Patologia Patologia - Revista Onco
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www.revistaonco.com.br<br />
Junho/Julho 2011<br />
Ano 1 • no 6<br />
Emergências<br />
oncológicas<br />
Neutropenia febril e câncer<br />
Transplante<br />
de medula<br />
O transplante de células-tronco<br />
hematopoéticas e a crescente<br />
disponibilidade de doadores<br />
Do bem<br />
Hospices: mais um recurso para<br />
os cuidados paliativos no Brasil<br />
<strong>Onco</strong>logia para todas as especialidades<br />
entrevista | abdômen | curtas | calendário<br />
<strong>Patologia</strong><br />
Entenda o papel cada vez mais central<br />
do patologista no âmbito do câncer
entrevista<br />
capa<br />
transplante de medula<br />
abdômen<br />
emergências oncológicas<br />
do bem<br />
curtas<br />
calendário<br />
6<br />
10<br />
16<br />
26<br />
36<br />
40<br />
44<br />
46<br />
À frente do Hospital de Câncer de Barretos, Henrique Prata<br />
fala sobre excelência, compromisso e parcerias em câncer<br />
<strong>Patologia</strong><br />
Antes restritos à bancada, patologistas se tornam figuras<br />
cada vez mais centrais no diagnóstico e no tratamento do câncer<br />
O transplante de células-tronco hematopoéticas e a crescente<br />
disponibilidade de doadores Luis Fernando S. Bouzas<br />
Cirurgia citorredutora e quimioterapia intraperitoneal hipertérmica<br />
(QtIPH) no tratamento da carcinomatose peritoneal<br />
Ademar Lopes e Adriano Carneiro<br />
Neutropenia febril e câncer – Parte 1<br />
Luiz Gustavo Torres e Daniel Tabak<br />
Hospices: cuidado e consolo até o fim<br />
Notícias da indústria, iniciativas, parcerias:<br />
um giro pelo mundo da oncologia<br />
Programe-se: eventos e congressos para anotar na agenda<br />
sumário
Conselho<br />
editorial<br />
Editor clínico:<br />
Sergio D. Simon<br />
Editorial Lilian Liang<br />
lilian@iasoeditora.com.br<br />
Comercial Simone Simon<br />
simone@iasoeditora.com.br<br />
Direção de arte Luciana Cury<br />
luciana@iasoeditora.com.br<br />
Pré-impressão Ione Gomes Franco<br />
Revisão Patrícia Villas Bôas Cueva<br />
4 junho/julho 2011 <strong>Onco</strong>&<br />
Ano 1 • número 6<br />
junho/julho 2011<br />
I – Cancerologia clínica<br />
<strong>Onco</strong>logia clínica:<br />
André Moraes (SP)<br />
Anelisa Coutinho (BA)<br />
Auro Del Giglio (SP)<br />
Carlos Sampaio (BA)<br />
Claudio Petrilli (SP)<br />
Clarissa Mathias (BA)<br />
Daniel Herchenhorn (RJ)<br />
Fernando Medina (SP)<br />
Gothardo Lima (CE)<br />
Igor Morbeck (DF)<br />
João Nunes (SP)<br />
José Bines (RJ)<br />
Karla Emerenciano (RN)<br />
Marcelo Aisen (SP)<br />
Marcelo Collaço Paulo (SC)<br />
Maria de Fátima Dias Gaui (RJ)<br />
Nise Yamaguchi (SP)<br />
Oren Smaletz (SP)<br />
Paulo Marcelo Gehm Hoff (SP)<br />
Roberto Gil (RJ)<br />
Sebastião Cabral Filho (MG)<br />
Sérgio Azevedo (RS)<br />
Sergio Lago (RS)<br />
<strong>Onco</strong>-hematologia:<br />
Carlos Chiattone (SP)<br />
Carmino de Souza (SP)<br />
Daniel Tabak (RJ)<br />
Jane Dobbin (RJ)<br />
Nelson Spector (RJ)<br />
Vânia Hungria (SP)<br />
Impressão: Ipsis Gráfica e Editora<br />
Tiragem: 10 mil exemplares<br />
ISSN: 2179-0930<br />
Jornalista responsável: Lilian Liang (MTb 26.817)<br />
Colaboraram nesta edição: Ademar Lopes,<br />
Adriano Carneiro, Conceição Lemes, Daniel Tabak,<br />
Luis Fernando Bouzas, Luiz Gustavo Torres<br />
e Sergio Azman<br />
Transplante de medula:<br />
Jairo Sobrinho (SP)<br />
Luis Fernando Bouzas (RJ)<br />
Nelson Hamerschlak (SP)<br />
Yana Novis (SP)<br />
II – Biologia molecular<br />
Ada Alves (RJ)<br />
André Vettore (SP)<br />
Carlos Gil (RJ)<br />
Helenice Gobbi (MG)<br />
José Cláudio Casali (RJ)<br />
Luísa Lina Villa (SP)<br />
Maria Isabel Achatz (SP)<br />
III – Cancerologia<br />
cirúrgica<br />
Neurologia:<br />
Manoel Jacobsen Teixeira (SP)<br />
Marcos Stavale (SP)<br />
Cabeça e pescoço:<br />
Luis Paulo Kowalski (SP)<br />
Vergilius Araújo (SP)<br />
Tórax:<br />
Angelo Fernandez (SP)<br />
Riad Naim Younes (SP)<br />
Abdômen:<br />
Ademar Lopes (SP)<br />
José Jukemura (SP)<br />
Laercio Gomes Lourenço (SP)<br />
Marcos Moraes (RJ)<br />
Paulo Herman (SP)<br />
Mama:<br />
Alfredo Barros (SP)<br />
Antonio Frasson (SP)<br />
Carlos Alberto Ruiz (SP)<br />
Maira Caleffi (RS)<br />
Urologia:<br />
Antônio Carlos L. Pompeu (SP)<br />
Miguel Srougi (SP)<br />
Ginecologia:<br />
Jorge Saad Souen (SP)<br />
Sérgio Mancini Nicolau (SP)<br />
Sophie Derchain (SP)<br />
Tecido osteoconjuntivo:<br />
Olavo Pires de Camargo (SP)<br />
Reynaldo J. Garcia Filho (SP)<br />
IV – Radioterapia<br />
Ludmila Siqueira (MG)<br />
Paulo Novaes (SP)<br />
Robson Ferrigno (SP)<br />
Rodrigo Hanriot (SP)<br />
Wladimir Nadalin (SP)<br />
V – Cuidados paliativos<br />
e dor<br />
Ana Claudia Arantes (SP)<br />
Claudia Naylor Lisboa (RJ)<br />
Fabíola Minson (SP)<br />
João Marcos Rizzo (RS)<br />
Ricardo Caponero (SP)<br />
A revista <strong>Onco</strong>& – <strong>Onco</strong>logia para todas as especialidades, uma<br />
publicação da Iaso Editora, especializada em comunicação médica,<br />
traz informações sobre oncologia a profissionais de todas as<br />
especialidades médicas. De circulação bimestral, tem distribuição<br />
nacional e gratuita por todo o território nacional. A reprodução<br />
do conteúdo da revista é permitida desde que citada a fonte.<br />
Rua João Álvares Soares, 1223<br />
Campo Belo – 04609-002 – São Paulo – SP<br />
(11) 2478-6985 (redação) (21) 3798-1437 (comercial)
Do poder das parcerias<br />
Em maio tive o privilégio de visitar o Hospital<br />
de Câncer de Barretos, a cerca de 400 qui -<br />
lômetros de São Paulo. Numa entrevista ani -<br />
mada e informal, o fazendeiro e diretor do hospital,<br />
Henrique Prata, contou como a instituição cresceu<br />
de uma estrutura que, em 1989, atendia 200 pessoas<br />
para se tornar um centro de referência em oncologia,<br />
responsável por 3 mil atendimentos diários em 2011.<br />
Prata se gaba, com razão, de oferecer tratamento<br />
de primeiro mundo a um público formado integral-<br />
mente por pacientes do Sistema Único de Saúde.<br />
Ao percorrer os longos corredores do complexo, vi<br />
que não era apenas discurso: as instalações são mo -<br />
derníssimas, não há macas nos corredores, os equi -<br />
pamentos passam por manutenções periódicas, os<br />
médicos trabalham em esquema de período integral<br />
e dedicação exclusiva. A máquina do Hospital de<br />
Câncer de Barretos funciona como um relógio.<br />
Não fosse por um pequeno detalhe: os R$ 5 mi -<br />
lhões negativos que o hospital encara todo final do<br />
mês no orçamento. O pagamento feito pelo SUS<br />
não cobre o tipo de tratamento que o Hospital de<br />
Câncer de Barretos oferece aos pacientes. E, da<br />
mesma forma que se orgulha de listar as qualidades<br />
da instituição, Prata também se orgulha de dizer<br />
que nada disso seria possível se não fossem as<br />
parcerias com que pode contar: governo, iniciativa<br />
privada, artistas, comunidade. A dívida mensal é<br />
paga por doações. O que falta, o próprio Prata se<br />
mobiliza para conseguir. Graças a essas parcerias,<br />
diz ele, as contas fecham, mês a mês.<br />
Assim como as grandes estruturas, círculos<br />
menores também se beneficiam do trabalho conjunto.<br />
Nesta edição de <strong>Onco</strong>& – <strong>Onco</strong>logia para todas<br />
as especialidades, a matéria de capa mostra como<br />
uma parceria bem azeitada entre patologistas, clíni-<br />
cos e cirurgiões pode fazer a diferença entre um<br />
diagnóstico certo ou errado, entre um tratamento<br />
mais ou menos adequado. A importância dessa<br />
parceria só muito recentemente começou a ser<br />
abordada e a discussão vem estimulando aproximações<br />
produtivas. Quando o assunto é câncer,<br />
trabalhar em conjunto torna o desafio da doença<br />
menos assustador.<br />
Em seu livro The Checklist Manifesto, o cirurgião<br />
e autor norte-americano Atul Gawande traz uma<br />
perspectiva interessante sobre o conceito de parcerias.<br />
Gawande defende brilhantemente a importância<br />
de checklists, ou “listas de checagem”, em<br />
pro cessos complexos para minimização de erros.<br />
Usando exemplos bem-sucedidos da indústria<br />
aeronáutica e da construção civil, seu objetivo é<br />
provar a utilidade dessas listas dentro da própria<br />
sala de cirurgia. Como previsto, as listas levaram à<br />
diminuição de erros médicos e de índices de infecções,<br />
mas também trouxeram um inesperado e<br />
bem-vindo efeito colateral: a lista criava uma atmosfera<br />
de equipe, em que os profissionais deixavam<br />
de ser indivíduos unidos por uma eventualidade<br />
para ser parceiros empenhados no cuidado daquele<br />
paciente. O trabalho, a partir daquele momento,<br />
passava a ser uma obra em conjunto, em que todos<br />
eram responsáveis pelo resultado.<br />
Talvez seja esse o segredo para uma medicina<br />
melhor.<br />
Boa leitura!<br />
Lilian Liang<br />
* Jornalista especializada na<br />
cobertura de saúde, é editora da<br />
<strong>Onco</strong>& – <strong>Onco</strong>logia para todas<br />
as especialidades<br />
Contato: lilian@iasoeditora.com.br<br />
<strong>Onco</strong>& junho/julho 2011 5
Divulgação<br />
entrevista<br />
Henrique Duarte Prata<br />
* Diretor-geral do Hospital<br />
de Câncer de Barretos<br />
6 junho/julho 2011 <strong>Onco</strong>&<br />
Algo maior<br />
À frente do Hospital de Câncer de Barretos, o fazendeiro<br />
Henrique Prata conta como transformou o sonho de seu pai<br />
num centro de referência para pacientes de câncer de todo o país<br />
Por Lilian Liang<br />
NUMA SALA AMPLA, COM VIDRAÇAS IMENSAS,<br />
HENRIQUE DUARTE PRATA, DIRETOR-GERAL DO<br />
HOSPITAL DE CÂNCER DE BARRETOS, CIDADE<br />
do interior a cerca de 400 quilômetros de São Paulo,<br />
despacha os afazeres da terça-feira em trajes pouco<br />
parecidos com os de médicos administradores que<br />
circulam nos grandes centros da capital. De calça<br />
jeans e camisa de listras verticais, o traje diz tudo:<br />
conforto, praticidade e zero medo de ter de se sujar<br />
enquanto coloca a mão na massa.<br />
A história da instituição que administra se mistura<br />
com a sua história pessoal. O hospital que é<br />
hoje referência no diagnóstico e tratamento de<br />
câncer no Brasil começou em 1967 como o tímido<br />
hospital geral São Judas Tadeu, criado pelos pais de<br />
Prata, ambos médicos. Apesar de tentativas, o<br />
menino nunca se interessou pelo hospital. Pelo contrário:<br />
Prata era um dos principais críticos de seu<br />
pai, que insistia numa operação que fechava todos<br />
os meses no vermelho. Seu negócio eram as fazendas,<br />
que aprendeu a administrar com o avô, depois<br />
de interromper os estudos.<br />
Em 1988, no entanto, foi convocado pelo pai,<br />
que já tinha tido um infarto, para colocar em ordem<br />
as contas do hospital e fechá-lo. Foi nessa ocasião<br />
que, abordado por um dos médicos da equipe, se<br />
convenceu de que ele, mesmo sem ser médico, poderia<br />
salvar aqueles pacientes se conseguisse angariar<br />
fundos para manter o hospital em funcionamento.<br />
Prata foi além: tirou da gaveta o projeto de um<br />
centro de oncologia, um plano de seu pai para tratar<br />
os pacientes de câncer em Barretos mesmo, já que<br />
muitos iam para São Paulo e não conseguiam nem<br />
sair da rodoviária. Prata passou o chapéu entre os<br />
amigos do avô fazendeiro e levantou o suficiente<br />
para criar o primeiro pavilhão do que é hoje o Hospital<br />
de Câncer de Barretos.<br />
Hoje o hospital é um absoluto gigante da oncologia:<br />
conta com 70 mil m 2 de área construída,<br />
2,5 mil colaboradores, 250 médicos em regime de<br />
período integral e dedicação exclusiva e realiza<br />
3 mil atendimentos diários. Atende apenas pacientes<br />
do SUS e oferece tratamento de primeiro<br />
mundo a pessoas que dependem do sistema público<br />
de saúde. Fecha todos os meses com um buraco de<br />
R$ 5,5 milhões no orçamento. “Esse é o déficit entre<br />
a medicina que nós fazemos e a medicina que o<br />
governo remunera. Mas o responsável por aumentar<br />
o déficit sou eu, porque a cada ano que passa eu<br />
quero uma medicina de melhor qualidade”, diz.<br />
Prata conta com todo tipo de doações para<br />
fechar as contas no final do mês: quantias que<br />
chegam a sete dígitos de empresas, artistas e fazendeiros,<br />
leilões, passando por notas fiscais paulistas<br />
de clientes de supermercados e por moedas de<br />
cofri nhos espalhados pelo Brasil. A ajuda chega de<br />
ou tras formas também: alimentos (afinal, são 8 mil<br />
refeições diárias), roupas e até papel higiênico –<br />
sim, faz três anos que o Hospital de Câncer de Barretos<br />
não com pra um rolo de papel higiênico.<br />
A fama do hospital se espalhou para outros estados.<br />
Dos 3 mil atendimentos diários, 20% são pacientes<br />
das regiões Norte e Centro-Oeste. Para<br />
atender esse público, o hospital disponibiliza 13<br />
alojamentos que comportam 650 pessoas, todos<br />
com direito a refeição. Para diminuir o deslocamento<br />
dos pacientes e evitar a sobrecarga em Barretos,<br />
em junho do ano passado foi fundada uma<br />
filial do hospital em Jales, na divisa com Mato<br />
Grosso do Sul. Neste ano, o Hospital de Câncer de<br />
Barretos assumirá a administração do Hospital de<br />
Base de Porto Velho, em Rondônia – quase 100%<br />
dos pacientes de câncer do estado viajam cerca de<br />
3 mil quilômetros até o hospital no interior paulista.
