Fragmentos de um Fascínio - Estudo Geral - Universidade de Coimbra
Fragmentos de um Fascínio - Estudo Geral - Universidade de Coimbra Fragmentos de um Fascínio - Estudo Geral - Universidade de Coimbra
Teresa Carvalho é inegável. Estreita‑se naquelas composições em que o poeta cria o seu próprio quadro, tantas vezes cheio de lugares vazios que as palavras crispadas vêm preencher, intensifica‑se em poemas onde surgem referências ou ecos pictóricos (estou a lembrar‑me, por exemplo, de um, de Produto Interno Lírico, em que as vacas das telas oníricas de Chagall vêm pousar, «como as moscas e as borboletas,/ em cada corola da paisagem do verso» (PIL: 49) e de outro, da mesma colectânea, onde o poeta confessa que «gostava de pintar como Magritte,/ que é como quem diz: gostava de trocar as voltas ao mundo» – PIL: 56), e, claramente, em poemas onde a substância da pintura marca presença de modo particular: O vermelho deste quadro à minha frente é o meu sangue a sair do bojo de uma história aos borbotões, tinta a imitar a dor. Eu sou o retábulo e o esboço imperfeito. (PIL: 18) A relação entre a arte do poeta e a do pintor, com uma longa história que não cabe aqui tracejar 1 , fortalece‑se ainda em Os Oficiantes da Luz 2 – uma obra de celebração dos grandes pintores, da Renascença à contemporaneidade – e atinge um momento de felicidade rara em Sobre Retratos, um livro de desígnio plástico e lirismo indagador que preserva as tradições 1 Vd. Carlos Ascenso André, «Poesia e Pintura»: O Poeta no Miradouro do Mundo, Coimbra, Centro Interuniversitário de Estudos Camonianos, 2008, pp. 159‑168. 2 Vd. Fernanda Botelho, «Os Oficiantes da Luz»: Colóquio/ Letras 135‑136 (Janeiro/Junho 1995), p. 245. 114
so b r e re t ra t o s (e s o b r e q u e m o s (d)e s c re v e) especulativas e cultas da poesia de língua portuguesa, recuperadas por Jorge de Sena nas Metamorfoses. Para dizer o que vê encontra José Jorge Letria na ekphrasis um procedimento‑chave que dá visualização e corpo ao famoso preceito de Horácio “ut pictura poesis”. Não se cinge o poeta àquela que se apresenta como a mais imediata definição de poesia ecfrástica, um género que se caracteriza por “descrever uma obra de arte”, por ser “a descrição poética de uma obra de arte pictórica ou escultórica”. Os poemas desta colectânea vão, antes, ao encontro da definição mais ampla de ekphrasis, que aponta também para um trabalho de recriação, comentário e exaltação 3 . Composto por uma extensa sequência de poemas que têm como referentes quadros célebres, retratos, em sentido amplo, que aquele leitor mais curioso (e dedicado) pode sempre apreciar sem necessidade de percorrer as galerias dos grandes museus de arte pública, este é um livro que parece desafiar os limites da plasticidade da linguagem verbal. Nele vemos crescer, pela Palavra, figuras diversas que passam pelos nossos olhos ao ritmo da força indomável do génio criador de José Jorge Letria: santos, descidos dos altares onde não cabem, a quem o poeta anima os volumes dos brocados e humaniza os rostos, tocados pela austeridade e por traços de luz espiritualizada que se entorna na página («São Francisco 3 V. M. Aguiar e Silva, Teoria e Metodologia Literárias, Lisboa, Universidade Aberta, 1990, pp. 163‑165. Vd. Fernando Guimarães, «As imagens ausentes», Jornal de Letras, 19 de Novembro 2008, p. 23. 115
- Page 53 and 54: Teresa Carvalho A linguagem comum -
- Page 55 and 56: Teresa Carvalho Que vereda de aço,
- Page 57 and 58: Teresa Carvalho marinha, castelo de
- Page 59 and 60: Teresa Carvalho sacrificaria os sig
- Page 61 and 62: Teresa Carvalho Assim se entende qu
- Page 63 and 64: Teresa Carvalho figura do pai; à a
- Page 65 and 66: Teresa Carvalho remete‑nos para a
- Page 67 and 68: Teresa Carvalho lembranças (…) Q
- Page 69 and 70: a P o É t i c a d a m á s c a ra
- Page 71 and 72: a P o É t i c a d a m á s c a ra
- Page 73 and 74: a P o É t i c a d a m á s c a ra
- Page 75 and 76: a P o É t i c a d a m á s c a ra
- Page 77 and 78: a P o É t i c a d a m á s c a ra
- Page 79 and 80: a P o É t i c a d a m á s c a ra
