Diversidade sexual na educação ... - unesdoc - Unesco
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Provocando a constatação de uma aparente contradição pergunto: como pode um currículo escolar excluir deliberadamente uma identidade por considerá-la inferior e negativa (a homossexual) se ela é fundamental para a consolidação da identidade normativa (a heterossexual)? Como pode a Educação discursar sobre sua importância nos processos de combate às desigualdades sociais, na busca pela proclamada cidadania plena, se o seu currículo não oferece a alunos/as e professoras/res as representações de todas as identidades? Sobre este aspecto Louro manifesta-se: 318 Uma pedagogia e um currículo queer se distinguiriam de programas multiculturais bem-intencionados, em que as diferenças (de gênero, sexuais ou étnicas) são toleradas ou são apreciadas como curiosidades exóticas. Uma pedagogia e um currículo queer estariam voltados para o processo de produção das diferenças e trabalhariam, centralmente, com a instabilidade e a precariedade de todas as identidades (LOURO, 004: 48). Quando falo em incluir representações positivas da identidade gay e lésbica nos currículos escolares admito que possam surgir outros impasses: Que representação é essa? Quem a define? Para Luhmann ( 998: 4 ), um caminho a seguir seria contestar a representação gay como pertencente a uma pessoa “doente, sexualmente pervertida, infeliz e anti-social”. Qual modelo de “representação positiva” seria apresentado, na medida em que há ampla diversidade na própria identidade gay? Isto torna qualquer modelo altamente contestável mesmo no interior das comunidades gay e lésbica e, por certo, na própria teoria queer. Mais do que combater a homofobia, a lesbofobia, a transfobia ou auxiliar na auto-estima gay e lésbica pela inclusão de temas, ou aumentar sua visibilidade, ou contribuir para a representação de pluralidade sexual, a teoria queer pretende indagar que condições tornam possíveis as aprendizagens de certas identidades e não de outras. O que é possível “tolerar” de conhecimento e por que a ignorância é buscada como estratégia de defesa, de preservação e de deliberada recusa de outras identidades? No jogo das identidades, que “eu” é fixado e que “eu” é negado? Que “outro” é fixado e que “outro” é negado? A pedagogia poderia começar questionando: Como nós adquirimos o conhecimento e como este saber é produzido na inter-relação entre professor/a-texto-aluno/a? Penso que esta visão supera a idéia de que na educação se dá transmissão do conhecimento, tirando-se assim, também, do/a professora/or, o status de ser o/a único/a que detém o conhecimento. Segundo Felman (apud LUHMANN, 998: 48),
“ensinar é... não a transmissão do conhecimento já feito. Ela é, antes, a criação de uma nova condição do saber, a criação de uma disposição original de aprendizagem”. Na introdução de seu artigo, ao mencionar o estado generalizado de desconhecimento (ou surpresa) de seus colegas ao ouvirem a expressão “teoria queer”, Britzman ( 99 : ) questionou os motivos pelos quais, para muitos, é impensável que as experiências de gays e lésbicas possam estar presentes no currículo escolar. E perguntou: “que espécie de diferença poderia ela fazer para todos numa sala de aula se a escrita gay e lésbica fosse colocada livremente longe das confirmações da homofobia, das malícias da inclusão ou como um evento especial?”