Corre o boato no estado de que “quem se trata em Barretos é curado”.<br />
Em Barretos, as obras de expansão continuam e Prata finalmente<br />
compreende o que seu pai, falecido em 1997, queria dizer: “Hoje eu<br />
entendo perfeitamente o que não é possível de ser explicado. O amor<br />
que meu pai tinha pelo hospital, ele não tinha como explicar, porque<br />
era uma concepção de fé. Não é algo racional”.<br />
A seguir, alguns trechos da entrevista.<br />
<strong>Onco</strong>& – Quais os principais obstáculos no cuidado do câncer no<br />
Brasil hoje e como o Hospital de Câncer de Barretos faz para enfrentá-los?<br />
Henrique Prata – Antes de mais nada, falta uma cultura de prevenção,<br />
que começa pelos próprios médicos. Eles cuidam do paciente<br />
tratando apenas da doença que levou o paciente a procurá-lo, mas não<br />
dão informações sobre a prevenção de outras condições potenciais. E,<br />
mesmo que fizessem isso, eles não teriam nem para onde mandar o<br />
paciente, porque essas instalações de prevenção e diagnóstico precoce<br />
não existem no conceito logístico dos hospitais.<br />
Da prevenção ao tratamento existe outro problema: oferecer diagnóstico<br />
e tratamento no mesmo lugar. O único lugar onde eu vi isso<br />
ser feito de forma diferente é no Japão, onde existe um centro de tratamento<br />
e numa outra área, distinta mas interligada, a parte de diagnóstico.<br />
Reproduzimos esse modelo aqui em Barretos – eu nunca inventei<br />
nada, mas copiei tudo que achava que funcionava com qualidade – e<br />
tivemos bons resultados. Nossos índices eram semelhantes aos de lá:<br />
das pessoas que vinham para rastreamento e ficavam numa mesma sala<br />
de espera com pessoas em tratamento, cerca de 30% não retornavam<br />
ao hospital porque ficavam impressionados com o que viam.<br />
Esse é um fator que deve ser corrigido na cultura dos hospitais bra -<br />
sileiros. Fomos pioneiros nisso. A Avon enxergou essa iniciativa com<br />
bons olhos: apresentamos um projeto em que se mostravam fatores que<br />
fariam com que a pessoa que viesse para diagnóstico se sentisse bem<br />
para voltar quantas vezes fossem necessárias, porque estaria voltando<br />
para uma espécie de hotel quatro estrelas, e não um hospital.<br />
Depois disso há também a busca dos protocolos de qualidade. Um<br />
número extremamente assustador é o apresentado pelo INCA [Instituto<br />
Nacional de Câncer, órgão ligado ao Ministério da Saúde], que diz que<br />
60% das mamografias feitas nos estados de São Paulo e Rio de Janeiro<br />
não servem para nada. É um problema cultural: fazer por fazer, sem<br />
nenhum protocolo de qualidade. No Brasil, as campanhas são lançadas<br />
em cima de quantidade. Mas de que adianta isso? É dinheiro jogado<br />
no lixo. É um conceito muito político: de não ver que o que resolve é<br />
fazer com qualidade, não em quantidade. Aqui em Barretos damos ênfase<br />
à qualidade: em câncer de mama, por exemplo, temos um protocolo<br />
da Holanda, mais rigoroso e preciso que os dos EUA e do Canadá;<br />
nos protocolos de Papanicolau, todo nosso serviço é feito com citologia<br />
líquida, cujo grau de precisão é 99,9%.<br />
Nós buscamos esses avanços no exterior porque temos um compromisso<br />
de qualidade, não aceitamos nada “mais ou menos”. Mas por<br />
que isso não parte dos órgãos competentes, do governo? O que eu vejo<br />
é que, para o SUS, o que se oferece já é bom demais. Este é o maior<br />
erro da medicina deste país: o governo paga uma tabela muito baixa<br />
em relação ao serviço do SUS, instituições aceitam e todos acham que<br />
fazer “mais ou menos” já é suficiente.<br />
<strong>Onco</strong>& – O senhor anunciou em abril que assumirá a administração<br />
do Hospital de Base de Porto Velho, em Rondônia, e foi<br />
criticado por dizer que o tratamento de câncer no estado não<br />
serviria nem para animais.<br />
Prata – Quando eu falei isso, algumas pessoas interpretaram como se<br />
eu estivesse denegrindo a imagem de Rondônia. Fiz a crítica porque<br />
também me propus a ajudar. Mas não entendo como pessoas com formação<br />
superior à minha, como médicos, aceitem que alguém seja<br />
operado em condições tão desumanas. [Mostra fotos de sua visita ao<br />
Hospital de Base de Porto Velho: janelas quebradas fechadas com papelão,<br />
chão sem piso, pias e torneiras enferrujadas, banheiros sujos e malconservados,<br />
quartos superlotados]. Isso eu acho um crime.<br />
A prova de que o tratamento de câncer em Rondônia é precária é<br />
que lá não existe nem serviço de diagnóstico. Não existe tomografia<br />
nem ressonância magnética no serviço público. Eles só têm ultrassom<br />
e, mesmo assim, de quinta categoria. Se não existem os exames adequados<br />
para o diagnóstico, não há como fazê-lo. Por isso o câncer só<br />
é encontrado na fase mais avançada no estado. Essa situação existe em<br />
outros lugares, mas esse hospital me doeu muito porque 96% da po -<br />
pulação de Rondônia que precisa de tratamento de câncer vem para<br />
Barretos, porque sabe que a chance de se tirar o tumor e morrer de infecção<br />
num lugar assim é 100%.<br />
<strong>Onco</strong>& – Mas será que, ao assumir a gestão do Hospital de Base<br />
de Porto Velho, não se acaba por isentar o governo local de inves -<br />
tir em saúde? Não é uma estratégia perversa?<br />
Prata – Para entender Porto Velho, você tem de entender Barretos. Se<br />
fôssemos esperar que o governo fizesse algo sobre gestão de oncologia,<br />
estaríamos esperando até hoje. O único governo que fez alguma coisa<br />
para a oncologia, para valer, foi o governador José Serra, que fez o Ins -<br />
tituto do Câncer do Estado de São Paulo (Icesp). Foi a primeira vez que<br />
eu vi, na história de 50 anos de gestão do Hospital de Câncer de Barretos,<br />
um político fazer algo sério em oncologia, uma instituição com qualidade<br />
desde instalações físicas até condutas científicas, como na iniciativa privada.<br />
O resto está aí: tudo podre, tudo ruim. Que chances tem o serviço<br />
público de oferecer alguma coisa com dignidade para a população? Nem<br />
em São Paulo, nem no Rio de Janeiro, nem em lugar nenhum se tem a<br />
chance de oferecer o que se oferece na iniciativa privada. A iniciativa privada<br />
está anos-luz na frente dos serviços de tratamento de câncer.<br />
Mas não vamos esperar existir um outro José Serra. Nós construímos<br />
o hospital com a ajuda do povo e da iniciativa privada. É uma filosofia<br />
da instituição, meu pai tinha esse idealismo. É o mesmo conceito que<br />
estamos levando para Rondônia. Queremos ajudar um estado em que<br />
96% da população com câncer depende de Barretos, uma cidade a 3 mil<br />
quilômetros de distância. Vi o tamanho da miséria lá e vamos fazer<br />
uma filial do Hospital de Câncer de Barretos para ajudar. A gestão será<br />
<strong>Onco</strong>& junho/julho 2011 7
inteiramente nossa, com médicos em período integral e dedicação exclusiva.<br />
Tudo vai se sustentar com a ajuda da iniciativa privada.<br />
<strong>Onco</strong>& – O que diferencia o Hospital de Câncer de Barretos de<br />
outros centros?<br />
Prata – Do porteiro ao médico, todos têm o mesmo conceito sobre<br />
humanização. As pessoas que aparecem na sua porta precisam ser<br />
tratadas como gente, com carinho, amor e respeito. Elas precisam se<br />
sentir seres humanos de valor igual a outros que tenham dinheiro,<br />
porque não é isso que acontece geralmente. A maioria dos serviços<br />
oferece um atendimento desigual, porque pensa que ter 30% de convênio<br />
e 10% de plano de saúde vai dar suporte no déficit da população<br />
chamada SUS, que vem trazer prejuízo para o hospital. Mas, sem<br />
querer, eles estão discriminando esse público, porque sempre oferecem<br />
instalações e tratamento de segunda categoria. Se o governo paga mal,<br />
que culpa têm os pacientes? Quando se tem uma instituição com três<br />
tipos de tratamento diferentes, mesmo que se pense que o paciente<br />
está sendo recebido nas mesmas instalações, por exemplo, na parte de<br />
medicamentos ninguém consegue sobreviver se não contar com a<br />
ajuda da iniciativa privada, porque a diferença no custo entre os tratamentos<br />
oferecidos e os de ponta é muito grande.<br />
Aqui em Barretos todos os pacientes sabem qual tipo de tratamento<br />
estão recebendo, para que tenham consciência de que estão tendo a<br />
mesma chance que teriam num serviço privado. E o povo é sábio, o<br />
povo enxerga isso.<br />
<strong>Onco</strong>& – O senhor fala muito do apoio do povo e da iniciativa<br />
privada. Câncer também é responsabilidade social?<br />
Prata – Fico triste ao ver que o Brasil não tem a cultura de doação da<br />
iniciativa privada dos EUA, do Canadá, que ainda tem medicina socia -<br />
lista, e mesmo da Europa, que ainda começa nesse sentido. Eu me lembro<br />
que visitei o primeiro hospital de câncer do mundo, na Inglaterra, fundado<br />
em 1851, e, até pouco antes de a Ladi Di morrer, nunca tinha recebido<br />
uma doação da iniciativa privada, porque se achava que tudo era<br />
responsabilidade do governo. A Lady Di quebrou isso. Ela enxergou que<br />
não era possível proporcionar um bom serviço só com o dinheiro do go -<br />
verno e se espelhou no modelo dos EUA, em que pessoas e empresas<br />
têm a cultura de ajudar os serviços sociais do país.<br />
A medicina dos EUA é de ponta no mundo inteiro porque mais de<br />
50% do orçamento é doação da iniciativa privada – todos os serviços recebem<br />
um absurdo de apoio da iniciativa privada, através de leis fiscais.<br />
Porém, o que mais me surpreende é a cultura de pessoas e empresas que<br />
ajudam na educação, na saúde. No Brasil, os ricos ainda estão muito<br />
longe de ajudar de maneira efetiva os pobres. Já melhorou muito, vem<br />
melhorando, mas ainda é muito medíocre. É um país injusto.<br />
<strong>Onco</strong>& – Com tantos desafios no tratamento de pacientes, o se -<br />
nhor ainda se aventurou na criação de um centro de ensino e<br />
pesquisa no hospital.<br />
Prata – Meu pai sempre me falou algo que eu não entendia, porque<br />
eu não tenho formação acadêmica: você só vai ser reconhecido como<br />
8 junho/julho 2011 <strong>Onco</strong>&<br />
uma instituição séria quando tiver uma área de ensino e pesquisa. Nós<br />
já éramos muito fortes em prevenção e tratamento, mas faltava essa<br />
parte de pesquisa. Quando eu me preparei para isso, vi que era algo<br />
sério: em serviços do primeiro mundo tudo era atrelado a ensino e<br />
pesquisa. Quando eu percebi que um dos resultados era oferecer uma<br />
medicina personalizada ao paciente, fui atrás desse conceito para trazer<br />
para cá. Um dos meus maiores orgulhos é oferecer aqui o tripé prevenção-tratamento-pesquisa<br />
e transformar o hospital no polo que meu<br />
pai queria. Hoje somos um serviço igual a todos os serviços sérios dos<br />
países de primeiro mundo. Passamos para um contexto internacional<br />
quando criamos o banco de tumores, disponibilizando nossa matériaprima<br />
em pesquisa para o mundo inteiro.<br />
Mas o que mais me alegra é a pesquisa aplicada para melhorar o<br />
tratamento dos pacientes de forma personalizada. Isso só se faz em me -<br />
di cina de milionário, porque custa muito fazer pesquisa sobre o efeito<br />
do medicamento no tratamento de um tumor específico. Mas, quando<br />
soube que a pesquisa aplicada poderia ajudar nisso, fui atrás. Isso me<br />
motiva: é muito caro, mas é um tratamento verdadeiro.<br />
<strong>Onco</strong>& – Parece que muito da excelência e da expansão do hospital<br />
se deve a seus esforços pessoais.<br />
Prata – Eu consigo convencer desde a pessoa que pode doar 1 real<br />
até o artista que pode doar 5 milhões. É um dom, porque quero fazer<br />
para os outros o que gostaria que fizessem para mim. Isso aparece de<br />
forma clara principalmente sobre minha equipe médica, que sabe que<br />
o que eu falo não é demagogia. Não me importa se um tratamento é<br />
caro. Eu busco o que é mais sério, o que é melhor. Nos primeiros dez<br />
anos, os médicos se chocavam comigo porque eu descobria no exterior<br />
tratamentos mais modernos que eles não ofereciam por causa de custos.<br />
Eu dizia: “Assim você vai perder o emprego comigo. O seu trabalho<br />
é trazer esse tratamento para mim”.<br />
Hoje eu tenho um déficit mensal de R$ 5,5 milhões no custeio do<br />
hospital entre a medicina que nós fazemos e a medicina que o governo<br />
remunera. O SUS paga muito mal, mas o responsável por aumentar o<br />
déficit sou eu, porque a cada ano que passa eu quero uma medicina<br />
de me lhor qualidade. Meu compromisso é com o paciente.<br />
<strong>Onco</strong>& – Algum momento o emocionou nessa jornada?<br />
Prata – De todos os artistas que viram o projeto, nenhum teve uma<br />
visão tão longe quanto o cantor Leandro, da dupla sertaneja Leandro e<br />
Leonardo [Leandro morreu de câncer em 1998]. Quando eu mostrei o<br />
projeto a ele, nós tínhamos 7 mil m 2 de área construída e queríamos expandir<br />
para 50 mil m 2 . Ele falou “Henrique, isso é pequeno demais, escolhe<br />
um negócio maior. Acho que para tudo que você está fazendo esse<br />
projeto é pequeno”. De todos os empresários e artistas para quem mostrei<br />
o projeto, ele foi o único que falou que era pequeno.<br />
Ele tinha razão. Tanto era pequeno que está se tornando maior hoje:<br />
já tem 70 mil m 2 de área construída aqui, já está com uma filial em Jales,<br />
outra em Porto Velho. Tenho uma lembrança muito especial por esse<br />
carinho que ele teve de falar: “Arruma algo maior”.
capa<br />
Deixando os bastidores<br />
Os patologistas, antes restritos à bancada, agora atuam com<br />
clínicos e cirurgiões e são figuras cada vez mais centrais no<br />
diagnóstico e no tratamento do câncer. Entenda a importância<br />
dessa interação e como ela pode ser ainda melhor<br />
Por Conceição Lemes<br />
HÁ 29 ANOS SOU REPÓRTER ESPECIALIZADA NA ÁREA DE SAÚDE. JÁ OUVI<br />
MUITAS BRINCA DEIRAS ENVOLVENDO MÉDICOS. MAS ESTA EU NÃO CO -<br />
nhecia: “O patologista é o médico que sabe tudo, resolveria<br />
tudo, mas chega um pouquinho atrasado”.<br />
Doutores, não me xinguem! Reclamem com quem a contou: o patologista<br />
Venancio Avancini Ferreira Alves, professor titular de patologia<br />
da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP).<br />
Tal máxima refletia a grande concentração do médico patologista<br />
nas necropsias, explicando qua se sempre a causa da morte, por meio<br />
da análise minuciosa de todos os órgãos, doença-base, comorbidades<br />
e efeitos das ações médicas.<br />
Mas essa realidade mudou consideravelmente na última década.<br />
O patologista, antes restrito à ban cada, hoje atua com clínicos,<br />
cirurgiões, epidemiologistas, radiologistas e endoscopistas.<br />
Embalado pela espirituosidade do colega, um outro patologista,<br />
que prefere o anonimato, graceja: “Com a internet, os próprios pacientes<br />
começam a buscar informação diretamente com a gente, o que<br />
era raríssimo antes. Estamos deixando de ser bastidor. Estamos indo<br />
para o palco também”.<br />
Na coxia ou na boca de cena, o papel do patologista é central no quebra-cabeça<br />
do câncer. É dele que vem a informação que os milhões de<br />
brasileiros que, anualmente, se submetem à biópsia por suspeita de<br />
tumor maligno anseiam ouvir: resultado negativo.<br />
Mas é dele também que vem a má notícia que ninguém quer receber:<br />
positivo para câncer. No Brasil, até o final de 2011 cerca de<br />
500 mil pessoas, entre crianças, adolescentes, adultos e idosos, terão<br />
esse diagnóstico.<br />
Em 2009, isso aconteceu com Sônia*, 54 anos. A mamografia detectou<br />
imagem sugestiva de tumor no seio esquerdo. A biópsia identificou<br />
câncer em estágio inicial. Fez cirurgia, quimiote rapia e radioterapia.<br />
“Um pesadelo”, conta. “Pior foi saber no ano passado que o resultado<br />
da biópsia estava errado. Era falso-positivo. Doeu muito mais. Eu<br />
10 junho/julho 2011 <strong>Onco</strong>&<br />
nunca tive câncer. O tratamento e o sofrimento foram desnecessários.”<br />
Com Ivana*, 61 anos, se deu o oposto: “A biópsia de mama [direita]<br />
deu negativa. O médico achou melhor refazer o exame. Aí, veio positiva.<br />
Fui ope rada. O exame realizado durante a cirurgia demons trou<br />
que era câncer mesmo. Isso já tem sete anos, estou curada”.<br />
“O ideal é o anatomopatológico ser preciso em 100% dos casos,<br />
mas isso eventualmente não é possível, até porque a medicina não é<br />
ciência exata”, afirma Roberto El Ibrahim, especialista em uropatologia<br />
e patologia gastrointestinal. “Em geral, o falso-negativo gira em torno<br />
de 5%; o falso-positivo, de 1% a 2%. São níveis de qualidade mun -<br />
diais. Por isso, temos de ter total empenho para evitá-los ao máximo,<br />
principalmente o falso-positivo, que é o pior fantasma.”<br />
“Não é incomum recebermos espécimes acon dicionados inadequadamente<br />
ou apenas o tecido com o nome do paciente e nada<br />
mais, nem de que órgão foram retirados”, adverte o patologista Carlos<br />
Bacchi, professor colaborador da Faculdade de Medicina da USP. “Isso<br />
dificulta a análise, podendo contribuir para diagnóstico inconclusivo,<br />
falso-ne gativo e até falso-positivo.”<br />
“É imprescindível que todos os profissionais envolvidos no<br />
cuidado do doente contribuam, partilhando as informações, para o<br />
diagnóstico ser o mais exato possível”, defende Alves. “Ganhamos<br />
nós, os patologistas, mas também clínicos e cirurgiões, e principalmente<br />
o paciente.”<br />
“A integração entre os vários especialistas é o melhor caminho para<br />
evitar que equívocos aconteçam e tenham impacto negativo no tratamento<br />
do paciente”, pondera o cirurgião de cabeça e pescoço Pedro<br />
Michaluart, professor livre-docente da Faculdade de Medicina da USP.<br />
“Devemos procurar criar condições para que essa seja a rotina.”<br />
O cirurgião do aparelho digestivo e coloproctologista Raul Cutait,<br />
professor associado de cirurgia da FMUSP, assina embaixo: “A inte -<br />
ração é mandatória quando se procura qualidade. Essa ati tude interativa,<br />
que pratico desde o início da vida profissional, faz a diferença”.
