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Diversidade sexual na educação ... - unesdoc - Unesco

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em algumas circunstâncias, borra e embaralha fortemente as fronteiras entre<br />

aquilo que a cultura do corpo define contemporaneamente como “cuidado de si”<br />

e como “violência sobre si”. 4<br />

A dissertação de José Soares Damico ( 004: 7 ) descreve uma das dimensões<br />

desse embaralhamento quando a<strong>na</strong>lisa uma das estratégias que jovens escolares<br />

“normais” utilizam para manejar o que ele nomeia de corpo-problema. Diz<br />

uma das jovens: [...] se eu vou sair amanhã, eu fico ontem e hoje sem comer. Eu fico<br />

dois dias sem comer, para no dia da festa eu ficar magra [...] E outra complementa:<br />

É que, se tu quiseres botar uma blusinha curtinha [...] e tem aquela “baita” barriga<br />

[...] se tu vais a uma festa te achando gordinha e vês alguém bem magra, tu já te sentes<br />

inferior. Para essas jovens, ficar dois dias sem comer funcio<strong>na</strong> como estratégia<br />

para alcançar um objetivo, qual seja, o de poder usar um vestido colado sem que<br />

a barriga fique saltada, aparecendo. Nesse sentido, o corpo feminino é o território<br />

da luta por “fechar a boca” para torná-lo aceitável e desejável, uma vez que sua<br />

aparência, ou a de algumas de suas partes, como o abdômen e o glúteo, exige das<br />

mulheres uma dose de sacrifício, autodiscipli<strong>na</strong>, autocontrole e força de vontade.<br />

As ações intencio<strong>na</strong>is que essas jovens desenvolvem não são ape<strong>na</strong>s práticas de<br />

intervenção sobre o corpo, mas assemelham-se também a uma moralização das<br />

condutas, <strong>na</strong> medida em que dependem tanto do domínio da mente – a força de<br />

vontade – quanto do domínio do corpo, cuja necessidade e aparência podem e<br />

devem ser “domadas” (LUPTON, 000).<br />

Também os corpos maternos, em especial, têm se constituído como territórios<br />

de governo das biopolíticas contemporâneas, e a análise desses processos<br />

vem se desdobrando em várias pesquisas elaboradas ou orientadas por mim desde<br />

000. A<strong>na</strong>lisando um programa do então governo FHC – o Bolsa Escola – Carin<br />

Klein ( 00 ), por exemplo, discute essa discursividade que investe sobre os corpos<br />

de mulheres e de homens <strong>na</strong> direção de produzir determi<strong>na</strong>das formas de exercício<br />

da maternidade e da paternidade. Dentre os vários enunciados a<strong>na</strong>lisados<br />

por ela, interessa-me destacar três, porque eles são modelares para que pensemos<br />

como relações de poder (que podem vir a se traduzir como violência) extrapolam<br />

relações entre indivíduos e de indivíduos consigo mesmos, inscrevendo-se <strong>na</strong>s estruturas,<br />

nos conhecimentos e <strong>na</strong>s políticas que conhecemos e que deveriam nos<br />

proteger, as quais, por isso mesmo, <strong>na</strong> maior parte das vezes, legitimamos; dessa<br />

forma, tais políticas e programas termi<strong>na</strong>m por reforçar algumas das diferenças e<br />

das desigualdades de gênero que buscam modificar e romper.<br />

4 “Anorexia mata modelo de 1,74 e 40 kg” foi uma das chamadas de capa do Jor<strong>na</strong>l Zero Hora, em 16 de novembro<br />

de 2006, período em que eu fazia os ajustes fi<strong>na</strong>is para encaminhar este texto para publicação.<br />

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