Diversidade sexual na educação ... - unesdoc - Unesco
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É bastante sintomático que, visando explicitamente a uma adaptação social, certas “diferenças”, por exemplo, a falta de um membro, uma orelha de abano, um nariz saliente, mamas caídas, barrigas flácidas, sejam minimizadas, isto é, “consertadas” por uma grande rede de profissionais e de especialistas, obviamente só disponíveis para quem tem recursos econômicos e pode investir em tratamentos estéticos e/ou em cirurgias corretivas. Também há pequenas diferenças, como cor de pele, tipo de cabelo e estatura, que desagradam à maioria, para a qual se oferece um enorme aparato de produtos industrializados, alisamentos de cabelos, uso de saltos altos etc... que vão contra qualquer princípio de saúde e, ao mesmo, tempo, são incentivados em grande escala pelos modelos televisivos como solução para a beleza de homens e mulheres. Porém, há marcas das deficiências que são por demais visíveis, ou em outra perspectiva, há pessoas que não podem usufruir destes meios de disfarce de diferenças. Há aquelass cujo grau de comprometimento social interfere em demasia na possibilidade de adaptação educacional, econômica e social. Há diferenças que implicam um enorme investimento econômico e emocional pessoal e da família, quando não do Estado, para que esta pessoa sobreviva minimamente com dignidade. Neste contexto de diferenças que se articulam em vários graus de comprometimento, ao discutir a questão da normalidade, não me refiro nem às pessoas que disfarçam as estrias com vestimenta específica nem às pessoas que necessitam de ajuda para se alimentar e sobreviver. Refiro-me a uma grande parcela da população que apresenta alguma diferença em relação ao desenvolvimento dos sentidos (audição, visão), motor e/ou cognitivo. Para estas pessoas, o estereótipo da anormalidade é um desafio que inclui seus familiares e toda a sociedade, caso esta almeje ser inclusiva. O que são pessoas deficientes, não-normais? São aquelas que não correspondem aos padrões físicos e intelectuais desejados pela sociedade capitalista e competitiva? São aquelas que não correspondem ao imperativo de se inserirem no mercado de trabalho e produzirem renda? São aquelas que não conseguem constituir famílias e cuidar a contento de seus filhos e filhas? São aquelas que são dependentes financeira e emocionalmente de seus cuidadores? Aquelas que são compreendidas como eternas crianças, e cujas expectativas da vida adulta são inexistentes? futuros adultos altamente produtivos e acabam sendo “valorizados”, e não marginalizados por todos. 273
3. A sexualidade e as deficiências Pensemos então na pessoa com deficiência mental e/ou com deficiência física, considerando a amplitude das manifestações destas deficiências. Há ainda uma grande ignorância sobre o assunto, pois muitas pessoas compreendem que qualquer sujeito com deficiência tem uma sexualidade patológica. A idéia – distorcida – de que há uma sexualidade atípica para todas as pessoas com deficiência decorre de um preconceito, da falta de informação daqueles que lidam com indivíduos deficientes e da generalização de uma possível limitação específica para toda a vida da pessoa em questâo, portanto, também para a vida sexual (AMOR PAN, 00 ; GLAT, 99 ; GLAT e FREITAS, 99 ; MAIA, 00 e 00 ; PINEL, 999; SALIMENE, 99 ). O pressuposto errôneo pode ser resumido na seguinte questão: se determinados problemas são identificados no corpo físico como um estigma e tais problemas são generalizados, afetarão também a manifestação da vida sexual e da vivência da sexualidade dessas pessoas. Esse é o grande equívoco preconceituoso que coloca em destaque a sexualidade e as deficiências. Defendo, de antemão, que toda pessoa é íntegra na sua sexualidade, qualquer que seja a ocorrência de deficiências (sensoriais, físicas e mentais) e as especificidades relacionadas a tais condições. Além disso, é preciso considerar que em todos esses casos há diferentes graus e potencialidades que não podem, a priori, ser considerados nem previstos; todo o desenvolvimento necessariamente depende da interação do organismo com o meio social em que ele se desenvolve, ou seja, não podemos prever quaisquer manifestações sobre a sexualidade em função de alguma deficiência sem considerar as condições de aprendizado e desenvolvimento desse sujeito. No caso da deficiência mental, desde o estudo clássico de Alain Giami e Claude Revault D’Allonnes ( 984), a literatura internacional e os estudos recentes no Brasil têm reafirmado que a crença em uma sexualidade atípica projeta para os deficientes ou a imagem de uma sexualidade ausente, isto