Fragmentos de um Fascínio - Estudo Geral - Universidade de Coimbra
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Teresa Carvalho<br />
entrega total ao acto da criação poética, a conduzir<br />
como que a <strong>um</strong>a anulação da própria consciência e<br />
cuja intensida<strong>de</strong> po<strong>de</strong> ser lida, ou sentida, na respiração<br />
nervosa do poema. Estamos na presença <strong>de</strong> <strong>um</strong>a “arte<br />
<strong>de</strong> ser” («eu sou o que escrevo» – PIL: 11) radicada na<br />
inevitabilida<strong>de</strong> do dizer e do fazer poéticos.<br />
A quem percorre o conjunto da poesia <strong>de</strong> J. J.<br />
Letria, não lhe é difícil verificar que a escrita é para o<br />
autor algo próximo <strong>de</strong> <strong>um</strong>a compulsão, <strong>um</strong>a imposição<br />
vocacional inelutável: «E não encontro paz/ se não<br />
apaziguar em mim essa febre/ que furiosamente me<br />
impele para a escrita» (SR‑L: 27). Esta pulsão (também<br />
a accionar os movimentos que <strong>de</strong>finem a sua poética: o<br />
enigma do H<strong>um</strong>ano, a trajectória pessoal <strong>de</strong> <strong>um</strong> “eu”<br />
fragmentado), que se traduz n<strong>um</strong>a especial energia<br />
da linguagem verbal, remete para a tradição órfica da<br />
poesia. E curioso é observar que a sua aparição é, <strong>de</strong><br />
<strong>um</strong> modo geral, acompanhada <strong>de</strong> vozes ou presenças,<br />
que po<strong>de</strong>m muito bem ser espectrais, portanto sem a<br />
corporalida<strong>de</strong> necessária à materialização verbal:<br />
Que vejo eu quando não escrevo?<br />
O cortejo suplicante dos fantasmas esvaídos<br />
que se apinham no patamar da minha voz. (N:LA: 18)<br />
Elas surgem habitualmente associadas a <strong>um</strong><br />
especial «instante <strong>de</strong> luz» 6 , <strong>um</strong>a centelha <strong>de</strong> luz, ligados<br />
a <strong>um</strong>a concepção do poema como epifania, como <strong>um</strong><br />
fenómeno que transcen<strong>de</strong> o poeta, <strong>um</strong> dom recebido ou<br />
6 Cf. «O Verso Alcançando o Infinito» (II: 417).<br />
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