Fragmentos de um Fascínio - Estudo Geral - Universidade de Coimbra
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Teresa Carvalho<br />
porque tu és <strong>um</strong> e és tantos<br />
que, mesmo no quadro,<br />
eu não sei qual <strong>de</strong> vós<br />
enganou o Almada, fazendo‑se passar<br />
por <strong>um</strong> outro, que era outro,<br />
que era outro, até à alucinação<br />
dos mundos que cabem no labirinto<br />
das tintas quando representam o génio.<br />
Até <strong>um</strong> terno ciclope, <strong>de</strong> olho discretamente<br />
il<strong>um</strong>inado pela nu<strong>de</strong>z <strong>de</strong> <strong>um</strong>a mulher e pela agilida<strong>de</strong><br />
verbal do poeta, a recriar a leveza radiosa e o inquietante<br />
do estilo pictórico <strong>de</strong> Odilon Redon, faz a sua aparição<br />
neste livro, arrastando o leitor para esferas on<strong>de</strong> as<br />
palavras parecem impotentes.<br />
Quem conhece a escrita poética <strong>de</strong> José Jorge<br />
Letria e, portanto, sabe que a sua medida é o excesso,<br />
ao ver aparecer estas figuras, há‑<strong>de</strong> perguntar‑se o que<br />
faz este pintor diante <strong>de</strong> <strong>um</strong> cavalete, preso a <strong>um</strong> género<br />
– pictórico – que, por pedir alg<strong>um</strong>a contenção, não<br />
faz o seu género. Ainda muito recentemente, <strong>de</strong> resto<br />
– exactamente há três colectâneas <strong>de</strong> poemas atrás –,<br />
afirmava que, «se pintasse,/ teria que pintar retábulos,<br />
tectos <strong>de</strong> capelas, murais,/ teria que ter tanto espaço<br />
como aquele que, por pieda<strong>de</strong>,/ peço à página, só para<br />
ter a certeza que nada fica <strong>de</strong> fora» (PIL: 56).<br />
A verda<strong>de</strong> é que os poemas‑retrato 4 <strong>de</strong>ste livro,<br />
que não são propriamente cópias verbais <strong>de</strong> objectos <strong>de</strong><br />
4 A expressão é emprestada <strong>de</strong> Jorge <strong>de</strong> Sena que a cunhou a<br />
propósito da colectânea <strong>de</strong> poemas <strong>de</strong> João Maia, Verbo do Verbo<br />
(1957).<br />
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