Cada vez mais presente no centro cirúrgico<br />
De um lado, as pessoas estão mais ligadas nas questões de saúde, buscam<br />
atenção médica mais cedo. De outro, a medicina e os exames de<br />
radiologia e endoscopia avançaram muito.<br />
Resultado: tumores são diagnosticados mais e mais precocemente.<br />
Mas, como pelas imagens não é possível assegurar se são câncer ou<br />
não, os achados levam a mais biópsias, impondo aos patologistas desafios<br />
cada vez maiores. Tanto que, antigamente, o habitual era os patologistas<br />
receberem para análise fragmentos com vários centímetros.<br />
Agora, o rotineiro são microbiópsias de apenas uns poucos milímetros<br />
ou até células isoladas.<br />
“No contexto do paciente com suspeita de câncer, temos duas<br />
funções principais”, observa Bacchi. A primeira, diagnosticar se o<br />
tumor é maligno ou não. Se benigno, geralmente é feita a cirurgia, e<br />
ele segue a vida. Se maligno, a segunda função é diagnosticar o tipo<br />
de câncer e fazer o seu estadiamento. Apoiado nesses dados, na presença<br />
de metástases ou não e na condição clínica do paciente, é que o<br />
oncologista vai adotar as condutas terapêuticas para o caso. “A base,<br />
porém, é o laudo do patologista”, frisa ele.<br />
“O patologista é fundamental tanto no diagnóstico do câncer como<br />
na avaliação da adequação do tratamento”, considera Michaluart. “Por<br />
vezes, sua avaliação intraoperatória é determinante na definição e no<br />
sucesso do tratamento.”<br />
Na verdade, o médico patologista participa do processo inteiro.<br />
Desde o rastreamento dos tumores de colo uterino e colorretal (por<br />
meio, respectivamente, dos exames de Papanicolau e sangue oculto nas<br />
fezes, seguido do exame colonoscópico e da correspondente análise do<br />
espécime biopsiado), passando pela detecção precoce dos cânceres de<br />
mama e próstata (via punção aspirativa nas lesões suspeitas) até a<br />
definição de tratamento mais individualizado, a partir de testes moleculares<br />
nas amostras. Eles permitem identificar as características<br />
prognósticas e preditivas das células do câncer de cada paciente.<br />
“É a patologia molecular”, define Alves. “Ela propicia a integração<br />
do achado morfológico a processos moleculares tanto nos planos cromossômicos<br />
quanto nos vários níveis de expressão dos genes.”<br />
Já existem vários testes moleculares em uso. Um deles é o imunohistoquímico,<br />
que pode ser feito em numerosas situações de diagnóstico<br />
ou escolha terapêutica. Sua principal utilidade é no diagnóstico<br />
de linhagens de diferenciação de uma neoplasia e, muitas vezes, do<br />
sítio de origem de um tumor identificado inicialmente a partir de uma<br />
metástase. Um exemplo de seu uso na seleção terapêutica é o estudo<br />
de câncer colorretal, permitindo analisar se os mecanismos naturais<br />
de reparo do DNA das células estão alterados.<br />
“O mecanismo reparador do DNA está presente nas células normais.<br />
Porém, está ausente em parte dos pacientes com câncer colorretal<br />
devido a um defeito nas enzimas que ‘consertam’ o DNA”, expõe<br />
Ibrahim. “Quando isso acontece, as células defeituosas passam a se<br />
multiplicar desordenadamente, podendo levar ao câncer.”<br />
O anatomopatológico, como já dissemos, diz se é câncer ou não.<br />
O imuno-histoquímico auxilia também a caracterizar onde está o pro -<br />
blema. Os pacientes com câncer colorretal que têm defeito no meca -<br />
nismo de reparação do DNA não respondem adequadamente à<br />
quimioterapia. Consequentemente, o tratamento quimioterápico adjuvante<br />
não é indicado para esses casos.<br />
Da mesma forma, por meio de testes moleculares das células<br />
doentes, é possível decidir a terapia adjuvante mais indicada para cada<br />
caso de câncer de mama. Ou seja, o tratamento que mais vai beneficiar<br />
<strong>Onco</strong>& junho/julho 2011 11
a paciente, com o menor prejuízo, o menor efeito colateral. Para algumas<br />
mulheres, basta o bloqueio da produção endógena de estrógenos<br />
e progesterona para controlar a doença. Já outras necessitam<br />
associar o tratamento hormonal à quimioterapia. Mas há aquelas que<br />
só res pondem à quimioterapia.<br />
“O patologista deve estar continuamente presente no centro cirúrgico,<br />
para exames intraoperatórios”, pondera Alves. “A nossa experiên -<br />
cia, somada à do cirurgião, permite o diagnóstico da grande maioria<br />
dos tumores, define acometimento de margens e encontro de even -<br />
tuais metástases, mesmo que microscópicas.”<br />
Patologistas, cirurgiões e clínicos, atenção!<br />
O anatomopatológico estuda as alterações morfológicas de padrões arquiteturais<br />
de tecidos (histopatologia) ou de células isoladas (citopatologia).<br />
Mais recentemente, a aplicação da biologia mole cular ao estudo de<br />
espécimes anatomopatológicos deu origem à patologia molecular.<br />
Cada anatomopatológico é um estudo complexo, voltado para<br />
compreender a doença que origina aquela lesão e o potencial benefício<br />
que a informação poderá trazer ao paciente. Depende de quem faz a<br />
análise – é um exame operador-dependente – e da qualidade do material<br />
enviado pelo cirurgião ao patologista.<br />
As imagens microscópicas estão bem padronizadas para boa parte<br />
das situações e é possível dar o resultado apenas olhando a coloração<br />
básica. Mas há lesões mais raras ou mais complexas, que exigem técnicas<br />
mais avançadas para concluir o diagnóstico. Mesmo assim, o<br />
patologista pode eventualmente ficar em dúvida. Nessa circunstância,<br />
a boa prática recomenda que se consultem colegas mais experientes<br />
ou patologistas especialistas.<br />
“Procuramos ser o mais precisos possível, tal qual um controlador<br />
de voo”, compara Ibrahim. “Um erro dele pode resultar em tragédia.<br />
Um erro nosso também. Por isso, temos de usar sempre o bom senso.<br />
Ser o mais assertivos possível, mas tendo o cuidado de reconhecer a<br />
limitação pessoal, da medicina e do método.”<br />
É imperioso ainda: 1) ser bem treinado; 2) experiente – quanto<br />
mais vezes se vê dada situação, maior a probabilidade de o diagnóstico<br />
ser preciso; 3) aprimorar-se continuamente.<br />
“Mas o patologista não trabalha sozinho. Alguns colegas acham que<br />
basta nos enviar um pedaço de carne que o olharemos no microscópio<br />
e daremos todas as respostas do mundo. Quem pensa assim está redondamente<br />
enganado”, adverte Ibrahim. “Isso é apenas parte da informação,<br />
que terá de ser integrada a uma porção de outras, muitas vezes<br />
discutidas com o clínico ou o cirurgião, para fazer o diagnóstico final.”<br />
“Pode parecer tolo, mas a designação precisa de cada amostra enviada<br />
ao patologista é fun-da-men-tal”, ressalta Alves. Bacchi acrescenta:<br />
“Coleta, manuseio e acondicionamento inadequados podem ser<br />
devastadores para a análise”.<br />
Fragmento de tecido da mama retirado da paciente e não colocado<br />
imediatamente em solução de formol a 10% começa a se de-<br />
12 junho/julho 2011 <strong>Onco</strong>&<br />
compor. Torna-se impossível enxergar no microscópio as estruturas<br />
de maneira ideal, o que dificulta, e às vezes até impossibilita, o<br />
diagnóstico definitivo.<br />
“Não há como revitalizar tecidos”, avisa Bacchi. “Material subóti -<br />
mo, análise limitada. Pode levar a resultados equivocados. Favorece<br />
desde respostas inconclusivas até falso-negativos e falso-positivos.”<br />
“O patologista não é adivinhador”, atenta Cutait. “O cirurgião deve<br />
saber o que esperar do exame, para que o patologista lhe dê aquilo<br />
que ele precisa. Para melhor interpretação, deve enviar todos os dados<br />
quanto à cirurgia ou ao espécime cirúrgico, bem como informações<br />
clínicas sobre o caso.”<br />
Troca de informações antes, durante e depois<br />
Por tudo isso, os cinco médicos entrevistados para esta reportagem<br />
de <strong>Onco</strong>& são unânimes: O trabalho em equipe multidisciplinar é<br />
chave. Conversem, dialoguem, interajam, troquem informações.<br />
Havendo qualquer dúvida ou discrepância, discutam-na antes, durante<br />
e depois do procedimento. Isso vale para clínicos, cirurgiões<br />
e patologistas.<br />
Especificamente, para o patologista, é importante também:<br />
√ Conversar com os clínicos e cirurgiões, a fim de saber as perguntas<br />
para as quais eles precisam de resposta. Devem ser esclarecidas<br />
quais as limitações dos vários métodos utilizados, como citopatológico,<br />
congelamento intraoperatório da amostra, imuno-histoquímica<br />
e exame de material parafinado.<br />
“Cada método tem suas limitações particulares, é muito importante<br />
todos da equipe as respeitarem”, reforça o cirurgião Michaluart. “É o<br />
que se espera de profissionais competentes e dedicados.”<br />
√ Buscar cooperação, quando trabalhar sozinho ou tiver alguma<br />
dúvida. Tentar manter contato com outros centros ou outros profissionais.<br />
Hoje em dia é possível passar pela internet imagem em alta<br />
definição de microscópio e consultar um colega a distância. É impossível<br />
um único profissional abranger toda a área do conhecimento.<br />
√ Dar um diagnóstico conclusivo quando realmente tiver os elementos<br />
necessários para fazer isso.<br />
√ Buscar à exaustão as respostas às suas perguntas. Pode ser com<br />
outros patologistas, na literatura. Deve-se ir até onde for possível para<br />
fazer o diagnóstico mais preciso.<br />
Já para o cirurgião e o clínico, é fundamental:<br />
√ Definir previamente com o patologista qual o melhor método<br />
para cada situação, o fixador mais adequado ao tipo de reação que<br />
será realizada no laboratório de patologia e a solução mais indicada<br />
para a preservação do espécime. Os espécimes devem ser colhidos e<br />
conservados nas melhores condições possíveis.<br />
“O ideal é que os médicos incumbidos de biópsias e punções aspirativas<br />
tenham treinamento com patologistas sobre a escolha das
áreas que poderão trazer as melhores informações<br />
sobre a lesão”, orien ta o professor Alves.<br />
√ Identificar detalhadamente cada paciente:<br />
idade, sexo, etnia, área geográfica em que mora.<br />
Fornecer também as informações clínicas re -<br />
levantes, resultados de exames de imagem e laboratoriais,<br />
principais hipóteses diagnósticas para<br />
o caso e as respostas que espera ter com esse estudo<br />
anatomopatológico. Essas informações podem<br />
cons tar do pedido ou ser transmitidas pessoalmente,<br />
dependendo da situação.<br />
“Com essas informações, o patologista terá<br />
condições de dar uma melhor resposta a vocês,<br />
clínicos e cirurgiões”, justifica Ibrahim. “Afinal, elas<br />
nos ajudam a raciocinar para que possamos interpretar<br />
adequadamente a biópsia.”<br />
Segunda opinião com<br />
especialista no órgão<br />
Apesar de todos esses cuidados, o resultado do<br />
anatomopatológico pode eventualmente ser inconclusivo.<br />
Não dá para garantir que é, mas também<br />
não dá para garantir que não é câncer. Ou há<br />
discrepância entre ele e o exame de imagem.<br />
Nessa situação, o que fazer? Apenas pela aparência<br />
do espécime dá para saber se o tumor é benigno<br />
ou maligno?<br />
“Com o acúmulo de experiência podemos<br />
fazer diagnósticos com mais facilidade e entender<br />
nossas limitações”, diz Ibrahim. “O exame<br />
perope ratório por congelação, por exemplo, implica<br />
congelar o tecido para cortar, aplicar-lhe<br />
uma co loração básica, rá pida, e olhá-lo no microscópio.<br />
Apenas com esse exame é possível<br />
fazer diagnóstico para a maior parte dos casos e<br />
contribuir na decisão cirúrgica.”<br />
Para as lesões que após essa primeira “olhada”<br />
ficam sem diagnóstico, parte-se então para outras<br />
colorações. Mesmo assim, algumas não permitem<br />
que os patologistas sejam assertivos, dizendo sim<br />
ou não. Como hoje, em função dos procedimentos<br />
minimamente invasivos, tem-se menos material<br />
para análise, eventualmente a carência de tecido<br />
não permite fazer um diagnóstico preciso. “Além<br />
disso, existem algumas áreas um pouco mais<br />
limítrofes (borderlines), que são difíceis de interpretar”,<br />
informa Bacchi.<br />
“Realmente, às vezes existem dúvidas, até<br />
mesmo porque várias situações dão margem a mais<br />
de uma interpretação”, nota Cutait. “Em alguns<br />
casos, o caminho é fazer estudos complementares,<br />
como os por imuno-histoquímica. Em outros, é importante<br />
solicitar a opinião de outro (ou outros) patologista(s),<br />
de preferência com experiência na<br />
doença ou no órgão afetado.”<br />
Já outras vezes pode ocorrer discrepância<br />
entre o que o radiolo gista achou e o resultado do<br />
anatomopatológico. Por exemplo, pela imagem se<br />
tem certeza de que a lesão é maligna e o patologista<br />
dá resultado de benigna. Nessa hora, tem de<br />
acender a luz vermelha. Pode ser que o patologista<br />
não esteja errado. Pode ser que a biópsia não<br />
tenha atingido o tumor principal. O tumor maligno<br />
está lá, mas a biópsia foi feita em região<br />
próxima. O patologista deu o diagnóstico do que<br />
ele viu. Também algumas lesões na radiologia<br />
imitam tumor maligno.<br />
“Temos de ter sempre em mente que a medicina<br />
não é exata. Assim, informações clínicas,<br />
cirúrgicas, radiológicas, laboratoriais e patológicas<br />
devem ser avaliadas em conjunto”, expõe<br />
Michaluart. “Quando há discordância, nova che -<br />
cagem de todos os dados deve ser realizada com<br />
a intenção de diminuir a probabilidade de o paciente<br />
ser prejudicado por avaliação equivocada<br />
em qualquer uma das etapas.”<br />
“Existem situações em que não há como errar,<br />
tão padronizada é a interpretação da imagem microscópica”,<br />
volta à carga Cutait. “O que ajuda: a<br />
experiência do patologista, uma segunda e<br />
mesmo terceira opinião em casos difíceis e, se<br />
possível, a investigação por meio de exames complementares<br />
específicos.”<br />
Conclusão: havendo qualquer impasse, clínico<br />
ou cirurgião e pato logista têm de sentar e discutir<br />
o que fazer. A segunda opinião de patologista, de<br />
preferência mais especializado no órgão ou na<br />
doença de que se suspeita, é muito útil se: (1) o<br />
tecido da biópsia mostra apenas mudanças sutis;<br />
(2) o diagnóstico é notoriamente complicado e<br />
difícil de fazer; ou (3) o tratamento proposto é especialmente<br />
arriscado.<br />
Com essa cautela, já enfatizou anteriormente<br />
o professor Alves, da USP, todos ganham: pato<br />
logistas, clínicos, cirurgiões e, principalmente,<br />
os pacientes.<br />
“Procuramos ser<br />
o mais precisos<br />
possível, tal qual<br />
um controlador<br />
de voo. Um erro<br />
dele pode resultar<br />
em tragédia.<br />
Um erro nosso<br />
também.”<br />
<strong>Onco</strong>& junho/julho 2011 13
Divulgação<br />
16 junho/julho 2011 <strong>Onco</strong>&<br />
transplante de medula<br />
Luis Fernando S. Bouzas<br />
* Diretor do Centro de Transplante<br />
de Medula Óssea (CEMO/INCA)<br />
Contato: lbouzas@inca.gov.br<br />
O transplante de células-tronco<br />
hematopoéticas e a crescente<br />
disponibilidade de doadores<br />
Resumo<br />
A prática clínica do transplante de células-tronco<br />
hematopoéticas (TCTH) somente foi possível com<br />
a melhoria dos conhecimentos na área de imunologia<br />
e histocompatibilidade (HLA). Entre os fatores<br />
facilitadores está a obtenção de um doador HLA<br />
compatível, que idealmente é um irmão, mas na<br />
maioria das vezes (70%) é um doador não apa -<br />
rentado. As alternativas viáveis para populações<br />
como a brasileira, com grande miscigenação, foram<br />
a expansão do Registro Nacional de Doadores de<br />
Medula Óssea (REDOME) e da Rede de Bancos de<br />
Sangue de Cordão Umbilical e Placentário – Rede<br />
BrasilCord. A identificação de características genéticas<br />
relacionadas ao HLA, presentes no cadastro do<br />
Registro Nacional de Receptores de Medula Óssea<br />
(REREME) e ausentes ou pouco frequentes no RE-<br />
DOME e na Rede Nacional de Sangue de Cordão<br />
Umbilical (RENACORD), assim como a análise da<br />
origem desses indivíduos, mostra uma miscigenação<br />
entre grupos antropológicos distintos como<br />
asiáticos, negroides, indígenas e caucasianos. Esses<br />
dados contribuem para o planejamento estratégico<br />
de expansão do BrasilCord e do próprio REDOME.<br />
A expansão desses registros nacionais, bem como<br />
os internacionais, permitirá a mais pacientes os<br />
benefícios de um transplante de células-tronco<br />
hematopoéticas, procedimento cada vez mais importante<br />
no tratamento de diversas enfermidades,<br />
tanto onco-hematológicas quanto as que possuem<br />
relação com o sistema imune.<br />
Introdução<br />
A toxicidade à medula óssea é uma séria limitação<br />
do tratamento do câncer em geral. O transplante de<br />
medula óssea (TMO) ou de células-tronco<br />
hematopoéticas (TCTH) permite a administração<br />
de doses elevadas e potencialmente curativas de<br />
drogas quimioterápicas associadas ou não a ra-<br />
dioterapia. Sob essas circunstâncias, a terapêutica<br />
estaria limitada principalmente pela toxicidade não<br />
hematopoética 1-4 .<br />
Há cerca de 60 anos, pesquisadores demons tra -<br />
ram a capacidade da medula óssea em proteger animais<br />
previamente irradiados com doses letais atra vés<br />
da reconstituição do sistema hematopoético 1-3 .<br />
As principais etapas do desenvolvimento do<br />
transplante de células-tronco hematopoéticas no<br />
mundo estão representadas esquematicamente na<br />
Figura 1, mostrando as conquistas científicas e tecnológicas<br />
que permitiram avanços nos resultados e<br />
na aplicação dos transplantes.<br />
Foi somente no final da década de 60 que a<br />
evolução da prática clínica do TCTH, após inú -<br />
meros insucessos, se tornou possível, graças ao<br />
desenvolvimento das áreas de imunologia e histo -<br />
compatibilidade (HLA – sistema de antígenos leucocitários<br />
humanos) 1,4,5 .<br />
Naquela época, um pequeno número de crian -<br />
ças portadoras de imunodeficiência grave e com<br />
leucemia avançada recebeu infusões de medula<br />
óssea de doadores familiares HLA idênticos 1,4 , e surgiram<br />
