Diversidade sexual na educação ... - unesdoc - Unesco

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314 também sugere novas formas de pensar a cultura, o conhecimento, o poder e a educação (LOURO, 004: 47). Esse processo de “provocar outro modo de conhecer e de pensar” torna a teoria queer “uma política de conhecimento cultural” (LOURO, 004: 0). Assim, creio que a epistemologia queer pode ser transferida para qualquer categoria de análise sociocultural, uma vez que sua premissa básica (rejeitar qualquer forma de normatividade) se presta tanto às discussões sexuais (que a originaram), como também às questões racial, étnica, colonial, de gênero, geracional. Trata-se de uma atitude intelectual, investigativa e crítica, de recusa a um sistema de significação normativo. Sobre isso Britzman ( 99 : ) é enfática “[...] o queer e a teoria, na Teoria Queer, significam ações, não atores. Ele pode ser entendido como um verbo ou como uma reação citacional que significa mais do que o significante”. Suzanne Luhmann ( 998: 4 ), ao considerar o espaço escolar como local das diferenças, pergunta: “como imaginar uma pedagogia queer?”... Questionando, a partir da existência dessa pedagogia, a autora indaga se “ela seria sobre e para os/as estudantes queer ou para os/as professores/as queer?” Ou ainda, “ela seria uma questão de currículo queer (métodos educacionais adequados aos conteúdos queer) ou ensino e aprendizagem queer?” E ela questiona ainda: “O que a teoria queer oferece às pedagogias que desejam práticas emancipatórias?”. Parece que o caráter polêmico, contestador e inconformado das teorias críticas emancipatórias encontra nas perturbadoras e irônicas proposituras queer uma convergência coerente. Sobre “classificações”, Louro ( 004: ) enfaticamente afirma que “são improváveis”. Tal pedagogia não pode ser reconhecida como uma pedagogia do oprimido, como libertadora ou libertária. Ela escapa de enquadramentos. Evita operar com os dualismos, que acabam por manter a lógica da subordinação (ibid.: 47). Entretanto, como no âmbito pedagógico entraria em ação um currículo queer? Em seu livro Um corpo estranho: ensaios sobre sexualidade e teoria queer, Louro ( 004) joga com o significado cultural do verbo “estranhar”. Para ela, a questão produtiva posta pela teoria queer à Educação é a possibilidade de “estranhar o currículo”, ou seja, “um movimento de desconfiar do currículo (tal como ele se apresenta)”. Desconcertá-lo, transtorná-lo, ou seja, 15 A autora afirma em relação à teoria queer: “[...] Para educadores e educadoras [...] o caminho talvez seja o de ampliar o sentido da teoria para além da conotação sexual e de gênero e voltar-se para um jeito queer de pensar a educação, o conhecimento, o poder e a construção das identidades” (LOURO, 2004: 211).

[...] colocar em situação embaraçosa o que há de estável naquele “corpo de conhecimentos”; enfim, fazer uma espécie de enfrentamento das condições em que se dá o conhecimento [...]? (ibid.: 4). Talvez, “o modo queer de pensar” possa nos apontar algum caminho. A ignorância de certas identidades subordinadas e de seus sujeitos tem sido significada por estudiosas queer, “como um efeito do conhecimento, de fato, como seu limite, e não como um estado originário ou inocente” (BRITZMAN, 99 : 4). A ignorância explicitaria “[...] uma dinâmica ativa da negação, uma recusa ativa da informação” (Felman apud LUHMANN, 998: 49) e, segundo Luhmann ( 998: 0), precisamos “compreender a ignorância não como carência de consciência, mas como uma resistência ao poder do conhecimento”. Contudo, poderia a ignorância ser desconstruída na Educação Sexual? Desconstruir a ignorância poderia ser interpretada como uma forma de levar a teoria queer para a prática da escola? Neste caso a inclusão curricular de conteúdos que expressassem a experiência gay e lésbica, contrapondo com a heterossexualidade, seria uma solução para essa ignorância? Em relação a tal questão, a teoria queer vem sinalizando para o rompimento do modelo normal heterossexual de análise e para a legitimação das identidades sexuais e de gênero. Para Louro ( 00 : 49), “[...] segundo os teóricos e as teóricas queer, é necessário empreender uma mudança epistemológica que efetivamente rompa com a lógica binária e com seus efeitos: a hierarquia, a classificação, a dominação e a exclusão”. Parece que esta inclusão curricular das representações de gays e lésbicas pode ser vista como uma possível estratégia de ação contra a homofobia, da mesma forma que pode ser vista como uma estratégia de subversão, conforme alerta Luhmann ( 998: 4 ). Mas não é suficiente! A instabilidade proporcionada pela teoria queer atua especialmente no sistema discursivo em que vivemos, no qual cada identidade sexual (homo, hetero ou bissexual) é construída através do eixo sexo/gênero, claramente identificável e interdependente, pois se espera a convergência lógica entre um corpo sexuado (que deve ser macho-homem ou fêmea-mulher), sua identidade de gênero (masculina ou feminina) e seu objeto de desejo (dirigido ao sexo oposto). A teoria queer caracteriza-se por “uma coleção de compromissos intelectuais com a relação existente entre sexo, gênero e desejo sexual” (SPARGO, 999: 9). 16 Sobre essa premissa que atrela um sexo a um gênero e este a uma dada sexualidade e suas implicações, 315

