Diversidade sexual na educação ... - unesdoc - Unesco
Diversidade sexual na educação ... - unesdoc - Unesco Diversidade sexual na educação ... - unesdoc - Unesco
Considerando as características da modernidade ocidental e as especificidades destas manifestações, foram-lhes relacionados contextos próprios, cuja presença aponta para a sua propulsão e reprodução. Assim, respectivamente, ao anti-semitismo relacionou-se a emergência dos totalitarismos; ao racismo, os desdobramentos da escravidão; ao sexismo, a estrutura familiar patriarcal. As respostas sociais e políticas diante destes preconceitos e discriminações, por sua vez, voltaram-se contra os discursos religiosos, científicos e políticos que tanto os legitimaram quanto os perpetuaram. Daí o esforço, especialmente nos âmbitos científicos e políticos, por se denunciar a deturpação ideológica dos saberes científicos (notadamente no campo da biologia, da psicologia e das ciências sociais), bem como o combate às plataformas políticas que acolhem e acionam tais proposições e perspectivas. As tentativas de superação do preconceito e da discriminação, neste contexto, estruturam-se a partir da premissa da descoberta dos processos de geração do preconceito e do enfrentamento aos respectivos atos de discriminação. Tanto do ponto de vista das ciências sociais e psicológicas, quanto do direito, cuida-se de identificar as circunstâncias concretas que, diante da dinâmica própria do fenômeno discriminatório, desencadeiam a discriminação e, ao mesmo tempo, combater as suas causas e as suas conseqüências. Nas causas, o totalitarismo, a escravidão e o patriarcado; nas conseqüências, os inumeráveis atos de discriminação e a desigual repartição de poder e benefícios entre os grupos. Entre eles, dinâmicas psicológicas e sociológicas, cuja presença traz à tona as imperfeições subjetivas e as conseqüências de processos de interação social conflitivos e injustos. Deste ponto de vista, anti-semitismo, racismo e sexismo podem ser superados ou, ao menos, atenuados na medida em que a conjugação de iniciativas individuais (autoconhecimento, abertura para o outro), coletivas (políticas públicas, especialmente educacionais) e jurídicas (repressão de atos discriminatórios e incentivo a medidas reparatórias e positivas) tenha condições de implementação e funcionamento. Totalitarismo, segregação racial e a estrutura familiar patriarcal seriam, portanto, realidades distintas, cujo vencimento aponta para a instituição de relações sociais mais igualitárias e menos discriminatórias, conduzindo, inclusive, não só a uma democratização da vida em sociedade, como também a um processo de aperfeiçoamento pessoal. Todavia, como referido desde a introdução, os estudos e o combate ao antisemitismo, ao racismo e ao sexismo revelam-se em estágio diverso daquele experimentado pela homofobia. Examinar mais detidamente a dinâmica da homofobia e sua relação com as aludidas expressões discriminatórias, portanto, é um caminho que necessita ser percorrido, objetivando compreender o porquê desta realidade. 58
Antes de adentrar nesta tarefa, é preciso sublinhar o caráter interseccional da discriminação. No exame das manifestações discriminatórias aludidas, costuma-se isolar cada uma das diversas expressões do preconceito e da discriminação. Este procedimento, meramente para fins comparativos, não significa ignorar a interseccionalidade da discriminação, isto é, a associação simultânea de múltiplas dinâmicas discriminatórias na realidade concreta de indivíduos e grupos. Também designada como “discriminação composta” ou “discriminação de cargas múltiplas” (CRENSHAW, 00 ), a interseccionalidade da discriminação chama a atenção para o resultado da articulação das diversas discriminações, tais como raça, sexo, classe, orientação sexual e deficiência. 