os primeiros resultados bem-sucedidos que<br />
impulsionaram o método.<br />
Inicialmente, o TCTH foi usado como derradeira<br />
e desesperada medida em pacientes que não<br />
respondiam ao tratamento convencional existente.<br />
Entretanto, os avanços nos cuidados de suporte e a<br />
compreensão ampla do procedimento estabelecendo<br />
suas principais indicações, bem como limitações e<br />
complicações, tornaram esse procedimento uma estratégia<br />
terapêutica cada vez mais utilizada para diversas<br />
enfermidades (Tabela 1). Entre as principais<br />
limitações podemos destacar a escolha do doador,<br />
que, preferencialmente, além de estar saudável, deve<br />
ser compatível com o receptor 1,2,3,4,5,7 .<br />
São tipos de doador de medula óssea:<br />
• singênico (irmão gêmeo);<br />
• alogênico;
Figura 1 Principais etapas de desenvolvimento do transplante de células-tronco hematopoéticas (TCTH) no mundo<br />
(adaptado de Appelbaum F. Hematopoietic-cell transplantation at 50. N Eng J M 2007;357:1472-5)<br />
• relacionado ou aparentado (irmão ou familiar);<br />
• não relacionado ou não aparentado (não familiar) – ex.: registro<br />
de doadores de medula óssea;<br />
• autólogo ou autogênico (medula óssea originária do próprio paciente<br />
com ou sem tratamento in vitro).<br />
As fontes de células-tronco hematopoéticas, com padrão de compatibilidade<br />
ideal, como irmãos gêmeos, são raras e nem sempre<br />
podem ser utilizadas. A maioria dos transplantes alogênicos realizados<br />
tem como doadores os membros da família geneticamente idênticos<br />
para o HLA. Em geral, são irmãos HLA A, B, DR idênticos com o receptor.<br />
A probabilidade de um indivíduo obter um irmão compatível<br />
é de 25%, sendo influenciada pelo número de irmãos existentes em<br />
cada família. Para outros membros da família, a probabilidade é inferior<br />
a 5% 1,2,3,4,5,7 .<br />
As complicações relacionadas ao TCTH aumentam na proporção<br />
da disparidade de compatibilidade, incluindo risco de rejeição, desenvolvimento<br />
tardio ou incompleto do enxerto e doença do en x ertocontra-hospedeiro<br />
(DECH) 2 .<br />
As fontes mais usadas para obtenção de células para os TCTH são:<br />
• a medula óssea obtida por aspiração com agulhas, em centro<br />
cirúrgico, sob anestesia geral ou peridural, das cristas ilíacas, em geral;<br />
• o sangue periférico mobilizado, ou seja, o doador recebe um<br />
medicamento denominado fator de crescimento celular (em geral de<br />
granulócitos e monócitos) por cerca de cinco dias e é submetido ao<br />
procedimento de aférese, em serviço especializado em hemoterapia,<br />
para a coleta das células-tronco hematopoéticas circulantes;<br />
• o sangue do cordão umbilical coletado e armazenado após<br />
preparo adequado, logo depois do parto, em bancos especializados.<br />
Esse material é rico em células-tronco hematopoéticas e se tornou<br />
uma das mais importantes alternativas nos transplantes com doador<br />
não aparentado.<br />
Tabela 1: Principais indicações para o transplante de células-tronco<br />
hematopoéticas<br />
Leucemias agudas<br />
Leucemias crônicas<br />
Síndromes mielodisplásicas<br />
Transtornos da CTH:<br />
- AAs<br />
- Anemia de Fanconi<br />
- HPN<br />
Transtornos mieloproliferativos:<br />
- Mielofibrose<br />
- Policitemia vera<br />
Transtornos linfoproliferativos:<br />
- Doença de Hodgkin<br />
- Linfoma não-Hodgkin<br />
- Leucemia pró-linfocítica<br />
Transtornos dos fagócitos<br />
Doenças de depósito<br />
Transtornos histiocíticos<br />
Anormalidades congênitas<br />
dos eritrócitos:<br />
- Talassemias<br />
- Blackfan-Diamond<br />
- Doença falciforme<br />
Distúrbios do sistema<br />
imunológico (SCID)<br />
Outras alterações hematológicas:<br />
- Plaquetas<br />
- Plasmócitos<br />
Doenças oncológicas:<br />
- Tumores cerebrais<br />
- Neuroblastoma<br />
- Sarcoma de Ewing<br />
Doenças autoimunes<br />
<strong>Onco</strong>& junho/julho 2011 17
Complexo Maior de Histocompatibilidade (MHC)<br />
A importância do MHC foi primeiramente observada em camundongos,<br />
em estudos de rejeição de tecidos entre diferentes membros da<br />
mesma espécie. Posteriormente verificou-se que todos os vertebrados<br />
possuem genes do MHC e seus produtos e que as respostas de rejeição<br />
a transplantes eram mediadas por células T 14 . Trata-se de uma família<br />
gênica que inclui vários genes altamente polimórficos, que participa<br />
ativamente na defesa de vertebrados contra parasitas e outros<br />
patógenos. Os antígenos codificados pelos genes do MHC estão expressos<br />
virtualmente em todas as células nucleadas do organismo. O<br />
MHC controla a atuação do sistema imune em todos os vertebrados e<br />
tem se mantido durante a evolução dessas espécies. Foi inicialmente<br />
identificado na década de 50, seguindo observações de que o soro de<br />
pacientes que apresentavam reações febris pós-transfusionais poderia<br />
causar a aglutinação de leucócitos oriundos de seus doadores bem<br />
como de outros indivíduos. Estudos subsequentes também demons -<br />
traram que anticorpos contra proteínas leucocitárias (glicoproteínas)<br />
de outros indivíduos da população poderiam estar presentes em soro<br />
de mulheres multíparas 1,11,14,17 .<br />
O MHC de organismos distintos recebe denominação específica<br />
para cada espécie. O MHC humano, localizado no braço curto do cro-<br />
Humano: HLA<br />
(cromossomo 6)<br />
Murino: H2<br />
(cromossomo 17)<br />
18 junho/julho 2011 <strong>Onco</strong>&<br />
Locus do MHC Classe I<br />
Locus do MHC Classe II<br />
Genes do<br />
proteassomo;<br />
TAP 1, 2<br />
mossomo 6, é conhecido como o sistema de antígenos leucocitários<br />
humanos (HLA) (Figura 2). Até hoje, o termo HLA é usado como<br />
sinônimo de proteínas do MHC humano 11,14 .<br />
A definição das características da ligação da molécula de HLA aos<br />
peptídeos fornece importante subsídio para o papel do sistema HLA<br />
na apresentação de antígenos, resposta imune e susceptibilidade a<br />
doenças. O papel do MHC na apresentação de antígenos, por sua vez,<br />
explica seu extenso polimorfismo na população, ou seja, quanto<br />
maior o polimorfismo do MHC, maior será a gama de peptídeos estranhos<br />
que serão apresentados ao sistema imune. Dessa forma, os<br />
genes MHC podem influenciar a resposta imune mediada por células<br />
T pela seleção de antígenos que podem ser ligados e apresentados<br />
para o seu reconhecimento 4,11,14 .<br />
As moléculas MHC têm um efeito importante nos transplantes de<br />
órgãos, tecidos e células, devido ao papel fundamental que exercem<br />
sobre a ativação de células T e a iniciação da resposta alogênica.<br />
Com o advento de métodos de tipificação por DNA, tornou-se possível<br />
definir cada classe de molécula HLA pela identificação de sua sequência<br />
específica. A diversidade significativa entre os genes do<br />
sistema HLA ultrapassou as expectativas. Portanto, a análise do<br />
polimorfismo do HLA é claramente importante para o entendimento<br />
Locus do MHC “Classe III”<br />
DP DM<br />
DP DR B<br />
Locus do MHC Classe II<br />
Proteínas do<br />
complemento:<br />
C4, Fator B, C2<br />
Citocinas: LTb,<br />
TN Fa, LT<br />
Locus do MHC “Classe III”<br />
Locus do MHC Classe I<br />
C A<br />
K DM I-A I-E D L<br />
Genes Classe I-like<br />
e pseudogenes<br />
Locus do MHC Classe I<br />
Figura 2 Esquema representativo da disposição dos genes para os MHC Classe I e Classe II em humanos<br />
e camundongos (adaptado de http://www.ufpe.br/biolmol/Aula-Imunogenetica/aula-imuno-05.htm em 25/01/2011)
de como os antígenos de histocompatibilidade funcionam como determinantes<br />
nos transplantes 11,14 .<br />
O polimorfismo proporcionado pelos genes HLA, associado com<br />
sua tendência de estar fortemente ligados uns aos outros, tem implicação<br />
importante na identificação de histocompatibilidade entre<br />
doador e receptor em TCTH 11,15,16,18 .<br />
Identificação de doadores voluntários<br />
não aparentados para TCTH<br />
Um doador compatível pode ser identificado para aproximadamente<br />
50% a 80% dos pacientes para os quais uma busca de doador não<br />
aparentado foi iniciada. A probabilidade de identificar um doador aumenta<br />
se o doador e o paciente possuem a mesma origem étnica ou<br />
racial. As chances de encontrar um doador idêntico também aumentam<br />
quando o paciente tem dois haplótipos e genótipo de HLA estendido<br />
comum. Quando um doador compatível HLA-A, -B –DR não<br />
estiver disponível e a seleção for feita entre doadores parcialmente<br />
idênticos, deve-se evitar a incompatibilidade em HLA-B e –DR pelo<br />
risco de se aumentar o número total de incompatibilidades. A importância<br />
da tipificação HLA-DP e –DQ ainda precisa ser explicitada<br />
na seleção de doadores para TCTH.<br />
O impacto da compatibilidade entre o doador e o receptor na<br />
evolução clínica após os TCTH assumiu vital importância, principalmente<br />
nos transplantes com doadores não aparentados. O desenvolvimento<br />
do conhecimento tem produzido informações detalhadas para a<br />
escolha do melhor doador possível, tanto no que concerne à prevenção<br />
das complicações imediatas quanto tardias, e levado ao aumento significativo<br />
dos indivíduos que passam a ser beneficiados com essa técnica.<br />
A utilidade clínica da tipificação por método baseado em DNA para<br />
a seleção de doadores está bem clara em pelo menos dois aspectos:<br />
• A identificação e a priorização de doadores com a melhor compatibilidade<br />
possível (a compatibilidade acurada e completa reduz<br />
os riscos de falência do enxerto e DECH com impacto positivo na<br />
sobrevida);<br />
• A identificação e a não utilização de doadores incompatíveis para<br />
inúmeros alelos (disparidades em vários loci estão associadas com o<br />
aumento dos riscos de falência do enxerto, DECH e mortalidade).<br />
Os requisitos mínimos para a compatibilidade HLA podem variar<br />
com a situação clínica. Existem dados comprovando que, na ausência<br />
de doadores compatíveis em nível alélico, o uso de um doador com<br />
um único alelo diferente não necessariamente reduz a sobrevida. Os<br />
fatores que regem em quais situações a incompatibilidade genética será<br />
ou não tolerada são extremamente complexos e dependentes das dife -<br />
renças entre os alelos ou antígenos do binômio doador-receptor, do<br />
procedimento relacionado ao transplante (regime de condicionamento<br />
e imunossupressão) e outras variáveis não ligadas ao HLA.<br />
Os registros brasileiros de doadores voluntários<br />
para os TCTH – uma política de saúde<br />
A constituição de registros internacionais de doadores não aparentados<br />
permitiu a expansão do número de pacientes que se beneficiam com<br />
o procedimento de TCTH. Porém, as limitações ainda são grandes, já<br />
que esses registros, com cerca de 17,5 milhões de doadores voluntários,<br />
têm, em sua maioria, uma grande representação de indivíduos<br />
caucasianos (85%), não atendendo adequadamente, portanto, as po -<br />
pulações mais miscigenadas e as minorias étnicas como orientais, negros<br />
e indígenas 9,10,12,15 .<br />
As alternativas viáveis para populações como a brasileira, com ca -<br />
racterísticas tão peculiares quanto à miscigenação, são o estabelecimento<br />
de um Registro Nacional de Doadores de Medula Óssea<br />
(REDOME) representativo e de uma Rede de Bancos de Sangue de<br />
Cordão Umbilical e Placentário (Rede BrasilCord) 7,12 .<br />
Registro Nacional de Doadores<br />
de Medula Óssea (REDOME)<br />
O REDOME foi criado em 1993, na Fundação Pró-Sangue, em São<br />
Paulo. Entretanto, somente a partir do ano 1999, com sua incorporação,<br />
por determinação do Ministério da Saúde, ao Instituto Nacional<br />
de Câncer (INCA), foram possíveis a ampliação e a aplicação<br />
de recursos específicos na busca de doadores. Para tal, foi fundamental<br />
a contribuição do Ministério da Saúde, através da regulamentação<br />
e do ressarcimento dos procedimentos envolvidos com o cadastro e<br />
a seleção de doadores, pesquisas em registros nacionais e internacionais,<br />
testes laboratoriais, coleta e transporte de unidades de células-tronco<br />
hematopoéticas.<br />
No período de transição, do ano 2000 a dezembro de 2003, cerca<br />
de 45 mil doadores foram cadastrados no Registro e apenas dois centros<br />
de referência (Hospital Universitário da Universidade Federal do<br />
Paraná e INCA) realizavam os transplantes proporcionados pelo sistema<br />
REDOME/INCA/MS.<br />
Em função da crescente demanda de doadores não aparentados<br />
no país e da complexidade que envolve o procedimento, foram iniciados<br />
esforços no sentido de reestruturar e ordenar o Sistema<br />
Nacional de Transplantes de Células-Tronco Hematopoéticas, con -<br />
ferindo a ele equidade, agilidade e confiabilidade. Assim, através de<br />
regulamentação específica, foi centralizada a gerência técnica dessa<br />
atividade no INCA, estabelecida uma divisão estrutural e operacional<br />
do REDOME e do REREME, bem como o credenciamento de oito<br />
novos centros de transplante.<br />
<strong>Onco</strong>& junho/julho 2011 19
Como estratégia operacional para o crescimento do REDOME em<br />
número de doadores, na abrangência das características populacionais<br />
e na agilidade para a disponibilidade dos doadores do REDOME para<br />
busca, foi desenvolvido em 2005 o sistema REDOME-NET, através de<br />
cooperação entre o DATASUS e o Setor de Tecnologia da Informação<br />
do INCA. Esse sistema permite a inclusão de doadores no cadastro por<br />
meio de conexão direta com hemocentros e laboratórios de imunogenética<br />
em todo o país. Essa ação, somada à intensa atividade na área<br />
de comunicação e às campanhas estruturadas envolvendo empresas,<br />
organizações públicas, privadas e representantes da sociedade em<br />
geral, modificou o cenário existente, proporcionando, em apenas seis<br />
anos, uma evolução do cadastro de doadores para mais de 2 milhões<br />
de doadores até dezembro de 2010.<br />
Rede Brasileira de Bancos de Sangue de Cordão Umbilical<br />
e Placentário (Rede BrasilCord)<br />
Na última década, vários estudos demonstraram o potencial das células<br />
obtidas do sangue do cordão umbilical e placentário (SCUP), que, contendo<br />
número suficiente de células progenitoras, pode ser utilizado<br />
como fonte para reconstituição hematopoética. Essas células são<br />
menos imunorreativas que as da medula óssea, permitindo a sua utilização<br />
num projeto de banco ou registro de SCUP e proporcionando<br />
transplantes não aparentados idênticos ou parcialmente idênticos com<br />
menos complicações 7 .<br />
Nos últimos 15 anos, o SCUP de irmão recém-nascido ou existente<br />
em um banco foi utilizado como fonte de células progenitoras<br />
em mais de 10 mil transplantes. Para o uso de SCUP necessitamos,<br />
portanto, do estabelecimento de um amplo painel de doadores ou<br />
banco de SCUP (BSCUP).<br />
No mundo inteiro existem mais de 450 mil unidades de SCUP armazenadas.<br />
A proporção de células-tronco no SCUP por volume pode<br />
ser maior que nas coletas de medula óssea. Quanto às doenças infecciosas,<br />
recomenda-se muita cautela, com processamento das amostras<br />
com testes de rastreamento para as principais afecções prevalentes no<br />
âmbito materno-fetal e as transmitidas pelo sangue. Da mesma forma, a<br />
principal maneira de se reduzir a possibilidade de transmissão de doenças<br />
genéticas é, além dos testes disponíveis, a obtenção de questionários bem<br />
delineados e aplicados a fim de identificá-las na historia familiar 7 .<br />
Quanto aos aspectos éticos, trata-se de material de fácil obtenção<br />
e descartável. É necessária a obtenção de consentimento materno para<br />
sua coleta e armazenamento, bem como para a utilização no banco de<br />
SCUP. No sentido de preservar possíveis solicitações futuras, todas as<br />
informações são confidenciais e a identificação nos questionários e dos<br />
prontuários maternos é substituída por códigos logo que a unidade<br />
seja liberada para uso do registro.<br />
A menor reatividade imunológica das CTH do SCUP facilita a uti-<br />
20 junho/julho 2011 <strong>Onco</strong>&<br />
lização em transplantes com maior grau de disparidade entre doador<br />
e receptor, o que aumenta a potencialidade de utilização de cada<br />
amostra, fazendo com que um estoque muito menor de doadores<br />
possa atender a população. Há, no entanto, duas grandes desvantagens<br />
desses bancos em relação aos registros de doadores não aparentados:<br />
a limitação representada pela necessidade de um número mínimo de<br />
CTH – portanto, esses bancos atendem preferencialmente crianças,<br />
pelo baixo peso corporal; e a necessidade de se estabelecer um banco<br />
com armazenamento físico de amostras, enquanto nos registros há apenas<br />
a coleta de amostras e o armazenamento de dados, sendo que a<br />
coleta de CTH ocorre apenas no momento do transplante, quando o<br />
doador e o receptor já foram identificados.<br />
Desde o primeiro transplante de SCUP bem-sucedido em um paciente<br />
com anemia de Fanconi, em 1988, os conhecimentos na área<br />
evoluíram e bancos se desenvolveram em todo o mundo. O EURO-<br />
CORD foi organizado para padronizar métodos de coleta, testes, criopreservação<br />
de SCUP de doadores aparentados ou não aparentados,<br />
para estudar as propriedades dessas células e criar um registro<br />
próprio para esses transplantes na Europa. Até 2002, vários centros<br />
faziam parte desse registro com 650 transplantes já realizados 7 .<br />
Em 2001, foi inaugurado no INCA o primeiro banco de SCUP do<br />
país, que desde então vem contribuindo para o desenvolvimento dessa<br />
área com: treinamento de pessoal; difusão de conhecimentos e tecnologia;<br />
apoio aos órgãos competentes, como a Agência Nacional de Vigilância<br />
Sanitária (Anvisa); desenvolvimento da regulamentação específica; e projeto<br />
piloto para o estabelecimento do BrasilCord. Esse banco possui capacidade<br />
instalada para armazenar 10,6 mil unidades e encontra-se em<br />
pleno funcionamento. Os procedimentos de captação de doadores, coleta,<br />
transporte, processamento, criopreservação e fornecimento de unidades<br />
de SCUP estão bem estabelecidos e seguem as normas vigentes nacionais<br />
