Diversidade sexual na educação ... - unesdoc - Unesco

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“ninguém poderá ser adotado por duas pessoas, salvo se forem marido e mulher, ou se viverem em união estável”. Mas foi justamente em torno da interpretação deste artigo que parece ter se dado o entendimento legal que favoreceu os três primeiros casos antes referidos de adoção de crianças por casais de gays ou de lésbicas. Os juízes reconheceram, por analogia com a união estável heterossexual, que aqueles casais, igualmente, têm uma relação caracterizada pela estabilidade, ostensibililidade, convivência e afetividade. Isto os habilitaria plenamente à adoção, dada também a concordância expressa nos pareceres de psicólogos e de assistentes sociais que acompanharam os casos e que confirmaram a “competência” social e psicológica dos requerentes para o exercício da parentalidade. Essas famílias, ao assegurarem seu reconhecimento público como casais de pessoas do mesmo sexo responsáveis legalmente por uma criança, colocaram em xeque o modelo familiar hegemônico institucionalizado no conjunto pai-mãe-filhos. Trata-se de um movimento mundial de mudança do modelo tradicional expresso em muitas outras famílias, milhares no Brasil e milhões no mundo, em que crianças estão sendo socialmente reconhecidas como filhas de casais de pessoas do mesmo sexo, ainda que não haja acolhimento legal explícito da composição familiar. Neste sentido, são freqüentes os casos de crianças que foram adotadas apenas por um dos integrantes do casal, mesmo quando este já mantinha um vínculo conjugal de longo prazo com seu parceiro ou parceira do mesmo sexo. Até recentemente, não havia qualquer jurisprudência relativa à adoção de crianças por casais de pessoas do mesmo sexo no Brasil, embora o Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8.0 9/90) não preveja qualquer discriminação de requerentes que pleiteiem a adoção em função de sua orientação sexual ou identidade de gênero. Por outro lado, deve ser destacado que ainda hoje, em muitas partes do país, gays e lésbicas solteiros podem encontrar grandes resistências ao longo dos processos de adoção, não sendo raros os casos que não foram recomendados em face da homofobia velada de assistentes sociais, psicólogos e juízes. Muitas vezes, no entanto, observa-se que gays e lésbicas têm prole de relações heterossexuais anteriores, o que implica registros de nascimento de seus filhos e filhas com a referência expressa a pai e a mãe biológicos, sendo mais raros os casos de fecundação in vitro e/ou inseminação artificial de um único cônjuge. @s filh@s de gays e de lésbicas e a escola É indiscutível que o ambiente escolar ainda é uma arena de muitos preconceitos e de discriminações contra filhos e filhas de gays e lésbicas, vistos como potencialmente perigosos para as outras crianças, particularmente em escolas reli- 171

giosas. Os três setores que compõem as instituições escolares – alunado, professorado e setor administrativo – parecem ainda não estar preparados para lidar com a diferença e com a diversidade no campo da organização familiar e da sexualidade. Na escola, estudantes que vêm de estruturas familiares não-convencionais geralmente são submetidos a situações embaraçosas, para não dizer constrangedoras e mesmo aterrorizadoras. Alia-se a estes preconceitos o fato de que muitas vezes a família da criança omite da escola, por temor de discriminação, que é uma família homoparental. Nestes casos, o risco é que a criança se veja esmagada entre a destruição identitária decorrente do segredo de suas origens e assédio moral e psicológico derivado da homofobia dirigida a seus pais e mães. Por outro lado, quando pais e mães homossexuais procuram claramente situar diretores e professores de seus filhos e filhas sobre o universo familiar em que vivem, isso também não lhes assegura acolhimento e compreensão automáticos. Os preconceitos que atingirão seus filhos e filhas podem ser antecipadamente dirigidos a eles próprios, sob o argumento de que “Deus”, a “natureza”, a “sociedade” ou a “lei” não reconhecem como legítimos seus vínculos afetivo-sexuais. O próprio ambiente familiar em que a criança vive é então condenado, considerado moralmente insalubre e socialmente inadequado. Às vezes, sob aparente aceitação, educadores reificam preconceitos, excluindo estas crianças e suas famílias de atividades coletivas da escola, com a alegação de “protegê-las” do preconceito e da discriminação. Apesar das mudanças sociais, a ainda presente sacralidade da família pode contribuir para o estranhamento da sua conjugação com homossexualidade (FONSECA, 00 ). Como pode a escola contribuir para maior aceitação social das famílias compostas por pessoas homossexuais, solteiras ou em situação de conjugalidade? Inicialmente, criando condições para que estas famílias sejam visíveis no contexto da escola. Para isto é importante que os formulários com informações sobre a família sejam amplos e permitam que casais do mesmo sexo possam preencher dados sobre paternidade e maternidade. Itens como nome da mãe e do pai devem contemplar a possibilidade de inclusão de outras pessoas que “cuidem” da criança, até mesmo nos casos de monoparentalidade, como avós e tios. Em segundo lugar, facultando a possibilidade de parceiros do mesmo sexo, na medida de seu interesse e disponibilidade, participem das reuniões de pais e mestres e sejam reconhecidos enquanto um casal homoparental, inclusive nas tradicionais festas de dias das mães e dos pais, datas nas quais geralmente quem não tem vínculo biológico fica ausente das comemorações escolares. Em terceiro lugar, incluindo a temática da homossexualidade e das famílias homoparentais no conteúdo das disciplinas da escola. 172