. Essa teórica queer é enfática ao dizer que “[...] a ausência da teorização gay e lésbica na educação é colocada na tensão com a crítica cultural e trocas históricas que concerne à constituição dos corpos do conhecimento e do conhecimento dos corpos” (BRITZMAN, 99 : ). Para ela (idem: ), a contribuição da teorização queer, demandada pelos movimentos de direitos humanos gays e lésbicos, tende a provocar uma “redefinição de família, das economias públicas do afeto e das representações e do direito de um dia-a-dia não organizado pela violência, exclusão, medicalização, criminalização”. Essa teorização apontaria ainda para “a estabilidade e campos fundamentalistas de categorias como masculinidade, feminilidade, sexualidade, cidadania, nação, cultura, alfabetização, maioridade sexual, 7 legalidade, e assim por diante; categorias que são completamente centrais nos caminhos nos quais a educação organiza o conhecimento dos corpos e os corpos do conhecimento” (ibid.: ). 17 A “idade do consentimento” difere em muitos países: Holanda (12); Espanha (13); Itália, Alemanha e Canadá (14); França (15); Inglaterra e Japão (16); Estados Unidos (14 a 18, dependendo do estado). No Brasil, o entendimento jurídico acerca da “idade do consentimento sexual” se dá na legislação sobre o casamento, portanto, atrelado à heterossexualidade. Hoje, casamentos legais no Brasil são possíveis a partir dos 16 anos (quando autorizados ou consentidos pelos pais ou se autorizados por um juiz); casamentos abaixo de 18 anos, se válidos, trazem emancipação automática pela Lei. A idade do consentimento (ou idade da maioridade sexual) indica a idade mínima legal a partir da qual um adolescente pode ter sexo com um parceiro maior de 18 anos que atualmente, no Brasil, é de 14 anos (se autorizado ou consentido pelos pais). O Código Penal (Art. 225) estabelece que o Estado não pode iniciar uma ação legal em crimes sexuais; ela deve ser iniciada pela própria vítima ou pelos pais da vítima (quando se tratar de um menor). Considerado um ato de natureza privada (não pública), o sexo é parte da vida privada do cidadão. Somente quando não aprovada pelos pais é que a relação sexual com menores (entre 14 e 18 anos) pode ser objeto de apreciação pela Justiça, sob o argumento de sedução (se direcionado a uma moça virgem) e/ou de corrupção de menores (em qualquer caso). Não há referência às relações homossexuais na Lei. A “idade do consentimento” refere-se não apenas à conjunção carnal (pênis na vagina), mas também a todas as formas de “atos libidinosos” (sexo oral e anal, manipulação e/ou contato da boca com os seios e a vagina, e a masturbação do outro). Alguém pode ser processado pelos pais de um menor se realizar qualquer destes atos libidinosos com o menor (e não apenas no caso da conjunção carnal). Namorar e beijar são permitidos em todas as idades e não são suscetíveis à restrição legal (do namoro não se presume o sexo). Por outro lado, a prostituição e a pornografia (e até atuar em cenas de sexo em filmes não-pornô) são proibidas para todos os menores abaixo de 18 anos, mesmo quando emancipados por casamento ou por qualquer outro motivo. Fontes: Códigos Civil e Penal Brasileiros, disponíveis em: e . Acesso em: 27 ago,2004. 319
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“ensi<strong>na</strong>r é... não a transmissão do conhecimento já feito. Ela é, antes, a criação de uma<br />
nova condição do saber, a criação de uma disposição origi<strong>na</strong>l de aprendizagem”.<br />
Na introdução de seu artigo, ao mencio<strong>na</strong>r o estado generalizado de desconhecimento<br />
(ou surpresa) de seus colegas ao ouvirem a expressão “teoria queer”,<br />
Britzman ( 99 : ) questionou os motivos pelos quais, para muitos, é impensável<br />
que as experiências de gays e lésbicas possam estar presentes no currículo escolar.<br />
E perguntou: “que espécie de diferença poderia ela fazer para todos numa sala de<br />
aula se a escrita gay e lésbica fosse colocada livremente longe das confirmações da<br />
homofobia, das malícias da inclusão ou como um evento especial?”.<br />
Essa teórica queer é enfática ao dizer que “[...] a ausência da teorização gay<br />
e lésbica <strong>na</strong> <strong>educação</strong> é colocada <strong>na</strong> tensão com a crítica cultural e trocas históricas<br />
