Sohn-Rethel - Trabalho manual e espiritual

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14.04.2013 Views

A troca das mercadorias é abstrata porque está não somente distinta, mas até temporalmente separada de seu uso. A ação da troca e a ação do uso excluem-se reciprocamente no tempo. Enquanto mercadorias são objetos de ações de troca (portanto se encontram no mercado) não podem ser utilizadas nem pelos vendedores nem pelos clientes. Só depois de completada a transação, portanto após sua passagem à esfera privada dos seus compradores, as mercadorias tornam-se disponíveis para o uso dos últimos. No mercado, nas lojas, nas vitrinas etc., as mercadorias estão quietas, prontas para um só tipo de manuseio, sua troca. Uma mercadoria assinalada por um preço definitivo, por exemplo, está sujeita à ficção de perfeita imutabilidade material, e isso não somente por parte de mãos de homens. Supõe-se até mesmo da natureza, que ela suspende sua respiração no corpo das mercadorias, enquanto o preço deve permanecer o mesmo. O fundamento é que só o negócio da troca muda o status social das mercadorias, seu status como propriedade de seu possuidor, e, para poder levar adiante essa mudança social ordenadamente e segundo suas normas próprias, as mercadorias devem permanecer excluídas de todas as mudanças físicas simultâneas ou então que se possa providenciar, que elas permaneçam materialmente imutadas. Portanto a troca é abstrata no tempo, a que ela recorre. E "abstrato" significa aqui que se evitam todos os indícios de possível uso das mercadorias. "Uso" entende-se aqui como produtivo tanto quanto consuntivo, e como sinônimo com todo o reino do relacionamento material do homem com a natureza, no sentido de Marx. "Em contraposição direta à rude objetividade sensível dos corpos das mercadorias, nenhum átomo de matéria natural entra em sua objetividade de valor". (O capital, MEW, p.62). Onde o nexus rerum social é reduzido a troca de mercadorias, deve-se produzir um vácuo em todas as atividades vitais físicas e espirituais dos homens, para que nesse vácuo tome lugar sua conexão com a sociedade. Troca de mercadorias é socialização pura enquanto tal, através de um ato que possui somente esse único conteúdo, separado de todos os outros. Contudo isso vale somente para os atos da troca, os atos recíprocos da entrega da propriedade, mas não vale para a consciência daqueles que trocam. Pois enquanto o uso das mercadorias é excluído de tal modo das ações dos interessados durante o tempo das tratativas da troca, ele não é excluído em absoluto de seus pensamentos. Ao contrário. O uso e a utilidade das mercadorias que estão no mercado para a troca ocupa os pensamentos dos clientes com toda vitalidade. E também esse interesse não se limita a conjectura. Os clientes têm o direito de assegurar-se do valor de uso das mercadorias. Podem tomar as mercadorias para observar, eventualmente tocá-las, prová-las, experimentá-las, fazer-se exibir o uso delas, e o tratamento do uso apresentado deveria ser idêntico com aquele, para o qual as mercadorias devem ser adquiridas. Contudo a demonstração das mercadorias no mercado serve tão somente para a instrução

conceptual e a formação do juízo dos clientes, portanto permanece restrita ao puro valor do conhecimento e é separada com absoluta precisão da práxis do próprio uso, mesmo que os dois sejam empiricamente de todo indistinguíveis reciprocamente. A praxis do uso é banida da esfera pública do mercado e pertence exclusivamente à esfera privada dos possuidores de mercadorias. No mercado o uso das coisas permanece "pura demonstração" para os interessados. Com a formação da essência do mercado, a imaginação dos homens separa-se do fazer e individualiza-se mais e mais como consciência privada. Esse fenômeno toma sua origem exatamente não da esfera privada do "uso", e sim daquela pública do mercado. Portanto, não é a consciência dos atores mercantis que é abstrata. Só seu negócio o é. Ambos são necessários: a abstração do negócio e a falta de abstração na consciência que o acompanha; por isso os agentes mercantis não se conscientizam da abstração de sua ação. A abstração subtrai-se à consciência deles. Com isso, a falta de consciência dos homens perante a abstração de suas relações de troca não é nem fundamento nem condição para esta abstração. Já esta pura fenomenologia da abstração da troca sugere que o sentido nela utilizado da palavra "abstrato" corresponde formalmente com seu uso na teoria do conhecimento. Denominamos "abstrato" aquilo que não é empírico, e o uso que se exclui da ação de troca corresponde com o conceito da empiria dentro de seus limites práticos, no âmbito de representação que lhe pertence. O que ultrapassa esses limites (ou seja propriedades das mercadorias irrelevantes para seu uso) subtrai-se à empiria do uso, mas com isso não se acrescenta nada à ação da troca. Esta é abstrata no sentido do não empírico, independentemente de quanto ampla ou estreitamente se estenderam os limites do uso das mercadorias nas várias épocas. Aliás o que está em questão aqui em ambos os campos (no da abstração da troca e no da teoria do conhecimento) é a homogeneidade da abstração. Aqui deve ser apontada outra ulterior contradição da abstração mercadoria (respectivamente: da troca). A ação da troca exige prescindir por completo do uso (e das propriedades empíricas dos objetos trocados). Ela exerce assim a negação radical da realidade física do uso. Apesar disso, ela mesma é contudo uma ação física: ela arranca a mercadoria trocada da propriedade do vendedor e a desloca para a propriedade do comprador e movimenta o dinheiro do pagamento na direção oposta. Eu denomino isso de fisicalidade da ação de troca 7. Evidentemente, a ação da troca devese distinguir do transporte, o qual - por difícil e complicado que seja - tem só que providenciar que sua carga chegue intacta ao cliente.

