagnéticos que viajam pelas ligações entre os neurônios, as sinapses. O cérebro está sempre literalmente fervilhando com milhões de acontecimentos neurais altamente carregados, dentre os quais, sem dúvida, uma grande parte é responsável por nossas impressionantes habilidades de processar dados e computar. Mas será que isso é o que entendemos por consciência? Será a computação — com toda sua diversidade e complexidade — tudo o que a mente verdadeiramente tem? Se assim for, ficamos tentados a imaginar por que os computadores não possuem mente. Sem dúvida, eles sabem fazer coisas muito sofisticadas. Conseguem analisar material genético, operar matemática complexa, ou jogar xadrez num nível razoável, embora vagarosamente. Mas até agora ninguém afirmaria que um sistema de computação eletrônico de qualquer tipo imaginável seja sequer remotamente consciente. Simplesmente não conseguimos sentir que eles são conscientes. Faltam-lhes espontaneidade e criatividade, falta-lhes imaginação, eles não riem de piadas, não desfrutam de música e não sentem dor nem fazem nenhuma das outras coisas desse tipo que normalmente associamos com a vida consciente da mente humana. Como colocou um filósofo de Oxford: "Simplesmente não saberíamos interpretar a sugestão de que um IBM 100 esteja bravo ou deprimido ou passando por uma crise de adolescência". 1 Talvez seja possível conceber que inventemos programas sofisticados que darão aos computadores a aparência de tal comportamento consciente — como no caso um tanto fantasmagórico de Eliza ou Doctor, o programa concebido para estimular entrevistas psiquiátricas rogerianas. Mas, como alertou o autor do Eliza, há mundos de
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cérebro e a consciência ou os estados mentais, embora a natureza exata desta ligação<br />
ainda seja um dos grandes mistérios tanto da ciência como da filosofia.<br />
Nos últimos anos, a maneira escolhida para tratar desse enigma tem sido o<br />
"funcionalismo" e a tendência a comparar o cérebro com um computador, sugerindo que<br />
a mente, ou consciência, pode ser igualada aos processos que acontecem dentro do<br />
computador. Somos aquilo que podemos fazer, e o que podemos fazer é definido pelo<br />
plano detalhado de nosso circuito. O modelo do computador ainda domina a maior parte<br />
das pesquisas sobre o cérebro, que por sua vez tingem com suas cores toda forma de nos<br />
percebermos. Muitas vezes falamos em ter de "alimentar o sistema" ou estarmos com os<br />
"fusíveis queimados", estarmos "ligados" ou "desligados" e "programados para o<br />
sucesso ou para o fracasso". Dizemos que nosso cérebro é o hardware e nossa mente o<br />
software. Toda a biologia moderna agora opera segundo "programas comportamentais"<br />
onde antes havia um senso de propósito, ou ao menos de direção. Pensamos em nós<br />
mesmos como a "máquina mental".<br />
O cérebro é certamente o órgão controlador central do sistema nervoso e, como<br />
tal, suas funções físicas incluem comunicação, coordenação, computação, aprendizado e<br />
memória, todas elas funções que nossos melhores computadores também possuem em<br />
algum grau. Nesse nível, as analogias entre o funcionamento cerebral e o do<br />
computador são irresistíveis.<br />
Existe indubitável semelhança entre o modo como são organizados os complexos<br />
ajuntamentos de neurônios do cérebro e o serpentear de fios que compõe o circuito<br />
elétrico de um computador, especialmente agora com a invenção dos computadores com<br />
processamento paralelo. Assim como as "células nervosas" de um computador, os 10<br />
bilhões ou 100 bilhões de neurônios do cérebro são também um tipo de fiação elétrica<br />
com várias mensagens passando para dentro e para fora do cérebro através de impulsos<br />
eletromagnéticos que viajam pelas ligações entre os neurônios, as sinapses. O cérebro<br />
está sempre literalmente fervilhando com milhões de acontecimentos neurais altamente<br />
carregados, dentre os quais, sem dúvida, uma grande parte é responsável por nossas<br />
impressionantes habilidades de processar dados e computar. Mas será que isso é o que<br />
entendemos por consciência? Será a computação — com toda sua diversidade e<br />
complexidade — tudo o que a mente verdadeiramente tem? Se assim for, ficamos<br />
tentados a imaginar por que os computadores não possuem mente.<br />
Sem dúvida, eles sabem fazer coisas muito sofisticadas. Conseguem analisar<br />
material genético, operar matemática complexa, ou jogar xadrez num nível razoável,<br />
embora vagarosamente. Mas até agora ninguém afirmaria que um sistema de<br />
computação eletrônico de qualquer tipo imaginável seja sequer remotamente consciente.<br />
Simplesmente não conseguimos sentir que eles são conscientes. Faltam-lhes<br />
espontaneidade e criatividade, falta-lhes imaginação, eles não riem de piadas, não<br />
desfrutam de música e não sentem dor nem fazem nenhuma das outras coisas desse tipo<br />
que normalmente associamos com a vida consciente da mente humana. Como colocou<br />
um filósofo de Oxford: "Simplesmente não saberíamos interpretar a sugestão de que um<br />
IBM 100 esteja bravo ou deprimido ou passando por uma crise de adolescência". 1<br />
Talvez seja possível conceber que inventemos programas sofisticados que darão<br />
aos computadores a aparência de tal comportamento consciente — como no caso um<br />
tanto fantasmagórico de Eliza ou Doctor, o programa concebido para estimular<br />
entrevistas psiquiátricas rogerianas. Mas, como alertou o autor do Eliza, há mundos de