Danah Zohar O SER QUÂNTICO

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14.04.2013 Views

supõe. Não só há bastante movimentação espontânea mas há ainda elaborados padrões de atividade aparentemente propositados". 7 Todas elas, ressalta Thorpe, ficariam evidentes até para nós se as víssemos num filme em câmera acelerada. Mais provas de que os animais inferiores, que externamente parecem muito diferentes de nós, possuem algum tipo de percepção consciente que opera sob princípios similares aos nossos foram recentemente oferecidas por estudos dos efeitos dos anestésicos cirúrgicos comuns (clorofórmio, halotano etc.) sobre o comportamento de caramujos grandes de reservatório. 8 Ao aplicar-se neles os mesmos anestésicos que privam os pacientes humanos de sua percepção consciente, os caramujos perderam seu reflexo de retração frente a estímulos dolorosos. De nossa parte, é provavelmente seguro supor, mesmo com as evidências que temos hoje, que quando falamos de consciência estamos falando de uma "propriedade" ou de um processo que nós, seres humanos, partilhamos, ao menos em certo grau, com todos os outros membros do reino animal. Esta suposição abrange nossos sentimentos intuitivos em relação a outros animais e aceita a possível validade dos argumentos filosóficos por analogia. Assim, estabelecendo graus de qualidade e complexidade, podemos admitir que, em certo sentido, todos os outros animais têm uma consciência, são capazes de um determinado grau de atividade espontânea e proposital, são sensíveis a estímulos parecidos com prazer e dor e são dotados de alguma capacidade rudimentar de livrearbítrio • No sentido mais primitivo possível, a posse desse conjunto de qualidades também significaria que existe algum tipo de "vida interior" subjetiva nos outros animais — toda criatura deve ter seu próprio "ponto de vista". A aceitacão disso pode muito bem afetar nossa postura moral em relação às criaturas diferentes de nós. Pampsiquismo — pleno e limitado A maior parte das pessoas provavelmente tem pouca dificuldade em aceitar a tese até este ponto, isto é, aceitar ao menos a possibilidade de que todos os membros do reino animal possuem uma vida consciente em algum grau. Alguns de nós talvez precisem ser convencidos de que os caramujos possuem um "ponto de vista" ou de que as minhocas tenham livre-arbítrio, mas não está completamente fora de nossa capacidade imaginar que outras criaturas talvez partilhem conosco algumas das propriedades que normalmente associamos à percepção consciente. Algumas pessoas, ao menos, estão familiarizadas com a idéia — se não plenamente convencidas — de que outros seres vivos, como as plantas, também podem ser dotados de algum tipo de propriedade sensitiva rudimentar. Mas, se formos mais além, até chegar a uma posição pampsíquica, sugerindo que mesmo os objetos inanimados como pedras ou pedaços de pau (para não falar de elétrons) devem ser incluídos no conjunto de seres conscientes da natureza, estaremos indo muito além do alcance da intuição da maior parte das pessoas — ao menos daquelas influenciadas pela atmosfera intelectual dos últimos trezentos anos. Poucos dentre os que estão vivos hoje têm algum sentimento de semelhança com a terra sobre a qual caminham ou a poeira que inalam. • Enumerar a posse de livre-arbítrio como critério necessário de consciência é, evidentemente, algo controvertido; mas isto será discutido no cap. 11: a consciência, vista como um processo mecânicoquântico, e o livre-arbítrio são de fato inseparáveis. Um ser quântico.é, necessariamente, um ser livre.

E, no entanto, nossa intuição moderna sobre tais coisas está em dissonância com muitas plataformas de nossa história cultural pré-cartesiana e pré-newtoniana. Tem-se alguma espécie de pampsiquismo organizado desde os tempos pré-socráticos. O Uno de Parmênides ou o Fluxo Divino de Heráclito fazem supor que todas as coisas, conscientes e materiais, derivam fundamentalmente de uma fonte comum. "Deus é o dia e a noite, o verão e o inverno, a guerra e a paz, a saciedade e a fome; mas assume várias formas, assim como o fogo quando é misturado com espécies leva um nome segundo o sabor de cada uma delas (...) O homem não sabe o quanto aquilo que sofre variação está harmonizado com ele." 9 Antes disso ainda, os espíritos da natureza dos animistas povoaram as árvores, montanhas e nuvens de chuvas da Grécia Antiga, da mesma forma que em muitas outras sociedades primitivas. A metáfora da Grande Corrente do Ser, 10 que retratou tudo como pertencente a uma única corrente unificada e completa estendendo-se do homem às menores partículas da matéria inanimada, originada em Timeu de Platão, influenciou a visão de mundo da gente de toda a Idade Média e da Renascença. Apenas nesta era moderna é que perdemos grandemente o contato com esse antigo paradigma. Mas, apesar disso, ou mais provavelmente como reação defensiva à tendência materialista e mecanicista de nossa cultura recente, algum tipo de pampsiquismo promoveu uma tradição moderna subcultural própria. Para muitos, a motivação foi basicamente espiritual ou religiosa. Conforme está expresso na Encyclopedia of Philosophy, muitos acreditaram que "somente aceitando o pampsiquismo é que o homem moderno (que acha impossível crer nas afirmações da religião tradicional) poderá escapar às angustiantes implicações do materialismo". 11 Elevando a matéria ao nível da consciência, ou ao menos enxergando algumas propriedades conscientes incipientes em toda a matéria, muitos filósofos e psicólogos modernos (Spinoza, Leibnitz, William James, Teilhard de Chardin, Whitehead etc.) entraram em contato com uma realidade subjacente não de todo alheia à sua própria experiência. "Se somos pampsíquicos", escreveu o filósofo alemão Hermann Lotze, no século 18, "não mais contemplamos 'uma parte do cosmo como mero instrumento cego e sem vida do cosmo usado para os fins de outra parte', mas, ao contrário, encontramos 'sob a superfície serena da matéria, por trás das repetições rígidas e regulares de seu funcionamento (...) o calor de uma atividade mental oculta'." 12 O contemporâneo de Lotze, G. T. Fechner, via a própria Terra como uma criatura viva, "um todo unitário em forma e substância, em propósito e efeito (...) e auto-suficiente em sua individualidade" 13 — uma idéia popularizada em nossa época pelo entusiasmo nutrido pela hipótese Gaia de J. E. Love-lock. 14 Muitos dos modernos pampsiquistas aceitavam a doutrina em sua forma mais plena, acreditando que cada montanha, árvore, flor e partícula de poeira realmente possui uma vida interior psicológica, mas este não é o tipo de pensamento pampsiquista que nos diz respeito aqui. Antes, devemos nos preocupar em ver o que a física moderna poderá lançar sobre a natureza da consciência, a fim de compreendermos o que há no relacionamento entre matéria e consciência, no nível quântico que agora faz com que alguns físicos quânticos, e mais um punhado de filósofos baseados no trabalho daqueles, sejam considerados integrantes da tradição pampsiquista. Há, necessariamente, uma forma muito mais limitada e cautelosa de pampsiquismo, já que nada na física moderna