e internacionais. A média de unidades coletadas é de 100 por mês, e cerca<br />
de 4,5 mil unidades foram armazenadas até setembro de 2010.<br />
O estabelecimento da Rede BrasilCord se concretizou pela publicação<br />
da portaria GM/MS 2381 em outubro de 2004, incorporando imediatamente<br />
os Bancos do Hospital Israelita Albert Einstein, do Hemocentro<br />
de Campinas e do Hemocentro de Ribeirão Preto. A rede prevê o esta -<br />
belecimento de um total de 13 bancos em diferentes capitais do país, a<br />
fim de atender nossa diversidade étnica. Para cumprir essa meta, o INCA,<br />
responsável pela organização, pelo desenvolvimento e pela implantação<br />
da Rede BrasilCord, obteve financiamento através de projeto de cunho<br />
social do BNDES, e até dezembro do ano passado 11 bancos de SCUP já<br />
haviam sido inaugurados, contemplando as cidades do Rio de Janeiro,<br />
São Paulo, Campinas, Belém, Recife, Brasília, Florianópolis, Fortaleza,<br />
Porto Alegre, restando ainda Curitiba e Belo Horizonte a inaugurar.<br />
As unidades de SCUP armazenadas também farão parte do REDOME<br />
através do RENACORD, sistema que reúne as informações das unidades
armazenadas pela Rede BrasilCord. A distribuição geográfica dos BSCUPs<br />
não deve ser uma preocupação, já que o acesso estará disponível a qualquer<br />
centro de transplante e o transporte das células para transplante em<br />
qualquer ponto do país não representa dificuldade operacional maior.<br />
A rede pode ser expandida futuramente de duas maneiras: através<br />
do aumento do número de centros de captação e processamento e da<br />
criação de um ou mais centros de grande capacidade de armazenamento.<br />
Isso deverá ocorrer depois que a rede inicial de 13 centros for<br />
implantada e sua viabilidade técnica e econômica demonstrada.<br />
Registro Nacional de Receptores<br />
de Medula Óssea (REREME)<br />
Em 2 de maio de 2006 foi publicada a portaria número 931 do Minis -<br />
tério da Saúde, que aprova o regulamento técnico para transplante de<br />
células-tronco hematopoéticas e controla toda a atividade no Brasil.<br />
Cerca de 90% desses procedimentos no país ocorrem em instituições<br />
públicas, credenciadas ou filantrópicas, com recursos públicos.<br />
A portaria estabeleceu as regras necessárias, considerando a necessidade<br />
de organizar o acesso com equidade e otimizar a aplicação dos<br />
recursos para manutenção e atualização do cadastro nacional de<br />
doadores não aparentados de células-tronco hematopoéticas.<br />
Em seu artigo 6º, parágrafo único, estabeleceu que o Sistema Nacional<br />
de Transplantes contará com a assessoria técnica do INCA nas<br />
atividades relacionadas a TCTH.<br />
A portaria estabeleceu ainda o programa informatizado de geren -<br />
ciamento do REREME, que contribuirá para o cadastro único de pacientes<br />
candidatos a TCTH alogênico. Dessa forma, o INCA, responsável<br />
Número de doadores cadastrados<br />
2 milhões<br />
1,8 milhão<br />
1,6 milhão<br />
1,4 milhão<br />
1,2 milhão<br />
1 milhão<br />
800 mil<br />
600 mil<br />
400 mil<br />
200 mil<br />
0<br />
2003<br />
Ano<br />
1.972.110<br />
2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010<br />
Figura 3 Crescimento do cadastro de doadores no REDOME<br />
(dados de 1993 a novembro de 2010)<br />
pelo desenvolvimento desse sistema de registro, manterá os cadastros<br />
do REDOME, que incluem os dados da Rede BrasilCord e do REREME,<br />
atualizados com as situações clínicas dos receptores e dos doadores.<br />
Características atuais dos Registros Nacionais<br />
Desde a sua criação, em 1993, foram recrutados e cadastrados no RE-<br />
DOME, até novembro de 2010, mais de 1,9 milhão de doadores, sendo<br />
97,5% a partir de janeiro de 2004 (Figura 3). Apesar de o crescimento<br />
do cadastro ser mais intenso nas regiões Sul e Sudeste, verificamos<br />
que, com o aproveitamento do potencial da rede de hemocentros distribuída<br />
no país, foi possível aumentar a representatividade dos estados<br />
das demais regiões (Figura 4).<br />
No período de 1993 a novembro de 2010 foram incluídos 7.655<br />
pacientes no REREME para busca de doador não aparentado, sendo<br />
4.084 pacientes de 2006 a 2010 (Figura 5). A origem geográfica desses<br />
Número de doadores cadastrados<br />
Número de pacientes<br />
1 milhão<br />
800 mil<br />
600 mil<br />
400 mil<br />
200 mil<br />
0<br />
Figura 4 Distribuição de doadores do REDOME por região<br />
(dados até novembro de 2010)<br />
4,5 mil<br />
4 mil<br />
3,5 mil<br />
3 mil<br />
2,5 mil<br />
2 mil<br />
1,5 mil<br />
mil<br />
500<br />
0<br />
5,1%<br />
Norte<br />
902<br />
até 1999<br />
13,5%<br />
2000-2005 2006 a nov/2010<br />
Figura 5 Pacientes inscritos no REREME por período desde o<br />
desenvolvimento do REDOME<br />
Ano<br />
7,5%<br />
Região<br />
47,7%<br />
25,6%<br />
0,6%<br />
Nordeste Centro-Oeste Sudeste Sul s/ UF<br />
2.669<br />
4.084<br />
<strong>Onco</strong>& junho/julho 2011 21
pacientes pode ser vista na Figura 6. Comparando-se a porcentagem<br />
de contribuição das diferentes regiões do país na constituição do RE-<br />
DOME e do REREME, podemos observar que os dois registros têm<br />
uma representatividade bastante semelhante.<br />
As principais indicações, representando 90% dos casos, para a inclusão<br />
desses pacientes foram leucemia mieloide crônica e aguda,<br />
leucemia linfoide aguda, anemia aplástica, anemia de Fanconi e síndromes<br />
mielodisplásicas.<br />
Pacientes inscritos no REREME (%)<br />
60%<br />
50%<br />
40%<br />
30%<br />
20%<br />
10%<br />
16,3%<br />
4,8% 5,9%<br />
Norte<br />
Figura 6 Origem geográfica dos pacientes inscritos no REREME<br />
Número de receptores com 6 X 6<br />
0<br />
80%<br />
70%<br />
60%<br />
50%<br />
40%<br />
30%<br />
20%<br />
10%<br />
22 junho/julho 2011 <strong>Onco</strong>&<br />
0<br />
Região<br />
57,35%<br />
15,6%<br />
Nordeste Centro-Oeste Sudeste Sul<br />
2002<br />
As características mais significativas dos pacientes e que podem<br />
auxiliar no direcionamento do REDOME são: 51% dos pacientes têm<br />
menos de 18 anos; 59% são do sexo masculino; 73% se classificam<br />
como brancos,12% negros e 10% pardos ou mulatos.<br />
Entre os fatos mais importantes da reestruturação dos registros de<br />
doadores e pacientes está a agilidade em se conseguir um doador no<br />
Brasil. Com o crescimento do REDOME e a utilização dos SCUPs armazenados<br />
nos bancos (BrasilCord), verificamos que 48% dos pacientes<br />
incluídos no REREME no período de 2005 a outubro de 2006<br />
(n=1197) tinham pelo menos um doador idêntico HLA A, B, DR de<br />
baixa resolução (6x6), e esse dado sobe para 70,53% nos registrados<br />
até 2009 (Figura 7) 16,17,18 .<br />
A análise preliminar dos dados referentes aos transplantes realizados<br />
aponta para uma representação adequada do REDOME/RENACORD,<br />
demonstrada pela sua progressiva capacidade em identificar doadores<br />
no âmbito nacional. Essa capacidade é diretamente proporcional e pode<br />
ser evidenciada se compararmos os números, antes e depois, da reestruturação<br />
do REDOME, em janeiro de 2004. Em julho de 2004, apenas<br />
25% dos doadores identificados para pacientes que necessitavam e<br />
aguardavam em lista eram nacionais, sendo os demais de origem internacional.<br />
Em novembro de 2010, com 513 TCTHs facilitados, essa porcentagem<br />
passou para 70,53% de origem nacional e apenas 29,47% de<br />
origem internacional. Considerando o uso de sangue de cordão umbi -<br />
2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009<br />
Figura 7 Probabilidade de encontrar um doador compatível HLA 6x6 em baixa resolução no REDOME<br />
Ano
lical em 395 TCTHs, até aquela data, verificamos que 24% das unidades<br />
foram fornecidas por bancos da Rede BrasilCord. As implicações desse<br />
desenvolvimento são inúmeras, entre elas a perspectiva de custos reduzidos,<br />
buscas mais ágeis e ampliação da participação do REDOME/<br />
RENACORD no fornecimento de doadores para a comunidade internacional,<br />
onde as minorias étnicas são pouco representadas.<br />
Conclusão<br />
O desenvolvimento das técnicas envolvidas no transplante de células-tronco<br />
hematopoéticas nas últimas décadas está sedimentado na<br />
base do conhecimento da imunogenética, da seleção, do processa-<br />
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mento e da criopreservação de células-tronco e nas estratégias de<br />
suporte terapêutico necessário para a recuperação do paciente.<br />
Dessa forma, houve grande avanço no prognóstico de várias enfermidades<br />
tratadas com essa modalidade de transplante. Por outro<br />
lado, somente com a descoberta de fontes alternativas de célulastronco,<br />
como o sangue de cordão umbilical e os doadores não<br />
aparentados inscritos em registros, foi possível oferecer a mais pacientes<br />
essa possibilidade de tratamento. Trata-se de uma iniciativa<br />
importante, que nos últimos dez anos, com os estudos envolvendo<br />
a chamada terapia regenerativa ou celular, vem protagonizando uma<br />
nova era da medicina moderna.<br />
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Paulo: Editora Atheneu; 2009. p, 565-88.<br />
<strong>Onco</strong>& junho/julho 2011 23
Divulgação<br />
abdômen<br />
Ademar Lopes<br />
* Diretor do Departamento de<br />
Cirurgia Pélvica do Hospital A.C.<br />
Camargo da Fundação Antonio<br />
Prudente – São Paulo; felllow<br />
da Sociedade Americana de<br />
Cirurgia <strong>Onco</strong>lógica<br />
Contato:<br />
ademarlopes@cirurgiaoncologica.com.br<br />
Adriano Carneiro<br />
* Cirurgião oncologista; médico<br />
titular do Departamento de<br />
Cirurgia Pélvica do Hospital A.C.<br />
Camargo da Fundação Antonio<br />
Prudente – São Paulo<br />
Contato:<br />
adrianocacosta@hotmail.com<br />
26 junho/julho 2011 <strong>Onco</strong>&<br />
Cirurgia citorredutora associada<br />
a quimioterapia intraperitoneal<br />
hipertérmica (QtIPH) no tratamento<br />
da carcinomatose peritoneal<br />
1. Introdução<br />
A carcinomatose peritoneal caracteriza-se pela<br />
ampla disseminação de carcinomas pelo peritônio e<br />
está frequentemente associada ao acúmulo de<br />
líquido na cavidade peritoneal, causando ascite<br />
neoplásica. Pode ser primária ou secundária. As<br />
neoplasias primárias do peritônio são raras e re -<br />
presentadas por mesotelioma e carcinoma, o último<br />
com comportamento biológico semelhante ao carcinoma<br />
oriundo do ovário. As carcinomatoses secundárias<br />
são mais frequentes, na maioria das vezes<br />
originárias de tumores primários de ovário, intestino<br />
grosso, estômago e apêndice. Os adenomas mucinosos<br />
do apêndice frequentemente se rompem,<br />
vindo a se implantar no peritônio, condição conhe -<br />
cida como pseudomixoma peritoneal. Os implantes<br />
peritoneais oriundos do pseudomixoma, assim<br />
como os mesoteliomas, caracterizam-se por serem<br />
não ou pouco invasivos, enquanto os demais são<br />
mais agressivos por serem invasivos 7 .<br />
Cirurgia, radioterapia, quimioterapia, imunote -<br />
rapia e hormonioterapia são as formas de tratamento<br />
das neoplasias malignas. As duas primeiras são<br />
modelos locorregionais de tratamento, e as últimas,<br />
abordagens sistêmicas. O tratamento multidisciplinar<br />
tem contribuído significativamente na melhora<br />
das taxas de cura, sobrevida e qualidade de vida de<br />
muitos pacientes com câncer.<br />
Os implantes peritoneais oriundos do<br />
pseudomixoma peritoneal não são responsivos a<br />
quimioterapia sistêmica, o que em geral também<br />
ocorre com o mesotelioma. Esses dois tumores têm<br />
hoje na cirurgia citorredutora associada a QtIPH a<br />
sua melhor forma de tratamento. Mesmo com os<br />
progressos na quimioterapia sistêmica dos tumores<br />
invasivos, o tratamento da carcinomatose peritoneal<br />
deles oriunda ainda constitui um grande desafio 1 .<br />
Agentes citotóxicos administrados por via sistêmica<br />
apresentam baixa concentração na cavidade peritoneal,<br />
sendo insuficientes para eliminar lesões<br />
residuais, mesmo microscópicas. Apesar da nítida<br />
relação dose-efeito das drogas citotóxicas para neoplasias<br />
do trato digestivo e do ovário, a dose tera -<br />
pêutica necessária para tratar doença peritoneal<br />
excede amplamente a dose tóxica. Além disso, o<br />
fator limitante mais significativo encontrado para<br />
ação do quimioterápico foi a baixa penetração das<br />
drogas em profundidade no nódulo tumoral<br />
(provavelmente 1-3 mm). Esse achado contribuiu<br />
com o princípio de reduzir cirurgicamente a doença<br />
peritoneal a níveis mínimos, para possibilitar a ação<br />
regional da quimioterapia intraperitoneal.<br />
Essa constatação serviu como motivação para o<br />
desenvolvimento de estudos sobre os efeitos da administração<br />
intraperitoneal de quimioterápicos a<br />
partir dos anos 1950 2,3 . A associação de cirurgia<br />
citorredutora e perfusão intraoperatória da cavidade<br />
peritoneal, com solução quimioterápica<br />
hipertérmica, representa uma nova e promissora<br />
modalidade terapêutica para um seleto grupo de<br />
pacientes com disseminação peritoneal das neoplasias.<br />
Essa modalidade de tratamento se baseia na<br />
tríade de citorredução, calor e quimioterapia regional.<br />
A citorredução por si só tem importante<br />
papel na ação dos quimioterápicos, por diminuir a<br />
população de células neoplásicas e, principalmente,<br />
sua fração não proliferativa. A hipertermia isolada<br />
tem ação citotóxica: aumenta a permeabilidade das<br />
células neoplásicas aos quimioterápicos e potencia -<br />
liza a citotoxicidade de alguns deles.<br />
A cirurgia citorredutora associada a hipertermia<br />
constitui uma modalidade de tratamento padrão para<br />
carcinoma de apêndice com disseminação peritoneal,<br />
pseudomixoma peritoneal e mesotelioma peritoneal.
Estudos na literatura demonstram ganho na sobrevida de pacientes portadores<br />
de câncer de cólon, estômago e ovário. Para esses casos, porém,<br />
são necessários mais estudos com melhor nível de evidência 4,5 .<br />
2. Avaliação da disseminação peritoneal<br />
O objetivo desejável da citorredução é deixar a doença microscópica ou<br />
mínima. Assim, a extensão da cirurgia varia conforme o grau da disse -<br />
minação peritoneal. Para avaliar a extensão da disseminação peritoneal,<br />
foi criado o índice de disseminação peritoneal (IDP) 6 . Para determinação<br />
do IDP, os nódulos peritoneais são classificados de acordo com seu<br />
tamanho e recebem valores numéricos de 0 a 3. A cavidade peritoneal é<br />
dividida em 13 regiões, e a soma dos índices de tamanho das lesões nessas<br />
13 regiões resulta no IDP (Figura 1). Existem, no entanto, algumas<br />
reservas no uso do IDP como indicador de possibilidade de citorredução<br />
completa ou mínima. Em tumores não invasivos como o pseudomixoma<br />
peritonei e o mesotelioma, um alto IDP pode ser convertido para citorredução<br />
completa, o que, habitualmente, não ocorre com tumores invasivos,<br />
como os oriundos do estômago, ovário e cólons 6,7 .<br />
A presença de implantes peritoneais invasivos irressecáveis ou com<br />
alto risco para a ressecção em locais críticos, como hilo hepático, raiz<br />
da mesentérica, tronco celíaco, mesentério, e vários pequenos implantes<br />
na serosa do intestino delgado associam-se ao mau prognóstico,<br />
mesmo com baixo IDP.<br />
11<br />
Regiões<br />
0. Central<br />
1. Superior direito<br />
2. Epigástrio<br />
3. Superior esquerdo<br />
4. Flanco esquerdo<br />
5. Inferior esquerdo<br />
6. Pelve<br />
7. Inferior direito<br />
8. Flanco direito<br />
9. Jejuno superior<br />
10. Jejuno inferior<br />
11. Íleo superior<br />
12. Íleo inferior<br />
Tamanho da lesão<br />
___<br />
___<br />
___<br />
___<br />
___<br />
___<br />
___<br />
___<br />
___<br />
___<br />
___<br />
___<br />
___<br />
Figura 1 Índice de Carcinomatose Peritonial (PCI). O tamanho da<br />
lesão (LS) define a pontuação (0 a 3) para cada uma das 13 regiões.<br />
O valor máximo é 39 (traduzido a partir de Jacquet e Sugarbaker –<br />
Boston: Kluwer Academic Publishers 1996:359–374)<br />
PCI<br />
Score do tamanho da lesão<br />
LS0 Sem tumor visível<br />
LS1 Tumor ≤ 0,5 cm<br />
LS2 Tumor ≤ 5 cm<br />
LS3 Tumor > 5 cm ou confluente<br />
3. Classificação da citorredução<br />
A citorredução pode ser avaliada pela doença residual macro ou microscópica<br />
após o ato cirúrgico, através do índice de citorredução (IC).<br />
O IC representa o principal fator prognóstico para os pacientes com<br />
carcinomatose peritoneal invasivas e não invasivas. Para implantes<br />
oriun dos de tumores gastrointestinais, o IC é classificado após a cirurgia<br />
da seguinte maneira:<br />
IC-0= ausência de doença macroscópica;<br />
IC-1= doença residual < que 2,5 mm;<br />
IC-2= nódulos residuais entre 2,5 e 25 mm;<br />
IC-3= nódulos residuais > 25 mm ou confluentes, em qualquer loca -<br />
lização da cavidade abdomino-pélvica (Figura 2) 6,7 .<br />
Os índices IC-0 e IC-1 são considerados ótimos para neoplasias<br />
não invasivas, enquanto nas invasivas apenas o IC-0 é considerado<br />
ótimo. Se durante a exploração da cavidade peritoneal concluir-se que<br />
a citorredução não será ótima, o cirurgião poderá decidir-se por<br />
ressecções paliativas com finalidade de aliviar sintomas e desistir da<br />
citorredução potencialmente completa associada a QtIPH 6,7 .<br />
IC-0<br />
Sem doença<br />
IC-1<br />
< 2,5 mm<br />
Figura 2 IC – Sistema de classificação conforme<br />
o diâmetro máximo da doença residual<br />
4. Aspectos técnicos<br />
A cirurgia citorredutora, impropriamente chamada de peritoniectomia,<br />
consiste na remoção de implantes peritoneais, incluindo maior ou<br />
menor quantidade de peritônio, na dependência da localização dos<br />
implantes e, se necessário, órgãos e ou estruturas não vitais, para atingir<br />
citorredução ótima (IC-0 ou IC-1). Devido à dinâmica de circulação<br />
de líquidos na cavidade peritoneal, os implantes são mais frequentes<br />
e numerosos nos epíplons, goteiras parietocólicas, cúpulas diafragmáticas,<br />
fundo de saco retouterino e retovesical.<br />
A citorredução, na sua forma mais ampla, inclui as seguintes etapas<br />
