Fragmentos de um Fascínio - Estudo Geral - Universidade de Coimbra
Fragmentos de um Fascínio - Estudo Geral - Universidade de Coimbra
Fragmentos de um Fascínio - Estudo Geral - Universidade de Coimbra
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
Teresa Carvalho<br />
marcada, no seu reflectir, por <strong>um</strong>a vigilância da poesia<br />
própria e da alheia: «Anda essa poesia que os críticos<br />
incensam/ a esbanjar‑se na luxúria da forma,/ incapaz<br />
<strong>de</strong> ter <strong>um</strong>a corda que vibre,/ <strong>um</strong> osso que doa, <strong>um</strong> lábio<br />
que trema./ Efeminou‑se na embriaguês do artifício/ e<br />
<strong>de</strong>ixou <strong>de</strong> ver o que se passava à sua volta» (NhPF: 33).<br />
Dir‑se‑ia que o acto poético é simultaneamente <strong>um</strong> acto<br />
reflexo e <strong>um</strong> acto reflectido.<br />
A pressa <strong>de</strong> escrever a palavra Fim, palavra que<br />
ocupa, aliás, <strong>um</strong> lugar central no universo poético do<br />
autor, não se compa<strong>de</strong>ce, porém, com certos artifícios,<br />
rasuras ou emendas que exigem paciência e vagar,<br />
minúcias que se prolongam no tempo e sossegos que se<br />
não têm. Não emendar, sublinhar dúvidas, ass<strong>um</strong>ir erros,<br />
enganos, <strong>de</strong>sacertos e contradições parece ser, <strong>de</strong> resto,<br />
o princípio orientador da sua poética. Vale a pena ouvir<br />
<strong>um</strong>a enigmática voz que vem d’ Os Mares Interiores:<br />
Não releias o que escreves, dizias,<br />
relê‑te, sim, sempre, no que escreves,<br />
porque o que tens para emendar<br />
não é o texto, mas a fonte que o produz,<br />
não é a página, mas a máquina da voz,<br />
não é a escrita mas o coração da escrita.<br />
Persegue‑me o grito dos pavões<br />
e as rimas que falam <strong>de</strong> dragões e <strong>de</strong> pelejar<br />
porque eu tenho pressa <strong>de</strong> acabar<br />
e não sei se quero ter emenda. (OMI: 114‑115)<br />
Pese embora <strong>um</strong> largo corpus relativo à exposição e<br />
meditação <strong>de</strong> <strong>um</strong>a prática poética, a oficina, ou antes, a<br />
104