giosas. Os três setores que compõem as instituições escolares – alu<strong>na</strong>do, professorado<br />

e setor administrativo – parecem ainda não estar preparados para lidar com a<br />

diferença e com a diversidade no campo da organização familiar e da <strong>sexual</strong>idade.<br />

Na escola, estudantes que vêm de estruturas familiares não-convencio<strong>na</strong>is geralmente<br />

são submetidos a situações embaraçosas, para não dizer constrangedoras<br />

e mesmo aterrorizadoras. Alia-se a estes preconceitos o fato de que muitas vezes a<br />

família da criança omite da escola, por temor de discrimi<strong>na</strong>ção, que é uma família<br />

homoparental. Nestes casos, o risco é que a criança se veja esmagada entre a destruição<br />

identitária decorrente do segredo de suas origens e assédio moral e psicológico<br />

derivado da homofobia dirigida a seus pais e mães.<br />

Por outro lado, quando pais e mães homossexuais procuram claramente situar<br />

diretores e professores de seus filhos e filhas sobre o universo familiar em que<br />

vivem, isso também não lhes assegura acolhimento e compreensão automáticos. Os<br />

preconceitos que atingirão seus filhos e filhas podem ser antecipadamente dirigidos<br />

a eles próprios, sob o argumento de que “Deus”, a “<strong>na</strong>tureza”, a “sociedade” ou a “lei”<br />

não reconhecem como legítimos seus vínculos afetivo-sexuais. O próprio ambiente<br />

familiar em que a criança vive é então conde<strong>na</strong>do, considerado moralmente insalubre<br />

e socialmente i<strong>na</strong>dequado. Às vezes, sob aparente aceitação, educadores reificam<br />

preconceitos, excluindo estas crianças e suas famílias de atividades coletivas da<br />

escola, com a alegação de “protegê-las” do preconceito e da discrimi<strong>na</strong>ção. Apesar<br />

das mudanças sociais, a ainda presente sacralidade da família pode contribuir para o<br />

estranhamento da sua conjugação com homos<strong>sexual</strong>idade (FONSECA, 00 ).<br />

Como pode a escola contribuir para maior aceitação social das famílias compostas<br />

por pessoas homossexuais, solteiras ou em situação de conjugalidade?<br />

Inicialmente, criando condições para que estas famílias sejam visíveis no contexto<br />

da escola. Para isto é importante que os formulários com informações sobre a família<br />

sejam amplos e permitam que casais do mesmo sexo possam preencher dados sobre<br />

paternidade e maternidade. Itens como nome da mãe e do pai devem contemplar<br />

a possibilidade de inclusão de outras pessoas que “cuidem” da criança, até mesmo<br />

nos casos de monoparentalidade, como avós e tios. Em segundo lugar, facultando<br />

a possibilidade de parceiros do mesmo sexo, <strong>na</strong> medida de seu interesse e disponibilidade,<br />

participem das reuniões de pais e mestres e sejam reconhecidos enquanto um casal homoparental,<br />

inclusive <strong>na</strong>s tradicio<strong>na</strong>is festas de dias das mães e dos pais, datas <strong>na</strong>s quais<br />

geralmente quem não tem vínculo biológico fica ausente das comemorações escolares.<br />

Em terceiro lugar, incluindo a temática da homos<strong>sexual</strong>idade e das famílias<br />

homoparentais no conteúdo das discipli<strong>na</strong>s da escola.<br />

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