Sohn-Rethel - Trabalho manual e espiritual
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Leonardo foi o primeiro que rompeu com isso; mas o próprio Leonardo<br />
recorre ao conceito de ímpeto para a explicação do conceito mecânico de<br />
força. O conceito de ímpeto pode servir de marca para a prisão na qual<br />
estavam retidos os costumes renascentistas de pensar. Ele se estende<br />
ainda aos matemáticos mais avançados da Itália como Tartaglia e<br />
Benedetti, Cardano e Ferrari, enquanto na segunda metade do século 16,<br />
parcialmente em sobreposição com eles, o pensamento moderno se abre<br />
caminho com Copérnico e Kepler e sobretudo em Galileu. Mas o que<br />
aconteceu para explica-lo? Cito Ernst Cassirer: "Antes de todos os<br />
problemas que a história da ciência nos coloca, a questão da origem da<br />
ciência exacta é aquela que está em primeiro lugar de um ponto de vista<br />
puramente filosófico." (Philosophie und exakte Wissenschaft, Frankfurt<br />
a.M., 1969, p.39).<br />
Contudo, por quanto o problema seja bicudo, o acesso à solução está claro:<br />
ocorreu uma mudança na relação de produção. O capitalismo mercantil<br />
transformou-se no capitalismo de produção. Mas como é que se explica a<br />
ciência natural matemática? Creio que é a partir disso que ela deve ser<br />
explicada. Nem é tão complicado: temos tão somente que considerar<br />
atentamente o novo producente, que entra em cena, gerado pela nova<br />
relação de produção. É uma potência muito contraditória, ou seja um<br />
producente, que no sentido literal e físico não produz mais nada. Muito mais<br />
ele desempenha seus controles do processo de produção somente por<br />
meio de seu dinheiro, que ele usa como capital enquanto compra fatores<br />
necessários para seu projecto, fatores pessoais e intelectuais, tais como as<br />
necessárias patentes etc. Da pertinente montagem e combinação desses<br />
fatores mais forças de trabalho resulta (supondo sua completude) um<br />
processo de produção corrente, que funciona sem que ele mesmo, o<br />
producente, ponha a mão em qualquer lugar que seja. Pois se ele fosse<br />
forçado a isso, ele não agiria mais como producente capitalista, e sim<br />
fracassaria em tal capacidade. Em outras palavras, a qualidade de<br />
producente capitalístico postula que o conjunto material interrelacionado da<br />
produção, da qual ele é responsável, forma um mecanismo funcionalmente<br />
autônomo. Se esse não for o caso, então será impossível para o<br />
producente controlar seu empreendimento produtivo com os meios do puro<br />
poder do dinheiro. Destarte (dito explicitamente) todo o capitalismo<br />
produtivo tornar-se-ia impossível.<br />
Mesmo sendo este postulado a implicação de um automatismo do<br />
mecanismo da produção, em geral ele é contudo ignorado. Mesmo Marx<br />
subtraiu-se a ele. Mas eu creio de poder reconhecer neste postulado a<br />
origem do surgimento da ciência exacta quantitativa da natureza.<br />
O conhecimento da particularidade característica da ciência exacta<br />
burguesa estende-se à resposta da questão: como é que uma sociedade<br />
totalmente organizada pelo princípio da apropriação faz com que ela seja,