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Fragmentos de um Fascínio - Estudo Geral - Universidade de Coimbra

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a má q u i n a d a es c r i t a<br />

da repetição: «Já quase tudo foi dito nos poemas./ Por<br />

isso a poesia está cansada e vai ficando seca e minguada»<br />

(NhPF: 16).<br />

A exaustão, manifestada com particular evidência<br />

nas produções mais recentes, dada pela isotopia da<br />

secura e da falência, esten<strong>de</strong>‑se ao poeta, enfastiado da<br />

rotina e nauseado <strong>de</strong> <strong>um</strong>a vida escassamente exaltante:<br />

«As vidas que vivi antes <strong>de</strong>sta/ que vai mirrando comigo<br />

livro a livro/ foram por certo mais exaltantes e fatais»<br />

(NhPF: 25).<br />

«Nenh<strong>um</strong> Amor é Tardio» é <strong>um</strong> poema em que<br />

a conjectura ganha acentos <strong>de</strong> suplemento artificial,<br />

concedido à escrita: «Tudo são hipóteses, exercícios dos<br />

sentidos,/ para que a escrita não <strong>de</strong>finhe/ à mingua <strong>de</strong><br />

tema que a anime» (NhPF: 41). O verso com que o<br />

poema remata – «O amor só é tardio/ quando o medo<br />

<strong>de</strong> amar já o venceu» –, n<strong>um</strong>a recuperação inesperada<br />

da energia que é o seu traço, po<strong>de</strong> revelar‑nos que o<br />

cansaço da escrita <strong>de</strong> J. J. Letria resultará menos do<br />

excesso e da <strong>de</strong>smesura que aparecem a marcá‑la e mais<br />

<strong>de</strong> <strong>um</strong>a tensão gerada entre o poeta e a linguagem (com<br />

as suas clivagens e duplicida<strong>de</strong>s), indo até <strong>um</strong>a quase<br />

confissão sobre a vanida<strong>de</strong> da poesia: «Nem meta<strong>de</strong> do<br />

que digo/ tem a dimensão do que é perene./ Não passa<br />

<strong>de</strong> esp<strong>um</strong>a, <strong>de</strong> argila, esboroando‑se/ sob o peso da<br />

chuva» (MI: 56).<br />

O <strong>de</strong>sajuste entre, por <strong>um</strong> lado, o <strong>de</strong>sejo e a<br />

necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> dizer do poeta e, por outro lado, a<br />

capacida<strong>de</strong> da linguagem, e da própria poesia, para<br />

configurar esse dizer, <strong>de</strong> tal modo que há sempre

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