Diversidade sexual na educação ... - unesdoc - Unesco

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Penso que certa subversão, no âmbito social e escolar, já ocorra através da gradual visibilidade queer, seja ela do ativismo gay e lésbico, dos estilos de vida queer, das práticas sexuais queer, seja das identidades queer. Esta visibilidade é fundamental para subverter a dicotomia sexo/gênero heteronormativa, mostrando uma infinidade de estranhos arranjos de identidades e de estilos, o que possibilita uma desestabilização do entendimento de as configurações de gênero e do desejo serem únicas ou fixas, até mesmo no contexto das identidades marginais. Neste sentido, o “modo queer de pensar” tanto abalaria questões de ordem conceitual e reflexiva envolvidas na produção dos discursos que definem essas representações acerca das identidades, como facilitaria seu processo de desconstrução. Talvez, a partir do “olhar queer”, pudéssemos perguntar: Como cada representação (do normal e do anormal) é criada e/ou recusada? Como cada representação marca as posições dos sujeitos no âmbito escolar e social? Como seria possível subverter essas posições de sujeito? Seria o caso de redefinir sua representação? Esta ênfase de “redefinição de representações” como estratégia sobre, contudo, limitações e esbarra na estratégia intelectual da própria teoria queer – ser contra qualquer imposição, norma ou padrão fixo. Portanto, parece que aquilo que deve ser “ensinado” não é qualquer tipo de nova identidade (esse processo se mostraria interminável). O que interessa é discutir na Educação Sexual como cada identidade é construída, (des)valorizada, assumida ou não, e desconstruir o processo que estabelece a normalidade. Assim, uma postura pedagógica baseada numa atitude queer poderia ser rigorosamente contra qualquer forma de normatização da sexualidade. Os procedimentos didático-metodológicos buscariam intervenções críticas ou subversivas das relações opressivas no âmbito do espaço escolar, entre a sexualidade heteronormativa e os regimes dos gêneros, na tentativa de demonstrar como a produção da normalidade é intencional, histórica, política e, sendo assim, instável, contingencial e mutável. Penso ser importante reforçar o caráter reflexivo da teoria queer que, no meu modo de ver, é anterior e superior a qualquer tentativa de definir posturas metodológicas fixas. Entendo que o foco da teoria queer na educação é o constante questionamento e a crítica ao pensamento normativo que permeia os currículos escolares, em geral, e às representações da sexualidade e do gênero, em particular. Neste sentido, a teoria queer pode ter uma lógica – a de problematizar as redes de poder e os interesses que definem as representações negativas, inferiores e propositadamente excluídas dos currículos acerca dos gêneros, das sexualidades, das relações étnico-raciais. 316 ver LOURO (2004: 65 e 80).

Quando Britzman ( 99 ) afirma que o “estudo dos limites’”(visto como um método de reflexão) consiste em exercitar a capacidade de perceber como o pensamento é formado, ou seja, “o que torna algo pensável”, sugere-me a necessidade de se duvidar constantemente da relevância e da valoração social de algumas identidades. Como, no âmbito da cultura, algo é considerado relevante/valorizado enquanto seu “diferente” é considerado irrelevante/desvalorizado? Neste sentido, a teoria queer pode ser vista como aquela que apresenta (como método?) a estratégia de confrontar explicações de ordem essencialista e construtivista tão comuns nas explicações acerca das questões das diferenças. Isto porque são essas explicações e esses modos de pensamento e significados que tornam “reais” as representações que definem, segundo Judith Butler ( 000), os “corpos que pesam” – aqueles que têm sua devida importância social, seja do ponto de vista sexual, de gênero, racial, étnico, ou geracional, e que são construídos nas relações de poder que podem ser problematizadas pela postura crítica de uma pedagogia queer escolar, presente na atitude da/o educadora/or. Para Britzman ( 99 : 7), na teoria queer, a normalidade (o estado normal) é uma ordem conceitual que rejeita imaginar como real a possibilidade do “outro”, precisamente porque a produção da diversidade é central para ela própria se autoreconhecer. Na ação pedagógica educacional, estar atento e apontar para essa produção da normalidade permite-nos considerar, de modo simultâneo, “as ‘instáveis relações diferenciais’ entre aqueles que transgridem o normal e aqueles que trabalham para ser reconhecidos como normais”. Isto torna inevitável o entendimento de identidade como aquilo que se estabelece sempre em um processo de relação, nunca isolada de seu outro. Luhmann ( 998: 4 ) lembra que “gays e lésbicas educam nossas crianças”, quando introduz a reflexão sobre a possibilidade de a “teoria queer ser trazida à pedagogia”. A existência de educadoras/es gays e lésbicas é tão convenientemente ignorada no espaço social e escolar quanto conteúdos gays e lésbicos nos currículos oficiais. Para Luhmann ( 998: 4 ), trata-se da evidência da: [...] marginalização dos sujeitos gays e lésbicos na escola, em sua desigualdade e invisibilidade [...]. Os efeitos prejudiciais da representação ausente podem ser minimizados pela inclusão de conteúdos gays e lésbicos como remédio contra homofobia, auto-estima e presença segura dos/as queer em sala de aula. 317