é, o mito da assexualidade, ou de uma sexualidade exagerada, isto é, o mito da hipersexualidade (AMOR PAN, 00 ; GHERPELLI, 99 ; MAIA, 00 e 00 ; PINEL, 999; TANG e LEE, 999). Nas instituições educacionais e de reabilitação, encontramos no discurso dos profissionais e dos pais a idéia de uma sexualidade exagerada, “exacerbada”, decorrente da observação (num ambiente de socialização intenso e, muitas vezes, segre- 5 Na literatura, são escassos os estudos sobre a sexualidade e as deficiências sensoriais, como a auditiva e a visual, até porque estas deficiências não se relacionam diretamente com a resposta sexual; porém, o argumento é o mesmo sobre as implicações psicossociais relacionadas a qualquer deficiência. Já discuti este tema em outros textos e oportunidades (por exemplo: MAIA, 2006). Nessa ocasião, no entanto, optei por discorrer apenas sobre a deficiência mental e física. 274
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3. A <strong>sexual</strong>idade e as deficiências<br />
Pensemos então <strong>na</strong> pessoa com deficiência mental e/ou com deficiência física,<br />
considerando a amplitude das manifestações destas deficiências. Há ainda uma grande<br />
ignorância sobre o assunto, pois muitas pessoas compreendem que qualquer sujeito<br />
com deficiência tem uma <strong>sexual</strong>idade patológica. A idéia – distorcida – de que há uma<br />
<strong>sexual</strong>idade atípica para todas as pessoas com deficiência decorre de um preconceito,<br />
da falta de informação daqueles que lidam com indivíduos deficientes e da generalização<br />
de uma possível limitação específica para toda a vida da pessoa em questâo,<br />
portanto, também para a vida <strong>sexual</strong> (AMOR PAN, 00 ; GLAT, 99 ; GLAT e<br />
FREITAS, 99 ; MAIA, 00 e 00 ; PINEL, 999; SALIMENE, 99 ).<br />
O pressuposto errôneo pode ser resumido <strong>na</strong> seguinte questão: se determi<strong>na</strong>dos<br />
problemas são identificados no corpo físico como um estigma e tais problemas<br />
são generalizados, afetarão também a manifestação da vida <strong>sexual</strong> e da vivência da<br />
<strong>sexual</strong>idade dessas pessoas. Esse é o grande equívoco preconceituoso que coloca em<br />
destaque a <strong>sexual</strong>idade e as deficiências. Defendo, de antemão, que toda pessoa é<br />
íntegra <strong>na</strong> sua <strong>sexual</strong>idade, qualquer que seja a ocorrência de deficiências (sensoriais,<br />
físicas e mentais) e as especificidades relacio<strong>na</strong>das a tais condições.<br />
Além disso, é preciso considerar que em todos esses casos há diferentes graus<br />
e potencialidades que não podem, a priori, ser considerados nem previstos; todo o<br />
desenvolvimento necessariamente depende da interação do organismo com o meio<br />
social em que ele se desenvolve, ou seja, não podemos prever quaisquer manifestações<br />
sobre a <strong>sexual</strong>idade em função de alguma deficiência sem considerar as condições<br />
de aprendizado e desenvolvimento desse sujeito.<br />
No caso da deficiência mental, desde o estudo clássico de Alain Giami e Claude<br />
Revault D’Allonnes ( 984), a literatura inter<strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l e os estudos recentes no Brasil<br />
têm reafirmado que a crença em uma <strong>sexual</strong>idade atípica projeta para os deficientes<br />
ou a imagem de uma <strong>sexual</strong>idade ausente, isto é, o mito da as<strong>sexual</strong>idade, ou de<br />
uma <strong>sexual</strong>idade exagerada, isto é, o mito da hiper<strong>sexual</strong>idade (AMOR PAN, 00 ;<br />
GHERPELLI, 99 ; MAIA, 00 e 00 ; PINEL, 999; TANG e LEE, 999).<br />
Nas instituições educacio<strong>na</strong>is e de reabilitação, encontramos no discurso dos<br />
profissio<strong>na</strong>is e dos pais a idéia de uma <strong>sexual</strong>idade exagerada, “exacerbada”, decorrente<br />
da observação (num ambiente de socialização intenso e, muitas vezes, segre-<br />
5 Na literatura, são escassos os estudos sobre a <strong>sexual</strong>idade e as deficiências sensoriais, como a auditiva<br />
e a visual, até porque estas deficiências não se relacio<strong>na</strong>m diretamente com a resposta <strong>sexual</strong>; porém, o<br />
argumento é o mesmo sobre as implicações psicossociais relacio<strong>na</strong>das a qualquer deficiência. Já discuti<br />
este tema em outros textos e oportunidades (por exemplo: MAIA, 2006). Nessa ocasião, no entanto, optei<br />
por discorrer ape<strong>na</strong>s sobre a deficiência mental e física.<br />
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