2. Homofobia Na primeira parte deste artigo, foi delineado, de forma sucinta e esquemática, o quadro conceitual por meio do qual é estudado o fenômeno discriminatório nos debates atuais. A partir dele, será analisada a homofobia, mediante a exposição das abordagens psicológica e sociológica e da relação entre as diversas formas de discriminação já referidas. Antes de iniciar tal plano, noticio os usos correntes do termo e um pouco de sua história. Com efeito, neste percurso investigatório, surgem muitas indagações: a homofobia se restringe a homossexuais ou alcança outros grupos? Quais as semelhanças e as diferenças entre a homofobia e outras formas de discriminação e preconceito? Qual a relação entre a homofobia e as demais manifestações discriminatórias? Diante da polêmica acerca do que seja a homossexualidade e, por conseguinte, de quem sejam homossexuais, como identificar as vítimas da homofobia? Mesmo que tão abrangentes e disputadas questões extrapolem o objeto desta reflexão, elas serão tangenciadas na medida em que a compreensão da homofobia e de suas manifestações requerer. 2.1. Homofobia: definição e elementos O que é homofobia? Uma resposta rápida e direta, no horizonte deste estudo, divisa a homofobia como forma de preconceito que pode resultar em discriminação. De modo mais específico, e agora valendo-me da acepção mais corrente, homofobia é a modalidade de preconceito e de discriminação direcionada contra homossexuais. 6 Daniel Welzer-Lang (1994) distingue a utilização do termo homofobia de um modo genérico ou particular. Antes mesmo da “homofobia específica” (aversão dirigida contra homossexuais), há a “homofobia geral” (manifestação do sexismo que resulta em discriminação dos sujeitos em virtude do seu sexo e gênero, sempre que estes carregam características atribuídas ao gênero oposto). 59
- Page 5 and 6: Diversidade Sexual na Educação: p
- Page 7 and 8: Apresentação A sociedade brasilei
- Page 9 and 10: Liberdade, essa palavra que o sonho
- Page 11 and 12: Corpo, Violência e Educação: uma
- Page 13 and 14: o que procuramos lutar. Não podemo
- Page 15 and 16: o reconhecimento da diversidade sex
- Page 17 and 18: 18 Janeiro, em Recife, São Paulo,
- Page 19 and 20: a camaradagem e as manifestações
- Page 21 and 22: 22 ca”, pelas brincadeiras [...]
- Page 23 and 24: ela contém” e - o que é crucial
- Page 25 and 26: Ademais, é preciso não descurar q
- Page 27 and 28: 28 [...] consiste numa atitude de d
- Page 29 and 30: Regimes de (in)visibilidade 30 Todo
- Page 31 and 32: mulheres homossexuais. A invisibili
- Page 33 and 34: quais, por sua vez, serão usados c
- Page 35 and 36: Ao lado disso, é preciso atentar-s
- Page 37 and 38: Alípio de Sousa Filho, em Homossex
- Page 39 and 40: Em Cenas de exclusões anunciadas:
- Page 41 and 42: de identidades LGBT estreita, seja
- Page 43 and 44: ______. Risposte: per un’antropol
- Page 45 and 46: FERREIRA, Paulo Rogers da Silva. Os
- Page 47 and 48: MEDEIROS, Luciana Soares. Pais homo
- Page 49 and 50: RYAN, Biel; FRAPPIER, Jean-Yves. Qu
- Page 51 and 52: Homofobia na Perspectiva dos Direit
- Page 53 and 54: 1.2. Preconceito e discriminação:
- Page 55: Quanto à perspectiva marxista trad
- Page 59 and 60: às causas e às origens, objetivan
- Page 61 and 62: e prejuízos a lésbicas, gays, bis
- Page 63 and 64: 2.3. A Homofobia diante do anti-sem
- Page 65 and 66: múltiplas (pobreza, racismo, desig
- Page 67 and 68: tica deste jaez seria improcedente:
- Page 69 and 70: Por fim, alerte-se que não se subs
- Page 71 and 72: que estão implicitamente escritas
- Page 73 and 74: desta espécie, é preciso atentar
- Page 75 and 76: cientemente sua prática intenciona
- Page 77 and 78: Neste quadro, as violações físic
- Page 79 and 80: GOLIN, Célio; POCAHY, Fernando Alt
- Page 81 and 82: RIOS, Roger Raupp. A Homossexualida
- Page 83 and 84: Neste pequeníssimo trecho já se c
- Page 85 and 86: Tais mudanças não são nada banai
- Page 87 and 88: Esse alinhamento (entre sexo-gêner
