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14.04.2013 Views

Corpo, Violência e Educação: uma abordagem de gênero Dagmar E. Estermann Meyer* ** Violência é um tema que invade as nossas vidas todos os dias: pauta os noticiários dos jornais impressos, radiofônicos, televisivos e eletrônicos e deixou de ser considerado um assunto exclusivo de páginas policiais. A violência é também uma preocupação e um fantasma; ela atravessa nossas conversas familiares, nosso fazer profissional, as rodas de conversa de amigos, rearranja nossos modos de viver e de nos movimentarmos na polis e nos assombra a tal ponto que é referida nas pesquisas de opinião, e também em pesquisas científicas, como sendo um dos problemas que mais afetam a população urbana brasileira. “Nunca vivemos tempos tão violentos” é uma frase-síntese desse processo de familiarização, quase naturalização, de uma “condição” que nos é apresentada como sendo constitutiva da vida nas sociedades contemporâneas. * Doutora em Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Professora adjunta na Faculdade de Educação da UFRGS, onde atua no curso de Licenciatura em Enfermagem e nos Programas de Pós- Graduação em Educação e em Enfermagem. ** Este artigo é uma versão ampliada e revista de comunicação apresentada na mesa redonda Corpo, Violência e Educação, na 28ª Reunião Anual da Anped, realizada em Caxambu/MG, no período de 16 a 19 de outubro de 2005, publicada nos anais do evento sob a forma de “resumo expandido”. O atual é um texto pensado, tecido e revisto por muitas pessoas a quem agradeço: Guacira L. Louro, Rosângela Soares, Jimena Furlani, Jane Felipe, Sandra Andrade, Simone Schwengber, Carin Klein, José S. Damico, Maria Claudia Dal’Igna, Ileana Wenetz e, na etapa final, Rogério Diniz Junqueira. 1 Reportagem de capa, publicada no Jornal Zero Hora de 17 de novembro de 2006 – dia em eu fechava a versão definitiva deste texto –, informava já em seu título que “o Brasil é o quarto país mais violento do mundo”, segundo o último Relatório da Organização dos Estados Ibero-Americanos para Educação, Ciência e Cultura (OEI).

É, portanto, justificado, legítimo e mesmo esperado que o tema se coloque também como uma prioridade na pauta de discussões de uma área tão fortemente implicada no que Norbert Elias chamou de “processo civilizador”, como o é a educação. Entretanto, em um ensaio em que discute a tensão entre pacificação e um tipo prevalente de violência, o mesmo autor ( 997) faz uma consideração que desarranja um pouco essa representação acerca da onipresença da violência na vida social atual. Exatamente por que desarranja, vou me permitir trazê-la para o texto em uma citação mais demorada. Diz ele: 214 Quando se empenham em examinar o problema da violência física na vida social dos seres humanos, as pessoas fazem freqüentemente o tipo errado de perguntas. É costume perguntarse: como é possível que pessoas vivendo numa sociedade possam agredir fisicamente e matar outras [..]? Ajustar-se-ia melhor aos fatos e seria, assim, mais proveitoso, se a pergunta fosse formulada de modo diferente [...]: como é possível que tantas pessoas consigam viver normalmente juntas em paz, sem medo de serem atacadas ou mortas por pessoas mais fortes do que elas, como é hoje o caso em grande parte [das sociedades em que vivemos]? [...] Talvez esse fato se evidencie primeiro quando nos apercebemos de quão mais elevado era o nível de violência nas relações entre pessoas em épocas pregressas do desenvolvimento humano. [...] É uma questão de despertar de novo o sentimento das pessoas para um fato que é surpreendente e ímpar: o grau relativamente elevado de não-violência que é característico das organizações sociais atuais. (ELIAS, 997: ). O argumento de Elias me é útil por várias razões. Em primeiro lugar, pela desacomodação que a inversão da pergunta provoca, quando sugere que a violência continua sendo exceção e não regra nestes tempos em que vivemos. Em segundo lugar porque, ao fazer referência à violência física e remeter às organizações sociais, a citação nos coloca diante da complexidade e da pluralidade de significações que envolvem o tema, que também são referidas por várias/os estudiosas/os que se têm dedicado a discutir a violência em seus diferentes desdobramentos e nuances. Ao admitirmos essa complexidade, estamos assumindo que aquilo que se entende, se nomeia, se pratica e se sofre como violência muda ao longo do tempo, e também no mesmo tempo, nas diferentes sociedades e nos grupos culturais.

Corpo, Violência<br />

e Educação: uma<br />

abordagem de<br />

gênero<br />

Dagmar E. Estermann Meyer* **<br />

Violência é um tema que invade as nossas vidas todos os dias: pauta os<br />

noticiários dos jor<strong>na</strong>is impressos, radiofônicos, televisivos e eletrônicos<br />

e deixou de ser considerado um assunto exclusivo de pági<strong>na</strong>s policiais.<br />

A violência é também uma preocupação e um fantasma; ela atravessa<br />

nossas conversas familiares, nosso fazer profissio<strong>na</strong>l, as rodas de conversa de amigos,<br />

rearranja nossos modos de viver e de nos movimentarmos <strong>na</strong> polis e nos assombra<br />

a tal ponto que é referida <strong>na</strong>s pesquisas de opinião, e também em pesquisas científicas,<br />

como sendo um dos problemas que mais afetam a população urba<strong>na</strong> brasileira.<br />

“Nunca vivemos tempos tão violentos” é uma frase-síntese desse processo de<br />

familiarização, quase <strong>na</strong>turalização, de uma “condição” que nos é apresentada como<br />

sendo constitutiva da vida <strong>na</strong>s sociedades contemporâneas.<br />

* Doutora em Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Professora adjunta <strong>na</strong> Faculdade<br />

de Educação da UFRGS, onde atua no curso de Licenciatura em Enfermagem e nos Programas de Pós-<br />

Graduação em Educação e em Enfermagem.<br />

** Este artigo é uma versão ampliada e revista de comunicação apresentada <strong>na</strong> mesa redonda Corpo, Violência<br />

e Educação, <strong>na</strong> 28ª Reunião Anual da Anped, realizada em Caxambu/MG, no período de 16 a 19<br />

de outubro de 2005, publicada nos a<strong>na</strong>is do evento sob a forma de “resumo expandido”. O atual é um<br />

texto pensado, tecido e revisto por muitas pessoas a quem agradeço: Guacira L. Louro, Rosângela Soares,<br />

Jime<strong>na</strong> Furlani, Jane Felipe, Sandra Andrade, Simone Schwengber, Carin Klein, José S. Damico, Maria<br />

Claudia Dal’Ig<strong>na</strong>, Ilea<strong>na</strong> Wenetz e, <strong>na</strong> etapa fi<strong>na</strong>l, Rogério Diniz Junqueira.<br />

1 Reportagem de capa, publicada no Jor<strong>na</strong>l Zero Hora de 17 de novembro de 2006 – dia em eu fechava a<br />

versão definitiva deste texto –, informava já em seu título que “o Brasil é o quarto país mais violento do<br />

mundo”, segundo o último Relatório da Organização dos Estados Ibero-Americanos para Educação, Ciência<br />

e Cultura (OEI).

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