Fragmentos de um Fascínio - Estudo Geral - Universidade de Coimbra
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Carlos A. Martins <strong>de</strong> Jesus<br />
Dão‑lhe <strong>um</strong> teatro<br />
do tamanho <strong>de</strong> <strong>um</strong>a cida<strong>de</strong> <strong>de</strong>serta<br />
e propõem‑lhe que use como cenário<br />
a sua <strong>de</strong>salmada se<strong>de</strong> <strong>de</strong> sonho,<br />
com tintas <strong>de</strong> água <strong>de</strong> esp<strong>um</strong>a,<br />
mais do que <strong>um</strong> cenário<br />
<strong>um</strong>a catedral para dar guarida<br />
a fantasmas e peregrinos nocturnos. (II: 133)<br />
É essa «catedral [que dá] guarida a fantasmas e<br />
peregrinos nocturnos» a própria poesia, como <strong>um</strong><br />
palco on<strong>de</strong> se (con)fun<strong>de</strong>m personagens diversas,<br />
<strong>um</strong> palco que é o próprio sujeito, na complexida<strong>de</strong><br />
transvectorial dos heterónimos não ass<strong>um</strong>idos que<br />
<strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> si se (con)fun<strong>de</strong>m, atormentado e fascinado<br />
pela multiciplicida<strong>de</strong> das figuras que no seu íntimo se<br />
digladiam. A catedral, elevada a per<strong>de</strong>r <strong>de</strong> vista, é <strong>de</strong><br />
resto <strong>um</strong>a imagem recorrente na poesia <strong>de</strong> J. J. Letria,<br />
relacionada precisamente com o universo metafórico da<br />
representação:<br />
(...) Abre‑se <strong>de</strong> par em par <strong>um</strong> teatro<br />
que consome a reserva <strong>de</strong> l<strong>um</strong>e que trago<br />
nos olhos e é nele que enceno o nascimento<br />
e a morte <strong>de</strong> <strong>um</strong> sonho alto como <strong>um</strong>a catedral<br />
on<strong>de</strong> se c<strong>um</strong>pre o gran<strong>de</strong> cisma da terra:<br />
<strong>de</strong>pois do trono em que se ergue<br />
há <strong>um</strong> vazio <strong>de</strong> tudo on<strong>de</strong> a vida anoitece. (II: 77)<br />
Espaço <strong>de</strong> ascese e <strong>de</strong> queda, <strong>de</strong> nascimento e <strong>de</strong><br />
morte, o palco – na sua matriz clássica – é sobretudo <strong>um</strong><br />
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