que concerne à constituição dos corpos do conhecimento e do conhecimento<br />
dos corpos” (BRITZMAN, 99 : ). Para ela (idem: ), a contribuição da<br />
teorização queer, demandada pelos movimentos de direitos humanos gays e lésbicos,<br />
tende a provocar uma “redefinição de família, das economias públicas do<br />
afeto e das representações e do direito de um dia-a-dia não organizado pela violência,<br />
exclusão, medicalização, crimi<strong>na</strong>lização”. Essa teorização apontaria ainda<br />
para “a estabilidade e campos fundamentalistas de categorias como masculinidade,<br />
feminilidade, <strong>sexual</strong>idade, cidadania, <strong>na</strong>ção, cultura, alfabetização, maioridade<br />
<strong>sexual</strong>, 7 legalidade, e assim por diante; categorias que são completamente centrais<br />
nos caminhos nos quais a <strong>educação</strong> organiza o conhecimento dos corpos e<br />
os corpos do conhecimento” (ibid.: ).<br />
17 A “idade do consentimento” difere em muitos países: Holanda (12); Espanha (13); Itália, Alemanha e<br />
Ca<strong>na</strong>dá (14); França (15); Inglaterra e Japão (16); Estados Unidos (14 a 18, dependendo do estado).<br />
No Brasil, o entendimento jurídico acerca da “idade do consentimento <strong>sexual</strong>” se dá <strong>na</strong> legislação sobre<br />
o casamento, portanto, atrelado à heteros<strong>sexual</strong>idade. Hoje, casamentos legais no Brasil são possíveis<br />
a partir dos 16 anos (quando autorizados ou consentidos pelos pais ou se autorizados por um juiz);<br />
casamentos abaixo de 18 anos, se válidos, trazem emancipação automática pela Lei. A idade do consentimento<br />
(ou idade da maioridade <strong>sexual</strong>) indica a idade mínima legal a partir da qual um adolescente<br />
pode ter sexo com um parceiro maior de 18 anos que atualmente, no Brasil, é de 14 anos (se autorizado<br />
ou consentido pelos pais). O Código Pe<strong>na</strong>l (Art. 225) estabelece que o Estado não pode iniciar uma ação<br />
legal em crimes sexuais; ela deve ser iniciada pela própria vítima ou pelos pais da vítima (quando se<br />
tratar de um menor). Considerado um ato de <strong>na</strong>tureza privada (não pública), o sexo é parte da vida privada<br />
do cidadão. Somente quando não aprovada pelos pais é que a relação <strong>sexual</strong> com menores (entre<br />
14 e 18 anos) pode ser objeto de apreciação pela Justiça, sob o argumento de sedução (se direcio<strong>na</strong>do<br />
a uma moça virgem) e/ou de corrupção de menores (em qualquer caso). Não há referência às relações<br />
homossexuais <strong>na</strong> Lei. A “idade do consentimento” refere-se não ape<strong>na</strong>s à conjunção car<strong>na</strong>l (pênis <strong>na</strong><br />
vagi<strong>na</strong>), mas também a todas as formas de “atos libidinosos” (sexo oral e a<strong>na</strong>l, manipulação e/ou contato<br />
da boca com os seios e a vagi<strong>na</strong>, e a masturbação do outro). Alguém pode ser processado pelos pais de<br />
um menor se realizar qualquer destes atos libidinosos com o menor (e não ape<strong>na</strong>s no caso da conjunção<br />
car<strong>na</strong>l). Namorar e beijar são permitidos em todas as idades e não são suscetíveis à restrição legal<br />
(do <strong>na</strong>moro não se presume o sexo). Por outro lado, a prostituição e a pornografia (e até atuar em ce<strong>na</strong>s<br />
de sexo em filmes não-pornô) são proibidas para todos os menores abaixo de 18 anos, mesmo quando<br />
emancipados por casamento ou por qualquer outro motivo. Fontes: Códigos Civil e Pe<strong>na</strong>l Brasileiros,<br />
disponíveis em: e . Acesso em: 27 ago,2004.<br />
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