de ressecção: grande epíplon em monobloco com o folheto peritoneal<br />
superior do mesocólon transverso, fáscia pancreato-lienal, baço e peri -<br />
tôneo subdiafragmático esquerdo, peritôneo subdiafragmático direito<br />
(Figuras 3 – A, B, C), pequeno omento e colecistectomia; cápsula de<br />
Glisson, peritôneo parietal anterior e lateral bilateralmente, peritôneo<br />
pélvico em monobloco com o retossigmoide, no homem, e exenteração<br />
pélvica posterior, na mulher. Para câncer de ovário emprega-se como<br />
componente da citorredução a linfadenectomia pélvica e retroperitoneal<br />
(Figura 3D) 2,20 . A ressecção de segmentos colônicos, entéricos,<br />
IC-2<br />
2,5 - 25 mm<br />
IC-3<br />
> 25 mm<br />
ou confluente<br />
<strong>Onco</strong>& junho/julho 2011 27
antrectomia, ou mesmo gastrectomia total, pode ser indicada para se<br />
conseguir doença mínima em tumores não invasivos, em casos selecionados.<br />
O uso do bisturi elétrico de ponta esférica e em alta voltagem<br />
facilita a ressecção do peritôneo. Usualmente, todas as anastomoses<br />
são feitas após o término da QtIPH para diminuir os riscos de compli-<br />
Terminada a citorredução, passa-se à fase da perfusão intraperitoneal<br />
contínua com quimioterapia hipertérmica. Um cateter de infusão quadrifurcado<br />
(Braile Biomédica) é inserido através da parede abdominal e tem<br />
suas extremidades posicionadas nos espaços subdiafragmáticos direito e<br />
esquerdo, no mesogástrio e na cavidade pélvica. Para controle de temperatura,<br />
temos usado três termômetros inseridos através da parede e<br />
posicionados na cavidade pélvica, no andar superior do abdome, no<br />
mesogástrio, além do termômetro esofágico.<br />
A perfusão da cavidade pode ser feita pela técnica aberta, também<br />
conhecida como técnica do Coliseu, ou pela técnica fechada. Na<br />
28 junho/julho 2011 <strong>Onco</strong>&<br />
Figura 3A Baço em monobloco com o peritônio<br />
da cúpula diafragmática esquerda e o remanescente<br />
do grande epíplon<br />
Figura 3C Peritônio diafragmático direito<br />
cações. Quando se procede à peritoniectomia subdiafragmática, a<br />
drenagem torácica ipsilateral é nossa rotina, pois, invariavelmente, os<br />
pacientes apresentam derrame pleural. A extensão do procedimento<br />
cirúrgico, sua duração, bem como as comorbidades, têm uma relação<br />
direta com a extensão da carcinomatose peritoneal.<br />
Figura 3B Fase do ato operatório com o fígado tracionado<br />
caudalmente com destaque para as cúpulas diafragmáticas<br />
após remoção do peritôneo das mesmas<br />
Figura 3D Linfadenectomia retroperitoneal realizada<br />
na citorredução para o câncer de ovário<br />
primeira, uma sutura contínua prende as bordas da ferida a um afastador<br />
de Thompson. Uma cobertura plástica é incorporada na sutura,<br />
onde se faz uma abertura através da qual se introduz a mão, permitindo<br />
manipulação contínua das vísceras, o que facilita a distribuição<br />
uniforme do líquido de perfusão. Utiliza-se um aspirador<br />
com filtro de carvão ativado para retirar o ar sob a cobertura plástica,<br />
evitando-se a contaminação do ambiente pela dispersão dos<br />
quimioterápicos. Na técnica fechada, após a inserção e o posicionamento<br />
dos cateteres e dos termômetros, fechamos hermeticamente a<br />
pele com sutura contínua da pele com nylon 2.0 (Figura 4) 2,20 . Não
há consenso sobre a melhor técnica, já que não existem trabalhos comparativos<br />
com bom nível de evidência. Usamos a técnica fechada para<br />
impedir o risco da dispersão de agentes citotóxicos no ambiente cirúrgico,<br />
evitando-se assim problemas de biossegurança, e por acreditarmos<br />
que, ao introduzir uma quantidade adequada de líquido, toda a<br />
cavidade e as superfícies viscerais serão adequadamente perfundidas.<br />
Os cateteres são conectados a uma máquina de circulação extracor-<br />
pórea, cujo rolete propulsor introduz e succiona a solução.<br />
Um trocador de calor acoplado ao sistema mantém a solução a ser<br />
infundida entre 43ºC e 44ºC, de modo que na cavidade peritoneal a<br />
temperatura é mantida entre 41ºC e 42ºC, e a perfusão é mantida por<br />
90 minutos. Terminada a fase de perfusão, aspira-se a solução e abrese<br />
a cavidade, que é lavada com soro fisiológico e, então, são confeccionadas<br />
as anastomoses.<br />
Figura 4 Fase do ato operatório onde se podem observar cateteres de perfusão intra-abdominais<br />
conectados a uma máquina de circulação extracorpórea com trocador de calor para aquecimento<br />
da solução com quimioterápico. Essa solução será utilizada na perfusão da cavidade peritoneal<br />
através de circuito fechado após cirurgia citorredutora<br />
A droga utilizada para o tratamento de pseudomixoma peritoneal,<br />
adenocarcinoma do apêndice, cólon e reto é a mitomicina C. Para mesotelioma,<br />
carcinoma do ovário e estômago, usam-se cisplatina e doxorrubi -<br />
c ina. A escolha do quimioterápico, bem como sua dose, é tarefa do<br />
oncologista clínico que faz parte da equipe. Ainda não existe uma<br />
padronização universal para a QtIPH, principalmente no que se refere a<br />
indicações, tempo de perfusão, nível de temperatura intra-abdominal,<br />
modelo de perfusão, quimioterápicos e suas respectivas doses.<br />
5. Indicações e contraindicações<br />
Na seleção dos pacientes, temos de considerar a origem do tumor<br />
primário com suas características anatomopatológicas, o reestadiamento<br />
que confirme doença restrita à cavidade peritoneal, a extensão<br />
da disseminação peritoneal, o julgamento da possibilidade de citorredução<br />
ótima ou subótima, a falta de outra opção terapêutica melhor,<br />
as condições clínicas do paciente, a infraestrutura hospitalar e a equipe<br />
envolvida no procedimento (Fluxograma 1). Uma equipe cirúrgica com<br />
larga experiência em cirurgia oncológica abdominopélvica, anestesio -<br />
logistas, intensivistas, oncologistas clínicos, um bom serviço de hemoterapia,<br />
fisioterapeutas, nutricionistas e a boa seleção dos pacientes são<br />
fatores importantes para diminuir a morbimortalidade. A QtIPH é indicada<br />
na presença de disseminação peritoneal passível de citorredução<br />
ótima, concomitantemente à ressecção do tumor primário, após a<br />
ressecção do mesmo ou após as recorrências 8 .<br />
A citorredução e a QtIPH parecem ser hoje os procedimentos de<br />
escolha no tratamento de tumores não invasivos, como o adenocarcinoma<br />
mucinoso do apêndice, o pseudomixoma peritoneal e o mesotelioma<br />
peritoneal. Para pacientes com carcinomatose de origem<br />
colorretal, Sugarbaker relatou 20% de sobrevida em cinco anos para<br />
pacientes com IDP entre 11 e 20. Nenhum paciente sobreviveu até os<br />
cinco anos quando o IDP foi maior que 20. A cirurgia citorredutora<br />
associada a QtIPH em tumores invasivos precisa ser mais bem investigada,<br />
em estudos prospectivos realizados em centros de referência, até<br />
que se conheçam mais a fundo os fatores prognósticos, de modo a dimensionar<br />
melhor suas indicações 9,10 .<br />
Nesse contexto, a presença de doença extra-abdominal, KPS igual<br />
ou menor que 70% e idade acima de 75 anos são contraindicações para<br />
citorredução e quimioterapia intraperitoneal hipertérmica. Para as neoplasias<br />
invasivas, são fatores prognósticos desfavoráveis: alto grau de<br />
malignidade histológica, citorredução incompleta, carcinoma tipo célu-<br />
<strong>Onco</strong>& junho/julho 2011 29
las em anel de sinete e a presença de linfonodos metastáticos na peça<br />
operatória do tumor primário. Em relação ao IDP, os pacientes entre<br />
0 e 12 são os melhores candidatos; entre 13 e 20, as indicações são<br />
controversas e há necessidade de avaliação individual dos casos; aqueles<br />
com índice acima de 20 não são candidatos ao procedimento 8,9,10<br />
(veja fluxograma na página ao lado).<br />
6. Fatores prognósticos<br />
A carcinomatose peritoneal foi associada historicamente à fase terminal<br />
das neoplasias, com sobrevida mediana em torno de seis meses. Com<br />
os avanços recentes da quimioterapia para implantes peritoneais de<br />
origem colorretal, essa sobrevida pode chegar a até 18 meses. A citorredução<br />
associada a QtIPH para o tratamento da carcinomatose peritoneal<br />
é um procedimento relativamente novo e ainda carente de<br />
estudos prospectivos aleatorizados, de forma que as publicações existentes<br />
devem ser vistas com certa reserva e servir de estímulo para estudos<br />
prospectivos multicêntricos bem elaborados, que possam, a<br />
médio prazo, responder a uma série de dúvidas ainda existentes. Nos<br />
fatores prognósticos dos pacientes submetidos ao procedimento, devemos<br />
considerar a origem do tumor primário e suas características<br />
anatomopatológicas, a extensão da carcinomatose, que ditará a extensão<br />
da ressecção, o índice de citorredução e a condição clínica do paciente.<br />
Pacientes com performance status menor que 70 na escala de<br />
Karnofsky não são candidatos a citorredução extensa e QtIPH. A morbidade<br />
do procedimento varia de 0% a 39%, e a mortalidade, de 0%<br />
a 20% nas diferentes séries, incluindo tumores primários diversos. No<br />
entanto, nas séries que restringiram a análise à carcinomatose de<br />
Figura 5 As taxas de sobrevida globais para pacientes com<br />
carcinomatose peritoneal, segundo tipos histológicos.<br />
Os tumores pouco invasivos apresentam maior sobrevida<br />
30 junho/julho 2011 <strong>Onco</strong>&<br />
origem colorretal, as taxas de morbidade e mortalidade variaram de<br />
22% a 54% e de 0% a 12% 11,12,13,14,15,16,17,18,19 .<br />
O pseudomixoma peritoneal de origem apendicular ou ovariana e<br />
o mesotelioma peritoneal têm como características biológicas serem<br />
tumores não ou pouco invasivos, o que facilita a citorredução e, portanto,<br />
se associam ao bom prognóstico. Glehen et al., em estudo multicêntrico,<br />
demonstraram que pacientes submetidos a ressecções CC-0,<br />
com tumores pouco invasivos, baixo IDP, em instituições com mais de<br />
sete anos de experiência nesse tipo de cirurgia, estão associados a um<br />
melhor prognóstico. Já pacientes com idade maior que 61 anos,<br />
ressecções CC-1, CC-2, ressecções sincrônicas de metástases hepáticas<br />
e presença de comprometimento linfonodal estavam associados a um<br />
pior prognóstico (Figuras 5 e 6) 21 .<br />
Numa série de 385 pacientes com pseudomixoma peritoneal, Su -<br />
garbaker relata sobrevida de cinco anos de 86% e 20%, respectivamente,<br />
para citorredução completa e incompleta mais QtIPH. As<br />
neoplasias malignas de estômago, cólons e ovário não adenoma mucinoso,<br />
entre outras, apresentam caráter invasivo, e a citorredução<br />
completa nas disseminações extensas não é factível na maioria das<br />
vezes, sendo este um importante fator prognóstico 10 .<br />
Glehen e cols. 12 , em estudo multicêntrico envolvendo 506 pacientes<br />
com carcinomatose peritoneal de origem colorretal tratados com<br />
citorredução associada a QtIPH, mostraram sobrevidas de 32,4 e<br />
8,4 meses, respectivamente, para citorredução completa e incompleta<br />
(p
• Pseudomixoma peritoneal<br />
• Mesotelioma peritoneal<br />
• Carcinoma de apêndice com<br />
disseminação mucinosa<br />
Possibilidade de citorredução<br />
CC0 ou CC1<br />
Seleção de pacientes<br />
1. Doença confinada à superfície peritoneal<br />
2. Redução máxima possível através de procedimentos<br />
de peritoniectomia e ressecções viscerais<br />
3. Possibilidade de utilização máxima de quimioterapia<br />
intraperitoneal e endovenosa para erradicar a doença<br />
da superfície peritoneal e evitar a progressão sistêmica<br />
4. Condição clínica favorável (KPS>70%)<br />
5. Ausência de terapêutica convencional eficaz<br />
Consentimento informado<br />
Laparotomia exploradora<br />
Origem da disseminação peritoneal<br />
• Ovário<br />
Após quimioterapia endovenosa<br />
com finalidade de consolidação<br />
ou para doença residual mínima<br />
Impossibilidade de citorredução<br />
CC0 ou CC1<br />
Cirurgia paliativa<br />
sem perfusão peritoneal<br />
Citorredução + quimioterapia<br />
intraperitoneal hipertérmica<br />
Avaliar quimioterapia endovenosa<br />
Seguimento<br />
Impossibilidade de<br />
citorredução CC0<br />
• Colorretal<br />
• Outros<br />
Fluxograma 1 Critérios e seleção de<br />
pacientes para cirurgia citorredutora<br />
e quimioterapia hipertérmica<br />
intraperitoneal 2,20<br />
Possibilidade de<br />
citorredução CC0<br />
Tratamento convencional para<br />
disseminação peritoneal<br />
<strong>Onco</strong>& junho/julho 2011 31
encontradas na peça operatória do tumor primário, metástases hepáticas<br />
e tumores pouco diferenciados se associaram ao mau prognóstico.<br />
7. Experiência do Departamento de Cirurgia Pélvica<br />
do Hospital A.C. Camargo, em São Paulo<br />
Iniciamos esse procedimento no início de 2001. Até o final de 2010<br />
tínhamos 114 pacientes e 121 procedimentos realizados, com resultados<br />
comparáveis aos melhores centros do mundo. Desse grupo de pacientes,<br />
a idade variou entre 25 e 71 anos (média de 48,2), o tempo<br />
cirúrgico entre 5,4 e 20 horas (média de 10,3 horas), a casuística entre<br />
sexo foi 32 homens (26,4%) e 89 mulheres (73,6%) e ocorreram 3<br />
óbitos (2,6%). A sobrevida global em cinco anos foi em torno de 65%,<br />
tendo melhores resultados pacientes portadores de pseudomixoma e<br />
mesotelioma, tumores não ou pouco invasivos (Figuras 7 e 8) 2,20 .<br />
Desse grupo de pacientes, 43 eram portadores de tumores do<br />
apêndice com implantes peritoneais, e 10 de mesotelioma. Dos tumores<br />
apendiculares, 10 tinham implantes oriundos de adenoma mucinoso<br />
do apêndice, e os demais, de adenocarcinoma de baixo grau.<br />
Vinte e quatro pacientes eram homens, e as demais, mulheres. A idade<br />
variou de 27 a 71 anos, com média de 48 anos 2,20 . À admissão, 24 pa-<br />
Survival Function<br />
Censored<br />
Figura 7 Sobrevida global de pacientes tratados<br />
com citorredução associada a QtIPH – 2001-2010<br />
32 junho/julho 2011 <strong>Onco</strong>&<br />
cientes (45,3%) apresentavam-se sem queixas clínicas relevantes. Entre<br />
os pacientes sintomáticos, a manifestação clínica mais comum foi o<br />
aumento do volume abdominal associado a ascite em 10 pacientes,<br />
seguida de massa abdominal palpável, em 4 casos.<br />
O principal procedimento realizado para o diagnóstico na institui -<br />
ção de origem, previamente ao encaminhamento, foi a laparotomia<br />
com biópsia ou ressecções parciais, em 21 casos (39,7%). Outras abordagens<br />
incluíram: laparoscopia com biópsia em 14 casos (26,4%) e<br />
apendicectomia em 9 (17%). Cinco pacientes (9,4%) apresentaram<br />
histórico de múltiplas abordagens cirúrgicas prévias, com ressecções<br />
paliativas. Além disso, 14 pacientes já haviam sido submetidos a tratamento<br />
prévio com quimioterapia sistêmica 2,20 .<br />
Alguns dados demográficos, bem como os tipos histológicos,<br />
podem ser verificados na Tabela 1.<br />
A duração do procedimento foi, em média, de 10,8 horas (6,5 a<br />
19,8 horas).<br />
A mensuração da disseminação peritoneal pelo sistema PCI apresentou<br />
uma pontuação média de 15,3, variando entre 2 e 39.<br />
Vinte e nove pacientes (54,8%) foram submetidos a citorredução<br />
Seguimento Total Seguimento Total<br />
Tu primário agrupado<br />
pseudomixoma/mesotelioma<br />
ccr e outros<br />
pseudomixoma/mesotelioma censored<br />
ccr e outros censored<br />
Figura 8 Sobrevida global por tipo de tumor de pacientes<br />
tratados com citorredução associada a QtIPH – 2001-2010
extensa com ressecção de víscera oca associada (gastrectomias parciais<br />
ou totais, enterectomias segmentares, colectomias parciais ou totais).<br />
Em 14 casos (26,4%) a citorredução envolveu apenas ressecção setorial<br />
do peritônio, com (8 casos) ou sem esplenectomia (6 casos). Procedimentos<br />
menores envolvendo ressecções isoladas de grande omento,<br />
vesícula biliar ou apêndice cecal totalizam os casos restantes.<br />
Apenas cinco procedimentos (9,5%) foram classificados com<br />
doença residual maior que 2,5 mm após a citorredução. Vinte e nove<br />
casos (54,7 %) foram considerados sem doença residual visível.<br />
Os quimioterápicos utilizados para perfusão peritoneal intraope ratória<br />
hipertérmica foram mitomicina C (73,6%), mitomicina C associada a<br />
Tabela 1: Características clínicas da população de estudo (n=53)<br />
Idade média (anos): 48 anos<br />
Variação de idade: 27 - 71 anos<br />
Sexo<br />
Masculino<br />
Feminino<br />
Histologia<br />
Apêndice cecal:<br />
- Adenoma<br />
- Adenocarcinoma GI<br />
Mesotelioma<br />
Duração média da cirurgia (mín. – máx.)<br />
PCI média (mín. – máx.)<br />
Extensão da ressecção<br />
Citorredução extensa com ressecção<br />
de víscera oca<br />
Peritoniectomia setorial, c/ esplenectomia<br />
Peritoniectomia setorial, s/ esplenectomia<br />
Ressecções menores<br />
Doença residual<br />
Ausência<br />
< 2,5mm<br />
2,5mm a 2,5cm<br />
> 2,5cm<br />
Tempo médio de internação (mín. – máx.)<br />
Permanência média em UTI (mín. – máx.)<br />
Pacientes (n) Pacientes (%)<br />
24<br />
29<br />
43<br />
10<br />
33<br />
10<br />
11h (6,5 – 19,8h)<br />
15,2 (2 – 39)<br />
25<br />
6<br />
6<br />
6<br />
22<br />
17<br />
2<br />
2<br />
45,3%<br />
54,7%<br />
81,1%<br />
18,9%<br />
Tabela 2: Características do procedimento cirúrgico, conforme o tipo de neoplasia<br />
Neoplasia do apêndice<br />
cecal (n=43)<br />
15,1 dias (5 – 41)<br />
3,2 dias (1 – 7)<br />
doxorrubicina (9,4%) e mitomicina associada a cisplatina (11,3%).<br />
A duração do período de internação hospitalar foi, em média,<br />
de 15 dias (5 a 41 dias), com permanência média em UTI de 3,4<br />
dias (1 a 16 dias) 2,20 .<br />
Esses dados podem ser avaliados para as neoplasias de apêndice<br />
cecal e mesotelioma, em separado, na Tabela 2.<br />
Vinte pacientes complementaram o tratamento com quimioterapia<br />
intraperitoneal no pós-operatório, com início no primeiro (13 casos)<br />
ou segundo (7 casos) dia após a cirurgia. Desses, 15 casos foram de<br />
neoplasias mucinosas do apêndice cecal (todos com 5-fluorouracil) e<br />
Mesotelioma<br />
peritoneal (n=10)<br />
9,7h (6,8 – 16h)<br />
15,7 (2 – 39)<br />
4<br />
2<br />
-<br />
4<br />
7<br />
2<br />
1<br />