supõe. Não só há bastante movimentação espontânea mas há ainda elaborados padrões<br />

de atividade aparentemente propositados". 7 Todas elas, ressalta Thorpe, ficariam<br />

evidentes até para nós se as víssemos num filme em câmera acelerada. Mais provas de<br />

que os animais inferiores, que externamente parecem muito diferentes de nós, possuem<br />

algum tipo de percepção consciente que opera sob princípios similares aos nossos foram<br />

recentemente oferecidas por estudos dos efeitos dos anestésicos cirúrgicos comuns<br />

(clorofórmio, halotano etc.) sobre o comportamento de caramujos grandes de<br />

reservatório. 8 Ao aplicar-se neles os mesmos anestésicos que privam os pacientes<br />

humanos de sua percepção consciente, os caramujos perderam seu reflexo de retração<br />

frente a estímulos dolorosos.<br />

De nossa parte, é provavelmente seguro supor, mesmo com as evidências que<br />

temos hoje, que quando falamos de consciência estamos falando de uma "propriedade"<br />

ou de um processo que nós, seres humanos, partilhamos, ao menos em certo grau, com<br />

todos os outros membros do reino animal. Esta suposição abrange nossos sentimentos<br />

intuitivos em relação a outros animais e aceita a possível validade dos argumentos<br />

filosóficos por analogia.<br />

Assim, estabelecendo graus de qualidade e complexidade, podemos admitir que,<br />

em certo sentido, todos os outros animais têm uma consciência, são capazes de um<br />

determinado grau de atividade espontânea e proposital, são sensíveis a estímulos<br />

parecidos com prazer e dor e são dotados de alguma capacidade rudimentar de livrearbítrio<br />

• No sentido mais primitivo possível, a posse desse conjunto de qualidades<br />

também significaria que existe algum tipo de "vida interior" subjetiva nos outros<br />

animais — toda criatura deve ter seu próprio "ponto de vista". A aceitacão disso pode<br />

muito bem afetar nossa postura moral em relação às criaturas diferentes de nós.<br />

Pampsiquismo — pleno e limitado<br />

A maior parte das pessoas provavelmente tem pouca dificuldade em aceitar a tese<br />

até este ponto, isto é, aceitar ao menos a possibilidade de que todos os membros do<br />

reino animal possuem uma vida consciente em algum grau. Alguns de nós talvez<br />

precisem ser convencidos de que os caramujos possuem um "ponto de vista" ou de que<br />

as minhocas tenham livre-arbítrio, mas não está completamente fora de nossa<br />

capacidade imaginar que outras criaturas talvez partilhem conosco algumas das<br />

propriedades que normalmente associamos à percepção consciente.<br />

Algumas pessoas, ao menos, estão familiarizadas com a idéia — se não<br />

plenamente convencidas — de que outros seres vivos, como as plantas, também podem<br />

ser dotados de algum tipo de propriedade sensitiva rudimentar. Mas, se formos mais<br />

além, até chegar a uma posição pampsíquica, sugerindo que mesmo os objetos<br />

inanimados como pedras ou pedaços de pau (para não falar de elétrons) devem ser<br />

incluídos no conjunto de seres conscientes da natureza, estaremos indo muito além do<br />

alcance da intuição da maior parte das pessoas — ao menos daquelas influenciadas pela<br />

atmosfera intelectual dos últimos trezentos anos. Poucos dentre os que estão vivos hoje<br />

têm algum sentimento de semelhança com a terra sobre a qual caminham ou a poeira<br />

que inalam.<br />

• Enumerar a posse de livre-arbítrio como critério necessário de consciência é, evidentemente, algo<br />

controvertido; mas isto será discutido no cap. 11: a consciência, vista como um processo mecânicoquântico,<br />

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