Diversidade sexual na educação ... - unesdoc - Unesco

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14.04.2013 Views

nais nacionais, têm vislumbrado ofensa a diversos direitos humanos e fundamentais na discriminação dirigida contra manifestações divorciadas do heterossexismo. Nestes casos, direitos básicos como a privacidade, a liberdade individual, o livre desenvolvimento da personalidade, a dignidade humana, a igualdade e a saúde são concretizados e juridicamente protegidos em demandas envolvendo homossexuais, bissexuais, travestis e transexuais. 7 Como aludido no parágrafo anterior, a homofobia viola de modo intenso e permanente uma série de direitos básicos, reconhecidos tanto pelo direito internacional dos direitos humanos, quanto pelo direito constitucional. Ao lesionar uma gama tão ampla de bens jurídicos, a homofobia manifesta-se por meio de duas formas de violência: física e não-física. A violência física, mais visível e brutal, atinge diretamente a integridade corporal, quando não chega às raias do homicídio. A segunda forma de violência, nãofísica, mas não por isso menos grave e danosa, consiste no não-reconhecimento e na injúria. O não-reconhecimento, configurando uma espécie de ostracismo social, nega valor a um modo de ser ou de viver, criando condições para formas de tratamento degradantes e insultuosas. Já a injúria, relacionada a esta exclusão da esfera de direitos e impedimento da autonomia social e da possibilidade de interação, é uma das manifestações mais difusas e cotidianas da homofobia (LOPES, 00 : 0). Nas palavras de Didier Eribon (citado por LOPES, 00 ), 72 O que a injúria me diz é que sou alguém anormal ou inferior, alguém sobre quem o outro tem poder e, antes de tudo, o poder de me ofender. A injúria é, pois, o meio pelo qual se exprime a assimetria entre os indivíduos. [...]. Ela tem igualmente a força de um poder constituinte. Porque a personalidade, a identidade pessoal, a consciência mais íntima, é fabricada pela existência mesma desta hierarquia e pelo lugar que ocupamos nela e, pois, pelo olhar do outro, do “dominante”, e a faculdade que ele tem de inferiorizar-me insultando-me, fazendo-me saber que ele pode me insultar, que sou uma pessoa insultável e insultável ao infinito. A injúria homofóbica inscreve-se em um contínuo que vai desde a palavra dita na rua que cada gay ou lésbica pode ouvir (veado sem-vergonha, sapata sem-vergonha) até as palavras 27 Um panorama desta evolução no direito internacional dos direitos humanos, ver WINTEMUTE (1995) e HEINZE (1995); no direito brasileiro, RIOS (2001) e GOLIN (2003).

que estão implicitamente escritas na porta de entrada da sala de casamentos da prefeitura: “proibida a entrada de homossexuais” e, portanto, até as práticas profissionais dos juristas que inscrevem essa proibição no direito, e até os discursos de todos aqueles e aquelas que justificam essas discriminações nos artigos que apresentam como elaborações intelectuais (filosóficas, teológicas, antropológicas, psicanalíticas etc.) e que não passam de discursos pseudocientíficos destinados a perpetuar a ordem desigual, a reinstituí-la, seja invocando a natureza ou a cultura, a lei divina ou as leis de uma ordem simbólica imemorial. Todos estes discursos são atos, e atos de violência. Estando manifesta a contrariedade ao direito da homofobia, bem como a violência de suas manifestações, deve-se atentar para o quanto a discriminação homofóbica está disseminada em nossa cultura heterossexista. De fato, ao lado de expressões intencionais de homofobia convivem discriminações nãointencionais, mas nem por isso menos graves ou injustas. Uma análise destas modalidades de discriminação homofóbica pode ser desenvolvida a partir das modalidades direta e indireta do fenômeno discriminatório, elaboradas no seio do direito da antidiscriminação. 3.3. Modalidades de discriminação: homofobia direta e indireta A homofobia, como expressão discriminatória intensa e cotidiana, ocorre sempre que distinções, exclusões, restrições ou preferências anulam ou prejudicam o reconhecimento, o gozo ou o exercício em pé de igualdade de direitos humanos e liberdades fundamentais nos campos econômico, social, cultural ou em qualquer campo da vida pública. Assim compreendida, a qualificação de um ato como homofóbico não depende da intencionalidade do ato ou da situação ocasionadora da lesão aos direitos humanos e liberdades fundamentais afetados. Deste modo, há discriminação homofóbica sempre que, de modo proposital ou não, houver tal espécie de lesão a direitos, decorrente da concretização de preconceito diante de estilos de ser e de viver divorciados do heterossexismo. Daí a relevância da análise das formas intencionais (discriminação direta) e não-intencionais (discriminação indireta) de discriminação homofóbica, uma vez que ambas lesionam direitos de modo grave e disseminado. 73

