Fragmentos de um Fascínio - Estudo Geral - Universidade de Coimbra
Fragmentos de um Fascínio - Estudo Geral - Universidade de Coimbra
Fragmentos de um Fascínio - Estudo Geral - Universidade de Coimbra
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
Carlos A. Martins <strong>de</strong> Jesus<br />
é <strong>um</strong> feixe <strong>de</strong> algas,<br />
<strong>um</strong> coral <strong>de</strong> tons ferinos,<br />
<strong>um</strong> rio <strong>de</strong>saguando em dédalo. (II: 42)<br />
Estrondo e sinfonia, a intranquila e vertiginosa<br />
tarefa <strong>de</strong> cultivar a palavra. Uma poesia que vive <strong>de</strong><br />
intersecções e sentimentos sempre múltiplos e cruzados,<br />
<strong>um</strong> amplo sentir que não cabe em espartilhos. Ressurge<br />
o poeta das ondas volvido em Dédalo, arquitecto mítico<br />
da palavra, capaz <strong>de</strong> ousar os mais perfeitos versos, a<br />
mais harmoniosa sinfonia. Artilhado com as asas <strong>de</strong><br />
cera que conduzem ao sonho, sente que nem o sol,<br />
astro flamejante, po<strong>de</strong> pôr termo a essa empresa sempre<br />
marcada pela audácia. Porque assim é o ofício da poesia,<br />
complexa arquitectura <strong>de</strong> sons e palavras roubadas à<br />
memória dos tempos:<br />
Balbuciava <strong>um</strong> poeta em busca <strong>de</strong> <strong>um</strong> nexo<br />
para as íntimas palavras que serpenteiam<br />
na cabeça dos <strong>de</strong>uses e tudo o que encontrava<br />
era <strong>um</strong>a erva rasteira, <strong>um</strong> murmúrio <strong>de</strong> vento,<br />
<strong>um</strong>a esp<strong>um</strong>a na boca, <strong>um</strong>a areia <strong>de</strong> lua.<br />
Arquitectava, à revelia dos livros,<br />
<strong>um</strong>a explicação para o assombro do mundo<br />
e vinham os cães, as flores carnívoras,<br />
os pássaros nocturnos e comiam‑lhe os olhos,<br />
como os séculos cost<strong>um</strong>am fazer à beleza dos mitos. (II: 70)<br />
Da infernal cabeça <strong>de</strong> Medusa nascem, terríveis<br />
em seu on<strong>de</strong>ar, as serpentes, confusão mais que<br />
labiríntica <strong>de</strong> palavras em que se per<strong>de</strong> o poeta, na<br />
22