Diversidade sexual na educação ... - unesdoc - Unesco
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lável diante do modus vivendi hegemônico. Esta compossibilidade, ainda que por vezes limitada e tensa, se dá particularmente no que respeita a instituições e a dinâmicas que estruturam o cotidiano dos indivíduos e a organização social, tais como a família fundada na heterossexualidade e a generificação da realidade. A homofobia, como já referido, apresenta-se mais renitente do que outras formas de preconceito e discriminação. De fato, se hoje são inadmissíveis as referências discriminatórias a negros, judeus e mulheres, ainda são toleradas, ou ao menos sobrelevadas, as manifestações homofóbicas. A persistência da homofobia ocorre, dentre outros fatores, porque a homossexualidade tende a afrontar de modo mais radical e incômodo instituições e dinâmicas basilares na vida em sociedade. 0 É claro que este contraste não rejeita, por exemplo, o potencial revolucionário do feminismo para a organização da vida familiar e social, pública e privada. Com propriedade, pondera-se que, assim como no combate à homofobia, a superação do sexismo pode contender a estrutura tradicional da família heterossexual ou questionar a binariedade do discurso de gênero (BUTLER, 999). Todavia, na homofobia, o que se reclama não é somente o rearranjo das relações conjugais heterossexuais ou a reorganização do espaço público, possibilitando condições de igualdade entre homens e mulheres. O combate à homofobia reclama não só ir além da “normalidade” da dominação masculina e do sexismo. Ele demanda, além do questionamento aos paradigmas já criticados pelo feminismo, rumar à crítica da heterossexualidade como padrão de normalidade. É preciso, neste sentido, a superação de mais esta “normalidade”. Neste passo, abrem-se pelo menos duas alternativas, que denomino de respostas radical e moderada diante da homofobia. A resposta radical pode ser estruturada como um dilema: a superação da homofobia insta à desconstrução do binômio hetero/homossexualidade, uma vez que a homofobia pressupõe a afirmação da heterossexualidade por meio do repúdio à homossexualidade. Dito de outro modo: para atacar a homofobia em suas raízes é preciso suplantar a heterossexualidade e a homossexualidade como identidades sexuais. Tal resposta pode soar, aos ouvidos de muitos, como “suicídio identitário”: acabar definitivamente a homofobia pela abolição da própria homossexualidade. Uma crí- 20 Esta afirmação, de que a homossexualidade tende a desafiar tais instituições e dinâmicas, sem necessariamente fazê-lo, pode ser constatada pelas diversas posturas presentes no movimento gay. Conforme a descrição de Bamforth (1997), enquanto alguns adotam uma perspectiva “revolucionária”, pugnando pela superação das identidades hetero/homossexuais e rejeitando a assimilação/adaptação a modalidades de relacionamento tradicionais, outros, “reformistas”, pleiteiam a inclusão na estrutura social vigente, basicamente pela eliminação das restrições decorrentes da identidade de sexos nas relações afetivas e sexuais. 68
tica deste jaez seria improcedente: ela pecaria por não perceber que o vencimento do heterossexismo, levado às últimas conseqüências, é que está em causa. A resposta moderada, por sua vez, pode redundar em um paradoxo: como sustentar a igualdade entre as orientações sexuais (e, por conseguinte, suprimir a homofobia) se, como sustenta Jonathan Katz ( 99 ), a heterossexualidade se define precisamente pela negação e a desvalorização da homossexualidade? Dito de outro modo: cuida-se de tentar conciliar o inconciliável. Diante desta encruzilhada teórica e política, é preciso buscar alternativas que ofereçam compreensão e respostas, possibilitando reagir à extensa gama de direitos violados pela discriminação homofóbica. Para tanto, lanço mão do aporte que o paradigma dos direitos humanos e, em particular, seus conteúdos antidiscriminatórios, fornece quando desafiado pela homofobia. 