Danah Zohar O SER QUÂNTICO
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À medida que tais decisões se desenrolam, a criança lentamente descobre tanto o seu pote como aquilo dentro de si mesma que gosta de fazer coisas assim, mas essa descoberta é uma descoberta criativa, • pois é exatamente por intermédio dela, enquanto vai se desenrolando, que a criança faz o pote e a si mesma (seu senso estético). Sua descoberta, que se revela em etapas, literalmente rouba o pote e esse aspecto dela mesma das esferas enevoadas da possibilidade, realizando-os. Sua criação agiu como parteira no nascimento de uma pequena porção nova de realidade. Uma compreensão intuitiva do relacionamento entre o brincar criativo de uma criança e a incorporação de sua pessoa potencial repousa no cerne do uso que Melanie Klein faz da brincadeira das crianças em sua psicanálise infantil. Ela acreditava que, por meio de sua brincadeira, a criança se descobria e também tornava-se mais ela mesma. A mesma teoria reforça o uso da arte e da música como terapia para adultos — a crença de que, tecendo uma cesta, pintando um quadro ou escrevendo uma canção, o paciente pode trazer algo de si para a existência. Essa auto-descoberta criativa tem raízes na física da consciência, que é totalmente diferente da física das máquinas. Tanto o aspecto mutuamente criativo do pote de argila da criança como a liberdade na qual ele se originou são estranhos ao processo pelo qual a máquina produz pratos. Atrás de cada máquina há um ser humano criativo reencenando o drama da criança e seu pote de argila, mas, para a máquina em si, a cor, o tamanho e o estilo exatos do prato que será produzido são determinados pelo mecanismo de sua construção. A máquina não tem livre-arbítrio. Padrões aleatórios produzidos por máquinas — como os conjuntos de figuras apresentados por um caça-níqueis de frutas — não são determinados, mas o sentido de liberdade associado à aleatoriedade é totalmente diferente daquele associado ao propósito ou intenção, e nenhum de seus produtos seria verdadeiramente criativo. Da mesma forma, o mecanismo da máquina de fazer pratos é determinado pelo projeto original dos pratos a serem fabricados. Nem a máquina nem o projeto dos pratos se alteram como resultado do processo de manufatura. São como duas bolas de bilhar newtonianas chocando-se — elas se encontram, mas ambas saem inalteradas do encontro. A diferença essencial entre a criança e a máquina, que torna uma criativa e a outra não, é que a criança está num diálogo constante e mutuamente criativo com seu ambiente, enquanto a máquina não. Como Wordsworth colocou há muito tempo, sua mente é "criadora e recebedora, ambos trabalhando em aliança com a obra que ela contempla". 5 Ao seguir seu impulso natural quântico • de fazer uma inteireza relacionai ordenada a partir das informações de sua experiência — seu impulso quântico de • Devo o meu conceito original de "descoberta criativa" a meu velho professor, o filósofo americano Samuel Todes. O uso que faz do termo é semelhante ao que ora descrevo, embora eu acredite que ele tenha adquirido significação pela associação à teoria quântica. • Para ser mais exata, seu natural impulso quântico estilo Prigogine — somente sistemas quânticos complexos e auto-ordenadores (sistemas Prigogine) exibiram uma natural e irreversível direção evolutiva. (Vide Prigogine, Order Out of Chaos, pp. 297-310.) Todos os sistemas do tipo Fröhlich possuem tal qualidade.
integrar-se —, a criança reúne, ipso facto, um objeto (seu pote de argila) e um mundo (sua relação com o pote, seu significado para ela e para os outros) que nunca estiveram ali antes. Criança, objeto e mundo são tornados reais conjuntamente, pelo colapso livre e indeterminado de muitas crianças, objetos e mundos possíveis dentro da mente da criança. Todos os sistemas quânticos (especialmente sistemas de bósons como é o nosso caso) partilham desse mesmo mecanismo de autodescoberta criativa por meio do diálogo com o próprio ambiente. Em seu nível mais elementar, esse diálogo se evidencia cada vez que um fóton passa através de uma ou de duas aberturas, ou manifesta-se como onda ou partícula em resposta à presença de uma tela de detecção ou de uma fotomultiplicadora. No nível mais complexo dos sistemas vivos (sistemas quânticos ordenados), há uma evidência recente e sugestiva de que a evolução biológica em si poderá ser, na verdade, uma "evolução reativa". 6 Ela talvez seja um diálogo quântico entre a criatura e seu ambiente, com capacidade de selecionar e realizar uma das muitas direções possíveis da evolução (mutações) latentes no código do DNA. A verossimilhança disso se fortalece em evidências recentes de que há coerência quântica no próprio DNA. 7 Todos os sistemas vivos evoluem e têm, na medida de sua evolução, uma espécie de criatividade embutida em seu desenvolvimento estrutural. Há, como diz Ilya Prigogine, uma flecha de tempo nos sistemas vivos que aponta em direção a mais e maior complexidade — "O tempo é construção". 8 Ou, como coloca o físico alemão Fritz Popp, "o estado de coerência é como um papel em branco sempre pedindo para que escrevamos nele". 