-<br />
14 dias (8 – 27)<br />
4,3 dias (1 – 16)<br />
<strong>Onco</strong>& junho/julho 2011 33
5 casos de mesotelioma peritoneal (todos com paclitaxel).<br />
Ocorreram dois óbitos relacionados ao procedimento, corres -<br />
pondendo a 3,8% de mortalidade operatória.<br />
Após um período médio de seguimento de 39,1 meses (mediana<br />
de 35 meses; mínimo de 6 e máximo de 102 meses), 15 recorrências<br />
foram diagnosticadas, com intervalo médio de 41,6 meses (mediana de<br />
40 meses, mínimo de 3,7 meses e máximo de 95,7 meses). Quatro casos<br />
foram passíveis de reabordagem curativa, com nova citorredução e<br />
quimioterapia intraperitoneal hipertérmica.<br />
A sobrevida global em cinco anos, estimada pelo método de Kaplan-Meier,<br />
foi de 88,3% para os pacientes com neoplasias mucinosas<br />
do apêndice cecal, e de 60% para os pacientes com mesotelioma peritoneal.<br />
A sobrevida global dos pacientes dessa série de portadores de<br />
pseudomixoma peritoneal e mesotelioma, assim como as séries reportadas<br />
na literatura, foi significativamente melhor que a dos pacientes<br />
portadores de carcinomatose peritoneal por câncer colorretal e outros<br />
tumores (Figura 9) 2,20 .<br />
8. Considerações finais<br />
A cirurgia citorrredutora associada a QtIPH transoperatória é um procedimento<br />
cirúrgico padrão-ouro para pseudomixoma peritoneal e<br />
mesotelioma e para casos bem selecionados de implantes peritoneais<br />
34 junho/julho 2011 <strong>Onco</strong>&<br />
de tumores invasivos oriundos do ovário, do intestino grosso e outros.<br />
A taxa de mortalidade pós-operatória varia de 0% a 10%.<br />
Trata-se de procedimento cirúrgico de alta complexidade que<br />
deve ser realizado em centros de referência que contem com equipe<br />
cirúrgica com boa formação em cirurgia abdominopélvica, bom<br />
serviço de anestesiologia, hemoterapia e terapia intensiva. Nos tumores<br />
invasivos, não é um método que substitui a quimioterapia<br />
sistêmica mas que se soma a ela. Presença de doença fora da cavidade<br />
abdominal, condições clínicas inadequadas (KPS menor que<br />
70%), IDP maior que 20 para tumores invasivos, quadros de obs -<br />
trução intestinal e invasão extensa do mesentério são as principais<br />
contraindicações para o procedimento. IDP, tipo de citorredução,<br />
grau de malignidade do tumor, presença de linfonodos metastáticos<br />
na peça operatória, componente de células em anel de sinete, presença<br />
de metástases hepáticas e experiência da ins t ituição são fatores<br />
relacionados ao prognóstico.<br />
Há uma carência de estudos prospectivos aleatorizados sobre esse<br />
tema. Em tumores não invasivos, será difícil obtê-los pelos bons resultados<br />
conseguidos com o método, o que dificulta ou impossibilita a alocação<br />
de pacientes no grupo controle (somente cirurgia). Em tumores<br />
invasivos, a realização desses estudos torna-se necessária para realmente<br />
co nhecermos melhor os reais candidatos ao procedimento.<br />
Figura 9 Sobrevida global de pacientes com neoplasias mucinosas do apêndice cecal (n=43) e mesotelioma<br />
peritoneal (n=10), tratados com cirurgia citorredutora e quimioterapia intraperitoneal hipertérmica
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Divulgação<br />
36 junho/julho 2011 <strong>Onco</strong>&<br />
emergências oncológicas<br />
Luiz Gustavo Torres<br />
* Médico oncologista do<br />
Centro de Tratamento<br />
<strong>Onco</strong>lógico (CENTRON)<br />
Contato:<br />
torres.luizgustavo@gmail.com<br />
Daniel Tabak<br />
* Hematologista-<strong>Onco</strong>logista;<br />
diretor médico do Centro de<br />
Tratamento <strong>Onco</strong>lógico (CENTRON);<br />
membro titular da Academia<br />
Nacional de Medicina<br />
Contato: dantabak@terra.com.br<br />
Neutropenia febril e câncer –<br />
parte 1<br />
Introdução<br />
AFEBRE EM PACIENTE NEUTROPÊNICO É CONSI -<br />
DERADA UMA EMERGÊNCIA MÉDICA. DURANTE O<br />
PERÍODO DE NEUTROPENIA PÓS-QUIMIOTERAPIA,<br />
a febre pode ser o único indicativo de infecção, já<br />
que os sinais e sintomas de inflamação estarão<br />
atenuados. A incidência de febre relacionada à neutropenia<br />
é documentada entre 10% e 50% em pacientes<br />
com tumores sólidos e até 80% nas<br />
neo plasias hematológicas após pelo menos um ciclo<br />
de qui mioterapia. O advento dos antibióticos de<br />
largo espectro permitiu o uso de regimes qui -<br />
mioterápicos mais agressivos, visto que as infecções<br />
respondiam por cerca de 75% da mortalidade relacionada<br />
à quimioterapia.<br />
Definição<br />
A febre em pacientes neutropênicos é definida<br />
como temperatura isolada (única medida) de 38,3<br />
graus Celsius ou sustentada de 38 graus (duas<br />
tomadas em intervalo de 1 hora). Deve-se ter<br />
atenção especial para idosos e usuários crônicos de<br />
glicocorticoides, nos quais é maior o risco de infecção,<br />
mesmo na ausência de febre.<br />
A neutropenia é usualmente definida como<br />
contagem absoluta de neutrófilos (CAN) < 500<br />
células/mm 3 ou
por amostra de ambas as vias do cateter e sangue periférico ou sangue<br />
periférico de sítios de punção diferentes em caso de ausência de acesso<br />
venoso central).<br />
O rastreamento microbiológico em outros materiais (urina, escarro,<br />
líquor, pele e fezes) deve ser realizado quando houver indicação<br />
clínica. Broncoscopia para coleta de lavado broncoalveolar deve ser<br />
considerada em caso de infiltrado pulmonar suspeito.<br />
Estudos recentes para avaliação da utilidade de marcadores inflamatórios<br />
(proteína C reativa, procalcitonina, interleucina 6 e 8) em<br />
pacientes neutropênicos com câncer foram inconsistentes. Não devem<br />
ser usados, portanto, para guiar terapia antimicrobiana.<br />
3. Exames de imagem: radiografia de tórax deve ser solicitada mesmo<br />
na ausência de sintomas respiratórios. Tomografias devem ser rea -<br />
lizadas apenas quando clinicamente indicadas.<br />
Terapia antibiótica<br />
A antibioticoterapia empírica deve ser direcionada aos patógenos mais<br />
comuns e mais virulentos, que podem oferecer risco iminente de morte<br />
ao neutropênico. Há algumas décadas, estudos apontavam taxa de mortalidade<br />
de até 70% em caso de retardo no início dos antibióticos. Relatos<br />
subsequentes a partir do final dos anos 70, após a implementação da<br />
antibioticoterapia de largo espectro, demonstraram clara associação entre<br />
o uso precoce dos antibióticos e a queda na taxa de mortalidade.<br />
O isolamento de bactérias gram-positivas acontece em maior frequência<br />
se comparado ao isolamento de gram-negativas. No entanto,<br />
as infecções por gram-negativas estão relacionadas a maior<br />
taxa de mortalidade. A cobertura inicial contra P. aeruginosa permanece<br />
amplamente recomendada pela alta mortalidade associada<br />
a essa infecção.<br />
Alto risco<br />
Pacientes considerados de alto risco devem receber antibioticote -<br />
rapia venosa com cobertura abrangente para germes gram-negativos,<br />
incluindo P. aeruginosa. São consideradas terapias de primeira linha:<br />
cefepima, piperacilina-tazobactam e carbapenêmicos. Uma metanálise<br />
recente comparou o uso isolado de betalactâmicos a associação betalactâmicos<br />
e aminoglicosídeos, demonstrando equivalência das tera -<br />
pias com perfil de toxicidade favorável a monoterapia.<br />
Amplamente aceita e recomendada, a monoterapia com cefepima<br />
tem sido recentemente questionada. Uma metanálise publicada em<br />
2007 por Yahav e colaboradores envolvendo 19 ensaios randomizados<br />
apontou um aumento na mortalidade associada ao uso do cefepima<br />
quando comparado a outros betalactâmicos (RR 1,41; 95% IC, 1,08-<br />
1,84). Apesar desse resultado conflitante, a monoterapia com cefepima<br />
continua sendo recomendada.<br />
A cobertura adicional empírica para gram-positivos não deve ser<br />
realizada de rotina em pacientes com neutropenia febril. Além de não<br />
estar associada a benefício clínico, o uso da vancomicina pode promover<br />
resistência em cepas como enterococos e S. aureus. Estafilococos<br />
coagulase-negativos, que são a principal causa de bacteriemia identificável<br />
em pacientes neutropênicos, são patógenos fracos e raramente<br />
provocam rápida deterioração clínica. Sendo assim, não há urgência<br />
para a associação empírica da vancomicina.<br />
No entanto, existem algumas situações clínicas em que a utilização<br />
empírica da vancomicina deve ser fortemente considerada. A<br />
frequente associação de choque séptico a S. aureus e a difusão de<br />
cepas resistentes a meticilina (MRSA) levam à recomendação de uso<br />
em caso de instabilidade hemodinâmica. Infecções por estreptococos<br />
viridans podem ser resistentes a betalactâmicos e fluoroquinolonas<br />
e estão usualmente ligadas a condições encontradas em<br />
pacientes neutropênicos, como mucosite gastrointestinal ou uso profilático<br />
de quinolonas.<br />
Uma alternativa à vancomicina em pacientes intolerantes é a<br />
linezolida. Em ensaio multicêntrico e randomizado, Jaksic e cola -<br />
boradores compararam o uso da vancomicina (1 g a cada 12 horas)<br />
com o da linezolida (600 mg a cada 12 horas), tendo encontrado<br />
taxa de mortalidade equivalente e perfil de toxicidade discretamente<br />
favorável à linezolida.<br />
Indicações para associação empírica da vancomicina:<br />
- Suspeita de sepse relacionada a cateter venoso;<br />
- Instabilidade hemodinâmica;<br />
- Pneumonia documentada radiologicamente;<br />
- Hemocultura positiva (gram-positivo, mesmo antes da identificação<br />
final);<br />
- Infecção de pele ou partes moles;<br />
- Colonização por MRSA;<br />
- Mucosite severa, em caso de pacientes em profilaxia com fluoroquinolona.<br />
*Em pacientes considerados de alto risco e alérgicos a betalactâmicos,<br />
a associação de ciprofloxacina a vancomicina ou clindami -<br />
cina é uma boa opção.<br />
A adição inicial dos aminoglicosídeos deve ser considerada apenas<br />
no caso de instabilidade hemodinâmica. O risco de infecção por bactérias<br />
gram-negativas resistentes também precisa ser avaliado pela<br />
história clínica do paciente ou pelo padrão de sensibilidade do hospital.<br />
Nesse caso, o uso dos aminoglicosídeos pode estar indicado. Em<br />
pacientes com disfunção renal, o ciprofloxacino aparece como opção<br />
aos aminoglicosídeos.<br />
<strong>Onco</strong>& junho/julho 2011 37
Doses dos antibióticos usualmente usados em<br />
neutropenia (em adultos com função renal normal)<br />
Ceftazidima<br />
Cefepima<br />
Piperacilina/Tazobactam<br />
Imipenem<br />
Meropenem<br />
Vancomicina<br />
Linezolida<br />
Metronidazol<br />
Anfotericina B lipossomal<br />
Itraconazol<br />
Voriconazol<br />
Caspofungina<br />
*Cancer principles and practice of oncology, 8th edition, DeVita,<br />
Hellman and Rosenberg’s<br />
Baixo risco<br />
Pacientes com baixo risco de complicação durante o curso da neutropenia<br />
podem ser considerados candidatos a antibioticoterapia por<br />
via oral. Devem estar ausentes todos os critérios considerados de alto<br />
risco. Dois grandes estudos randomizados de comparação entre terapia<br />
oral com ciprofloxacina e amoxicilina-clavulanato versus terapia<br />
venosa mostraram equivalência. Deve-se levar em conta, no entanto,<br />
que os pacientes foram acompanhados em unidade hospitalar e não<br />
em regime ambulatorial.<br />
O uso isolado da ciprofloxacina deve ser desencorajado mesmo<br />
nos pacientes de baixo risco, pela cobertura imprópria para germes<br />
gram-positivos. Se comparada à ciprofloxacina, a levofloxacina tem<br />
maior cobertura para gram-positivos e pode oferecer boa cobertura<br />
para P. aeruginosa quando usada na dose de 750 mg/dia. No entanto,<br />
até a presente data faltam dados mais robustos na literatura para justificar<br />
também a monoterapia com levofloxacina mesmo na população<br />
de baixo risco.<br />
A terapia antimicrobiana oral apresenta óbvias vantagens, como<br />
menor custo, menos toxicidade e melhor aceitação dos pacientes.<br />
38 junho/julho 2011 <strong>Onco</strong>&<br />
2 g a cada 8 horas<br />
2 g a cada 8-12 horas<br />
4,5 g a cada 6 horas<br />
500 mg a cada 6 horas<br />
1-2 g a cada 8 horas<br />
1 g a cada 12 horas<br />
600 mg a cada 12 horas<br />
500 mg a cada 6-8 horas<br />
3 mg/kg/dia<br />
200 mg (IV) a cada 12 horas (4 doses)<br />
seguidos de 200 mg/dia<br />
6 mg/kg a cada 12 horas (2 doses)<br />
seguidos de 3 mg/kg a cada 12 horas<br />
70 mg/dia (1 dose)<br />
seguidos de 50 mg/dia<br />
Poucos estudos publicados, no entanto, investigam a segurança da<br />
manutenção dos pacientes em regime ambulatorial quando comparado<br />
à terapia padrão intra-hospitalar. Estudos recentes têm sugerido que<br />
após breve período de internação (24 horas) seria seguro manter os<br />
pacientes em regime ambulatorial. Esse breve período de observação<br />
serviria para confirmar a estabilidade clínica, descartar sepse fulminante,<br />
avaliar o suporte familiar e realizar o rastreamento microbio -<br />
lógico com a coleta de amostras para culturas. Tendo-se optado pelo<br />
seguimento ambulatorial do tratamento, é fundamental que o paciente<br />
tenha acesso à equipe médica 24 horas por dia, 7 dias por semana e<br />
pronto acesso ao hospital.<br />
Quando a antibioticoterapia deve ser modificada?<br />
Um acompanhamento clínico rigoroso, com exame físico diário,<br />
atenção a novos sintomas e monitoramento das culturas (com novas<br />
coletas de qualquer sítio suspeito novo), é de fundamental importância<br />
para um desfecho favorável. Febre persistente isolada em pacientes<br />
clinicamente estáveis raramente indica necessidade de alteração do<br />
regime antibiótico empregado. De forma geral, acréscimos ou mudança<br />
da terapia empírica inicial devem ser guiados por modificação<br />
da condição clínica ou resultados das culturas. Exceção deve ser feita<br />
aos pacientes considerados de baixo risco e, portanto, em uso de antibioticoterapia<br />
oral. Nesse grupo, se não houver controle da febre após<br />
48 horas de antibióticos, deve-se considerar internação hospitalar para<br />
terapia antimicrobiana venosa e vigilância clínica.<br />
Apesar do uso frequente da vancomicina em pacientes neutropênicos,<br />
não há benefício demonstrado na sua adição em casos de febre<br />
persistente ou recrudescente. Em estudo prospectivo, randomizado,<br />
que avaliou a adição da vancomicina ao uso da piperacilina-tazobactan,<br />
Wade e colaboradores não encontraram diferença significativa,<br />
tendo como desfecho o desaparecimento da febre após 72 horas.<br />
Quando a vancomicina compõe o regime inicial, recomenda-se fazer<br />
a descontinuação da droga caso não seja observado crescimento de<br />
germes gram-positivos nas culturas coletadas na admissão após<br />
período de 48 horas de incubação.<br />
Caso de febre persistente<br />
Em caso de febre persistente após 48-72 horas de antibiótico em<br />
pacientes clinicamente estáveis, deve-se realizar novo rastreamento<br />
para identificar o sítio infeccioso. Coleta de novo set de hemoculturas,<br />
pesquisa de toxina de Clostridium difficile nas fezes (na presença de<br />
diar reia e/ou dor abdominal) e tomografias conforme indicação clínica<br />
(ex.: a dos seios da face e a do tórax são recomendadas em pacientes<br />
com alto risco de infecção fúngica invasiva) devem ser considerados.<br />
Causas não infecciosas como febre relacionada a droga, tromboflebite,<br />
neoplasia de base e hematomas volumosos devem ser lembradas como<br />
possíveis agentes causais.<br />
Em pacientes clinicamente instáveis está indicada a substituição<br />
do regime antibiótico (cefalosporinas ou piperacilina/tazobactam)
pelos carbapenêmicos em associação com aminoglicosídeos e cobertura<br />
fúngica anticândida com fluconazol ou novos antifúngicos (em<br />
caso de pacientes em uso profilático de fluconazol).<br />
Nos casos de febre persistente após o quarto dia de antibioticote -<br />
rapia em pacientes estáveis mas ainda sem recuperação medular iminente,<br />
cabe considerar fortemente o rastreamento de infecção fúngica<br />
invasiva (TC de tórax e seios da face) e iniciar terapia antifúngica empírica<br />
(com cobertura para fungos filamentosos, como asper gilose).<br />
São aceitas as seguintes opções: anfoteri cina B (prefe rencialmente lipossomal),<br />
caspo fungina, itraconazol e voriconazol.<br />
Usado como profilaxia em pacientes de alto risco de infecção fún -<br />
gica, o fluconazol não exerce papel profilático no desenvolvimento de<br />
infecção por fungos filamentosos (aspergilose, zigomicose e fusariose),<br />
que ocorrem quase que exclusivamente em pacientes com neutropenia<br />
grave (< 100 cels/mm 3 ) e prolongada (> 10 dias).<br />
Por quanto tempo manter os antibióticos?<br />
Nos casos em que é documentada infecção, clínica ou microbiologicamente,<br />
a duração da terapia deve ser ditada pelo germe e pelo<br />
sítio envolvidos. Quando não se identifica agente ou foco de infecção<br />
evidente, recomenda-se a descontinuação da terapia apenas após<br />
atingido o patamar acima de 500 neutrófilos/mm 3 .<br />
Referências bibliográficas<br />
1. Freifeld AG, Bow EJ, Sepkowitz KA, et AL. Clinical practice guideline for<br />
the use of antimicrobial agents in neutropenic patients with câncer. 2010<br />
update by the Infectious Diseases Society of America. Clin Infect Dis 2011;<br />
52:56-93<br />
2. DeVita, Hellman, and Rosenberg s. Cancer Principles & Practice of <strong>Onco</strong>logy<br />
8th edition. Chapter 62.<br />
3. Paul M, Soares-Weiser K, Grozinsky S, ET AL. Baet-lactam versus beta-lactam-aminoglycoside<br />
combination therapy in câncer patients with neutropenia.<br />
Cochrane Database Syst Ver 2003: CD003038.<br />
4. Yahav D, Paul M, Fraser A, ET AL. Efficacy and safety of cefepime: A systematic<br />
review and meta-analysis. Lancet infect Dis 2007; 7:338-48.<br />
5. Jaksic B, Martinelli G, Perez-Oteyza J, et al. Efficacy and safety of linezolid<br />
compared with vancomycin in a randomized, double-bind study of febrile<br />
neutropenic patients with cancer. Clin Infect Dis 2006; 42:597.<br />
6. Wade JC, Glasmacher A. Vancomycin does not benefit persistently febrile<br />
neutropenic people with cancer. Cancer Treat Ver 2004; 30:119-26.