Penso que certa subversão, no âmbito social e escolar, já ocorra através da<br />

gradual visibilidade queer, seja ela do ativismo gay e lésbico, dos estilos de vida queer,<br />

das práticas sexuais queer, seja das identidades queer. Esta visibilidade é fundamental<br />

para subverter a dicotomia sexo/gênero heteronormativa, mostrando uma infinidade<br />

de estranhos arranjos de identidades e de estilos, o que possibilita uma desestabilização<br />

do entendimento de as configurações de gênero e do desejo serem únicas<br />

ou fixas, até mesmo no contexto das identidades margi<strong>na</strong>is. Neste sentido, o “modo<br />

queer de pensar” tanto abalaria questões de ordem conceitual e reflexiva envolvidas<br />

<strong>na</strong> produção dos discursos que definem essas representações acerca das identidades,<br />

como facilitaria seu processo de desconstrução. Talvez, a partir do “olhar queer”, pudéssemos<br />

perguntar: Como cada representação (do normal e do anormal) é criada<br />

e/ou recusada? Como cada representação marca as posições dos sujeitos no âmbito<br />

escolar e social? Como seria possível subverter essas posições de sujeito? Seria o<br />

caso de redefinir sua representação?<br />

Esta ênfase de “redefinição de representações” como estratégia sobre, contudo,<br />

limitações e esbarra <strong>na</strong> estratégia intelectual da própria teoria queer – ser contra<br />

qualquer imposição, norma ou padrão fixo. Portanto, parece que aquilo que deve<br />

ser “ensi<strong>na</strong>do” não é qualquer tipo de nova identidade (esse processo se mostraria<br />

interminável). O que interessa é discutir <strong>na</strong> Educação Sexual como cada identidade<br />

é construída, (des)valorizada, assumida ou não, e desconstruir o processo que<br />

estabelece a normalidade. Assim, uma postura pedagógica baseada numa atitude<br />

queer poderia ser rigorosamente contra qualquer forma de normatização da <strong>sexual</strong>idade.<br />

Os procedimentos didático-metodológicos buscariam intervenções críticas<br />

ou subversivas das relações opressivas no âmbito do espaço escolar, entre a <strong>sexual</strong>idade<br />

heteronormativa e os regimes dos gêneros, <strong>na</strong> tentativa de demonstrar como<br />

a produção da normalidade é intencio<strong>na</strong>l, histórica, política e, sendo assim, instável,<br />

contingencial e mutável.<br />

Penso ser importante reforçar o caráter reflexivo da teoria queer que, no meu<br />

modo de ver, é anterior e superior a qualquer tentativa de definir posturas metodológicas<br />

fixas. Entendo que o foco da teoria queer <strong>na</strong> <strong>educação</strong> é o constante questio<strong>na</strong>mento<br />

e a crítica ao pensamento normativo que permeia os currículos escolares, em<br />

geral, e às representações da <strong>sexual</strong>idade e do gênero, em particular. Neste sentido, a<br />

teoria queer pode ter uma lógica – a de problematizar as redes de poder e os interesses<br />

que definem as representações negativas, inferiores e propositadamente excluídas<br />

dos currículos acerca dos gêneros, das <strong>sexual</strong>idades, das relações étnico-raciais.<br />

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ver LOURO (2004: 65 e 80).

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