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Fragmentos de um Fascínio - Estudo Geral - Universidade de Coimbra

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Teresa Carvalho<br />

A valorização <strong>de</strong> <strong>um</strong> trabalho <strong>de</strong> tipo oficinal,<br />

visível nesta poesia, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> logo, ao nível do tratamento do<br />

ritmo, da rima, que muito contribuem para a limpi<strong>de</strong>z<br />

que a percorre, encontra eco em J. J. Letria, e não apenas<br />

em expressões que o <strong>de</strong>nunciam («rendilhado <strong>de</strong> sons»,<br />

«oficiante do verbo»):<br />

Eu bem sei, sempre o soube<br />

que a poesia também é banca <strong>de</strong> trabalho,<br />

oficina, registo do muito que foi lido.<br />

Mas ai <strong>de</strong>la se for apenas isso,<br />

Se aceitar fazer <strong>de</strong>ssa condição totalida<strong>de</strong>,<br />

<strong>de</strong>sse labor <strong>um</strong> fim e não <strong>um</strong> meio. (NhPF: 55)<br />

Cabe perguntar: on<strong>de</strong> está, na sua poesia, essa<br />

«banca <strong>de</strong> trabalho», que aponta para a racionalida<strong>de</strong><br />

da criação poética, pontuada não pela torrencialida<strong>de</strong>,<br />

pela exuberância verbal e pela comoção <strong>de</strong>spudorada<br />

(que se manifesta na confissão gramatical <strong>de</strong> <strong>um</strong> “eu”),<br />

mas pela economia emotiva (e dos próprios meios <strong>de</strong><br />

expressão), não pela entrega entusiasmada, mas pela<br />

luci<strong>de</strong>z e o rigor formal? Serão assim tão altos os tap<strong>um</strong>es<br />

<strong>de</strong>sta escrita que não <strong>de</strong>ixam ver estratégias, modos<br />

<strong>de</strong> fazer, mas, tão‑só, «modos <strong>de</strong> dizer» («ásperos uns,<br />

cantantes outros» – MI: 63)? Por que razão sobre essa<br />

“banca” vê apenas o leitor, para além <strong>de</strong> certos objectos<br />

que remetem para <strong>um</strong>a visão <strong>de</strong>sencantada da existência<br />

(e para <strong>um</strong> poeta que conce<strong>de</strong> <strong>de</strong>masiado à angústia da<br />

finitu<strong>de</strong>) – as tenazes letais, as tesouras implacáveis, os<br />

g<strong>um</strong>es, enfim, instr<strong>um</strong>entos agudos e perfurantes aptos<br />

a fracturar e a dissecar <strong>um</strong>a interiorida<strong>de</strong> –, <strong>um</strong> «mágico<br />

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