Diversidade sexual na educação ... - unesdoc - Unesco

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questão da orientação sexual”. O documento recomendou a todos/as os/as profissionais da psicologia no país que nenhuma pessoa deveria/deve ser submetida a qualquer tipo de “tratamento de cura” por desejar relacionar-se afetiva e sexualmente com pessoa do mesmo sexo (FURLANI, 007: ). Para Ana Bock ( 00 ), “Os psicólogos deram, naquela data, um passo a mais na defesa dos direitos humanos e da igualdade social. Além disso, colocaram-se em dia com as leituras mais modernas da homossexualidade”. A idéia de eqüidade sexual acompanha uma mudança epistêmica na área da sexualidade. Os “direitos sexuais” surgem (e ganham força) num contexto histórico em que se destaca também a força do discurso favorável aos “direitos humanos”. Os grupos subordinados que se organizaram e se mobilizaram politicamente nos movimentos sociais, sobretudo a partir dos anos 9 0, contribuíram com o contexto e impulsionaram o posicionamento teórico/acadêmico dos ditos “especialistas das ciências” na revisão em modificação dos enquadramentos patológicos e das definições de algumas “doenças”, antes usadas como justificativa para a exclusão social e a privação de direitos desses sujeitos discriminados. 0 Quais os efeitos desses entendimentos no campo da Educação? Como seria uma pedagogia baseada nos “direitos sexuais”? Quais os debates pertinentes numa Educação Sexual que procuraria basear sua discussão da sexualidade reconhecendo os “direitos sexuais” como legítimos? Quais as diferenças na pauta curricular dessa Educação Sexual quando se consideram diferentes interesses no interior de diferentes identidades culturais: gays e lésbicas, mulheres negras, feministas, crianças e adolescentes? Quais as identidades merecedoras de “direitos sexuais”? Por exemplo, em relação às mulheres, se pensarmos no feminismo, veremos que, mais intensamente a partir dos anos 970, esse movimento baseou sua estratégia por mudanças sociais em duas frentes: na primeira, de cunho epistemológico, buscando acirrar o debate acerca das concepções em face da sexualidade da mulher (denunciando a lógica reprodutiva como base da sexualidade normal, ao mesmo tempo em que trazia à tona o princípio do “direito ao controle do próprio corpo”); em outra frente, de ordem política, definiu lutas sociais e jurídicas (em favor da contracepção e da legalização e descriminalização do aborto). Observa Maria Betânia Ávila: 10 Por exemplo, quanto aos relacionamentos entre pessoas do mesmo sexo, somente a partir dos anos 1980 é que instituições da saúde começaram a rever os significados diante dessa sexualidade subordinada: em 1985, o Conselho Federal de Medicina, no Brasil, considerou sem efeito o parágrafo 302.0 do Código Internacional de Doenças (CID), da OMS, que catalogava o “homossexualismo” como desvio e transtorno sexual. Em 1991, a Anistia Internacional passou a considerar violação dos direitos humanos a proibição da prática homossexual. Em 1993, a OMS tornou sem efeito o código 302.0 (que vigorava desde 1948) (FURLANI, 2007: 154). 304

Para o feminismo, o que estava em questão era a relação entre liberdade e exercício da sexualidade. É importante chamar a atenção para o aspecto histórico: esse debate nasce como uma demanda no campo da liberdade sexual, inclusive no marco da vivência da heterossexualidade (ÁVILA, 00 : ). Para ela, nos anos 970, o feminismo no Brasil diferiu daquele desenvolvido nos EUA: aqui, havia maior ênfase no campo da liberdade reprodutiva decorrente da forte politização influenciada pelas discussões ligadas à desigualdade socioeconômica. A desigualdade e a exploração da mulher no controle da natalidade eram questões políticas no âmbito da saúde pública. Para o feminismo, temas como igualdade social, igualdade de gênero e igualdade de classe eram prioridades. Contudo, a autora lembra que os rigores do contexto político “fizeram com que se perdesse uma certa radicalidade do sentido da liberdade, tanto na vida reprodutiva quanto na vida sexual” (ibid.: ). A discussão sobre prazer e autonomia e o exercício mesmo da liberdade acabaram perdendo densidade no debate político. Evidentemente, havia uma premissa – ainda válida e importante – que se referia à impossibilidade de se pensar o exercício da liberdade em um contexto de desigualdade, pobreza, miséria e discriminação (ibid.). Vamos pensar: para a Educação Sexual, como seria uma pedagogia baseada nos Direitos Sexuais? Falar em Direitos Sexuais das mulheres é falar não só de questões de ordem biológica/reprodutiva (concepção, anticoncepção, aborto, tecnologias reprodutivas), mas também daquelas de ordem afetiva/prazerosa (ligadas à representação de “liberdade sexual”). Se aspectos reprodutivos reportam à heterossexualidade (mas não são exclusivos dela), outras identidades sexuais precisam ser enfrentadas: a lesbianidade e todas as problematizações advindas das diversas posições de sujeitos ocupadas pelas mulheres em decorrência das interseções de raça, gênero, sexualidade, classe. A sexualidadevem sendo cada vez mais discutida nos encontros internacionais promovidos pelas Nações Unidas que, ao destacarem as frentes de ação para os projetos nos diversos países, traçam uma cartografia dos direitos sexuais das mulheres. Por exemplo, violência sexual, escravidão sexual e prostituição forçada foram consi- 305