<strong>na</strong>is <strong>na</strong>cio<strong>na</strong>is, têm vislumbrado ofensa a diversos direitos humanos e fundamentais<br />

<strong>na</strong> discrimi<strong>na</strong>ção dirigida contra manifestações divorciadas do heterossexismo.<br />

Nestes casos, direitos básicos como a privacidade, a liberdade individual, o livre<br />

desenvolvimento da perso<strong>na</strong>lidade, a dignidade huma<strong>na</strong>, a igualdade e a saúde são<br />

concretizados e juridicamente protegidos em demandas envolvendo homossexuais,<br />

bissexuais, travestis e transexuais. 7<br />

Como aludido no parágrafo anterior, a homofobia viola de modo intenso e<br />

permanente uma série de direitos básicos, reconhecidos tanto pelo direito inter<strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l<br />

dos direitos humanos, quanto pelo direito constitucio<strong>na</strong>l. Ao lesio<strong>na</strong>r uma<br />

gama tão ampla de bens jurídicos, a homofobia manifesta-se por meio de duas<br />

formas de violência: física e não-física.<br />

A violência física, mais visível e brutal, atinge diretamente a integridade corporal,<br />

quando não chega às raias do homicídio. A segunda forma de violência, nãofísica,<br />

mas não por isso menos grave e danosa, consiste no não-reconhecimento e<br />

<strong>na</strong> injúria. O não-reconhecimento, configurando uma espécie de ostracismo social,<br />

nega valor a um modo de ser ou de viver, criando condições para formas de tratamento<br />

degradantes e insultuosas. Já a injúria, relacio<strong>na</strong>da a esta exclusão da esfera<br />

de direitos e impedimento da autonomia social e da possibilidade de interação, é<br />

uma das manifestações mais difusas e cotidia<strong>na</strong>s da homofobia (LOPES, 00 : 0).<br />

Nas palavras de Didier Eribon (citado por LOPES, 00 ),<br />

72<br />

O que a injúria me diz é que sou alguém anormal ou inferior,<br />

alguém sobre quem o outro tem poder e, antes de tudo, o poder<br />

de me ofender. A injúria é, pois, o meio pelo qual se exprime<br />

a assimetria entre os indivíduos. [...]. Ela tem igualmente<br />

a força de um poder constituinte. Porque a perso<strong>na</strong>lidade, a<br />

identidade pessoal, a consciência mais íntima, é fabricada pela<br />

existência mesma desta hierarquia e pelo lugar que ocupamos<br />

nela e, pois, pelo olhar do outro, do “domi<strong>na</strong>nte”, e a faculdade<br />

que ele tem de inferiorizar-me insultando-me, fazendo-me<br />

saber que ele pode me insultar, que sou uma pessoa insultável<br />

e insultável ao infinito.<br />

A injúria homofóbica inscreve-se em um contínuo que vai<br />

desde a palavra dita <strong>na</strong> rua que cada gay ou lésbica pode ouvir<br />

(veado sem-vergonha, sapata sem-vergonha) até as palavras<br />

27 Um panorama desta evolução no direito inter<strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l dos direitos humanos, ver WINTEMUTE (1995) e<br />

HEINZE (1995); no direito brasileiro, RIOS (2001) e GOLIN (2003).

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