A troca das mercadorias é abstrata porque está não somente distinta, mas<br />

até temporalmente separada de seu uso. A ação da troca e a ação do uso<br />

excluem-se reciprocamente no tempo. Enquanto mercadorias são objetos<br />

de ações de troca (portanto se encontram no mercado) não podem ser<br />

utilizadas nem pelos vendedores nem pelos clientes. Só depois de<br />

completada a transação, portanto após sua passagem à esfera privada dos<br />

seus compradores, as mercadorias tornam-se disponíveis para o uso dos<br />

últimos. No mercado, nas lojas, nas vitrinas etc., as mercadorias estão<br />

quietas, prontas para um só tipo de manuseio, sua troca. Uma mercadoria<br />

assinalada por um preço definitivo, por exemplo, está sujeita à ficção de<br />

perfeita imutabilidade material, e isso não somente por parte de mãos de<br />

homens. Supõe-se até mesmo da natureza, que ela suspende sua<br />

respiração no corpo das mercadorias, enquanto o preço deve permanecer o<br />

mesmo. O fundamento é que só o negócio da troca muda o status social<br />

das mercadorias, seu status como propriedade de seu possuidor, e, para<br />

poder levar adiante essa mudança social ordenadamente e segundo suas<br />

normas próprias, as mercadorias devem permanecer excluídas de todas as<br />

mudanças físicas simultâneas ou então que se possa providenciar, que elas<br />

permaneçam materialmente imutadas. Portanto a troca é abstrata no<br />

tempo, a que ela recorre. E "abstrato" significa aqui que se evitam todos os<br />

indícios de possível uso das mercadorias. "Uso" entende-se aqui como<br />

produtivo tanto quanto consuntivo, e como sinônimo com todo o reino do<br />

relacionamento material do homem com a natureza, no sentido de Marx.<br />

"Em contraposição direta à rude objetividade sensível dos corpos das<br />

mercadorias, nenhum átomo de matéria natural entra em sua objetividade<br />

de valor". (O capital, MEW, p.62). Onde o nexus rerum social é reduzido a<br />

troca de mercadorias, deve-se produzir um vácuo em todas as atividades<br />

vitais físicas e espirituais dos homens, para que nesse vácuo tome lugar<br />

sua conexão com a sociedade. Troca de mercadorias é socialização pura<br />

enquanto tal, através de um ato que possui somente esse único conteúdo,<br />

separado de todos os outros. Contudo isso vale somente para os atos da<br />

troca, os atos recíprocos da entrega da propriedade, mas não vale para a<br />

consciência daqueles que trocam.<br />

Pois enquanto o uso das mercadorias é excluído de tal modo das ações<br />

dos interessados durante o tempo das tratativas da troca, ele não é<br />

excluído em absoluto de seus pensamentos. Ao contrário. O uso e a<br />

utilidade das mercadorias que estão no mercado para a troca ocupa os<br />

pensamentos dos clientes com toda vitalidade. E também esse interesse<br />

não se limita a conjectura. Os clientes têm o direito de assegurar-se do<br />

valor de uso das mercadorias. Podem tomar as mercadorias para observar,<br />

eventualmente tocá-las, prová-las, experimentá-las, fazer-se exibir o uso<br />

delas, e o tratamento do uso apresentado deveria ser idêntico com aquele,<br />

para o qual as mercadorias devem ser adquiridas. Contudo a demonstração<br />

das mercadorias no mercado serve tão somente para a instrução

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