Diversidade sexual na educação ... - unesdoc - Unesco

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ela oculta e como os interpela? Os contextos políticos, mundial, nacional e local, acenam para que prática(s) pedagógica(s)? Por exemplo, Jeffrey Weeks ( 000: 74) afirmou que vivemos um tempo de “crise sobre o(s) significado(s) da sexualidade”. Uma preocupação intensa com o controle da sexualidade tem sido observada nas sociedades modernas. O relacionamento entre os sexos (homens e mulheres) foi substancialmente abalado pelos estudos feministas, tanto do ponto de vista epistemológico quanto político. O autor classificou os significados atribuídos à sexualidade (e em decorrência, nossas atitudes diante da temática) em três estratégias distintas de regulação: a) a posição absolutista – em que “o sexo é considerado perigoso, perturbador e fundamentalmente anti-social”; essa educação seria baseada em “posições morais que propõem um controle autoritário e rígido” da sexualidade; b) a aposição libertária – que vê o desejo sexual como “benigno, vitalizante e libertador”; e c) a posição liberal – cautelosa em qualificar o sexo; considera desvantajoso tanto o “autoritarismo moral quanto o excesso” (ibid.: 74) em que cabe “à lei controlar e manter a esfera pública – os padrões comuns de decência” (ibid.: 74-7 ). 294 [...] somos herdeiros de uma tradição absolutista [...] inscrita em instituições sociais: o casamento, a heterossexualidade, a vida familiar e a monogamia. Embora tenha suas raízes na tradição religiosa judaico-cristã, o absolutismo está agora muito mais amplamente enraizado. Sabemos que um código moral essencialmente autoritário dominou a regulação da sexualidade até os anos 9 0 (WEEKS, 000: 7 ). Este, sem dúvida, é um modo de ver a questão da sexualidade no social... Deborah Britzman ( 000: 9 -9 ), em seu artigo “Curiosidade, Sexualidade e Currículo”, apresenta uma revisão do que denominou “três versões da Educação Sexual: a versão normal, a versão crítica e aquela versão que ainda não é tolerada”. Para a autora, as duas primeiras são difíceis de serem distinguidas, uma vez que ambas não conseguem “ultrapassar o moralismo e as categorias eugenistas da normalização”. A versão da sexualidade ainda não tolerada (pelo menos no currículo escolar) é exercida, entretanto, nas vidas cotidianas das pessoas e no domínio da cultura mais ampla: na literatura, no filme, na música, na dança, nos esportes, na moda e nas piadas (BRITZMAN, 000: 9 ).

Tanto Weeks ( 000) quanto Britzman ( 000) apresentaram formas de classificação da sexualidade em função de um contexto político, que é regulador e que se mostra conflitante nas disputas por significados. Em minha tese de doutorado (FURLANI, 00 ), tendo a sociedade contemporânea ocidental como foco, sistematizei oito diferentes abordagens acerca da Educação Sexual que, de certa forma, estão presentes e/ou repercutem no atual universo educacional, pedagógico e político brasileiro. As oito abordagens foram por mim denominadas de: biológica-higienista, moral tradicionalista, terapêutica, religiosa radical, emancipatória, dos Direitos Humanos, dos direitos sexuais e queer. Cada qual, entendo, está articulada com distintos discursos e possui uma lógica em seus enunciados que constroem determinado(s) conhecimento(s) acerca dos objetivos da educação sexual por ela pretendida. Quando, em 9 , Michel Foucault publicou “As palavras e as coisas”, o até então status, conferido pelas ciências sociais à análise histórica, baseado na “continuidade dos fatos”, foi abalado. Para Foucault, a descontinuidade instaurava o entendimento epistêmico de “ruptura”. Esse entendimento me pareceu útil para problematizar como as distintas abordagens entre si possuem interfaces de articulação ou total discordância entre si, mas que, acima de tudo, compartilham um mesmo espaço histórico-social. Procurei fazer este exercício de distinção em minha tese. Neste artigo, vou pinçar três delas (a abordagem “dos Direitos Humanos”, a “dos Direitos Sexuais” e aquela baseada na “pedagogia Queer”) e discutir seus enunciados, seus argumentos, sua lógica política e suas possibilidades na Educação Sexual em qualquer nível de ensino e formação. Meu objetivo é proporcionar uma reflexão, sobretudo útil aos campos da Educação e das Políticas Públicas de ações afirmativas para os grupos subordinados. Estas três abordagens parecem possuir pressupostos e princípios mais próximos de um compromisso político e pedagógico de uma Educação Sexual voltada para o reconhecimento da diversidade, o respeito da diferença e a problematização das desigualdades e das injustiças sociais, especialmente quando pensamos em sujeitos subordinados em função das suas identidades culturais (sexuais, de gênero, de geração, de classe e/ou étnico-raciais). A abordagem dos Direitos Humanos A partir dos anos de 970, no Ocidente, intensificaram-se as discussões acerca da exclusão social. Os movimentos sociais críticos e suas denúncias sobre as desigualdades chamaram a atenção para a inexistência da universalidade dos direitos 295