- Page 81 and 82: a P o É t i c a d a m á s c a ra
- Page 83 and 84: 91 a má q u i n a d a es c r i t a
- Page 85 and 86: 93 a má q u i n a d a es c r i t a
- Page 87 and 88: 95 a má q u i n a d a es c r i t a
- Page 89 and 90: 97 a má q u i n a d a es c r i t a
- Page 91 and 92: 99 a má q u i n a d a es c r i t a
- Page 93 and 94: 101 a má q u i n a d a es c r i t
- Page 95 and 96: 103 a má q u i n a d a es c r i t
- Page 97 and 98: 105 a má q u i n a d a es c r i t
- Page 99 and 100: 107 a má q u i n a d a es c r i t
- Page 101 and 102: 109 a má q u i n a d a es c r i t
- Page 103: so b r e re t ra t o s (e s o b r e
- Page 107 and 108: so b r e re t ra t o s (e s o b r e
- Page 109 and 110: so b r e re t ra t o s (e s o b r e
- Page 111 and 112: so b r e re t ra t o s (e s o b r e
- Page 113 and 114: so b r e re t ra t o s (e s o b r e
- Page 115 and 116: so b r e re t ra t o s (e s o b r e
- Page 117 and 118: 127 Pl a c e n t a d e v o z e s a
- Page 119 and 120: Carlos A. Martins de Jesus e te ele
- Page 121 and 122: Carlos A. Martins de Jesus «vozes
- Page 123 and 124: Carlos A. Martins de Jesus e perfum
- Page 125 and 126: Carlos A. Martins de Jesus nem no n
- Page 127 and 128: Carlos A. Martins de Jesus poetisa
- Page 129 and 130: Imagem 1 J. Van Eyck, O Casal Arnol
- Page 131 and 132: Imagem 3 Fragmento de um krater de
- Page 133 and 134: Imagem 5 Michel Sittow, Catarina de
- Page 135 and 136: Imagem 7 G. Arcimboldo, O Verão (1
- Page 137 and 138: es t u d o s s o b r e Jo s é Jo r
- Page 139 and 140: SOUSA, João Rui de, «Nos Caminhos
- Page 141: Aqui se reúnem sete ensaios que t
so b r e re t ra t o s (e s o b r e q u e m o s (d)e s c re v e)<br />
especulativas e cultas da poesia <strong>de</strong> língua portuguesa,<br />
recuperadas por Jorge <strong>de</strong> Sena nas Metamorfoses.<br />
Para dizer o que vê encontra José Jorge Letria na<br />
ekphrasis <strong>um</strong> procedimento‑chave que dá visualização<br />
e corpo ao famoso preceito <strong>de</strong> Horácio “ut pictura<br />
poesis”. Não se cinge o poeta àquela que se apresenta<br />
como a mais imediata <strong>de</strong>finição <strong>de</strong> poesia ecfrástica, <strong>um</strong><br />
género que se caracteriza por “<strong>de</strong>screver <strong>um</strong>a obra <strong>de</strong><br />
arte”, por ser “a <strong>de</strong>scrição poética <strong>de</strong> <strong>um</strong>a obra <strong>de</strong> arte<br />
pictórica ou escultórica”. Os poemas <strong>de</strong>sta colectânea<br />
vão, antes, ao encontro da <strong>de</strong>finição mais ampla <strong>de</strong><br />
ekphrasis, que aponta também para <strong>um</strong> trabalho <strong>de</strong><br />
recriação, comentário e exaltação 3 .<br />
Composto por <strong>um</strong>a extensa sequência <strong>de</strong> poemas<br />
que têm como referentes quadros célebres, retratos,<br />
em sentido amplo, que aquele leitor mais curioso<br />
(e <strong>de</strong>dicado) po<strong>de</strong> sempre apreciar sem necessida<strong>de</strong><br />
<strong>de</strong> percorrer as galerias dos gran<strong>de</strong>s museus <strong>de</strong> arte<br />
pública, este é <strong>um</strong> livro que parece <strong>de</strong>safiar os limites da<br />
plasticida<strong>de</strong> da linguagem verbal.<br />
Nele vemos crescer, pela Palavra, figuras diversas<br />
que passam pelos nossos olhos ao ritmo da força<br />
indomável do génio criador <strong>de</strong> José Jorge Letria:<br />
santos, <strong>de</strong>scidos dos altares on<strong>de</strong> não cabem, a quem<br />
o poeta anima os vol<strong>um</strong>es dos brocados e h<strong>um</strong>aniza<br />
os rostos, tocados pela austerida<strong>de</strong> e por traços <strong>de</strong> luz<br />
espiritualizada que se entorna na página («São Francisco<br />
3 V. M. Aguiar e Silva, Teoria e Metodologia Literárias, Lisboa,<br />
Universida<strong>de</strong> Aberta, 1990, pp. 163‑165. Vd. Fernando Guimarães,<br />
«As imagens ausentes», Jornal <strong>de</strong> Letras, 19 <strong>de</strong> Novembro 2008, p.<br />
23.<br />
115