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também sugere novas formas de pensar a cultura, o conhecimento,<br />

o poder e a <strong>educação</strong> (LOURO, 004: 47).<br />

Esse processo de “provocar outro modo de conhecer e de pensar” tor<strong>na</strong> a teoria<br />

queer “uma política de conhecimento cultural” (LOURO, 004: 0). Assim, creio<br />

que a epistemologia queer pode ser transferida para qualquer categoria de análise<br />

sociocultural, uma vez que sua premissa básica (rejeitar qualquer forma de normatividade)<br />

se presta tanto às discussões sexuais (que a origi<strong>na</strong>ram), como também<br />

às questões racial, étnica, colonial, de gênero, geracio<strong>na</strong>l. Trata-se de uma atitude<br />

intelectual, investigativa e crítica, de recusa a um sistema de significação normativo.<br />

Sobre isso Britzman ( 99 : ) é enfática “[...] o queer e a teoria, <strong>na</strong> Teoria Queer,<br />

significam ações, não atores. Ele pode ser entendido como um verbo ou como uma<br />

reação citacio<strong>na</strong>l que significa mais do que o significante”.<br />

Suzanne Luhmann ( 998: 4 ), ao considerar o espaço escolar como local<br />

das diferenças, pergunta: “como imagi<strong>na</strong>r uma pedagogia queer?”... Questio<strong>na</strong>ndo,<br />

a partir da existência dessa pedagogia, a autora indaga se “ela seria sobre e para<br />

os/as estudantes queer ou para os/as professores/as queer?” Ou ainda, “ela seria uma<br />

questão de currículo queer (métodos educacio<strong>na</strong>is adequados aos conteúdos queer)<br />

ou ensino e aprendizagem queer?” E ela questio<strong>na</strong> ainda: “O que a teoria queer<br />

oferece às pedagogias que desejam práticas emancipatórias?”. Parece que o caráter<br />

polêmico, contestador e inconformado das teorias críticas emancipatórias encontra<br />

<strong>na</strong>s perturbadoras e irônicas proposituras queer uma convergência coerente. Sobre<br />

“classificações”, Louro ( 004: ) enfaticamente afirma que “são improváveis”.<br />

Tal pedagogia não pode ser reconhecida como uma pedagogia<br />

do oprimido, como libertadora ou libertária. Ela escapa de enquadramentos.<br />

Evita operar com os dualismos, que acabam por<br />

manter a lógica da subordi<strong>na</strong>ção (ibid.: 47).<br />

Entretanto, como no âmbito pedagógico entraria em ação um currículo<br />

queer? Em seu livro Um corpo estranho: ensaios sobre <strong>sexual</strong>idade e teoria queer, Louro<br />

( 004) joga com o significado cultural do verbo “estranhar”. Para ela, a questão<br />

produtiva posta pela teoria queer à Educação é a possibilidade de “estranhar o<br />

currículo”, ou seja, “um movimento de desconfiar do currículo (tal como ele se<br />

apresenta)”. Desconcertá-lo, transtorná-lo, ou seja,<br />

15 A autora afirma em relação à teoria queer: “[...] Para educadores e educadoras [...] o caminho talvez seja o<br />

de ampliar o sentido da teoria para além da conotação <strong>sexual</strong> e de gênero e voltar-se para um jeito queer<br />

de pensar a <strong>educação</strong>, o conhecimento, o poder e a construção das identidades” (LOURO, 2004: 211).

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