Tanto Weeks ( 000) quanto Britzman ( 000) apresentaram formas de classificação<br />

da <strong>sexual</strong>idade em função de um contexto político, que é regulador e que se<br />

mostra conflitante <strong>na</strong>s disputas por significados.<br />

Em minha tese de doutorado (FURLANI, 00 ), tendo a sociedade contemporânea<br />

ocidental como foco, sistematizei oito diferentes abordagens acerca da<br />

Educação Sexual que, de certa forma, estão presentes e/ou repercutem no atual<br />

universo educacio<strong>na</strong>l, pedagógico e político brasileiro. As oito abordagens foram<br />

por mim denomi<strong>na</strong>das de: biológica-higienista, moral tradicio<strong>na</strong>lista, terapêutica,<br />

religiosa radical, emancipatória, dos Direitos Humanos, dos direitos sexuais e queer.<br />

Cada qual, entendo, está articulada com distintos discursos e possui uma lógica em<br />

seus enunciados que constroem determi<strong>na</strong>do(s) conhecimento(s) acerca dos objetivos<br />

da <strong>educação</strong> <strong>sexual</strong> por ela pretendida.<br />

Quando, em 9 , Michel Foucault publicou “As palavras e as coisas”, o até<br />

então status, conferido pelas ciências sociais à análise histórica, baseado <strong>na</strong> “continuidade<br />

dos fatos”, foi abalado. Para Foucault, a descontinuidade instaurava o entendimento<br />

epistêmico de “ruptura”. Esse entendimento me pareceu útil para problematizar<br />

como as distintas abordagens entre si possuem interfaces de articulação<br />

ou total discordância entre si, mas que, acima de tudo, compartilham um mesmo<br />

espaço histórico-social. Procurei fazer este exercício de distinção em minha tese.<br />

Neste artigo, vou pinçar três delas (a abordagem “dos Direitos Humanos”, a<br />

“dos Direitos Sexuais” e aquela baseada <strong>na</strong> “pedagogia Queer”) e discutir seus enunciados,<br />

seus argumentos, sua lógica política e suas possibilidades <strong>na</strong> Educação Sexual<br />

em qualquer nível de ensino e formação. Meu objetivo é proporcio<strong>na</strong>r uma<br />

reflexão, sobretudo útil aos campos da Educação e das Políticas Públicas de ações<br />

afirmativas para os grupos subordi<strong>na</strong>dos. Estas três abordagens parecem possuir<br />

pressupostos e princípios mais próximos de um compromisso político e pedagógico<br />

de uma Educação Sexual voltada para o reconhecimento da diversidade, o respeito<br />

da diferença e a problematização das desigualdades e das injustiças sociais, especialmente<br />

quando pensamos em sujeitos subordi<strong>na</strong>dos em função das suas identidades<br />

culturais (sexuais, de gênero, de geração, de classe e/ou étnico-raciais).<br />

A abordagem dos Direitos Humanos<br />

A partir dos anos de 970, no Ocidente, intensificaram-se as discussões acerca<br />

da exclusão social. Os movimentos sociais críticos e suas denúncias sobre as desigualdades<br />

chamaram a atenção para a inexistência da universalidade dos direitos<br />

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