Fragmentos de um Fascínio - Estudo Geral - Universidade de Coimbra
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ca r t o g ra f a n d o o labirinto<br />
Contrário é o efeito que a en<strong>um</strong>eração produz<br />
no poema «Os Valores Pessoais», justamente, do livro<br />
A Memória Segundo Magritte. Aqui surpreen<strong>de</strong>mos o<br />
poeta a elaborar o inventário do que lhe pertence: «é<br />
tudo e é nada, é <strong>um</strong> pente,/ <strong>um</strong> pincel da barba, alguns<br />
livros/ as cartas que não cheguei a mandar,/ o retrato<br />
dos filhos ainda pequenos […] <strong>um</strong> sabonete com aroma<br />
<strong>de</strong> bétula/ <strong>um</strong> fósforo molhado pelas lágrimas» (MSM:<br />
115). Não é apenas o banal quotidiano contido n<strong>um</strong>a<br />
página – <strong>um</strong> quadro – que conten<strong>de</strong> com a pose teatral<br />
e cerimoniosa que se observa no «Retrato dos Esposos<br />
Arnolfi», título, aliás, por que é conhecido o quadro e que<br />
o poeta, sintomaticamente, recusou para título do seu<br />
poema, n<strong>um</strong> procedimento raro nesta colectânea que,<br />
<strong>de</strong> <strong>um</strong> modo geral, faz coincidir os títulos. São os valores<br />
materiais que conten<strong>de</strong>m com <strong>um</strong>a insubstancialida<strong>de</strong><br />
que o «obsessivo azul» convertido em moldura que cerca<br />
e abriga os bens do poeta vem sublinhar. É <strong>um</strong> quadro<br />
não apenas para ser visto/lido mas para ser pensado, à<br />
semelhança do quadro <strong>de</strong> Jan Van Eyck.<br />
Também por meio daquele procedimento,<br />
que envolve transferências <strong>de</strong> valores simbólicos, se<br />
converte <strong>um</strong>a mensagem não imediatamente óbvia,<br />
que, <strong>de</strong> resto, tem <strong>de</strong>safiado vários críticos <strong>de</strong> arte,<br />
n<strong>um</strong>a comunicação nítida – indutora <strong>de</strong> esquemas<br />
simplistas e <strong>de</strong> <strong>um</strong>a facilida<strong>de</strong> poética que não existem<br />
– a ocupar o centro escópico do ‘poema‑retrato’: o<br />
dinheiro tudo compra.<br />
Vale a pena sublinhar que o poema <strong>de</strong> Sobre<br />
Retratos, sendo embora <strong>um</strong> poema ecfrástico (e a