- Page 89 and 90: muitas vezes, por uma intensa rejei
- Page 91 and 92: Teorias sobre a Gênese da Homossex
- Page 93 and 94: posição dos antropólogos Peter F
- Page 95 and 96: É recente a crítica teórica e o
- Page 97 and 98: espeitabilidade à defesa desta min
- Page 99 and 100: Torna-se importante destacar ainda
- Page 101 and 102: ção” na fase narcísica, respon
- Page 103 and 104: A mãe que mostra ter sido a lei pa
- Page 105 and 106: cujas razões (na espécie humana e
Considerando as características da modernidade ocidental e as especificidades<br />
destas manifestações, foram-lhes relacio<strong>na</strong>dos contextos próprios, cuja presença<br />
aponta para a sua propulsão e reprodução. Assim, respectivamente, ao anti-semitismo<br />
relacionou-se a emergência dos totalitarismos; ao racismo, os desdobramentos<br />
da escravidão; ao sexismo, a estrutura familiar patriarcal. As respostas sociais e políticas<br />
diante destes preconceitos e discrimi<strong>na</strong>ções, por sua vez, voltaram-se contra<br />
os discursos religiosos, científicos e políticos que tanto os legitimaram quanto os<br />
perpetuaram. Daí o esforço, especialmente nos âmbitos científicos e políticos, por se<br />
denunciar a deturpação ideológica dos saberes científicos (notadamente no campo<br />
da biologia, da psicologia e das ciências sociais), bem como o combate às plataformas<br />
políticas que acolhem e acio<strong>na</strong>m tais proposições e perspectivas.<br />
As tentativas de superação do preconceito e da discrimi<strong>na</strong>ção, neste contexto,<br />
estruturam-se a partir da premissa da descoberta dos processos de geração do preconceito<br />
e do enfrentamento aos respectivos atos de discrimi<strong>na</strong>ção. Tanto do ponto<br />
de vista das ciências sociais e psicológicas, quanto do direito, cuida-se de identificar<br />
as circunstâncias concretas que, diante da dinâmica própria do fenômeno discrimi<strong>na</strong>tório,<br />
desencadeiam a discrimi<strong>na</strong>ção e, ao mesmo tempo, combater as suas causas<br />
e as suas conseqüências. Nas causas, o totalitarismo, a escravidão e o patriarcado;<br />
<strong>na</strong>s conseqüências, os inumeráveis atos de discrimi<strong>na</strong>ção e a desigual repartição de<br />
poder e benefícios entre os grupos. Entre eles, dinâmicas psicológicas e sociológicas,<br />
cuja presença traz à to<strong>na</strong> as imperfeições subjetivas e as conseqüências de processos<br />
de interação social conflitivos e injustos.<br />
Deste ponto de vista, anti-semitismo, racismo e sexismo podem ser superados<br />
ou, ao menos, atenuados <strong>na</strong> medida em que a conjugação de iniciativas individuais<br />
(autoconhecimento, abertura para o outro), coletivas (políticas públicas, especialmente<br />
educacio<strong>na</strong>is) e jurídicas (repressão de atos discrimi<strong>na</strong>tórios e incentivo a<br />
medidas reparatórias e positivas) tenha condições de implementação e funcio<strong>na</strong>mento.<br />
Totalitarismo, segregação racial e a estrutura familiar patriarcal seriam, portanto,<br />
realidades distintas, cujo vencimento aponta para a instituição de relações<br />
sociais mais igualitárias e menos discrimi<strong>na</strong>tórias, conduzindo, inclusive, não só a<br />
uma democratização da vida em sociedade, como também a um processo de aperfeiçoamento<br />
pessoal.<br />
Todavia, como referido desde a introdução, os estudos e o combate ao antisemitismo,<br />
ao racismo e ao sexismo revelam-se em estágio diverso daquele experimentado<br />
pela homofobia. Exami<strong>na</strong>r mais detidamente a dinâmica da homofobia<br />
e sua relação com as aludidas expressões discrimi<strong>na</strong>tórias, portanto, é um caminho<br />
que necessita ser percorrido, objetivando compreender o porquê desta realidade.<br />
58