do bem<br />
OPROCESSO DE MORTE É UMA SITUAÇÃO MUITO PARTICULAR. É PRE-<br />
CISO SUPORTE PSICOLÓGICO, SOCIAL E ESPIRITUAL PARA QUE SEJA<br />
CONDUZIDO DE FORMA ADEQUADA, OFERECENDO QUALIDADE DE<br />
vida pelo maior tempo possível. Mas o que fazer quando remédios e<br />
tratamentos clínicos não surtem mais efeito? A resposta pode estar nos<br />
hospices, espaços de acolhimento onde pacientes que esgotaram todas<br />
as possibilidades de tratamentos curativos podem passar seus últimos<br />
momentos de vida de forma digna. Além de se beneficiarem com<br />
cuidados paliativos, eles liberam os leitos de hospitais para quem ainda<br />
tem condições de cura.<br />
A proposta é melhorar a qualidade de vida dos pacientes por meio<br />
de assistência multiprofissional, com equipes formadas por médico,<br />
enfermeiro, psicólogo, fisioterapeuta, nutricionista, fonoaudiólogo, assistente<br />
social, terapeuta ocupacional, voluntários e até religiosos. “Dependendo<br />
do tipo de atendimento, outros profissionais da área de<br />
saúde podem ser consultados”, explica Judimara Gozzani, responsável<br />
pela implantação do futuro Hospice Infantil da Santa Casa de São Paulo<br />
(saiba mais no quadro).<br />
Não há como padronizar o tempo de internação; ele vai depender<br />
da doença tratada e da proposta de serviço. “No caso de pacientes com<br />
câncer, devido à evolução mais aguda, o tratamento deve ser mais objetivo,<br />
porque o quadro clínico evolui de forma mais rápida e a internação<br />
acaba sendo mais curta. Já um idoso com uma demência pode<br />
precisar de cuidados por períodos prolongados”, explica Maria Goretti<br />
Maciel, diretora do Serviço de Cuidados Paliativos do Hospital do<br />
Servidor Público Estadual de São Paulo. Também é possível internar<br />
um paciente que tenha câncer avançado e esteja com pneumonia, dor<br />
ou outra complicação da doença. “Você interna, trata aquela complicação<br />
e depois dá alta”, destaca.<br />
Apesar de bastante difundido pelo mundo, no Brasil os hospices<br />
ainda são iniciativas isoladas. “Existem algumas instalações semelhantes<br />
em Campinas, Ribeirão Preto, algumas hospedarias e unidades de<br />
40 junho/julho 2011 <strong>Onco</strong>&<br />
Cuidado e consolo<br />
até o fim<br />
Ainda raros no Brasil, hospices proporcionam cuidado<br />
multidisciplinar e aliviam a dor e o sofrimento<br />
de pacientes fora das possibilidades terapêuticas<br />
Por Sergio Azman<br />
cuidados paliativos em hospitais, como os do Servidor Público Muni -<br />
cipal e Estadual”, afirma Toshio Chiba, coordenador-geral do Programa<br />
de Cuidados Paliativos do Instituto do Câncer do Estado de São Paulo<br />
(Icesp). Entre os hospices privados, os mais conhecidos são o Premier<br />
Residence Hospital, que atende pacientes idosos com sequelas, com<br />
média de internação um pouco mais longa; e a Clínica Sainte-Marie,<br />
ambos em São Paulo.<br />
Para Ricardo Caponero, oncologista clínico da Clínica de <strong>Onco</strong>logia<br />
Médica de São Paulo e ex-presidente da Associação Brasileira de Cuidados<br />
Paliativos, embora não se enquadrem no modelo ideal preconizado<br />
pela Organização Mundial da Saúde (OMS), algumas iniciativas têm<br />
se aproximado do conceito. “O HC-IV – INCA, em Vila Isabel, Rio de<br />
Janeiro, oferece cuidados paliativos de qualidade, mas num contexto<br />
em que a estrutura financeira ainda deriva de verbas destinadas ao Ins -<br />
tituto Nacional de Câncer, e não da remuneração do trabalho em cuidados<br />
paliativos. Nesse sentido, ele é um grande prestador de cuidados<br />
paliativos com algumas características de hospice, mas se ajusta muito<br />
mais a um hospital voltado ao primor no controle de sintomas.”<br />
O que falta?<br />
Mas, afinal, por que os hospices não são uma prática comum no Brasil?<br />
Os especialistas acreditam que seja pela união de alguns fatores, como<br />
cultura do país, custo e educação, ou a falta dela. Segundo Caponero,<br />
alguns dos trabalhos que serão apresentados no congresso da American<br />
Society of Clinical <strong>Onco</strong>logy (ASCO) deste ano, em Chicago, e alguns<br />
dos textos do “Educational Booklet”, um resumo das aulas teóricas<br />
apresentadas durante o evento, apontam exatamente para as diferenças<br />
culturais na aceitação dos hospices. “A cultura brasileira ainda está<br />
muito voltada para a tecnocracia da medicina, a busca da cura por<br />
todos os meios, médicos ou através de métodos complementares. A<br />
educação para a morte e a aceitação dela como um fenômeno natural<br />
do processo de viver estão longe do senso comum”, diz.
Chiba concorda que a aceitação da morte não<br />
seja uma ideia realmente disseminada. “Uma das<br />
barreiras é o conceito de que é preciso alocar recursos,<br />
muitas vezes desnecessários, que sabidamente<br />
não funcionam naquela situação em que o<br />
paciente se encontra. Isso está errado. É preciso alocar<br />
os recursos adequados para que a pessoa,<br />
mesmo fora das possibilidades terapêuticas de<br />
tratamento específico, receba um alívio de dor e de<br />
sofrimento físico nessa fase final da vida. E isso inclusive<br />
é uma crítica à sociedade, que acredita que<br />
o paciente tem de sobreviver a qualquer custo. A<br />
natureza não é assim. Com isso, começa a ter uma<br />
inversão de valores, em que a medicina aumenta o<br />
sofrimento em vez de ajudar”, explica.<br />
Ana Cláudia Arantes, integrante do corpo<br />
clínico do Hospital Israelita Albert Einstein e presidente<br />
da Casa do Cuidar, instituição de cuidados<br />
paliativos para formação e assistência domiciliar,<br />
acredita que o preconceito em relação à morte exista<br />
principalmente por parte dos médicos. “Os profissionais<br />
têm muita dificuldade em conversar sobre<br />
terminalidade com seus pacientes graves, e a família<br />
também tem bastante medo de tocar no assunto”,<br />
diz. Aliás, como em qualquer unidade de cuidados<br />
paliativos, a família é tão importante quanto o<br />
doente. “A gente sempre conversa com os familiares,<br />
toma as decisões em conjunto”, ressalta Goretti.<br />
Os custos são outro fator. Não porque sejam<br />
altos, mas porque não estão definidos. Caponero explica<br />
que atualmente o Sistema Único de Saúde<br />
(SUS) remunera a assistência domiciliar e o Programa<br />
de Saúde da Família (PSF), mas tem uma<br />
abrangência muito mais limitada. “O interessante é<br />
que o SUS tornou obrigatórios, por portaria, a as-<br />
Primeiro hospice<br />
infantil do Brasil<br />
A Santa Casa de São Paulo deve inaugurar um<br />
hospice infantil em cerca de um ano. A estrutura<br />
terá sete apartamentos e poderá atender,<br />
no ambiente ambulatorial, até 3 mil crianças<br />
por ano, na faixa etária de 0 a 15 anos.<br />
Segundo Judimara Gozzani, responsável<br />
pela implantação, a estrutura e os recursos são<br />
os mesmos para hospices adultos e infantis,<br />
com algumas adaptações pa ra os pacientes pe -<br />
sistência à dor e os cuidados paliativos para todos os<br />
centros de referência em oncologia. No entanto, não<br />
se estabeleceu a forma como esses centros são remunerados.<br />
Por exemplo, como cobrar pela assistência<br />
multiprofissional que inclui, não só, mas também, a<br />
assistência espiritual? Como seguir à risca as recomendações<br />
da OMS e estender a assistência ao<br />
período do luto? Nesse caso, como se remunera o<br />
atendimento aos familiares do paciente que já faleceu?”,<br />
questiona. Segundo ele, na esfera privada, as<br />
tabelas adotadas pela maioria dos planos de saúde<br />
não englobam os cuidados paliativos. “No entanto,<br />
algumas poucas operadoras estão começando a discutir<br />
e implementar iniciativas nesse sentido.”<br />
Por não utilizar uma infraestrutura tecnológica<br />
diátricos. “Quando forem atendidas em ambiente<br />
especial (hospice), as crianças terão mais<br />
conforto e deixarão leitos do hospital terciário<br />
livres para quem precisa.”<br />
Além da equipe multi disciplinar, o hospice<br />
terá alguns apartamentos para in ternações de<br />
curto prazo, com a finalidade de resolver pro -<br />
blemas que a família esteja enfrentando com o<br />
paciente em seu domicílio. “Também teremos<br />
um apar tamento especial para o fim da vida,<br />
quando a família não tem condições ou não deseja<br />
que o paciente morra em casa”, conta.<br />
<strong>Onco</strong>& junho/julho 2011 41
“ A educação para a<br />
morte e a aceitação<br />
dela como um<br />
fenômeno natural<br />
do processo de viver<br />
estão longe do<br />
senso comum.”<br />
42 junho/julho 2011 <strong>Onco</strong>&<br />
avançada e cara, o maior custo em cuidados paliativos<br />
é mesmo o recurso humano. “A equipe passa por um<br />
estresse muito grande, tem de ser muito bem treinada<br />
e remunerada. No Hospital do Servidor Público Estadual,<br />
temos uma enfermaria com dez leitos, com<br />
uma média de 15 a 20 pacientes por semana. A rotatividade<br />
é alta, às vezes são sete, oito óbitos nesse<br />
período. Além disso, tem de ter um tempo diferente,<br />
não dá para atender correndo. Tem de ter paciência,<br />
disponibilidade e tempo para conversar com a família<br />
e com o paciente”, afirma Goretti.<br />
Educação contra dor<br />
Segundo Chiba, durante o tratamento de câncer, mais<br />
de 90% dos pacientes sentem dor. Desses, 60% sentem<br />
dor lancinante. “E educação contra a dor é uma<br />
situação deficitária no Brasil. Não existe a formação<br />
em universidades nem a chancela da Associação<br />
Médica Brasileira. Atualmente está sendo aprovado<br />
no Conselho Federal de Medicina o reconhecimento<br />
dessa área de atuação, graças ao trabalho da Academia<br />
Nacional de Cuidados Paliativos junto com o<br />
Ministério Público e o Ministério da Saúde”, explica.<br />
Ana Cláudia acredita que, em primeiro lugar,<br />
existe a necessidade de oferecer formação na área.<br />
“Em outros países, essa é uma disciplina obrigatória<br />
na graduação. Mas ainda não existe essa formação<br />
nas faculdades do Brasil.”<br />
Para ela, a partir do momento em que se tem<br />
profissionais qualificados para oferecer esses cuidados,<br />
é interessante que cada hospital conte com<br />
pelo menos uma equipe nuclear para dar essa as-<br />
Exclusivamente oncológico<br />
O projeto piloto do Núcleo Avançado de Cuida-<br />
dos Especiais (NACE), do Instituto do Câncer do<br />
Estado de São Paulo (Icesp), começou em setem-<br />
bro de 2009, em Cotia, com dez leitos. Atual-<br />
mente, 40 leitos são destinados a pacientes que<br />
estão fora das possibilidades terapêuticas de cura.<br />
“A ocupação é sempre grande, cerca de 90%.<br />
Por isso, só atendemos pacientes encaminhados<br />
pelo Instituto do Câncer. Apesar de fazermos<br />
parte do sistema do Hospital das Clínicas, não<br />
conseguimos atender a demanda de pacientes<br />
com outras patologias que necessitam de cuida-<br />
sistência. “As pessoas que estão na fase de terminalidade<br />
irão se beneficiar muito disso. Principalmente<br />
pelo fato de que não serão submetidas a<br />
procedimentos contraindicados”, diz.<br />
Hospice no SUS?<br />
Apesar de reconhecer a importância dos hospices<br />
para pacientes com doenças fora das possibilidades<br />
de tratamento, os médicos acreditam que essa não<br />
seria a solução mais adequada em termos de cuidados<br />
paliativos para a saúde pública.<br />
Para Chiba, o modelo de expansão de cuidados<br />
paliativos avançados deveria se basear no sistema de<br />
assistência domiciliar. “Programas como o Núcleo<br />
Avançado de Cuidados Especiais (NACE) são fundamentais<br />
para fins de formação. Mas como modelo<br />
de expansão, para cuidados paliativos no hospital,<br />
eu acredito que deveria ser através do sistema de assistência<br />
domiciliar. Antes, todo mundo morria em<br />
casa. De umas três gerações para cá, todos morrem<br />
no hospital. Por isso, ainda vai demorar para que<br />
esse quadro seja revertido e o sistema de saúde passe<br />
a investir nos cuidados em casa.”<br />
Para Goretti, o ideal seria a criação de uma enfermaria<br />
no hospital geral. “É caro manter uma estrutura<br />
extra-hospitalar, é mais fácil pegar uma ala<br />
do hospital e destinar aos cuidados paliativos. Além<br />
disso, quando é feito dentro do hospital geral, nós<br />
podemos exercer um papel didático importantíssimo,<br />
disseminar o conhecimento para que os<br />
médicos possam entender melhor o que é o cui -<br />
dado paliativo”, defende.<br />
dos paliativos avançados”, explica Toshio Chiba,<br />
coordenador-geral do Programa de Cuidados<br />
Paliativos do Icesp.<br />
O trabalho específico e técnico é realizado pela<br />
equipe multiprofissional, composta por médicos,<br />
enfermeiras, psicólogos, assistentes sociais, terapeutas<br />
ocupacionais, entre outros. Além disso, oferece<br />
a possibilidade da permanência de familiares e não<br />
restringe os horários para visitas, diferentemente do<br />
que acontece nos hospitais. “No NACE existe flexi -<br />
bilidade nos horários de visitas e no número de<br />
visitantes, e também é possível trazer crianças, ca -<br />
chorros, gatos. É uma situação bastante facilitada,<br />
basta avisar antes”, explica.
curtas<br />
Sanofi-aventis<br />
lança Jevtana ®<br />
(cabazitaxel)<br />
no Brasil<br />
Imagens: divulgação<br />
A sanofi-aventis Brasil anuncia o<br />
lançamento de Jevtana ® (cabazitaxel)<br />
injetável no mercado brasileiro, para<br />
o tratamento de pacientes com câncer<br />
da próstata metastático hormoniorrefratário<br />
tratados anteriormente com<br />
esquema contendo docetaxel.<br />
Jevtana ® associado à prednisolo -<br />
na/prednisona foi aprovado com base<br />
nos resultados do estudo TROPIC de<br />
fase III, que envolveu 755 pacientes<br />
com câncer da próstata metastático<br />
hormoniorrefratário tratados ante -<br />
riormente por quimioterapia à base<br />
de docetaxel. Os resultados de -<br />
monstra ram uma redução estatisticamente<br />
significativa de 30% [HR=0,70<br />
(IC 95%: 0,59-0,83); p
FDA aprova teste de HPV para rastreamento de câncer cervical nos EUA<br />
A Roche Molecular Diagnostics obteve recentemente a aprovação do<br />
FDA, órgão regulador norte-americano, para o teste cobas HPV para uso<br />
nos EUA. O novo teste cobas HPV é realizado no sistema cobas RMD<br />
4800 e é o único que detecta, individualmente, os genótipos de HPV 16<br />
e 18, além de identificar simultaneamente outros 12 tipos de HPV de alto<br />
risco como um resultado combinado.<br />
Sua rápida aprovação – em apenas oito meses – aconteceu, em<br />
parte, graças aos resultados conclusivos do estudo ATHENA, que envolveu<br />
47 mil mulheres e é o maior estudo para registro realizado nos<br />
EUA para rastreamento do câncer cervical.<br />
Parte dos resultados do estudo ATHENA foi publicada inicialmente<br />
no American Journal of Clinical Pathology, em fevereiro. Os resultados<br />
demonstraram que 1 em cada 10 mulheres com idade acima de 30 anos que apresentaram resultado positivo para HPV dos tipos<br />
16 e/ou 18 com o teste cobas HPV tinha pré-câncer de colo do útero, apesar do resultado normal de seu teste de Papanicolau.<br />
Fundação do Câncer faz campanha<br />
para comemorar 20 anos<br />
Para comemorar seus<br />
20 anos, a Fundação<br />
do Câncer pro mo -<br />
verá a partir de ju -<br />
nho uma campanha<br />
para apresentar os<br />
resultados dos esforços<br />
no combate à<br />
doença nesse pe -<br />
ríodo. Foca da no tema otimismo, ela será veiculada em meios<br />
eletrônicos, impressos, on-line e também em redes sociais.<br />
Uma das ações inovadoras se dará através de um aplicativo integrado<br />
com o Facebook: o usuário que clicar na linha do tempo do hotsite<br />
da campanha ganhará uma linha do tempo personalizada com as<br />
principais datas dos conteúdos postados no seu perfil (aniversário, casamento,<br />
nascimento do filho, título do clube para o qual torce) associadas<br />
aos eventos que marcaram a história da Fundação do Câncer.<br />
Para o superintendente da instituição, Jorge Alexandre Cruz, o<br />
objetivo é mostrar que a participação da sociedade civil é fundamental<br />
para apoiar ações de prevenção, detecção precoce e combate da<br />
doença. “No mundo todo, os governos sozinhos não dão conta do<br />
câncer. Por isso é tão importante mostrar os resultados do trabalho<br />
realizado”, explica.<br />
Maior sobrevida com uso de<br />
cetuximabe no tratamento<br />
de primeira linha em pacientes<br />
com câncer colorretal metastático<br />
Uma análise atualizada do estudo CRYSTAL de fase III publicada<br />
na última edição do Journal of Clinical <strong>Onco</strong>logy incluiu uma<br />
avaliação da sobrevida global, conforme o status de mutação do<br />
gene KRAS em pacientes com câncer colorretal metastático<br />
(CCRm), e mostrou que a adição de cetuximabe, do laboratório<br />
Merck Serono, à quimioterapia padrão (FOLFIRI) em pacientes<br />
com gene KRAS selvagem resultou em aumento de sobrevida<br />
global de 3,5 meses, comparado com tratamento com FOLFIRI<br />
isoladamente. O estudo CRYSTAL é o único a demonstrar até<br />
hoje expressiva melhora de sobrevida global de uma terapiaalvo<br />
associada com quimioterapia padrão (FOLFIRI) em tratamento<br />
de primeira linha do CCRm.<br />
O estudo CRYSTAL, multicêntrico e randomizado, envolveu<br />
1.198 pacientes para investigar a eficácia e a segurança do uso de<br />
cetuximabe em associação com FOLFIRI versus FOLFIRI isoladamente<br />
no tratamento de primeira linha de pacientes com CCRm.<br />
Em 2008, o estudo CRYSTAL foi reconhecido pela Sociedade<br />
Americana de <strong>Onco</strong>logia Clínica (ASCO) como um dos “maiores<br />
avanços clínicos em oncologia” naquele ano.<br />
<strong>Onco</strong>& junho/julho 2011 45
calendário<br />
II Congresso Brasileiro de<br />
Fisioterapia em <strong>Onco</strong>logia<br />
2011 ASCO Annual Meeting 3 a 7 de junho Chicago, IL, EUA www.asco.org<br />
1 o Fórum de <strong>Onco</strong>logia<br />
Pediátrica do Rio de Janeiro<br />
Simpósio Internacional de<br />
Mastologia (SIMRIO 2011)<br />
14 de junho Rio de Janeiro, RJ www.foprio.org.br<br />
17 e 18 de junho Rio de Janeiro, RJ www.inca.gov.br<br />
Uro-<strong>Onco</strong> 2011 17 de junho Ribeirão Preto, SP www.vsfutura.com.br<br />
Atualização em Nutrição<br />
<strong>Onco</strong>lógica<br />
XIII Congresso da Sociedade<br />
Brasileira de Radioterapia<br />
20 de junho Santos, SP<br />
lipeolino@yahoo.com.br<br />
Breast Cancer Conference 30 de junho e<br />
1<br />
São Paulo, SP<br />
o de julho<br />
46 junho/julho 2011 <strong>Onco</strong>&<br />
2011<br />
Evento Data Local Informações<br />
Neuro-<strong>Onco</strong>logia:<br />
um passo adiante<br />
XV Congresso da Sociedade<br />
Brasileira de Transplante<br />
de Medula Óssea<br />
2 a 4 de junho Rio de Janeiro, RJ www.inca.gov.br<br />
SoBRICE 2011 10 a 13 de agosto Búzios, RJ<br />
VIII Maratona Urológica<br />
Internacional<br />
IV Fórum de Enfermagem e<br />
Farmácia <strong>Onco</strong>lógica e II Fórum<br />
de Nutrição em <strong>Onco</strong>logia<br />
21 de junho Rio de Janeiro, RJ www.congressosdasbrt.com.br<br />
www.hybrida.com.br<br />
1 Porto Alegre, RS<br />
o de julho www.eventosnpa.com.br<br />
www.sobrice2011.com.br<br />
11 a 14 de agosto Rio de Janeiro, RJ www.inca.gov.br<br />
12 e 13 de agosto Rio de Janeiro, RJ www.maratonaurologica.com.br<br />
19 e 20 de agosto Recife, PE<br />
www.sequipe.com.br