9 Temos um impulso físico de sermos criativos que decorre da física dos sistemas vivos. Mas, além dessa criatividade estrutural, uma interpretação quântica da consciência nos revela como pode existir uma criatividade comportamental — a da criança e do pote de argila — que também se estende dos seres humanos até as criaturas mais simples, descendo por toda a escala evolutiva. Mesmo as minhocas revelam uma tendência primitiva de integração de seus dados sensoriais desenvolvendo lentamente um estilo de vida, um mundo. Elas respondem a estímulos de seu ambiente, aprendem que certas respostas lhes proporcionam (grosso modo) prazer e outras dor, e aprendem a comportar-se de acordo com isso. Algumas chegaram a aprender a não se mover quando expostas à luz, apesar de seu instinto de fazê-lo, e outras aprenderam a percorrer labirintos simples. 10 Talvez esteja errado dizer que as minhocas agem propositadamente na construção de seu mundo, ou mesmo dizer que elas "escolhem" uma forma de comportamento em detrimento de outra. Propósito e escolha são categorias humanas que derivam de capacidades especificamente humanas (ou ao menos dos animais superiores). É importante, porém, reconhecer que uma criatividade comportamental elementar está disponível até para sistemas vivos muito simples em conseqüência de sua capacidade quântica de estar em diálogo com o mundo circundante (sua unidade muito elementar de consciência) e de integrar informações deste. O que torna a criatividade humana tão mais impressionante e espantosa que a da minhoca não é o fato de ser diferente, em princípio, mas o de ser diferente em tipo e
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seu pote como aquilo dentro de si mesma que gosta de fazer coisas assim, mas essa<br />
descoberta é uma descoberta criativa, • pois é exatamente por intermédio dela, enquanto<br />
vai se desenrolando, que a criança faz o pote e a si mesma (seu senso estético). Sua<br />
descoberta, que se revela em etapas, literalmente rouba o pote e esse aspecto dela<br />
mesma das esferas enevoadas da possibilidade, realizando-os. Sua criação agiu como<br />
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Uma compreensão intuitiva do relacionamento entre o brincar criativo de uma<br />
criança e a incorporação de sua pessoa potencial repousa no cerne do uso que Melanie<br />
Klein faz da brincadeira das crianças em sua psicanálise infantil. Ela acreditava que, por<br />
meio de sua brincadeira, a criança se descobria e também tornava-se mais ela mesma. A<br />
mesma teoria reforça o uso da arte e da música como terapia para adultos — a crença de<br />
que, tecendo uma cesta, pintando um quadro ou escrevendo uma canção, o paciente<br />
pode trazer algo de si para a existência. Essa auto-descoberta criativa tem raízes na<br />
física da consciência, que é totalmente diferente da física das máquinas.<br />
Tanto o aspecto mutuamente criativo do pote de argila da criança como a<br />
liberdade na qual ele se originou são estranhos ao processo pelo qual a máquina produz<br />
pratos. Atrás de cada máquina há um ser humano criativo reencenando o drama da<br />
criança e seu pote de argila, mas, para a máquina em si, a cor, o tamanho e o estilo<br />
exatos do prato que será produzido são determinados pelo mecanismo de sua<br />
construção. A máquina não tem livre-arbítrio. Padrões aleatórios produzidos por<br />
máquinas — como os conjuntos de figuras apresentados por um caça-níqueis de frutas<br />
— não são determinados, mas o sentido de liberdade associado à aleatoriedade é<br />
totalmente diferente daquele associado ao propósito ou intenção, e nenhum de seus<br />
produtos seria verdadeiramente criativo.<br />
Da mesma forma, o mecanismo da máquina de fazer pratos é determinado pelo<br />
projeto original dos pratos a serem fabricados. Nem a máquina nem o projeto dos pratos<br />
se alteram como resultado do processo de manufatura. São como duas bolas de bilhar<br />
newtonianas chocando-se — elas se encontram, mas ambas saem inalteradas do<br />
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A diferença essencial entre a criança e a máquina, que torna uma criativa e a outra<br />
não, é que a criança está num diálogo constante e mutuamente criativo com seu<br />
ambiente, enquanto a máquina não. Como Wordsworth colocou há muito tempo, sua<br />
mente é "criadora e recebedora, ambos trabalhando em aliança com a obra que ela<br />
contempla". 5<br />
Ao seguir seu impulso natural quântico • de fazer uma inteireza relacionai<br />
ordenada a partir das informações de sua experiência — seu impulso quântico de<br />
• Devo o meu conceito original de "descoberta criativa" a meu velho professor, o filósofo americano<br />
Samuel Todes. O uso que faz do termo é semelhante ao que ora descrevo, embora eu acredite que ele<br />
tenha adquirido significação pela associação à teoria quântica.<br />
• Para ser mais exata, seu natural impulso quântico estilo Prigogine — somente sistemas quânticos<br />
complexos e auto-ordenadores (sistemas Prigogine) exibiram uma natural e irreversível direção evolutiva.<br />
(Vide Prigogine, Order Out of Chaos, pp. 297-310.) Todos os sistemas do tipo Fröhlich possuem tal<br />
qualidade.