questão da orientação <strong>sexual</strong>”. O documento recomendou a todos/as os/as profissio<strong>na</strong>is<br />

da psicologia no país que nenhuma pessoa deveria/deve ser submetida a qualquer<br />

tipo de “tratamento de cura” por desejar relacio<strong>na</strong>r-se afetiva e <strong>sexual</strong>mente<br />

com pessoa do mesmo sexo (FURLANI, 007: ). Para A<strong>na</strong> Bock ( 00 ), “Os<br />

psicólogos deram, <strong>na</strong>quela data, um passo a mais <strong>na</strong> defesa dos direitos humanos e<br />

da igualdade social. Além disso, colocaram-se em dia com as leituras mais moder<strong>na</strong>s<br />

da homos<strong>sexual</strong>idade”.<br />

A idéia de eqüidade <strong>sexual</strong> acompanha uma mudança epistêmica <strong>na</strong> área da<br />

<strong>sexual</strong>idade. Os “direitos sexuais” surgem (e ganham força) num contexto histórico<br />

em que se destaca também a força do discurso favorável aos “direitos humanos”.<br />

Os grupos subordi<strong>na</strong>dos que se organizaram e se mobilizaram politicamente nos<br />

movimentos sociais, sobretudo a partir dos anos 9 0, contribuíram com o contexto<br />

e impulsio<strong>na</strong>ram o posicio<strong>na</strong>mento teórico/acadêmico dos ditos “especialistas das<br />

ciências” <strong>na</strong> revisão em modificação dos enquadramentos patológicos e das definições<br />

de algumas “doenças”, antes usadas como justificativa para a exclusão social e a<br />

privação de direitos desses sujeitos discrimi<strong>na</strong>dos. 0<br />

Quais os efeitos desses entendimentos no campo da Educação? Como seria<br />

uma pedagogia baseada nos “direitos sexuais”? Quais os debates pertinentes numa<br />

Educação Sexual que procuraria basear sua discussão da <strong>sexual</strong>idade reconhecendo<br />

os “direitos sexuais” como legítimos? Quais as diferenças <strong>na</strong> pauta curricular dessa<br />

Educação Sexual quando se consideram diferentes interesses no interior de diferentes<br />

identidades culturais: gays e lésbicas, mulheres negras, feministas, crianças e<br />

adolescentes? Quais as identidades merecedoras de “direitos sexuais”?<br />

Por exemplo, em relação às mulheres, se pensarmos no feminismo, veremos<br />

que, mais intensamente a partir dos anos 970, esse movimento baseou sua estratégia<br />

por mudanças sociais em duas frentes: <strong>na</strong> primeira, de cunho epistemológico, buscando<br />

acirrar o debate acerca das concepções em face da <strong>sexual</strong>idade da mulher (denunciando<br />

a lógica reprodutiva como base da <strong>sexual</strong>idade normal, ao mesmo tempo<br />

em que trazia à to<strong>na</strong> o princípio do “direito ao controle do próprio corpo”); em outra<br />

frente, de ordem política, definiu lutas sociais e jurídicas (em favor da contracepção e<br />

da legalização e descrimi<strong>na</strong>lização do aborto). Observa Maria Betânia Ávila:<br />

10 Por exemplo, quanto aos relacio<strong>na</strong>mentos entre pessoas do mesmo sexo, somente a partir dos anos 1980<br />

é que instituições da saúde começaram a rever os significados diante dessa <strong>sexual</strong>idade subordi<strong>na</strong>da:<br />

em 1985, o Conselho Federal de Medici<strong>na</strong>, no Brasil, considerou sem efeito o parágrafo 302.0 do Código<br />

Inter<strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l de Doenças (CID), da OMS, que catalogava o “homos<strong>sexual</strong>ismo” como desvio e transtorno<br />

<strong>sexual</strong>. Em 1991, a Anistia Inter<strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l passou a considerar violação dos direitos humanos a proibição<br />

da prática homos<strong>sexual</strong>. Em 1993, a OMS tornou sem efeito o código 302.0 (que vigorava desde 1948)<br />

(FURLANI, 2007: 154).<br />

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