3. Direitos Humanos e antidiscriminação: aporte jurídico para a compreensão e para o combate da homofobia O objetivo desta seção é, mediante o aporte da perspectiva dos direitos humanos, contribuir para o entendimento da homofobia e seu enfrentamento. Consciente da amplitude de temas, de perspectivas e de questões que o paradigma dos direitos humanos suscita, limito-me ao âmbito do direito da antidiscriminação, entendido como conjunto de conteúdos e institutos jurídicos relativos ao princípio da igualdade enquanto proibição de discriminação e como mandamento de promoção e respeito da diversidade. Deste modo, é possível avançar não só na conceituação da homofobia, como também na efetividade de seu combate, potencializando o raciocínio e o instrumental jurídicos em face desta realidade. 3.1. Conceito jurídico de discriminação Como referido (item . ), o termo discriminação designa a materialização, no plano concreto das relações sociais, de atitudes arbitrárias, comissivas ou omissivas, originadas do preconceito, capazes de produzir violação de direitos contra indivíduos e grupos estigmatizados. Mais freqüente no vocabulário jurídico, é a partir deste campo que ora se analisa o conceito de discriminação. Alerte-se que a abordagem da discriminação através de um ponto de vista jurídico não implica desconhecer ou menosprezar o debate sociológico ao redor 69
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tica deste jaez seria improcedente: ela pecaria por não perceber que o vencimento<br />
do heterossexismo, levado às últimas conseqüências, é que está em causa.<br />
A resposta moderada, por sua vez, pode redundar em um paradoxo: como<br />
sustentar a igualdade entre as orientações sexuais (e, por conseguinte, suprimir a<br />
homofobia) se, como sustenta Jo<strong>na</strong>than Katz ( 99 ), a heteros<strong>sexual</strong>idade se define<br />
precisamente pela negação e a desvalorização da homos<strong>sexual</strong>idade? Dito de outro<br />
modo: cuida-se de tentar conciliar o inconciliável.<br />
Diante desta encruzilhada teórica e política, é preciso buscar alter<strong>na</strong>tivas que<br />
ofereçam compreensão e respostas, possibilitando reagir à extensa gama de direitos<br />
violados pela discrimi<strong>na</strong>ção homofóbica. Para tanto, lanço mão do aporte que o paradigma<br />
dos direitos humanos e, em particular, seus conteúdos antidiscrimi<strong>na</strong>tórios,<br />
fornece quando desafiado pela homofobia.<br />
3. Direitos Humanos e antidiscrimi<strong>na</strong>ção: aporte<br />
jurídico para a compreensão e para o combate<br />
da homofobia<br />
O objetivo desta seção é, mediante o aporte da perspectiva dos direitos humanos,<br />
contribuir para o entendimento da homofobia e seu enfrentamento. Consciente<br />
da amplitude de temas, de perspectivas e de questões que o paradigma dos<br />
direitos humanos suscita, limito-me ao âmbito do direito da antidiscrimi<strong>na</strong>ção, entendido<br />
como conjunto de conteúdos e institutos jurídicos relativos ao princípio da<br />
igualdade enquanto proibição de discrimi<strong>na</strong>ção e como mandamento de promoção<br />
e respeito da diversidade. Deste modo, é possível avançar não só <strong>na</strong> conceituação da<br />
homofobia, como também <strong>na</strong> efetividade de seu combate, potencializando o raciocínio<br />
e o instrumental jurídicos em face desta realidade.<br />
3.1. Conceito jurídico de discrimi<strong>na</strong>ção<br />
Como referido (item . ), o termo discrimi<strong>na</strong>ção desig<strong>na</strong> a materialização,<br />
no plano concreto das relações sociais, de atitudes arbitrárias, comissivas ou omissivas,<br />
origi<strong>na</strong>das do preconceito, capazes de produzir violação de direitos contra indivíduos<br />
e grupos estigmatizados. Mais freqüente no vocabulário jurídico, é a partir<br />
deste campo que ora se a<strong>na</strong>lisa o conceito de discrimi<strong>na</strong>ção.<br />
Alerte-se que a abordagem da discrimi<strong>na</strong>ção através de um ponto de vista<br />
jurídico não implica desconhecer ou menosprezar o debate sociológico ao redor<br />
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